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PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. REVISÃO ADMINISTRATIVA. IRREPETIBILIDADE DOS VALORES RECEBIDOS DE BOA-FÉ PELO SEGURADO. TEMA 979 DO STJ. MODULAÇÃO ...

Data da publicação: 10/09/2021, 07:01:17

EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. REVISÃO ADMINISTRATIVA. IRREPETIBILIDADE DOS VALORES RECEBIDOS DE BOA-FÉ PELO SEGURADO. TEMA 979 DO STJ. MODULAÇÃO DE EFEITOS. 1. São irrepetíveis os valores recebidos de boa-fé pelo segurado, ainda que por força de interpretação errônea, má aplicação da lei ou erro da Administração da Previdência Social, mesmo considerando-se o definido no art. 115 da LBPS. 2. Inaplicável a disciplina do Tema 979 do STJ, diante da modulação de efeitos indicada no julgamento do referido tema. (TRF4, AC 5007070-77.2019.4.04.7110, QUINTA TURMA, Relator FRANCISCO DONIZETE GOMES, juntado aos autos em 02/09/2021)

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5007070-77.2019.4.04.7110/RS

PROCESSO ORIGINÁRIO: Nº 5007070-77.2019.4.04.7110/RS

RELATOR: Juiz Federal FRANCISCO DONIZETE GOMES

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)

APELADO: ERICK LUIS CAPERA BARNECHE (Absolutamente Incapaz (Art. 3º CC)) (AUTOR)

ADVOGADO: BERENICE RIBEIRO DIAS (OAB RS090059)

ADVOGADO: EDUARDO RIOS PINTO RIBEIRO (OAB RS073368)

ADVOGADO: Guilherme Neves Piegas (OAB RS081335)

ADVOGADO: OTAVIO GIUSTI MILLER (OAB RS114810)

APELADO: LUCIANA CAPERA BARNECHE (Pais) (AUTOR)

ADVOGADO: BERENICE RIBEIRO DIAS (OAB RS090059)

ADVOGADO: EDUARDO RIOS PINTO RIBEIRO (OAB RS073368)

ADVOGADO: Guilherme Neves Piegas (OAB RS081335)

ADVOGADO: OTAVIO GIUSTI MILLER (OAB RS114810)

MPF: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL (MPF)

RELATÓRIO

Cuida-se de apelação interposta pelo INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS em face de sentença (evento 65, DOC1) que julgou parcialmente procedente o pedido de restabelecimento de benefício previdenciário e de declaração de inexistência de débito, em 28/02/2020, lançando dispositivo com os seguintes termos:

Ante o exposto, julgo parcialmente procedente o pedido, nos termos do art. 487, I, do Código de Processo Civil, para o fim de condenar o INSS a cancelar a dívida apurada em virtude da percepção do NB 87/520.651.804-9 e abster-se de promover qualquer cobrança sob essa rubrica.

Nos termos do art. 85 do CPC, condeno o INSS a arcar com honorários de advogado, que fixo em 10% sobre o valor cobrado (R$ 97.090,88). Condeno o autor a pagar honorários advocatícios, que fixo em 10%, calculados sobre as prestações vencidas até o ajuizamento do feito. É vedada a compensação (art. 85, § 14, CPC). Fica suspensa a condenação em relação à parte autora, na medida em que agraciada com a assistência judiciária gratuita.

Demanda isenta de custas (art. 4º, I e II, da Lei n. 9.289/1996).

Sentença não sujeita ao reexame necessário, tendo em vista que, não obstante ilíquida, o proveito econômico certamente não alcança o piso monetário eleito pela legislação como ensejador da remessa obrigatória (inciso I do § 3º do art. 496 do CPC).

Interposto(s) o(s) recurso(s), caberá à Secretaria intimar a parte contrária para contrarrazões e, na sequência, remeter os autos ao Tribunal Regional Federal da 4ª Região. Não havendo recurso ou no retorno deste com a manutenção da sentença:

- certifique-se o trânsito em julgado;

- esgotada a prestação jurisdicional, remetam-se os autos para baixa e arquivamento.

Intimem-se. Cumpra-se.

Apela o INSS (evento 73, DOC1) defendendo que a sentença merece reforma diante da prevalência do direito da Administração à restituição dos valores pagos indevidamente ao segurado, ainda que diante da sua boa-fé, com fundamento na disciplina do art. 115 da Lei nº 8.213/91.

Com contrarrazões ao recurso (evento 79, DOC1), vieram os autos a este Tribunal para julgamento.

