| D.E. Publicado em 03/12/2015 |
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0013030-07.2015.4.04.9999/RS
RELATOR | : | Des. Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ |
APELANTE | : | LUCIELE GONÇALVES MENDES |
ADVOGADO | : | Luciana Ely Chechi |
: | Rodrigo Ramos | |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. REQUISITOS.
1. O direito ao benefício assistencial pressupõe o preenchimento dos seguintes requisitos: a) condição de deficiente (incapacidade para o trabalho e para a vida independente, de acordo com a redação original do art. 20 da LOAS, ou impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir a participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas, conforme redação atual do referido dispositivo) ou idoso (neste caso, considerando-se, desde 1º de janeiro de 2004, a idade de 65 anos); e b) situação de risco social (estado de miserabilidade, hipossuficiência econômica ou situação de desamparo) da parte autora e de sua família.
2. Não atendidos os pressupostos pela parte autora, é indevido o benefício.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Colenda 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, negar provimento ao apelo da parte autora, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 24 de novembro de 2015.
Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ
Relator
| Documento eletrônico assinado por Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 7878415v6 e, se solicitado, do código CRC E6809D61. | |
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0013030-07.2015.4.04.9999/RS
RELATOR | : | Des. Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ |
APELANTE | : | LUCIELE GONÇALVES MENDES |
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RELATÓRIO
Cuida-se de apelação interposta pela parte autora em face da sentença que julgou improcedente o pedido de benefício assistencial devido à pessoa com deficiência.
Sustenta, em síntese, que preenche os requisitos necessários à concessão da prestação continuada requerida.
Embora intimado, o INSS não apresentou contrarrazões.
Vieram os autos a esta Corte para julgamento.
A Procuradoria Regional da República da 4ª Região opinou pelo desprovimento do recurso.
É o relatório.
VOTO
Premissas
Trata-se de demanda previdenciária na qual a parte autora objetiva a concessão de BENEFÍCIO ASSISTENCIAL, previsto no art. 203, inciso V, da Constituição Federal e regulamentado pelo artigo 20 da Lei nº 8.742/93, com a redação dada pelas Leis nº 12.435, de 06-07-2011, e nº 12.470, de 31-08-2011.
O direito ao benefício assistencial pressupõe o preenchimento dos seguintes requisitos: a) condição de deficiente (incapacidade para o trabalho e para a vida independente, de acordo com a redação original do art. 20 da LOAS, ou impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir a participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas, conforme redação atual do referido dispositivo) ou idoso (neste caso, considerando-se, desde 1º de janeiro de 2004, a idade de 65 anos); e b) situação de risco social (estado de miserabilidade, hipossuficiência econômica ou situação de desamparo) da parte autora e de sua família.
Saliente-se, por oportuno, que a incapacidade para a vida independente a que se refere a Lei 8.742/93, na redação original, deve ser interpretada de forma a garantir o benefício assistencial a uma maior gama possível de pessoas com deficiência, consoante pacífica jurisprudência do STJ (v.g. STJ, 5ª Turma, RESP 360.202/AL, Rel. Min. Gilson Dipp, DJU de 01-07-2002) e desta Corte (v.g. AC n. 2002.71.04.000395-5/RS, 6ª Turma, Rel. Des. Federal João Batista Pinto Silveira, DJU de 19-04-2006).
Desse modo, a incapacidade para a vida independente (a) não exige que a pessoa possua uma vida vegetativa ou seja incapaz de se locomover; (b) não significa incapacidade para as atividades básicas do ser humano, tais como alimentar-se, fazer a higiene pessoal e vestir-se sozinho; (c) não impõe a incapacidade de se expressar ou se comunicar; e (d) não pressupõe dependência total de terceiros.
No que diz respeito ao requisito econômico, cabe ressaltar que o Superior Tribunal de Justiça admitiu, em sede de Recurso Repetitivo, a possibilidade de demonstração da condição de miserabilidade por outros meios de prova, quando a renda per capita familiar fosse superior a ¼ do salário mínimo (REsp 1112557/MG, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, TERCEIRA SEÇÃO, DJe 20/11/2009). Posteriormente, o Plenário do Supremo Tribunal Federal, ao julgar, em 18-04-2013, a Reclamação nº 4374 e o Recurso Extraordinário nº 567985, este com repercussão geral, reconheceu e declarou, incidenter tantum, a inconstitucionalidade do parágrafo 3º do artigo 20 da Lei 8.742/93 (LOAS), por considerar que o critério ali previsto - ser a renda familiar mensal per capita inferior a um quarto do salário mínimo - está defasado para caracterizar a situação de miserabilidade.
