Apelação Cível Nº 5018094-34.2020.4.04.9999/RS
PROCESSO ORIGINÁRIO: Nº 5000007-67.2016.8.21.0071/RS
RELATOR: Juiz Federal FRANCISCO DONIZETE GOMES
APELANTE: MAURO JUNIOR VENTURA DA SILVA
ADVOGADO: ALDA CRISTINA DE SOUZA FREITAS (OAB RS058272)
ADVOGADO: EDWARD NUNES MACHRY (OAB RS067219)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
MPF: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL
RELATÓRIO
Cuida-se de apelação em face de sentença (
) publicada em 26/03/2020 na qual o juízo a quo julgou procedente o pedido lançando o seguinte dispositivo:Diante do exposto, julgo procedente o pedido veiculado na demanda movida por Mauro Junior Ventura da Silva contra o INSS, nos termos do artigo 487, inc. I, do CPC, para:
1. Condenar o réu a conceder ao autor o benefício previdenciário de prestação continuada;
2. Condenar o réu ao pagamento das prestações vencidas desde o requerimento administrativo, com correção monetária e juros, conforme fundamentação.
O ônus sucumbencial deve ser integralmente atribuído à requerida que, por sua vez é isenta do pagamento de custas, nos termos do artigo 5º, inciso I, da Lei Estadual 14.634/2014, isenção esta que não alcança eventuais despesas.
Deixo de fixar honorários advocatícios nos termos do artigo 55 da Lei 9.099/95.
Apelou a Autarquia Previdenciária (
) requerendo a reforma da sentença diante da não comprovação do risco social, sendo, pois, indevido o benefício. Sustentou que a renda familiar exorbita o limite de 1/4 do salário mínimo per capita. Defendeu, ainda, que não foi comprovada a situação de deficiente da parte autora, por ser criança e não estar impossibilitada para atos da vida civil.Subsidiariamente, requereu a aplicação do juros de mora conforme limites da caderneta de poupança, bem como a consideração dos índices de deflação.Por fim, prequestionou os dispositivos legais e constitucionais debatidos.Recorreu a parte autora (
), pela manutenção da sentença quanto à concessão do benefício assistencial, contudo requerendo reforma desta com vistas a fixar honorários advocatícios à parte recorrida.Processado o feito, vieram os autos a esta Corte para julgamento.
O Ministério Público Federal - MPF com assento nesta Corte opinou pelo desprovimento do apelo do INSS, devendo a sentença ser mantida (
).É o relatório.
VOTO
Recebimento do recurso
Importa referir que a apelação deve ser conhecida, por ser própria, regular e tempestiva.
Remessa Oficial
O Colendo Superior Tribunal de Justiça, seguindo a sistemática dos recursos repetitivos, decidiu que é obrigatório o reexame de sentença ilíquida proferida contra a União, Estados, Distrito Federal e Municípios e as respectivas autarquias e fundações de direito público (REsp 1101727/PR, Relator Ministro Hamilton Carvalhido, Corte Especial, julgado em 4/11/2009, DJe 3/12/2009).
No caso em exame, tendo em conta que o valor da condenação fica aquém do limite referido artigo 496, §3º, inciso I, do NCPC/2015, ainda que considerados os critérios de juros e correção monetária, a sentença proferida nos autos não está sujeita a reexame necessário.
Do Benefício Assistencial
A Constituição Federal instituiu, no art. 203, caput, e em seu inciso V, "a garantia de um salário mínimo de benefício mensal à pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, conforme dispuser a lei".
