APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 5002124-31.2015.4.04.7004/PR
RELATOR | : | ROGERIO FAVRETO |
APELANTE | : | EROTIDES SANTIAGO DA SILVA |
ADVOGADO | : | francis marcel carrilho cardoso |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELADO | : | OS MESMOS |
MPF | : | MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL |
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. PESSOA INCAPACITADA DE PROVER A PRÓPRIA MANUTENÇÃO OU TÊ-LA PROVIDA DE OUTRA FORMA. COMPROVAÇÃO. CONCESSÃO. REMESSA NECESSÁRIA. RESTITUIÇÃO DOS VALORES. PRINCÍPIO DA IRREPETIBILIDADE.
1. Procede o pedido de concessão do benefício assistencial previsto no art. 203, V da CF/88 quando atendidos os requisitos previstos na Lei nº 8.742/1993.
2. Comprovada a condição de pessoa deficiente ou idosa e a situação de risco social da parte autora e de sua família, é devido o benefício assistencial desde o requerimento administrativo.
3. O fato de integrante do grupo familiar auferir proventos não impede que outra pessoa da mesma família possa habilitar-se ao benefício assistencial, desde que verificada a situação de miserabilidade. Logo, ao se calcular a renda familiar da parte autora, não se pode considerar no cálculo qualquer benefício assistencial ou benefício previdenciário de renda mínima que seja percebido por idoso ou deficiente integrante do grupo familiar.
4. O § 3º, I, do art. 496, do novo Código de Processo Civil dispensa a submissão da sentença ao duplo grau de jurisdição quando a condenação ou o proveito econômico obtido na causa for de valor certo e líquido inferior a 1.000 (mil) salários-mínimos para a União e suas respectivas autarquias e fundações de direito público.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 5ª. Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, não conhecer da remessa necessária, negar provimento à apelação do INSS e dar provimento à apelação da parte autora, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 11 de abril de 2017.
Desembargador Federal ROGERIO FAVRETO
Relator
| Documento eletrônico assinado por Desembargador Federal ROGERIO FAVRETO, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8893056v6 e, se solicitado, do código CRC EBE65EB2. | |
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| Signatário (a): | Rogerio Favreto |
| Data e Hora: | 11/04/2017 13:59 |
APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 5002124-31.2015.4.04.7004/PR
RELATOR | : | ROGERIO FAVRETO |
APELANTE | : | EROTIDES SANTIAGO DA SILVA |
ADVOGADO | : | francis marcel carrilho cardoso |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELADO | : | OS MESMOS |
MPF | : | MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL |
RELATÓRIO
Trata-se de ação em que a parte autora pretende o restabelecimento de benefício assistencial devido à pessoa deficiente, a contar da data da cessação administrativa, ocorrida em 01/09/2014. Postula, ainda, a inexigibilidade do débito constituído pela Autarquia Previdenciária, em razão do pagamento do benefício alegadamente de forma indevida.
Sentenciando, o MM. Juiz assim decidiu (evento 75 originário):
3. Dispositivo
Pelo exposto, resolvendo o mérito do pedido, forte no art. 487, inciso I, do CPC, julgo procedente o pedido inicial, para o fim de:
3.1. Condenar o INSS a:
a) RESTABELECER à parte autora o benefício assistencial de que trata o art. 20 da Lei n.º 8.742/1993 (NB 514.983.427-7), a partir da realização do estudo socioeconômico apresentado no evento '11' (05.06.2015), nos termos da fundamentação;
b) REIMPLANTAR o aludido benefício, IMEDIATAMENTE, em razão da antecipação dos efeitos da tutela deferida, com início de pagamento administrativo (DIP) fixado na data da prolação desta sentença;
c) PAGAR à parte autora (via judicial) as prestações vencidas (desde 05.06.2015) até a data da implantação administrativa, devidamente atualizadas, consoante critérios definidos na fundamentação;
d) PAGAR honorários ao(à) advogado(a) da parte autora; ressalto que a parte autora sucumbiu em parcela mínima do pedido (pagamento no período de 04.12.2014 até 04.06.2015), motivo pelo qual a condenação recai sobre a parte ré;
e) DEVOLVER à Justiça Federal (Seção Judiciária do Paraná) o valor adiantado a título de honorários periciais, devidamente atualizados, tendo em vista que o resultado do estudo socioeconômico foi favorável ao autor, demonstrando que o INSS não tinha razão em rejeitar a pretensão estampada na inicial.