É o relatório.

VOTO

Nos termos do artigo 1.046 do Código de Processo Civil (CPC), em vigor desde 18 de março de 2016, com a redação que lhe deu a Lei 13.105, de 16 de março de 2015, suas disposições aplicar-se-ão, desde logo, aos processos pendentes, ficando revogada a Lei 5.869, de 11 de janeiro de 1973.

Com as ressalvas feitas nas disposições seguintes a este artigo 1.046 do CPC, compreende-se que não terá aplicação a nova legislação para retroativamente atingir atos processuais já praticados nos processos em curso e as situações jurídicas consolidadas sob a vigência da norma revogada, conforme expressamente estabelece seu artigo 14.

Recebimento do recurso

Importa referir que a apelação deve ser recebida, por ser própria, regular e tempestiva.

Da repetição de valores

A controvérsia recursal restringe-se à restituição de valores recebidos de boa-fé pelo segurado.

A respeito do tema, a jurisprudência deste Regional firmou-se, desde longa data, no sentido da impossibilidade de repetição de valores recebidos de boa-fé pelo segurado, em face do caráter alimentar das prestações previdenciárias que implica relativização do estabelecido nos artigos 115, inciso II, da Lei nº 8.123/91 e 154, § 3º, do Decreto 3.048/99.

Nesse sentido, este Tribunal Regional Federal da 4ª Região já decidiu:

PROCESSO CIVL E PREVIDENCIÁRIO. DEVOLUÇÃO.DOS VALORES PAGOS EM RAZÃO DE ERRO DA ADMINISTRAÇÃO. BOA-FÉ DO SEGURADO. CARÁTER ALIMENTAR DAS PRESTAÇÕES. IRREPETIBILIDADE. 1. É indevida a devolução de valores recebidos em decorrência de erro da Administração Pública no pagamento do benefício previdenciário, tanto em razão da boa-fé do segurado e da sua condição de hipossuficiente, como também em virtude do caráter alimentar das parcelas e da irrepetibilidade dos alimentos. (TRF4 5014634-88.2015.404.7000, SEXTA TURMA, Relator JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA, juntado aos autos em 21/10/2016).

PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. VALORES RECEBIDOS INDEVIDAMENTE. CARÁTER ALIMENTAR. BOA-FÉ. IRREPETIBILIDADE. 1. É indevida a devolução de valores recebidos em decorrência de erro da Administração Pública no pagamento do benefício previdenciário, tanto em razão da boa-fé do segurado e da sua condição de hipossuficiente, como também em virtude do caráter alimentar das parcelas. Precedentes do STJ e desta Corte. 2. No caso em tela, a autora, beneficiária de pensão por morte desde 1969, contraiu novo matrimônio em 1971, ato que levaria à perda da qualidade de dependente pela legislação da época (Decreto 60.501/67, art. 15, VI). Quando requereu a pensão por morte em decorrência do falecimento do novo cônjuge, em 2011, foi informada de que houve pagamento indevido da pensão por morte no período de 40 anos, havendo lançamento do débito. irrepetibilidade dos valores recebidos de boa-fé. (TRF4, APELREEX 0014099-11.2014.404.9999, QUINTA TURMA, Relator ROGER RAUPP RIOS, D.E. 08/11/2016).Na mesma linha é o entendimento do Superior Tribunal de Justiça:

PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL. CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 1973. APLICABILIDADE. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. BENEFÍCIO RECEBIDO INDEVIDAMENTE POR ERRO DA ADMINISTRAÇÃO. BOA-FÉ. VERBA DE CARÁTER ALIMENTAR. RESTITUIÇÃO DE VALORES. IMPOSSIBILIDADE. I - Consoante o decidido pelo Plenário desta Corte na sessão realizada em 09.03.2016, o regime recursal será determinado pela data da publicação do provimento jurisdicional impugnado. Assim sendo, in casu, aplica-se o Código de Processo Civil de 1973. II - Por força do princípio da irrepetibilidade dos alimentos, e, sobretudo, em razão da diretriz da boa-fé objetiva do segurado, não cabe a devolução de valores recebidos, a título de benefício previdenciário, por força de interpretação equivocada, má aplicação da lei ou erro da Administração. III - Recurso Especial não provido. (REsp 1550569/SC, Rel. Ministra REGINA HELENA COSTA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 03/05/2016, DJe 18/05/2016).

PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. PAGAMENTO INDEVIDO. BOA-FÉ. ERRO DA ADMINISTRAÇÃO. VERBA DE CARÁTER ALIMENTAR. RESTITUIÇÃO DE VALORES. IMPOSSIBILIDADE. 1. Conforme a jurisprudência do STJ é incabível a devolução de valores percebidos por pensionista de boa-fé por força de interpretação errônea, má aplicação da lei ou erro da Administração. 2. É descabido ao caso dos autos o entendimento fixado no Recurso Especial 1.401.560/MT, julgado sob o rito do art. 543-C do CPC, pois não se discute na espécie a restituição de valores recebidos em virtude de antecipação de tutela posteriormente revogada. 3. Recurso Especial não provido. (REsp 1553521/CE, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 03/11/2015, DJe 02/02/2016).

No entanto, quando os benefícios previdenciários são obtidos, comprovadamente, mediante fraude, dolo e má-fé, há previsão legal autorizando a administração a adotar medidas administrativas para fazer cessar a ilicitude, bem como a buscar a via judicial para obter a restituição da verba indevidamente paga.

Assim, ainda que se trate de parcela com nítido caráter alimentar, acaso caracterizada a má-fé do beneficiário no recebimento dos valores, não há como se obstar a conduta da Administração de procurar reaver os valores pagos indevidamente. Nesse sentido:

PREVIDENCIÁRIO. PAGAMENTOS FEITOS INDEVIDAMENTE. AUSÊNCIA DE BOA-FÉ. DEVOLUÇÃO. POSSIBILIDADE. A despeito da manifesta natureza alimentar da prestação, evidenciada a má-fé, impõe-se a condenação da requerida na devolução dos valores recebidos indevidamente. (TRF4 5006912-07.2014.404.7204, QUINTA TURMA, Relator ROGERIO FAVRETO, juntado aos autos em 15/06/2016).

PREVIDENCIÁRIO. REVISÃO DE BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. REMESSA EX OFFICIO. INEXISTÊNCIA. DECADÊNCIA. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. DEFICIENTE. VALORES PERCEBIDOS DE MÁ-FÉ PELO RESPONSÁVEL LEGAL. REPOSIÇÃO AO ERÁRIO. POSSIBILIDADE DE RESSARCIMENTO. CONSECTÁRIOS LEGAIS DA CONDENAÇÃO. PRECEDENTES DO STF E STJ. CONSECTÁRIOS DA SUCUMBÊNCIA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. MAJORAÇÃO. AJG. INEXIGIBILIDADE TEMPORÁRIA. 1. Hipótese em que a sentença não está sujeita à remessa ex officio, a teor do disposto no artigo 496, § 3º, I, do Código de Processo Civil. 2. O pagamento de benefício de prestação continuada não atrai a incidência do prazo decadencial, de modo a admitir a revisão administrativa bianual expressamente prevista em lei, no que se refere à permanência dos requisitos legais. 3. A Administração possui o poder-dever de anular seus próprios atos, quando eivados de ilegalidade, assegurado o contraditório e ampla defesa. 4. A revisão administrativa é cabível quando fundada na suspeita de fraude ou erro, não se tratando de nova valoração de provas já examinadas. 5. Evidenciada a ciência do recebimento irregular de benefício assistencial pelo responsável legal do deficiente físico após o início do exercício de atividade laboral e constituição de entidade familiar própria, sem que os valores revertessem em favor do titular do benefício, está configurada a má-fé, sendo cabível o ressarcimento dos pagamentos indevidos. 6. Critérios de correção monetária e juros de mora conforme decisão do STF no RE nº 870.947, DJE de 20-11-2017 e do STJ no REsp nº 1.492.221/PR, DJe de 20-3-2018. 7. Improvido o recurso da parte autora, majora-se a verba honorária, elevando-a de 5% para 10% sobre o valor da causa atualizado, consideradas as variáveis dos incisos I a IV do § 2º e o § 11, ambos do artigo 85 do CPC, suspendendo-se a sua exigibilidade temporariamente em face do benefício da assistência judiciária gratuita. (TRF4 5007610-45.2016.4.04.7009, TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DO PR, Relator FERNANDO QUADROS DA SILVA, juntado aos autos em 12/06/2021)

PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. DEVOLUÇÃO DE VALORES RECEBIDOS DE FORMA INDEVIDA. Comprovado nos autos que o segurado concorreu para a inclusão de períodos de trabalho inexistentes, em sua CTPS, o que resultou em pagamento indevido de benefício, correta a decisão que afasta a boa-fé no recebimento dos valores e determina a respectiva devolução ao INSS. (TRF4, AC 5005617-36.2017.4.04.7104, SEXTA TURMA, Relatora TAÍS SCHILLING FERRAZ, juntado aos autos em 22/06/2021)