Tal garantia foi regulamentada pelo art. 20 da Lei 8.742/93 (LOAS), alterada pela Lei 9.720/98. Posteriormente, a redação do mencionado art. 20 foi novamente alterada pelas Leis nºs 12.435/2011 e 12.470/2011, passando a apresentar a seguinte redação:
Art. 20. O benefício de prestação continuada é a garantia de um salário-mínimo mensal à pessoa com deficiência e ao idoso com 65 (sessenta e cinco) anos ou mais que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção nem de tê-la provida por sua família. (Redação dada pela Lei nº 12.435, de 2011)
§ 1o Para os efeitos do disposto no caput, a família é composta pelo requerente, o cônjuge ou companheiro, os pais e, na ausência de um deles, a madrasta ou o padrasto, os irmãos solteiros, os filhos e enteados solteiros e os menores tutelados, desde que vivam sob o mesmo teto. (Redação dada pela Lei nº 12.435, de 2011)
§ 2o Para efeito de concessão deste benefício, considera-se pessoa com deficiência aquela que tem impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas. (Redação dada pela Lei nº 12.470, de 2011)
§ 3o Considera-se incapaz de prover a manutenção da pessoa com deficiência ou idosa a família cuja renda mensal per capita seja inferior a 1/4 (um quarto) do salário-mínimo. (Redação dada pela Lei nº 12.435, de 2011)
Portanto, o direito ao benefício assistencial pressupõe o preenchimento de dois requisitos: a) condição de deficiente ou idoso (65 anos ou mais); e b) situação de risco social (estado de miserabilidade, hipossuficiência econômica ou situação de desamparo) da parte autora e de sua família.
Precedentes jurisprudenciais resultaram por conformar o cálculo da renda familiar per capita, da qual deve ser excluído o valor auferido por idoso com 65 anos ou mais a título de benefício assistencial ou benefício previdenciário de renda mínima. Neste sentido:
AGRAVO REGIMENTAL. PREVIDENCIÁRIO. SOBRESTAMENTO DO FEITO EM RAZÃO DE ADMISSIBILIDADE DE RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DA CONTROVÉRSIA. DESNECESSIDADE. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. ART. 34, PARÁGRAFO ÚNICO, DA LEI Nº 10.741/2003. APLICAÇÃO ANALÓGICA.
EXCLUSÃO DE BENEFÍCIO DE VALOR MÍNIMO PERCEBIDO POR IDOSO OU DEFICIENTE.
1. Esta Corte Superior já firmou entendimento no sentido da inaplicabilidade do disposto no art. 543-C do CPC nesta instância, em relação ao julgamento dos recursos que tratam sobre a mesma matéria afetada à observância do rito previsto no citado dispositivo.
2. No cálculo da renda familiar per capita, deve ser excluído o valor auferido por pessoa idosa a título de benefício assistencial ou benefício previdenciário de renda mínima, este último por aplicação analógica do parágrafo único do art. 34 da Lei nº 10.741/03.
3. Agravo regimental a que se nega provimento.
(AgRg no REsp 1117833/RS, Rel. Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, QUINTA TURMA, julgado em 24/09/2013, DJe 02/10/2013)
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. IDOSO. EXCLUSÃO BENEFÍCIO. VIABILIDADE. CONSECTÁRIOS. 1. Comprovados os requisitos da idade avançada e hipossuficiência econômica do grupo familiar, cabível a concessão do benefício assistencial. 2. A jurisprudência desta Corte Regional, bem como do Superior Tribunal de Justiça, é pacífica no sentido de que qualquer benefício de valor mínimo recebido por idoso de 65 anos ou mais (salvo quando recebido por força de deficiência, quando então o requisito etário é afastado) deve ser excluído da apuração da renda familiar. 