3.2. DECLARAR a inexistência do débito relativamente à exigência do INSS de devolução dos valores recebidos pela parte autora a título de benefício assistencial (NB 514.983.427-7), no período de 04.05.2006 a 31.08.2014, determinando ao INSS o cancelamento da dívida cobrada por meio do Ofício nº. 14.023.07.0/0921/2014 (evento '01' - OFÍCIO/C11).
Tendo em vista que se trata de sentença ilíquida, o valor dos honorários advocatícios de sucumbência somente será definido em liquidação de sentença, nos termos do art. 85, § 4º, inciso II, do Novo Código de Processo Civil; não obstante isso, considerando os critérios previstos no § 2º desse dispositivo, especialmente a natureza e a importação da causa, sem complexidade alguma, o trabalho realizado pelo advogado e o tempo exigido para o seu serviço, desde já fica definido que o percentual a ser aplicado no cálculo dos honorários é o mínimo previsto nos incisos do § 3º do referido art. 85. A base de cálculo dos honorários é o montante da dívida que era cobrada pelo INSS, devidamente atualizada pelo INPC, somado ao montante das prestações vencidas do benefício a partir de 05.06.2015 até a presente data (Súmulas n.º 76 do Tribunal Regional e n.º 111 do Superior Tribunal de Justiça).
O INSS é isento de custas no foro federal. Se ainda não realizado, promova-se o pagamento da Assistente Social, por meio do Sistema AJG, certificando-se nos autos.
Desnecessário encaminhar requisição à Agência da Previdência Social para a implantação do benefício, porquanto compete ao(à) Procurador(a) que representa o INSS em juízo realizar as diligências administrativas necessárias para o cumprimento das decisões judiciais. A reimplantação do benefício deve ser compravada até o final do prazo recursal, sob pena de imposição de multa por descumprimento.
Sentença sujeita a reexame necessário, nos termos do art. 496 do CPC/2015; não é possível aplicar a dispensa prevista no § 3º desse artigo, porque o valor da condenação não é líquido. Assim, com ou sem recursos voluntários, oportunamente, remetam-se os autos ao TRF da 4ª Região.
Irresignado, a parte autora interpôs apelação requerendo sejam julgados procedentes os seus pedidos. Afirma, em síntese, ter preenchido o requisito da miserabilidade desde o período compreendido entre os dias 04/12/2014 e 06/06/2015 (evento 79 originário).
Por sua vez, o INSS interpôs apelação pugnando pela reforma da sentença. Preliminarmente, requer a nulidade da decisão, em face da carência de fundamentação. No mérito, sustenta, em síntese, que a parte autora não preenche o requisito socioeconômico para concessão do benefício (evento 80 originário).
Oportunizadas as contrarrazões, vieram os autos a esta Corte.
O Ministério Público Federal opinou pelo não provimento das apelações do INSS e da parte autora (evento 4).
É o relatório.
VOTO
Da ordem cronológica dos processos:
O presente feito está sendo levado a julgamento em consonância com a norma do art. 12 do atual CPC (Lei nº 13.105/2015, com redação da Lei nº 13.256/2016) que assim dispõe: os juízes e os tribunais atenderão, preferencialmente, à ordem cronológica de conclusão para proferir sentença ou acórdão. Nessa ordem de julgamento, também são contempladas as situações em que estejam litigando pessoa com mais de sessenta anos (idoso, Lei n. 10.741/2013), pessoas portadoras de doenças indicadas no art. 6º, inciso XIV, da Lei n. 7.713/88, as demandas de interesse de criança ou adolescente (Lei n. 8.069/90) ou os processos inseridos como prioritários nas metas impostas pelo CNJ.
