
EXTRATO DE ATA DA SESSÃO Ordinária DE 06/11/2019
Apelação Cível Nº 5000556-55.2018.4.04.7139/RS
RELATOR: Juiz Federal JULIO GUILHERME BEREZOSKI SCHATTSCHNEIDER
PRESIDENTE: Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA
PROCURADOR(A): JOÃO HELIOFAR DE JESUS VILLAR
SUSTENTAÇÃO ORAL: LUCIANA ZAIONS por LUCAS PEREIRA GONCALVES
APELANTE: Luzia Pereira Gonçalves (Pais) (AUTOR)
ADVOGADO: ADRIANA GARCIA DA SILVA (OAB RS054703)
ADVOGADO: LUCIANA ZAIONS (OAB RS086387)
ADVOGADO: LUIZA PEREIRA SCHARDOSIM DE BARROS
APELANTE: LUCAS PEREIRA GONCALVES (Absolutamente Incapaz (Art. 3º CC)) (AUTOR)
ADVOGADO: ADRIANA GARCIA DA SILVA (OAB RS054703)
ADVOGADO: LUCIANA ZAIONS (OAB RS086387)
ADVOGADO: LUIZA PEREIRA SCHARDOSIM DE BARROS
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
MPF: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL (MPF)
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Ordinária do dia 06/11/2019, às 10:00, na sequência 125, disponibilizada no DE de 18/10/2019.
Certifico que a 6ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
PROSSEGUINDO NO JULGAMENTO, APÓS OS VOTOS DO DES. FEDERAL PAULO AFONSO BRUM VAZ ACOMPANHANDO A DIVERGÊNCIA, E DO JUIZ FEDERAL MARCELO MALUCELLI ACOMPANHANDO O RELATOR, E A RETIFICAÇÃO DO VOTO DO DES. FEDERAL JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA PARA ACOMPANHAR A DIVERGÊNCIA, A 6ª TURMA DECIDIU, POR MAIORIA, VENCIDO O RELATOR, DAR PARCIAL PROVIMENTO À APELAÇÃO, NOS TERMOS DO VOTO DA JUÍZA FEDERAL TAÍS SCHILLING FERRAZ, QUE LAVRARÁ O ACÓRDÃO.
RELATORA DO ACÓRDÃO: Juíza Federal TAIS SCHILLING FERRAZ
Votante: Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA
Votante: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ
Votante: Juiz Federal MARCELO MALUCELLI
LIDICE PEÑA THOMAZ
Secretária
MANIFESTAÇÕES DOS MAGISTRADOS VOTANTES
Acompanha o(a) Relator(a) em 06/11/2019 06:48:12 - GAB. 103 (Des. Federal FERNANDO QUADROS DA SILVA) - Juiz Federal MARCELO MALUCELLI.
Acompanha a Divergência em 06/11/2019 10:21:15 - GAB. 91 (Des. Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ) - Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ.
É certo que a Administração, em atenção ao princípio da legalidade, poderá, a qualquer tempo, rever atos nulos ou ilegais. Tal ilação está respaldada nos verbetes das Súmulas nºs 346 e 473 do STF, in verbis:
Súmula 346: A Administração Pública pode declarar a nulidade dos seus próprios atos.
Súmula 473: A Administração pode anular seus próprios atos, quando eivados de vícios que os tornam ilegais, porque deles não se originam direitos; ou revogá-los, por motivo de conveniência ou oportunidade, respeitados os direitos adquiridos, e ressalvada, em todos os casos, a apreciação judicial.
Todavia, para isso deve fundamentar legalmente sua decisão, dando oportunidade de defesa ao administrado, porquanto a existência de contencioso com procedimento legalmente previsto e órgãos específicos limita o poder de revisão com base na autotutela. Com efeito, embora a Administração esteja autorizada a anular seus próprios atos quando eivados de vícios que os tornem ilegais (Súmula 473/STF), tratando-se de anulação de ato administrativo cuja formalização tenha repercutido no campo de interesses individuais, tal medida não prescinde da instauração de processo administrativo, com obediência aos princípios constitucionais da ampla defesa e do contraditório (STF, RE 594.296/MG, Plenário, Ministro Dias Toffoli, DJ de 13.02.2012).