3. O Supremo Tribunal Federal reconheceu no RE 870947, com repercussão geral, a inconstitucionalidade do uso da TR. 4. O Superior Tribunal de Justiça, no REsp 1495146, em precedente também vinculante, e tendo presente a inconstitucionalidade da TR como fator de atualização monetária, distinguiu os créditos de natureza previdenciária, em relação aos quais, com base na legislação anterior, determinou a aplicação do INPC, daqueles de caráter administrativo, para os quais deverá ser utilizado o IPCA-E. 5. Estando pendentes embargos de declaração no STF para decisão sobre eventual modulação dos efeitos da inconstitucionalidade do uso da TR, impõe-se fixar desde logo os índices substitutivos, resguardando-se, porém, a possibilidade de terem seu termo inicial definido na origem, em fase de cumprimento de sentença. 6. Os juros de mora, a contar da citação, devem incidir à taxa de 1% ao mês, até 29-06-2009. A partir de então, incidem uma única vez, até o efetivo pagamento do débito, segundo o percentual aplicado à caderneta de poupança. (TRF4 5027464-76.2016.4.04.9999, SEXTA TURMA, Relator ARTUR CÉSAR DE SOUZA, juntado aos autos em 27/06/2019)
PREVIDENCIÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. PESSOA IDOSA. REANÁLISE DO PEDIDO ADMINISTRATIVO. EXCLUSÃO. BENEFÍCIO DE RENDA MÍNIMA. CÔNJUGE IDOSO. POSSIBILIDADE. NOTIFICAÇÃO. AUTORIDADE COATORA. NECESSIDADE. ANULAÇÃO DA SENTENÇA. 1. O mandado de segurança destina-se à proteção de direito líquido e certo, nos termos do art. 1º da Lei 12.016/2009, sendo exigível a prova pré-constituída, uma vez que não admite dilação probatória. 2. O direito ao benefício assistencial, previsto no art. 203, V, da Constituição Federal, e nos arts. 20 e 21 da Lei 8.742/93 (LOAS) pressupõe o preenchimento de dois requisitos: a) condição de pessoa com deficiência ou idosa e b) situação de risco social, ou seja, de miserabilidade ou de desamparo. 4. O pedido para que reanalisado o requerimento administrativo, excluindo-se do cálculo da renda familiar a aposentadoria de um salário mínimo recebida pelo cônjuge idoso, por ser matéria de direito, pode ser conhecido. Contudo, tendo em vista que a autoridade coatora não foi notificada, não havendo a formação da relação da processual, é de ser anulada a sentença, para que retorne o feito à origem e proceda-se ao regular processamento do mandado de segurança. (TRF4, AC 5000466-94.2019.4.04.7112, QUINTA TURMA, Relatora GISELE LEMKE, juntado aos autos em 28/06/2019)
Também deverá ser desconsiderado o valor auferido a título de benefício previdenciário por incapacidade ou assistencial em razão de deficiência, independentemente de idade, como vem sendo decidido desde longa data por esta Corte:
PREVIDENCIÁRIO. EMBARGOS INFRINGENTES. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. ARTS. 203, V, DA CRFB/88 E 20 DA LEI N.º 8.742/93. MISERABILIDADE. COMPROVAÇÃO.
1. A constitucionalidade do § 3.º do art. 20 da Lei n.º 8.742/93 (STF, ADIN 1.232, Plenário, Rel. p/acórdão Min. Nelson Jobim, DJU 01-6-2001 e RCL 2303-AgR, Plenário, Rel. Min. Ellen Gracie, DJU 01-4-2005) não desautoriza o entendimento de que a comprovação do requisito da renda mínima familiar per capita não superior a ¼ (um quarto) do salário mínimo, necessária à concessão do benefício assistencial, não exclui outros fatores que tenham o condão de aferir a condição de miserabilidade da parte autora e de sua família.
2. Para fins de aferir a renda familiar nos casos de pretensão à concessão de benefício assistencial, os valores de benefícios decorrentes de incapacidade (auxílio-doença e aposentadoria por invalidez) devem ser considerados distintamente se comparados aos valores referentes aos outros benefícios previdenciários, porquanto aqueles, via de regra, devem fazer frente às necessidades geradas pela incapacidade que ensejou a concessão do benefício, não se podendo dar-lhes a dimensão, à vista do princípio da razoabilidade, de também atender a todas as demais exigências do grupo familiar.
3. Caso em que o único rendimento do grupo familiar (autora, mãe e pai), resume-se ao benefício de aposentadoria por invalidez percebido pelo genitor, de valor mínimo (R$ 300,00), que, se excluído, configura a situação de renda inexistente, expondo a situação de risco social, necessária à concessão do benefício.