Ademais, cumpre registrar que foi lançado ato ordinatório na informação processual deste feito programando o mês de julgamento, com observância cronológica e preferências legais. Esse procedimento vem sendo adotado desde antes (2013) da vigência do novo CPC.
Da remessa necessária:
Em relação à remessa necessária, a Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça dirimiu a controvérsia e firmou o entendimento, no julgamento do Recurso Especial Repetitivo nº 1.101.727/PR, no sentido de que é obrigatório o reexame de sentença ilíquida proferida contra a União, os Estados, o Distrito Federal, os Municípios e as respectivas autarquias e fundações de direito público (Código de Processo Civil, artigo 475, parágrafo 2º). Em conformidade com esse entendimento, o STJ editou a súmula Nº 490: "A dispensa de reexame necessário, quando o valor da condenação ou do direito controvertido for inferior a sessenta salários mínimos, não se aplica a sentenças iliquidas".
Contudo, § 3º, I, do art. 496, do novo Código de Processo Civil, dispensa a submissão da sentença ao duplo grau de jurisdição quando a condenação ou o proveito econômico obtido na causa for de valor certo e líquido inferior a 1.000 (mil) salários-mínimos para a União e suas respectivas autarquias e fundações de direito público.
A despeito da orientação firmada sob a égide do antigo Código de Processo Civil, de submeter ao reexame necessário as sentenças ilíquidas, é pouco provável que a condenação nas lides previdenciárias, na quase totalidade dos feitos, ultrapassem o valor limite de mil salários mínimos. E isso fica evidente especialmente nas hipóteses em que possível mensurar o proveito econômico por mero cálculo aritmético.
Assim, tomando como referência o montante previsto no dispositivo do novo CPC, tratando-se de benefício cujo valor corresponde a um salário mínimo por mês e levando em consideração a data da cessação administrativa (04/12/2014) e a data da publicação da sentença (14/10/2016), é forçoso concluir que o valor da condenação, acrescidos de correção monetária e juros, não excederá 1.000 (mil) salários-mínimos.
Nesse caso, portanto, não conheço da remessa necessária.
Por fim, na hipótese de impugnação específica sobre o ponto, fica a parte inconformada, desde já, autorizada a instruir o respectivo recurso contra a presente decisão com memória de cálculo do montante que entender devido, o qual será considerado apenas para a análise do cabimento ou não da remessa necessária.
Da nulidade da sentença:
Quanto à alegada ausência de fundamentação, tal exigência tem como objetivo o controle da decisão judicial, não sendo necessária, contudo, mais do que a exteriorização dos elementos que propiciaram o convencimento do magistrado.
O preceito constitucional da fundamentação não determina que todos os argumentos possíveis sejam explanados na decisão, bastando a exteriorização dos pressupostos lógicos que conduziram à convicção decisória do magistrado. Não se pode confundir eventual insuficiência de fundamentação com ausência de fundamentação, o que não ocorre no caso dos autos.
Em verdade, o art. 93, IX da Constituição determina que o julgador dê as razões de seu convencimento, não se exigindo que a decisão seja exaustivamente fundamentada, porquanto a decisão com motivação sucinta é decisão motivada, estando satisfeita a premissa constitucional (STF, AgR, Relator Min. RICARDO LEWANDOWSKI, Segunda Turma, julgado em 16/12/2016; Repercussão Geral reconhecida pelo Plenário, no julgamento do AI 791.292 QO-RG, Rel. Min. Gilmar Mendes, DJe de 12/08/2010; ARE 686655 ED, Relator Min. LUIZ FUX, Primeira Turma, julgado em 07/08/2012).