Não fosse isso o bastante, o cancelamento não decorreu de ilegalidade ou irregularidade no ato de concessão do benefício, conforme referido no bem lançado voto divergente, verbis:
No caso em concreto, segundo se verifica do processo administrativo, o benefício do autor, incapaz, foi concedido em 2008 e cancelado em 2018, ao argumento de que desde 2009 houve superação da renda familiar, não mais se enquadrando a família no requisito da miserabilidade exigido para a concessão do benefício assistencial.
Judicializada a questão, viu-se que a conformação da renda à exigência legal estava satisfeita, tendo o INSS agido precipitadamente quando suspendeu o amparo.
Por certo que para caracterizar a ocorrência do dano moral não é necessário que haja o propósito deliberado de cancelar o benefício, mas há que se exigir do INSS cuidado redobrado na revisão administrativa, pois a pessoa que recebeu o amparo, recebeu também a segurança do estado de que ela teria condições de se manter com a renda concedida. O motivo do cancelamento deve ser suficiente, com lastro em profunda averiguação e investigação dos fatos ocorridos, não bastando mera revaloração de provas.
Assim, considero injustificado e flagrante o equívoco da Autarquia na análise realizada no benefício assistencial do autor, que resultou no cancelamento de prestação de natureza alimentar, direito fundamental do demandante, que necessitava da renda para enfrentar despesas com suas mais básicas necessidades, as quais não podiam ser supridas por seus pais, cujas rendas individuais eram insuficientes para fazer frente a todos os gastos familiares.
A respeito da indenização por danos morais, o Superior Tribunal de Justiça já sinalizou no sentido de que O mero dissabor não pode ser alçado ao patamar do dano moral, mas somente aquela agressão que exacerba a naturalidade dos fatos da vida, causando fundadas aflições ou angústias no espírito de quem ela se dirige. Recurso parcialmente conhecido e, nessa parte, provido. (REsp nº 215.666/RJ, Rel. Ministro CESAR ASFOR ROCHA, QUARTA TURMA, julgado em 21/06/2001, DJ 29/10/2001, p. 208).
Bem analisadas as circunstâncias do caso concreto, em cotejo com as provas documentais trazidas aos autos, forçoco concluir pela efetiva demonstração do abalo moral sofrido pelo autor que, teve cessado o benefício em virtude de erro atribuído única e exclusivamente ao INSS, sem que lhe fosse oportunizada qualquer espécie de defesa ou contraditório quanto ao procedimento da Administração, sendo obrigado a ingressar em juízo para defender seus direitos.
Entendo que a reparação por dano moral tem por finalidade compensar a vítima pelo sofrimento, tristeza, dor, angústia e aflição, não guardando, portanto, vinculação com os valores dos atrasados a receber em ação previdenciária ou dos salários ou benefícios que deixou de receber, ainda que tais elementos também possam ser levados em consideração, na medida em que constituam parte das circunstâncias do caso e tenham relação com a intensidade do sofrimento da vítima.