(EIAC N.º 2004.04.01.017568-9/PR, Terceira Seção, Relator o Juiz Federal João Batista Lazzari, unânime, DE 20/07/2009)
Tal orientação é adotada por esta Turma, consoante segue:
BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. CONCESSÃO. PESSOA COM DEFICIÊNCIA. CONDIÇÃO SOCIOECONÔMICA. MISERABILIDADE. PREENCHIMENTO DE REQUISITOS. BENEFÍCIO DE RENDA MÍNIMA. EXCLUSÃO. CORREÇÃO MONETÁRIA E JUROS DE MORA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. CUSTAS PROCESSUAIS. 1. O direito ao benefício assistencial, previsto no art. 203, V, da Constituição Federal, e nos arts. 20 e 21 da Lei 8.742/93 (LOAS) pressupõe o preenchimento de dois requisitos: a) condição de pessoa com deficiência ou idosa e b) situação de risco social, ou seja, de miserabilidade ou de desamparo. 2. Reconhecida a inconstitucionalidade do critério econômico objetivo em regime de repercussão geral, bem como a possibilidade de admissão de outros meios de prova para verificação da hipossuficiência familiar, cabe ao julgador, na análise do caso concreto, aferir o estado de miserabilidade da parte autora e de sua família. 3. Deve ser excluído do cômputo da renda familiar o benefício previdenciário de renda mínima (valor de um salário mínimo) percebido por idoso e o benefício assistencial recebido por outro membro da família de qualquer idade. Aplicação analógica do art. 34, parágrafo único, da Lei 10.741/2003 (Estatuto do Idoso). 4. Preenchidos os requisitos, é de ser concedido o benefício assistencial desde a DER, em 10/2012, até a data da concessão administrativa, em 03/2016. 5. Diferimento, para a fase de execução, da fixação dos índices de correção monetária aplicáveis a partir de 30/06/2009. 6. Juros de mora simples de um por cento (1%) ao mês, a contar da citação (Súmula 204 do STJ), até 29/06/2009, e, a partir de tal data, conforme o art. 5º da Lei 11.960/2009, que deu nova redação ao art.1º-F da Lei 9.494/1997. 7. Honorários de sucumbência fixados no percentual mínimo das faixas de incidência previstas no § 3º do art. 85 do NCPC, percentual a ser definido por ocasião da liquidação do julgado, nos termos do art. 85, § 4º, II, ambos do NCPC. 8. O INSS é isento do pagamento das custas no Foro Federal (inc. I do art. 4º da Lei 9.289/1996) e na Justiça Estadual do Rio Grande do Sul, devendo, contudo, pagar eventuais despesas processuais, como as relacionadas a correio, publicação de editais e condução de oficiais de justiça (artigos 2º, parágrafo único, e 5º, I da Lei Estadual 14.634/2014). (TRF4, AC 5000626-03.2016.4.04.7120, QUINTA TURMA, Relatora GISELE LEMKE, juntado aos autos em 28/06/2019)
Ressalto que tal pessoa, em decorrência da exclusão de sua renda, também não será considerada na composição familiar, para efeito do cálculo da renda per capita.
Não podem ser incluídos no cálculo da renda familiar os rendimentos auferidos por irmãos ou filhos maiores de 21 anos e não inválidos, bem assim por avós, tios, sobrinhos, primos e outros parentes não relacionados no art. 16 da Lei de Benefícios, conforme disposto no art. 20, § 1º, da Lei n.º 8.742/93, na redação dada pela Lei n.º 9.720, de 30-11-1998, ao entender como família, para efeito de concessão do benefício assistencial, o conjunto de pessoas, que vivam sob o mesmo teto, elencadas no art. 16 da Lei de Benefícios - entre as quais não se encontram aquelas antes referidas.
O egrégio Supremo Tribunal Federal tem assentado, por decisões monocráticas de seus Ministros, que decisões que excluem do cálculo da renda familiar per capita os rendimentos auferidos por pessoas não relacionadas no art. 16 da Lei de Benefícios não divergem da orientação traçada no julgamento da ADI 1.232-1, como se constata, v. g., de decisões proferidas pelos Ministros GILMAR MENDES (AI 557297/SC - DJU de 13-02-2006) e CARLOS VELLOSO (Reclamação 3891/RS - DJU de 09-12-2005).
Porém, a partir da entrada em vigor da Lei n.º 12.435, de 06-07-2011, que alterou a redação do art. 20, § 1º, da Lei n.º 8.742/93, o conceito de família, para efeito de concessão do benefício assistencial, passou a ser o conjunto de pessoas, que vivam sob o mesmo teto, ali elencadas ("Para os efeitos do disposto no caput, a família é composta pelo requerente, o cônjuge ou companheiro, os pais e, na ausência de um deles, a madrasta ou o padrasto, os irmãos solteiros, os filhos e enteados solteiros e os menores tutelados, desde que vivam sob o mesmo teto.").