E como tal é o caso dos autos, cuja sentença recorrida exteriorizou os fundamentos conducentes ao resultado decisório, tendo o magistrado a quo manifestado-se de forma clara, analisando todos os pontos alegados pelas partes.
Nestes termos, não prospera a insurgência do INSS.
Do benefício assistencial devido à pessoa com deficiência:
À época do requerimento administrativo, anteriormente às alterações promovidas na Lei nº 8.742/1993 no ano de 2011, os critérios de concessão do benefício assistencial estavam assim dispostos:
Art. 20. O benefício de prestação continuada é a garantia de 1 (um) salário mínimo mensal à pessoa portadora de deficiência e ao idoso com 70 (setenta) anos ou mais e que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção e nem de tê-la provida por sua família.
§ 1o Para os efeitos do disposto no caput, entende-se como família o conjunto de pessoas elencadas no art. 16 da Lei no 8.213, de 24 de julho de 1991, desde que vivam sob o mesmo teto.
§ 2º Para efeito de concessão deste benefício, a pessoa portadora de deficiência é aquela incapacitada para a vida independente e para o trabalho.
§ 3º Considera-se incapaz de prover a manutenção da pessoa portadora de deficiência ou idosa a família cuja renda mensal per capita seja inferior a 1/4 (um quarto) do salário mínimo.
§ 4º O benefício de que trata este artigo não pode ser acumulado pelo beneficiário com qualquer outro no âmbito da seguridade social ou de outro regime, salvo o da assistência médica.
§ 5º A situação de internado não prejudica o direito do idoso ou do portador de deficiência ao benefício.
§ 6o A concessão do benefício ficará sujeita a exame médico pericial e laudo realizados pelos serviços de perícia médica do Instituto Nacional do Seguro Social - INSS.
Para efeito de concessão deste benefício, a pessoa com deficiência é aquela incapacitada para a vida independente e para o trabalho, ou seja, aquela portadora de incapacidade que impede o exercício de atividade remunerada, o que deve ser analisado à luz do caso concreto.
Em relação à criança com deficiência, deve ser analisado o impacto da incapacidade na limitação do desempenho de atividades e na restrição da participação social, compatível com a sua idade.
Assim, em conclusão, o benefício assistencial é devido à pessoa com deficiência integrante de grupo familiar em situação de miserabilidade.
Do conceito de família:
O conceito de família, à época do requerimento administrativo, compreendia: o requerente do benefício, o cônjuge, a companheira, o companheiro e o filho não emancipado, de qualquer condição, menor de 21 (vinte e um) anos ou inválido, os pais e o irmão não emancipado, de qualquer condição, menor de 21 (vinte e um) anos ou inválido.
Da condição socioeconômica:
Em relação ao critério econômico, o art. 20, § 3º, da Lei nº 8.742/1993, estabelecia que se considerava hipossuficiente a pessoa com deficiência ou idoso cuja família possuísse renda per capita inferior a ¼ do salário mínimo.
Contudo, o Superior Tribunal de Justiça, por sua Terceira Seção, ao apreciar recurso especial representativo de controvérsia, relativizou o critério estabelecido pelo referido dispositivo legal. Entendeu que, diante do compromisso constitucional com a dignidade da pessoa humana, "a limitação do valor da renda per capita familiar não deve ser considerada a única forma de se comprovar que a pessoa não possui outros meios de prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, pois é apenas um elemento objetivo para se aferir a necessidade, ou seja, presume-se absolutamente a miserabilidade quando comprovada a renda per capita inferior a ¼ do salário mínimo" (REsp n. 1.112.557/MG, rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, Terceira Seção, j. 28/10/2009, DJ 20/11/2009).