Tal orientação restou atualizada recentemente pelo Superior Tribunal de Justiça - STJ. No julgamento realizado em 10/03/2021, a questão da devolução de valores recebidos de boa-fé, à título de benefício previdenciário, por força de interpretação errônea, má aplicação da lei ou erro da Administração da Previdência Social, Tema 979 daquela Corte, foi delineada a seguinte tese:

Com relação aos pagamentos indevidos aos segurados decorrentes de erro administrativo (material ou operacional), não embasado em interpretação errônea ou equivocada da lei pela Administração, são repetíveis, sendo legítimo o desconto no percentual de até 30% (trinta por cento) de valor do benefício pago ao segurado/beneficiário, ressalvada a hipótese em que o segurado, diante do caso concreto, comprova sua boa-fé objetiva, sobretudo com demonstração de que não lhe era possível constatar o pagamento indevido.

Todavia, seus efeitos se restrigem aos processos distribuídos após o referido julgamento, segundo definido em modulação de efeitos publicada em 23/4/2021.

Do caso concreto

No caso dos autos constatou-se que o apelado não faz jus ao restabelecimento do benefício assistencial em razão de sua deficiência diante da significativa alteração da renda per capita da família, o que deu azo ao cancelamento de seu benefício.

Todavia, não se tem a percepção de que o segurado agiu de má-fé ao perceber o benefício. Isto porque, se de fato houve alteração da renda familiar, tal alteração não foi significativa o suficiente para que se possa considerar, segundo o senso comum, ser indevido o benefício previdenciário.

Segundo os autos denotam, a renda da família se alterou de renda inferior a 1/4 do salário mínimo por pessoa para cerca de 1/2 salário mínimo por pessoa. A renda de 1/2 salário mínimo por pessoa não é suficiente para que a parte considere restar afastado o risco social, muito antes pelo contrário, famílias nestas condições se consideram em situação de miserabilidade, percepção social atualmente integrada à legislação, muito embora em caráter excepcional (art. 1º da Lei nº Lei nº 13.982, de 2/4/2020, que alterou o art. 20-A da Lei 8.213/91).

Ademais, como lapidarmente fundamentado pelo Juízo Singular, cabe à Administração, no exercício do poder-dever de revisão de atos administrativos, proceder à revisão administrativa em intervalo de tempo razoável, de modo a inibir os pagamentos indevidos, o que ocorreu no limite para a decadência do direito, não tendo sido atendida a determinação legal de revisão administrativa bianual dos benefícios assistenciais (art. 21 da Lei nº 8.213/91), e não se tendo observado sonegação de informação pelo segurado, pois as referidas informações estavam ao alcance do INSS. Colhe-se da sentença:

Observo que, ainda que em tese se conclua que o recebimento passou a ser indevido, incumbiria ao INSS adotar as providências necessárias à cessação, descabendo atribuir EXCLUSIVAMENTE ao titular do BPC a responsabilidade por prestar informações ao ente público acerca da modificação nas condições socioeconômicas da família.

A propósito do tema, cumpre destacar que, de fato, o Decreto n. 6.214/2007, o qual regulamenta o benefício de prestação continuada, prevê que:

Art. 35-A. O beneficiário, ou seu representante legal, deve informar ao INSS alterações dos dados cadastrais correspondentes à mudança de nome, endereço e estado civil, a fruição de qualquer benefício no âmbito da Seguridade Social ou de outro regime, a sua admissão em emprego ou a percepção de renda de qualquer natureza elencada no inciso VI do caput do art. 4º.

Não obstante, a legislação que rege essa espécie de prestação também estabelece mecanismos para detectar eventuais alterações fáticas que possam implicar em descaracterização da miserabilidade e/ou da deficiência. Nesse sentido, o art. 21, caput, da LOAS determina a realização de revisões bianuais nas prestações, ao passo que o art. 39, II, do Decreto n. 6.214/2007 estabelece que:

Art. 39. Compete ao INSS, na operacionalização do Benefício de Prestação Continuada:

(...)