O Superior Tribunal de Justiça corrobora tal orientação, como demonstram os seguintes arestos:
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. RENDA MENSAL PER CAPITA. CONCEITO DE FAMÍLIA. ART. 20, § 1º, DA LEI N. 8.742/93, ALTERADO PELA LEI N. 12.435/2011. PRECEDENTES. RECURSO ESPECIAL PROVIDO.
I - Na origem, cuida-se de ação ajuizada em desfavor do Instituto Nacional do Seguro Social - INSS objetivando a concessão do benefício da assistência social à pessoa com deficiência. Foram interpostos recursos especiais pelo beneficiário e pelo Ministério Público Federal. II - O Tribunal de origem negou o benefício assistencial pleiteado por entender que a renda mensal, proveniente da aposentadoria por invalidez do cunhado e do salário do sobrinho da parte autora, é suficiente para prover o seu sustento, afastando, assim, a condição de miserabilidade.
III - O conceito de renda mensal da família contido na Lei n.
8.472/1991 deve ser aferido levando-se em consideração a renda das pessoas do grupo familiar indicado no § 1º do citado art. 20 que compartilhem a moradia com aquele que esteja sob vulnerabilidade social (idoso, com 65 anos ou mais, ou pessoa com deficiência), qual seja: "[...] o requerente, o cônjuge ou companheiro, os pais e, na ausência de um deles, a madrasta ou o padrasto, os irmãos solteiros, os filhos e enteados solteiros e os menores tutelados, desde que vivam sob o mesmo teto".
IV - Portanto, entende-se que "são excluídas desse conceito as rendas das pessoas que não habitem sob o mesmo teto daquele que requer o benefício social de prestação continuada e das pessoas que com ele coabitem, mas que não sejam responsáveis por sua manutenção socioeconômica" (REsp n. 1.538.828/SP, Rel. Ministro Benedito Gonçalves, Primeira Turma, julgado em 17/10/2017, DJe 27/10/2017.) Ainda nesse sentido: REsp n. 1.247.571/PR, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, Sexta Turma, DJe 13/12/2012.
V - Assim, deve ser afastado o entendimento da Corte de origem que fez somar a renda do cunhado e do sobrinho. Ainda que vivam sob o mesmo teto do requerente do benefício, seus rendimentos não devem ser considerados para fins de apuração da hipossuficiência econômica a autorizar a concessão de benefício assistencial, pois não se enquadram conceito de família previsto no § 1º do art. 20 da Lei n.
8.742/93.
VI - Recursos especiais providos.
(REsp 1727922/SP, Rel. Ministro FRANCISCO FALCÃO, SEGUNDA TURMA, julgado em 19/03/2019, DJe 26/03/2019)
PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. ARTS. 2º, I E V, E PARÁGRAFO ÚNICO, E 16 DA LEI N. 8.213/1991. SÚMULA 282/STF. DISSÍDIO JURISPRUDENCIAL NÃO DEMONSTRADO. ART. 20 DA LEI N. 8.213/1991.
CONCEITO DE RENDA FAMILIAR. PESSOAS QUE VIVAM SOB O MESMO TETO DO VULNERÁVEL SOCIAL E QUE SEJAM LEGALMENTE RESPONSÁVEIS PELA SUA MANUTENÇÃO. RECURSO ESPECIAL PARCIALMENTE CONHECIDO E, NESSA EXTENSÃO, PROVIDO PARA RESTABELECER A SENTENÇA.
1. Os recursos interpostos com fulcro no CPC/1973 sujeitam-se aos requisitos de admissibilidade nele previstos, conforme diretriz contida no Enunciado Administrativo n. 2 do Plenário do STJ.
2. O conceito de renda mensal da família contido na Lei n. 8.472/1991 deve ser aferido levando-se em consideração a renda das pessoas do grupo familiar indicado no § 1º do artigo 20 que compartilhem a moradia com aquele que esteja sob vulnerabilidade social (idoso, com 65 anos ou mais, ou pessoa com deficiência).
3. São excluídas desse conceito as rendas das pessoas que não habitem sob o mesmo teto daquele que requer o benefício social de prestação continuada e das pessoas que com ele coabitem, mas que não sejam responsáveis por sua manutenção socioeconômica.
4. No caso, o fato de a autora, ora recorrente, passar o dia em companhia de outra família não amplia o seu núcleo familiar para fins de aferição do seu estado de incapacidade socioeconômica.
5. Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa extensão, provido.