Além disso, o STJ, órgão ao qual compete a uniformização da interpretação da lei federal em nosso sistema, acrescentou, no julgado citado, que "em âmbito judicial vige o princípio do livre convencimento motivado do juiz (art. 131 do CPC) e não o sistema de tarifação legal de provas, motivo pelo qual essa delimitação do valor da renda familiar per capita não deve ser tida como único meio de prova da condição de miserabilidade do beneficiado".
Como se percebe, o entendimento da Corte Superior consolidou-se no sentido de que é possível a aferição da miserabilidade do deficiente ou do idoso por outros meios, ainda que não observado estritamente o critério da renda familiar per capita previsto no § 3º do art. 20 da Lei nº 8.742/1993.
Nesse sentido, tenho adotado posição de flexibilizar os critérios de reconhecimento da miserabilidade, merecendo apenas adequação de fundamento frente à recente deliberação do Supremo Tribunal Federal, que, por maioria, ao analisar os recursos extraordinários 567.985 e 580.963, ambos submetidos à repercussão geral, reconheceu a inconstitucionalidade do § 3º do art. 20 da Lei nº 8.742/1993 - LOAS, assim como do art. 34 da Lei 10.741/2003 - Estatuto do Idoso.
Com efeito, reconhecida a inconstitucionalidade do critério econômico objetivo em regime de repercussão geral, cabe ao julgador, na análise do caso concreto, aferir o estado de miserabilidade da parte autora e de sua família, sendo o caso, a justificar a concessão do benefício assistencial. Cabe registrar que esta Corte - Tribunal Regional Federal da 4ª Região, ainda que por outros fundamentos, vinha adotando uma maior flexibilização nos casos em que a renda per capita superava o limite estabelecido no art. 20, § 3º, da LOAS, agora dispensável enquanto parâmetro objetivo de renda familiar.
Em conclusão, o benefício assistencial destina-se àquelas pessoas que se encontram em situação de elevada pobreza, por não possuírem meios para prover sua subsistência, nem de tê-la provida por sua família, ainda que a renda familiar per capita venha a ser considerada como meio de prova desta situação.
Do caso concreto:
No caso em tela, a parte autora busca o restabelecimento do benefício assistencial - NB 514.983.427-7, o qual foi concedido com DIB 19/08/2002 e cessado em 01/09/2014, após constatação de irregularidade na manutenção do benefício. Em consequência, a Autarquia Previdenciária promoveu a cobrança e determinou a devolução dos valores recebidos no período de 19/08/2002 a 04/12/2014.
Quanto à condição de miserabilidade, o estudo social (evento 11 originário), realizado em 05/06/2015, informa que o grupo familiar atualmente é composto pelo autor, sua companheira Carmela dos Santos Silva, seu filho Marcos Antônio dos Santos Silva e o neto Junio Silva Moreira.
A família residia, à época da visita domiciliar, em imóvel alugado de alvenaria, em bom estado de conservação e habitabilidade, composto de uma cozinha, uma sala, dois dormitórios, um banheiro e área externa coberta. A mobília era simples e a moradia possuía energia elétrica, água tratada, pavimentação e rede de esgoto.
A renda familiar provém do benefício de prestação continuada, no valor de um salário mínimo mensal, percebida pela companheira do requerente. Insta destacar que Marcos Antônio, de acordo com o laudo social, é dependente químico, razão pela qual não consegue permanecer no mercado de trabalho.
Ademais, conforme o parecer socioeconômico, as despesas consubstanciavam-se no pagamento de aluguel, alimentação, higiene, limpeza, energia elétrica e água, totalizando um valor aproximado de R$ 1.072,00 mensais.
Sabe-se, também, que a família era acompanhada pelo Centro de Referência da Assistência Social e recebia, eventualmente, uma cesta básica, bem como doações de roupas e calçados da comunidade.