II - verificar o registro de benefícios previdenciários e de emprego e renda em nome do requerente ou beneficiário e dos integrantes do grupo familiar, em consonância com a definição estabelecida no inciso VI do art. 4º;

Com efeito, ainda que se reconheça que o demandante tinha o dever legal de informar o réu a respeito da aquisição de renda por parte de seu pai, não há nos autos demonstração de que seus genitores foram devidamente orientados acerca dessa obrigação quando da concessão do benefício, devendo-se ter presente que, embora o desconhecimento da lei não escuse o seu descumprimento, é inequívoco que em situações como a dos autos, em que o deferimento da prestação se deu em razão da constatação de uma situação de miserabilidade (indiscutivelmente presente na DIB), essa exigência deve ser mitigada. Portanto, considero que se afigura plenamente plausível que a ausência de manifestação do beneficiário realmente seja decorrência da ignorância a respeito da necessidade de prestar informações, até porque em nenhum momento ela procurou omitir o incremento de renda em seu núcleo familiar.

Nesse sentido, observo que a autora foi convocada em 24-8-2017 para se manifestar acerca da "possível irregularidade na manutenção de seu benefício...", sendo que na defesa apresentada em 18/09/2017 (evento 15, CONTES2, p. 3) não impugnou a informação de que seu grupo familiar, em determinados momentos, contou com rendimentos superiores ao parâmetro legal, arguindo que necessita da manutenção do benefício em razão do genitor do autor não estar prestando a ajuda necessária, por estar desempregado, informação que é confirmada no extrato do CNIS acostado no evento 64.

A par disso, é importante destacar que a legislação de regência expressamente atribui ao INSS a responsabilidade pela verificação periódica da persistência dos requisitos que autorizaram a concessão do BPC e que a manifestação do titular do BPC sequer seria necessária à constatação da modificação nas condições fáticas que deram ensejo ao deferimento.

No caso, não se pode perder de vista que os dados que resultaram na suspensão do amparo assistencial sempre estiveram ao alcance do INSS, o qual tinha ciência de que o pai do autor compunha o grupo familiar no qual ele se inseria.

De fato, considerando que o NB 87/520.651.804-9 foi deferido em junho de 2007, com DIB a partir de 19/03/2007, e que somente em agosto de 2017 (evento 15, CONTEST5, p. 4) teria sido realizado o cruzamento de dados que apontou o indício de irregularidade na manutenção da prestação titularizada pelo postulante, resta evidente que a autarquia previdenciária sequer cumpriu a estipulação legal de proceder à revisão dos benefícios assistenciais a cada dois anos.

Observo, finalmente, que o fato do genitor da parte autora passar a auferir renda mensal não é, por si só, hábil à demonstração da existência de irregularidade na percepção do BPC. De fato, somente com o processamento, pelo requerido, de uma reavaliação da situação fática seria possível a verificação da (in)suficiência desse novo rendimento para a manutenção do grupo familiar, uma vez que poderia ter havido modificação na composição deste (o critério balizador é a renda per capita) ou nas despesas de seus membros.

Nesse contexto, tenho que é o INSS quem deve arcar com o ônus da demora na interrupção dos pagamentos relativos ao NB 87/520.651.804-9, visto que, ainda que a renda familiar per capita seja pouco superior ao limite de 1/4 do salário mínimo nas competências que quer ver repetidas, não efetuou a revisão bianual do BPC, além de ter levado mais de um ano para suspender o benefício após a constatação de que o titular não preenchia mais os requisitos para recebê-lo. Dessa forma, concluo que também não houve irregularidade na percepção do NB 87/520.651.804-9 até 01/11/2018 - DCB e, consequentemente, que é indevida a cobrança do débito apurado em desfavor do requerente por força do pagamento da renda mensal da aludida prestação.

Diante do fundamentado, e por estar a sentença adequada à linha de julgamento adotada por esta Corte, não merece provimento a apelação do INSS.

Ônus Sucumbenciais

Ausente impugnação quanto aos ônus sucumbenciais, resta mantida a sentença no ponto.

Uma vez que a sentença foi proferida após 18/3/2016 (data da vigência do NCPC), aplica-se a majoração prevista no artigo 85, § 11, desse diploma, observando-se os ditames dos §§ 2º a 6º quanto aos critérios e limites estabelecidos. Assim, majoro a verba honorária em 20% sobre o percentual mínimo da primeira faixa (artigo 85, § 3º, inciso I, do NCPC).

Conclusão

Negar provimento à apelação do INSS.

Prequestionamento

Ficam prequestionados, para fins de acesso às instâncias recursais superiores, os dispositivos legais e constitucionais elencados pelas partes cuja incidência restou superada pelas próprias razões de decidir.

Dispositivo

Ante o exposto, voto por negar provimento à apelação.