(REsp 1538828/SP, Rel. Ministro BENEDITO GONÇALVES, PRIMEIRA TURMA, julgado em 17/10/2017, DJe 27/10/2017)
No que se refere à renda mínima, o Superior Tribunal de Justiça, assentou que essa renda não é o único critério a balizar a concessão do benefício, devendo ser examinado juntamente com outros meios de aferição do estado de miserabilidade, hipossuficiência econômica ou situação de desamparo do autor e de sua família. Em síntese, a renda per capita inferior a 1/4 de salário mínimo implica presunção de miserabilidade a ensejar o deferimento do benefício, mas não impede o julgador de, mediante as demais provas dos autos, concluir pela caracterização da condição de miserabilidade da parte e de sua família.
Do caso concreto
A condição de deficiente é inconteste, porquanto fora reconhecida em diversos laudos médicos (2013 a 2016), todos convergindo ao mesmo diagnóstico.
Os atestados e laudos médicos, juntados pelo autor, registram que ele é portador de sintomas depressivos (CID 10: F 32.2), apresentando Retardo mental leve (CID F 70.1) e tendo sido diagnosticado com Transtorno de Déficit de Atenção com Hiperatividade (TDAH).
Já o laudo médico pericial (
), de 13/06/2017 atesta ser o autor portador de Retardo Mental Leve (CID F 70.1) e Transtorno de Personalidade do tipo esquizóide (CID F 60.1). Transcrevo, por oportuno, as conclusões periciais:Não há medicação específica. No momento é menor, mas certamente na idade adulta será incapaz aos atos da vida civil. A parte autora é possuidora de patologias que a incapacitam total a atividade laboral e na fase adulta o incapacitarão aos atos da vida civil.
Desse modo, comprovada a deficiência incapacitante do autor.
No que toca à situação de miserabilidade, esta não se demonstra no Estudo Social (
), tendo em vista a renda per capta superar o limite legal, bem como não haver elementos fáticos e contexto social favorável à concessão do benefício.A renda do grupo familiar é composta pelo salário do genitor do requerente, no valor de R$ 1.500,00 (um mil e quinhentos reais). A referida renda, considerando-se que o grupo familiar é composto de 3 pessoas (autor, sua mãe e seu pai), resulta em renda de R$ 500,00 per capita, o que resulta superior ao limite legal daquele ano, correspondente a R$ 238,00.
Observando os gastos familiares declarados do Estudo Social (R$ 191,00 - moradia, R$ 100,00 - luz, R$ 90,00 - água e R$ 600,00 de alimentação) e as despesas com medicação R$ 244,00, têm-se o valor de R$ 934,00. Conclui-se que a renda declarada é capaz de enfrentar os gastos mensais da família, sendo de apontar que, nos termos do previsto na Ação Civil Pública 5044874- 22.2013.404.7100/RS, somente se pode descontar as despesas médicas comprovadamente não alcançadas pela rede pública, o que não se comprova nos autos.
Embora a renda familiar não seja o único critério definidor da situação de risco social, não há elementos fáticos que demonstrem a vulnerabilidade social do autor e seu grupo familiar, vez que o laudo de estudo social atesta tratar-se de grupo familiar que possui residência própria, em bom de estado de conservação e composta dos eletrodomésticos e utensílios básicos e necessários à manutenção digna da família.
Por oportuno, transcrevo as conclusões do laudo de estudo social:
"A casa em que residem é própria, financiada através do Programa Minha Casa Minha Vida, é de alvenaria com revestimento, encontra-se em bom estado de conservação, possui dois quartos, um banheiro, sala e cozinha."
Assim, não configurada situação de risco social ou vulnerabilidade da requerente, pela análise dos autos em conjunto com elementos fáticos, é indevida a concessão do benefício assistencial.