Ainda, em complementação ao estudo social foi colhida a prova oral, a qual transcrevo da sentença, a fim de se evitar tautologia:
Em seu depoimento pessoal, o autor, Sr. EROTIDES SANTIAGO DA SILVA, disse que (evento '73' - VIDEO2) mora atualmente na Rua 21 de abril, Jardim Alvorada, em Umuarama/PR, faz um ano que mora lá, na casa mora ele, a esposa Carmela, o filho Marcos e um neto, ele não é filho do Marcos; a casa em que mora é alugada, paga 450 reais, ninguém trabalha na casa do autor, o último trabalho foi em São Paulo, depois que veio para Umuarama não trabalhou mais, tem problema de saúde; o filho Marcos não trabalha porque bebe, ele é dependente, não consegue trabalhar; a família se sustenta com o benefício assistencial percebido pela esposa; antes desse endereço, morou na Rua Paulo Fabio Pimentel Gonçalves, no Dom Pedro II, sempre em casa de aluguel; os outros filhos se chamam Valdir, Cristina e Márcia; a Márcia morou com o autor bastante tempo, faz um ano e tanto que ela casou e foi embora; o neto que mora com o autor é da Cristina, ele veio do sítio para Umuarama para estudar, passa a semana com o autor; os filhos do autor não tem condições de ajudar o autor; o gol que está no nome do autor era da filha do autor, ela trabalhando na averama conseguiu um dinheiro e comprou, como ela não tinha carteira colocou no nome do autor; faz uns 2 anos que vendeu o carro, era um golzinho modelo velho; quando a sua filha Marcia trabalhava no Averama o filho Marcos morava com o autor, ele arrumou a mulher mas sempre morava com o autor; hoje é a esposa quem paga o aluguel; o Marcos ficou internado umas par de vezes, não ficava mais de um mês, porque lá não pode ficar mais de um mês; quando a Márcia morava com eles, ela ajudava nas contas de casa, água, luz e combustível, o autor usava o carro porque sua esposa tinha que fazer tratamento para o câncer, foi a Márcia quem comprou o carro, a Márcia não usava o carro, ela não sabe dirigir; depois que ela casou vendeu o carro.
A testemunha do juízo, MARIA APARECIDA FERNANDES VIEIRA, relatou que (evento '73' - VIDEO3) conhecera o autor há 5 anos porque a esposa dele passava no portão da casa da depoente e esta sempre ajudava a esposa do autor, dava roupa para ele, o que tinha sobrando dava para a Carmelita; a depoente não sabia onde eles moravam; a casa em que eles moram hoje é do neto da depoente, eles moram lá desde o ano passado, eles pagam 450 reais, quem paga é a Carmelita, a fonte de renda deles hoje é o salário da aposentadoria, ela paga o aluguel e o resto que sobra ela paga água, energia; quem mora lá é o autor, a Dona Carmelita, um filho, mas ela falou que tem um neto que mora lá; o filho deles não trabalha, ele é doente, não sabe o que ele tem; não sabe quantos filhos o casal tem; eles não tem carro, nunca viu o autor com carro, a depoente quase não vai lá porque é a Carmelita quem traz o dinheiro do aluguel para a depoente; ninguém da família trabalha; a depoente ajudava a Carmelita porque ela pedia, a Carmelita passava em outras casas, tinha uma outra vizinha que ajudava ela também; isso ainda acontece, esses dias a depoente deu arroz, feijão, ela pede alimentos, roupa; a depoente conhecia a Márcia, filha do autor, porque ela trabalhava como doméstica na casa de seu pai, não sabe se Márcia morou com o autor, ela ficou sabendo pela mãe que ela se casou.
Cumpre salientar que, durante o período compreendido entre os dias 04/12/2014 e 05/06/2015, noticiou-se que a filha do requerente Marcia dos Santos Silva e a menor Vitória Gabrielli de Jesus também integravam o grupo familiar.
Nesse sentido, passo a avaliar a renda familiar naquele período, levando-se em consideração os rendimentos percebidos pela filha do autor. Em análise ao CNIS, verifico que Marcia auferia remuneração em torno de R$ 1.000,00 a R$ 1.500,00 junto à empresa Averama Alimentos S/A (evento 18, CNIS4, originário).