Assim, forçoso reconhecer que as despesas com os cuidados necessários da parte autora, especialmente medicamentos, alimentação especial, fraldas descartáveis, tratamento médico, psicológico e fisioterápico, podem ser levadas em consideração na análise da condição de miserabilidade da família da parte demandante.
A propósito, a eventual percepção de recursos do Programa Bolsa Família, que, segundo consta no site do Ministério do Desenvolvimento Social e de Combate à Fome (http://www.mds.gov.br/bolsafamilia/), destina-se à "transferência direta de renda que beneficia famílias em situação de pobreza e de extrema pobreza em todo o País" e "tem como foco de atuação os 16 milhões de brasileiros com renda familiar per capita inferior a R$ 70,00 mensais, e está baseado na garantia de renda, inclusão produtiva e no acesso aos serviços públicos", não só não impede a percepção do benefício assistencial do art. 203, V, da Constituição Federal, como constitui prova indiciária acima de qualquer dúvida razoável de que a unidade familiar se encontra em situação de grave risco social.
Exame do caso concreto
Em relação à alegada incapacidade da parte autora, constam do laudo médico, realizado por perito de confiança do juízo a quo, os seguintes dados (fls. 56-59):
A - enfermidade: escoliose torácica (CID - 10 M41-1);
B - a doença pode ser comprovada a partir do dia 08/10/2012, através de atestado médico apresentado durante a realização da perícia médica;
C - quanto à incapacidade laboral, o expert referiu que, tratando-se de estudante, não realiza atividades laborais;
D - idade: nascida em 03/07/2000, contava 13 anos à data do exame pericial;
E - observações gerais: trata-se de periciada estudante, com impedimento para a realização de atividades que demandem, permanentemente, esforço físico, carregamento de peso ou flexão do corpo. Para a sua recuperação, deverá realizar intervenção cirúrgica na coluna torácica.
No tocante ao requisito econômico, foi elaborado parecer social no qual se destacam os aspectos abaixo indicados (fl. 72-73):
A - grupo familiar composto pelas seguintes pessoas: Ilbanês Luiz Prestes Mendes, pai, 37 anos, trabalhador rural e Salete Gonçalves Mendes, mãe, 34 anos, do lar;
B - renda familiar: R$ 924,66
C - condições de moradia: mobiliário básico, modesto, alguns oriundos de doações de familiares e de vizinhos;
D - despesas com cuidados pessoais: a renda familiar é insuficiente para custear todos os recibos de despesas apresentados. Ademais, foi mostrado comprovante de depósito relacionado à pensão que Ilbanês paga mensalmente para um filho fora do casamento no valor de R$ 150,00;
E - Observações: as limitações financeiras da família são visíveis; Luciele precisa do benefício para assegurar melhores condições de vida, auxiliar a prover a manutenção das suas necessidades básicas e fazer frente aos gastos relacionados com seu tratamento.
Conclusão quanto ao direito da parte autora no caso concreto
Inexiste impedimento à concessão do benefício assistencial de prestação continuada a menor de idade. Ao contrário, a assistência social a crianças e adolescentes é prioritária em nosso País, à luz do art. 203, incisos I e II, da Constituição Federal.
Se o menor é deficiente, a proteção social é reforçada, conforme os incisos IV e V do mesmo artigo. Em matéria de assistência social, à vista do princípio da dignidade da pessoa humana, fundamento do Estado Democrático de Direito (CF, art. 1º, III), não é possível interpretação restritiva contrária aos que a Constituição e a lei manifestamente buscaram proteger. Nesse sentido: AC 0012344-15.2015.404.9999, Sexta Turma, Relator Des. Federal João Batista Pinto Silveira, D.E. 15/10/2015.
Nesse sentido, manifesta-se a doutrina:
Em se tratando de criança menor de 14 anos, vedada que é de trabalhar (artigo 7º, XXXIII, da CR/88), não há que se falar em capacidade de prover a própria subsistência. É a sua família quem deve fazê-lo. Se esta não o conseguir, na forma da lei, o benefício será devido, desde que o menor seja considerado deficiente físico.
Cabe, agora, indagar a razão pela qual o legislador deferiu a benesse ao deficiente, e não às crianças genericamente consideradas, já que todas elas não trabalham (ou não deveriam...).