Aplicação dos índices negativos de inflação
A pretensão da parte autora, no sentido de ver considerados eventuais índices inflacionários negativos na atualização monetária do valor da condenação merece acolhida. Com efeito, conforme o entendimento desta Turma, devem ser aplicados os índices deflacionários, segundo os fundamentos constantes do voto da Relatoria do Desembargador Federal Celso Kipper, proferido no julgamento da AC 5054735-03.2011.404.7100/RS (Sessão de 30/3/2012), exemplificado pela ementa a seguir:
PREVIDENCIÁRIO. EMBARGOS À EXECUÇÃO DE SENTENÇA. ATUALIZAÇÃO MONETÁRIA. LEI Nº 11.960/09. FIXAÇÃO DE OUTRO CRITÉRIO PELO JULGADO. DEFLAÇÃO. 1. (omissis). 2. Aplicam-se os índices de deflação no cômputo da correção monetária do crédito judicial previdenciário, porquanto não há ofensa aos princípios constitucionais da irredutibilidade e da preservação do valor real dos proventos.
Desse modo, deve ser provido o recurso da Autarquia Previdenciária, no ponto.
Honorários advocatícios e custas processuais
No caso dos autos, o juízo de origem deixou de fixar honorários advocatícios por considerar que a ação que tramita perante a Justiça Estadual, no exercício de competência delegada, por analogia à Justiça Federal, visto que o feito tramitaria no Juizado Especial Federal, a teor da Lei nº 9.099/95 e Lei nº 10.259/01.
Entretanto, o pedido da parte autora restou julgado parcialmente procedente, em primeiro grau, tendo tramitado pelo rito comum, sendo indevida a aplicação de regra processual isolada do rito correspondente.
Modificada a solução da lide e considerando a improcedência do pedido, as custas e os honorários ficam a cargo da parte autora, os quais fixo em 10% do valor da causa, devidamente atualizado, nos termos do III do §4º do artigo 85 do NCPC.
Suspensa a exigibilidade de tais valores, devido à assistência judiciária gratuita, nos termos do artigo 98, §3º, do NCPC.
Honorários periciais
Deve a parte autora suportar o pagamento dos valores fixados a título de honorários periciais, pois sucumbente na demanda. Suspensa a exigibilidade de tais valores, conforme artigo 98, §3º, NCPC.
Da tutela antecipada
No tocante à antecipação dos efeitos da tutela, entendo que deve ser revogada a tutela diante da modificação da sentença de procedência e do provimento do apelo da Autarquia Previdenciária.
Todavia, cumpre ressaltar que não é devida a devolução dos valores recebidos a título de antecipação de tutela revogada. Isso porque resta consolidado o entendimento jurisprudencial no sentido de que, em se tratando de valores percebidos pelo segurado em razão de antecipação de tutela, é indevida a repetição ou desconto das parcelas pagas, fundamentada nos princípios da razoabilidade, da segurança jurídica e da dignidade da pessoa humana.
Não é desconhecida a existência dos precedentes do STJ, no julgamento dos Recursos Especiais 1.384.418/SC e 1.401.560/MT. No entanto, o próprio STJ, por sua Corte Especial, no julgamento do EResp 1.086.154/RS, já relativizou o entendimento adotado, mantendo a inexigibilidade da restituição em caso em que a antecipação da tutela originou-se de cognição exauriente.
Por outro lado, não se trata de reconhecer a inconstitucionalidade do dispositivo, mas que a sua aplicação ao caso concreto não é compatível com a generalidade e a abstração de seu preceito, o que afasta a necessidade de observância da cláusula de reserva de plenário (art. 97 da Constituição Federal), conforme se lê no RE 734.199/RS, rel. Ministra Rosa Weber.
Com efeito, quanto à repetição de valores, o egrégio Supremo Tribunal Federal, recentemente assentou que as parcelas vencimentais e/ou beneficiárias recebidas por força de tutela antecipada judicial não terão que ser devolvidas em face da boa fé e da segurança jurídica (MS 26125 AgR, Relator(a): Min. Edson Fachin, Tribunal Pleno, julgado em 02/09/2016, Acórdão Eletrônico DJe-204 Divulg 23-09-2016 Public 26-09-2016)
Nesse sentido, a orientação jurisprudencial adotada por este Tribunal em casos análogos: AC 5001594-08.2017.4.04.7117, Quinta Turma, Relatora Gisele Lemke, juntado aos autos em 01/03/2018; AC 5008339-14.2015.4.04.7104, Quinta Turma, Relator Luiz Carlos Canalli, juntado aos autos em 03/04/2018; AG 5010261-28.2016.4.04.0000, Sexta Turma, Relator Artur César De Souza, juntado aos autos em 12/04/2018; e AC 5029118-64.2017.4.04.9999, Sexta Turma, Relator João Batista Pinto Silveira, juntado aos autos em 06/02/2018.