Além disso, deve ser salientado, no que toca ao requisito miserabilidade, que o Supremo Tribunal Federal, em julgamento ocorrido em 18/04/2013 (RE 567.985/MT e RE 580.963/PR), declarou a inconstitucionalidade do parágrafo único do artigo 34 da Lei 10.741/03 (Estatuto do Idoso), o qual estabelece que o benefício assistencial já concedido a qualquer idoso membro da família "não será computado para os fins do cálculo da renda familiar per capita a que se refere a LOAS". Segundo entendeu o Supremo Tribunal Federal, o parágrafo único do artigo 34 da Lei 10.741/03 violou o princípio da isonomia. Isso porque abriu exceção para o recebimento de dois benefícios assistenciais por idosos, mas não permitiu a percepção conjunta de benefício de idoso com o de deficiente ou de qualquer outro previdenciário. Assim, incorreu o legislador em equívoco, pois, tratando-se de situações idênticas, deveria ser possível a exclusão do cômputo do benefício, independentemente de sua origem.
Portanto, além da possibilidade de aferição da miserabilidade por outros meios diversos da renda familiar per capita, destaca-se que, para o fim de preservar a dignidade dos idosos, o art. 34, parágrafo único, da Lei nº 10.741/03 (Estatuto do Idoso) determina que o benefício assistencial ou previdenciário já concedido a qualquer membro idoso da família não será computado na renda familiar per capita. O objetivo claro desta regra é preservar a dignidade do idoso, que, pelas peculiaridades que cercam essa fase da vida, não pode ser submetido a privações, obrigando-se a dividir o benefício assistencial por ele percebido com outros membros do grupo familiar que não possuam renda.
O espírito do legislador foi o de assegurar, ao idoso ou deficiente, renda mensal mínima de um salário mínimo. Diante disso, o fato de integrante do grupo familiar auferir proventos não impede que outra pessoa da mesma família possa habilitar-se ao benefício assistencial, desde que verificada a situação de miserabilidade.
Logo, ao se calcular a renda familiar da parte autora, não se pode considerar no cálculo qualquer benefício assistencial ou benefício previdenciário de renda mínima que seja percebido por idoso integrante do grupo familiar.
Diante desse quadro, é possível concluir que a renda auferida pela filha Márcia, para o sustento de seis pessoas, não assegurava uma vida digna para o requerente, uma vez que depende de recursos que a família não possui, para atendimento de suas necessidades básicas e especiais.
Assim, diante das considerações, verifico que a parte autora está em evidente risco social e depende do benefício para garantir sua sobrevivência digna, tendo em vista estar inserida em um grupo familiar de vulnerabilidade. Por outro lado, o INSS não trouxe qualquer indício de que o requerente tenha percebido o benefício de forma irregular desde sua concessão, não havendo efetiva comprovação da mudança das condições econômicas do demandante. Do mesmo modo, não indicou quando efetivamente ocorreu a superação das condições que ensejaram a concessão do benefício.
Nesse sentido, as testemunhas ouvidas em juízo igualmente confirmaram a situação econômica precária vivenciada pelo autor e sua família, inclusive na época em que a Autarquia Previdenciária entendeu indevido o benefício.
O conjunto probatório carreado aos autos é suficiente para demonstrar que desde a concessão do amparo assistencial o requerente sobrevive em condições precárias, em casa simples e com renda insuficiente para a sobrevivência de todos integrantes do grupo familiar.
Portanto, não demonstrada a superação dos requisitos que motivaram o deferimento do benefício, assim como a alteração das condições econômicas do grupo familiar da parte autora, merece reforma a sentença, condenando o INSS ao restabelecimento do benefício assistencial desde a data do cancelamento administrativo.