Documento eletrônico assinado por FRANCISCO DONIZETE GOMES, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40002666035v18 e do código CRC 9d4e1a66.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): FRANCISCO DONIZETE GOMES
Data e Hora: 2/9/2021, às 18:33:41


5007070-77.2019.4.04.7110
40002666035.V18


Conferência de autenticidade emitida em 10/09/2021 04:01:16.

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5007070-77.2019.4.04.7110/RS

PROCESSO ORIGINÁRIO: Nº 5007070-77.2019.4.04.7110/RS

RELATOR: Juiz Federal FRANCISCO DONIZETE GOMES

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)

APELADO: ERICK LUIS CAPERA BARNECHE (Absolutamente Incapaz (Art. 3º CC)) (AUTOR)

ADVOGADO: BERENICE RIBEIRO DIAS (OAB RS090059)

ADVOGADO: EDUARDO RIOS PINTO RIBEIRO (OAB RS073368)

ADVOGADO: Guilherme Neves Piegas (OAB RS081335)

ADVOGADO: OTAVIO GIUSTI MILLER (OAB RS114810)

APELADO: LUCIANA CAPERA BARNECHE (Pais) (AUTOR)

ADVOGADO: BERENICE RIBEIRO DIAS (OAB RS090059)

ADVOGADO: EDUARDO RIOS PINTO RIBEIRO (OAB RS073368)

ADVOGADO: Guilherme Neves Piegas (OAB RS081335)

ADVOGADO: OTAVIO GIUSTI MILLER (OAB RS114810)

MPF: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL (MPF)

EMENTA

PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. REVISÃO ADMINISTRATIVA. IRREPETIBILIDADE DOS VALORES RECEBIDOS DE BOA-FÉ PELO SEGURADO. TEMA 979 DO STJ. MODULAÇÃO DE EFEITOS.

1. São irrepetíveis os valores recebidos de boa-fé pelo segurado, ainda que por força de interpretação errônea, má aplicação da lei ou erro da Administração da Previdência Social, mesmo considerando-se o definido no art. 115 da LBPS. 2. Inaplicável a disciplina do Tema 979 do STJ, diante da modulação de efeitos indicada no julgamento do referido tema.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, negar provimento à apelação, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Porto Alegre, 31 de agosto de 2021.



Documento eletrônico assinado por FRANCISCO DONIZETE GOMES, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40002666036v3 e do código CRC 6e99f971.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): FRANCISCO DONIZETE GOMES
Data e Hora: 2/9/2021, às 18:33:41


5007070-77.2019.4.04.7110
40002666036 .V3


Conferência de autenticidade emitida em 10/09/2021 04:01:16.

Poder Judiciário
Tribunal Regional Federal da 4ª Região

EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 24/08/2021 A 31/08/2021

Apelação Cível Nº 5007070-77.2019.4.04.7110/RS

RELATOR: Juiz Federal FRANCISCO DONIZETE GOMES

PRESIDENTE: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO

PROCURADOR(A): FÁBIO BENTO ALVES

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)

APELADO: ERICK LUIS CAPERA BARNECHE (Absolutamente Incapaz (Art. 3º CC)) (AUTOR)

ADVOGADO: BERENICE RIBEIRO DIAS (OAB RS090059)

ADVOGADO: EDUARDO RIOS PINTO RIBEIRO (OAB RS073368)

ADVOGADO: Guilherme Neves Piegas (OAB RS081335)

ADVOGADO: OTAVIO GIUSTI MILLER (OAB RS114810)

APELADO: LUCIANA CAPERA BARNECHE (Pais) (AUTOR)

ADVOGADO: BERENICE RIBEIRO DIAS (OAB RS090059)

ADVOGADO: EDUARDO RIOS PINTO RIBEIRO (OAB RS073368)

ADVOGADO: Guilherme Neves Piegas (OAB RS081335)

ADVOGADO: OTAVIO GIUSTI MILLER (OAB RS114810)

MPF: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL (MPF)

Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 24/08/2021, às 00:00, a 31/08/2021, às 14:00, na sequência 452, disponibilizada no DE de 13/08/2021.

Certifico que a 5ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:

A 5ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO.

RELATOR DO ACÓRDÃO: Juiz Federal FRANCISCO DONIZETE GOMES

Votante: Juiz Federal FRANCISCO DONIZETE GOMES

Votante: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO

Votante: Desembargador Federal ROGER RAUPP RIOS

LIDICE PEÑA THOMAZ

Secretária



Conferência de autenticidade emitida em 10/09/2021 04:01:16.

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