Assim, em face da natureza alimentar do benefício previdenciário, ainda que revogada a tutela que o concedeu, não cabe a devolução dos valores recebidos de boa-fé, os quais se presumem consumidos para a manutenção da subsistência do beneficiário hipossuficiente. A devolução de tais valores violaria os princípios da proporcionalidade e da dignidade da pessoa humana.
Conclusão
Dar provimento ao apelo da Autarquia para julgar improcedente o pedido, nos termos do art. 487, inc. I, do Código de Processo Civil.
Revogar a decisão que concedeu a antecipação de tutela, pela improcedência do pedido e reforma da sentença.
Prejudicada a apreciação da apelação da parte autora.
Modificar a sentença para fixar honorários advocatícios proporcionais à sucumbência sofrida pelas partes, conforme fundamentação, bem como determinar a aplicação dos índices negativos de inflação.
Prequestionamento
Ficam prequestionados, para fins de acesso às instâncias recursais superiores, os dispositivos legais e constitucionais elencados pelas partes cuja incidência restou superada pelas próprias razões de decidir.
Dispositivo
Ante o exposto, voto por dar provimento ao recurso do INSS.
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Apelação Cível Nº 5018094-34.2020.4.04.9999/RS
PROCESSO ORIGINÁRIO: Nº 5000007-67.2016.8.21.0071/RS
RELATOR: Juiz Federal FRANCISCO DONIZETE GOMES
APELANTE: MAURO JUNIOR VENTURA DA SILVA
ADVOGADO: ALDA CRISTINA DE SOUZA FREITAS (OAB RS058272)
ADVOGADO: EDWARD NUNES MACHRY (OAB RS067219)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
MPF: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. REQUISITOS. RISCO SOCIAL. NÃO COMPROVADO. DEDUÇÃO DE GASTOS. DEFLAÇÃO. REVOGAÇÃO. TUTELA ANTECIPADA.
1. São dois os requisitos para a concessão do benefício assistencial: a) condição de deficiente ou idoso (65 anos ou mais); e b) situação de risco social (estado de miserabilidade, hipossuficiência econômica ou situação de desamparo) da parte autora e de sua família. 2. Embora a renda per capta familiar ultrapasse, em pouco, o máximo legal de 1/4 previsto em lei, a análise isolada do critério econômico não merece prosperar, devendo ser cotejada com demais critérios objetivos e especificidades de cada caso. 3. Não comprovada a situação de risco social é indevida a concessão do benefício assistencial. 4. A pretensão da Autarquia Previdenciária, no sentido de ver considerados eventuais índices inflacionários negativos na atualização monetária do valor da condenação, merece acolhida, conforme o entendimento desta Turma. 5. Revogada a decisão que concedeu a antecipação de tutela, pela improcedência do pedido e reforma da sentença.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, dar provimento ao recurso do INSS, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 30 de setembro de 2021.
Documento eletrônico assinado por FRANCISCO DONIZETE GOMES, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40002778923v12 e do código CRC 1b736ae5.Informações adicionais da assinatura:
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 23/09/2021 A 30/09/2021
Apelação Cível Nº 5018094-34.2020.4.04.9999/RS
RELATOR: Juiz Federal FRANCISCO DONIZETE GOMES
PRESIDENTE: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
PROCURADOR(A): JOÃO HELIOFAR DE JESUS VILLAR
APELANTE: MAURO JUNIOR VENTURA DA SILVA
ADVOGADO: ALDA CRISTINA DE SOUZA FREITAS (OAB RS058272)
ADVOGADO: EDWARD NUNES MACHRY (OAB RS067219)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
MPF: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 23/09/2021, às 00:00, a 30/09/2021, às 16:00, na sequência 506, disponibilizada no DE de 13/09/2021.
Certifico que a 5ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A 5ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, DAR PROVIMENTO AO RECURSO DO INSS.
RELATOR DO ACÓRDÃO: Juiz Federal FRANCISCO DONIZETE GOMES
Votante: Juiz Federal FRANCISCO DONIZETE GOMES
Votante: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
Votante: Desembargador Federal ROGER RAUPP RIOS
LIDICE PEÑA THOMAZ
Secretária
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