Em caso análago, esta Corte assim já se manifestou:
A doutrina e a jurisprudência não são unânimes no estabelecimento dos critérios a serem observados na mensuração do valor da reparação do dano moral, mas penso haver um ponto de convergência, consistente em uma multiplicidade de fatores, inerentes às particularidades do caso concreto, à situação pessoal dos envolvidos, à extensão do dano e ao princípio da razoabilidade, dentre outros (v.g. a natureza da lesão e a extensão do dano, as condições pessoais do ofendido, as condições pessoais do responsável, a equidade, a cautela e a prudência, a gravidade da culpa, o arbitramento em função da natureza e finalidade da indenização: Cahali, Yussef Said. Dano Moral. 3ª ed. São Paulo: RT, 2005, pp. 277-280; compatibilidade com a reprovabilidade da conduta ilícita, com a intensidade e a duração do sofrimento experimentado pela vítima, com a capacidade econômica do causador do dano, com as condições sociais do ofendido: Cavalieri Filho, Sérgio. Programa de Responsabilidade Civil. 8ª ed. São Paulo: Atlas, 2008, p. 93; o grau de repercussão ocasionado na esfera ideal do ofendido, tais como os reflexos sociais e pessoais, a possibilidade de superação física ou psicológica e a extensão e duração dos efeitos da ofensa: Cianci, Mirna. O Valor da Reparação Moral. 2ª ed. São Paulo: Saraiva, 2007, p. 137; o grau de reprovabilidade da conduta ilícita, a intensidade e duração do sofrimento experimentado pela vítima, a capacidade econômica do causador do dano e as condições pessoais do ofendido: Santos, Antonio Jeová. Dano Moral Indenizável. 4ª ed. São Paulo: RT, 2003, p. 186; circunstâncias pessoais, econômicas e sociais das partes, as vantagens que a satisfação pode proporcionar e a averiguação da conduta da vítima e do lesante: Severo, Sérgio. Os Danos Extrapatrimoniais. São Paulo: Saraiva, 1996, p. 230), multiplicidade esta ignorada ao se estabelecer, pura e simplesmente, uma equiparação com os valores patrimoniais a serem recebidos, ou com salários e benefícios que deixaram de ser pagos.
Há que se considerar, pois, a gravidade da ofensa ao patrimônio subjetivo do segurado ou beneficiário, atento à intensidade do sofrimento, angústia e aflição e ao grau de violação de sua dignidade; a função pedagógica da condenação, visando a elidir novas lesões de direitos aos administrados (TRF 4ª-Região, AC n. 2003.72.00.002050-0-SC, Segunda Turma, Rel. Des. Federal Antonio Albino Ramos de Oliveira, D.E. de 04-10-2006), e o princípio da razoabilidade, cuidando que o valor da reparação não seja irrisório ou, ao revés, ensejador de enriquecimento sem causa.
Em matéria previdenciária, já sabido que uma das partes - normalmente a que produziu o dano - é autarquia federal, e outra é segurado ou beneficiário da Previdência ou Assistência Sociais, e que o evento danoso costuma consistir em cancelamento, indeferimento ou redução indevida de benefício previdenciário ou assistencial, que pode ou não gerar direito à reparação por dano moral, penso que devem ser observados os seguintes parâmetros para a fixação do quantum devido:
a) as circunstâncias do cancelamento, indeferimento ou redução do benefício, com especial atenção ao grau de culpa da Autarquia, intimamente ligado com o patamar de extrapolação das atividades administrativas normais, consistentes na cautelosa verificação dos requisitos para a percepção do benefício;
b) a eventual culpa concorrente do ofendido;
c) a gravidade da ofensa ao patrimônio subjetivo do segurado ou beneficiário, atento à intensidade do sofrimento, angústia e aflição e ao grau de violação de sua dignidade;
d) a função pedagógica da condenação, "visando a elidir novas lesões de direitos aos administrados" (AC Nº 2003.72.00.002050-0/SC, TRF/4ª Região, 2ª Turma, Rel. Des. Federal Antonio Albino Ramos de Oliveira, D.E. de 04-10-2006);
e) o princípio da razoabilidade, cuidando que o valor da reparação não seja irrisório ou, ao revés, ensejador de enriquecimento sem causa. (TRF4, APELREEX 5006817-30.2012.4.04.7112, SEXTA TURMA, Relator CELSO KIPPER, juntado aos autos em 04/09/2014)
Ante o exposto, com a vênia do eminente Relator, voto por acompanhar a divergência para reconhecer a configuração do dano moral na espécie, devendo ser pago o montante "correspondente ao total das parcelas vencidas desde a indevida suspensão do benefício até a data em que cumprida a antecipação da tutela deferida em juízo".
Conferência de autenticidade emitida em 07/07/2020 02:38:44.