A justificativa ressai da própria consciência popular. Por óbvio, uma criança deficiente exige cuidados profissionais e uma atenção especial da família diferentes de uma sadia.
Quando se trata de uma criança saudável, a lei considera que a família, mesmo em situação precária, pode trabalhar para sustentá-la. Para tanto, utiliza dos recursos por todos conhecidos: creches, escolas infantis, revezamento de familiares no cuidado dos filhos etc.
Já em se tratando de uma criança deficiente, exige-se, muitas vezes, bem mais da família. Freqüentemente um dos pais, ou ambos, vêem-se obrigados a se afastarem do trabalho, mesmo contra a vontade, para se dedicarem pessoalmente ao seu cuidado. Noutros termos, a criança deficiente acaba por reduzir, muitas vezes, a própria capacidade laboral de sua família.
É essa a razão pela qual se confere o benefício assistencial ao deficiente, seja ele maior ou menor de idade.
Não se trata de aferir se o deficiente é ou não incapaz para o trabalho, simplesmente. A lei é expressa ao dizer que a deficiência deve culminar, também, na incapacidade para a vida independente. Isso porque, nesse caso, alguém da família deverá furtar-se de trabalhar, parcial ou totalmente, para auxiliar aquele que não consegue, por si só, viver.
É claro que um bebê, por exemplo, mesmo são, também não o consegue. Mas, conforme já dito, uma criança deficiente exige bem mais cuidados, além de gastos médicos periódicos.
De todo o exposto, pode-se dizer que a deficiência de uma criança, para ensejar o benefício assistencial em comento, deve ser tal que comprometa a sua família de forma diferente do que ocorreria com uma criança sadia.
E o que uma criança saudável normalmente faz? Brinca, estuda, alimenta-se, a partir de certa idade, sozinha, anda, corre, tudo isso sem grandes gastos médicos regulares ou cuidados especiais da família.
Se uma criança, por exemplo, possuir uma redução parcial em sua capacidade auditiva ou visual, mas, com o uso de um aparelho de surdez ou de lentes corretivas, consegue viver plenamente sua vida de criança (estudando e brincando sem maiores problemas), não será ela alvo do benefício assistencial em apreço.
A deficiência, na verdade, deve ser tal que prejudique a vida relativamente normal da criança e de sua família. Só assim será a mesma considerada deficiente para os fins aqui analisados.
É nisso que reside a razão pela qual uma criança pode ensejar a concessão do benefício assistencial enquanto outras, não.
Não se quer, com isso, restringir indevidamente um direito constitucionalmente assegurado, mas, sim, fazer com que ele alcance quem, de fato, deve ser protegido.
Afinal, para se tratar de forma desigual alguém, deve ele enquadrar-se em uma situação ou condição também desigual.
MADEIRA, Danilo Cruz. O benefício assistencial (LOAS) ao portador de deficiência menor de 14 anos. Revista Jus Navigandi, Teresina, ano 15, n. 2735, 27 dez. 2010. Disponível em: . Acesso em: 19 nov. 2015.
Contudo, na hipótese dos autos, ainda que preenchido o requisito a socioeconômico, é indevido o benefício, porquanto ficou sobejamente demonstrado que, a despeito da importante limitação física para a realização de atividades que demandem, permanentemente, esforço físico, carregamento de peso ou flexão do corpo, em decorrência da escoliose torácica que a acomete, a parte autora vem frequentando regularmente a escola.
Conclusão
Ratifica-se a sentença que julgou improcedente o pedido de benefício assistencial.
Dispositivo
Ante o exposto, voto por negar provimento ao apelo da parte autora.
Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ
Relator
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 24/11/2015
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0013030-07.2015.4.04.9999/RS
ORIGEM: RS 00019974620138210149
RELATOR | : | Des. Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ |
PRESIDENTE | : | Paulo Afonso Brum Vaz |
PROCURADOR | : | Dr. Sérgio Cruz Arenhart |
APELANTE | : | LUCIELE GONÇALVES MENDES |
ADVOGADO | : | Luciana Ely Chechi |
: | Rodrigo Ramos | |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 24/11/2015, na seqüência 180, disponibilizada no DE de 04/11/2015, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 5ª TURMA, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU NEGAR PROVIMENTO AO APELO DA PARTE AUTORA.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Des. Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ |
VOTANTE(S) | : | Des. Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ |
: | Des. Federal ROGERIO FAVRETO | |
: | Juiz Federal LUIZ ANTONIO BONAT |
Lídice Peña Thomaz
Secretária de Turma
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