Em consequência, considerando que a cessação do amparo assistencial do autor foi ilegal, não cabe ao INSS cobrar os valores recebidos supostamente de forma indevida.
Dos honorários advocatícios:
O atual CPC inovou de forma significativa com relação aos honorários advocatícios, buscando valorizar a atuação profissional dos advogados, especialmente pela caracterização como verba de natureza alimentar (§ 14, art. 85, CPC) e do caráter remuneratório aos profissionais da advocacia.
Cabe ainda destacar, que o atual diploma processual estabeleceu critérios objetivos para fixar a verba honorária nas causas em que a Fazenda Pública for parte, conforme se extrai da leitura do § 3º, incisos I a V, do art. 85. Referidos critérios buscam valorizar a advocacia, evitando o arbitramento de honorários em percentual ou valor aviltante que, ao final, poderia acarretar verdadeiro desrespeito à profissão. Ao mesmo tempo, objetiva desestimular os recursos protelatórios pela incidência de majoração da verba em cada instância recursal.
No caso dos autos, contudo, o magistrado a quo postergou a fixação dos honorários advocatícios para a fase de liquidação, por considerar a sentença ilíquida (art. 85, § 4º, II).
A partir dessas considerações, reformada a sentença de parcial procedência, impõem-se a majoração da verba honorária em favor do advogado da parte autora.
Por outro lado, em atenção ao § 4º do art. 85 e art. 1.046, tratando-se de sentença ilíquida e sendo parte a Fazenda Pública, a definição do percentual fica postergada para a fase de liquidação do julgado, restando garantida, de qualquer modo, a observância dos critérios definidos no § 3º, incisos I a V, conjugado com § 5º, todos do mesmo dispositivo.
Outrossim, face o provimento do apelo e com fulcro no § 11, do art. 85 do novo CPC, atribuo o acréscimo de mais 50% incidente sobre o valor a ser apurado em sede de liquidação a título de honorários.
Da antecipação dos efeitos da tutela:
Confirmado o direito ao benefício e inalterados os requisitos para a concessão, resta mantida a antecipação dos efeitos da tutela concedida pelo juízo de origem.
Conclusão:
Reforma-se a sentença, dando provimento à apelação da parte autora para julgar procedente o pedido de restabelecimento do benefício desde a data da cessação administrativa, em 14/12/2014.
Resta mantida a sentença quanto à declaração de inexistência de débito relativo à restituição dos valores.
Não conhecida a remessa necessária.
Dispositivo:
Ante o exposto, voto por não conhecer da remessa necessária, negar provimento à apelação do INSS e dar provimento à apelação da parte autora, nos termos da fundamentação.
Desembargador Federal ROGERIO FAVRETO
Relator
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 11/04/2017
APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 5002124-31.2015.4.04.7004/PR
ORIGEM: PR 50021243120154047004
RELATOR | : | Des. Federal ROGERIO FAVRETO |
PRESIDENTE | : | Rogerio Favreto |
PROCURADOR | : | Dr. Eduardo Kurtz Lorenzoni |
APELANTE | : | EROTIDES SANTIAGO DA SILVA |
ADVOGADO | : | francis marcel carrilho cardoso |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELADO | : | OS MESMOS |
MPF | : | MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 11/04/2017, na seqüência 324, disponibilizada no DE de 23/03/2017, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, a DEFENSORIA PÚBLICA e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 5ª TURMA, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU NÃO CONHECER DA REMESSA NECESSÁRIA, NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO DO INSS E DAR PROVIMENTO À APELAÇÃO DA PARTE AUTORA, NOS TERMOS DA FUNDAMENTAÇÃO.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Des. Federal ROGERIO FAVRETO |
VOTANTE(S) | : | Des. Federal ROGERIO FAVRETO |
: | Des. Federal ROGER RAUPP RIOS | |
: | Juiz Federal HERMES S DA CONCEIÇÃO JR |
Lídice Peña Thomaz
Secretária de Turma
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