APELAÇÃO CÍVEL Nº 5006606-53.2018.4.04.9999/RS
RELATOR | : | ARTUR CÉSAR DE SOUZA |
APELANTE | : | JEDIELSON SANTOS DE QUADROS |
ADVOGADO | : | ELESIO ROBERTO DA SILVA |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
MPF | : | MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL |
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. VIABILIDADE. HONORÁRIOS PERICIAIS. CONSECTÁRIOS.
1. Comprovados os requisitos da deficiência para o labor e hipossuficiência econômica do grupo familiar, cabível a concessão do benefício assistencial.
2. Honorários periciais a cargo do INSS. Omissão da sentença que se supre.
3. O Supremo Tribunal Federal reconheceu no RE 870947, com repercussão geral, a inconstitucionalidade do uso da TR, determinando, no recurso paradigma, a adoção do IPCA-E para o cálculo da correção monetária.
4. Considerando que o recurso que originou o precedente do STF tratava de condenação da Fazenda Pública ao pagamento de débito de natureza administrativa, o Superior Tribunal de Justiça, no REsp 1495146, em precedente também vinculante, e tendo presente a inconstitucionalidade da TR como fator de atualização monetária, distinguiu os créditos de natureza previdenciária, em relação aos quais, com base na legislação anterior, determinou a aplicação do INPC.
5. Os juros de mora, a contar da citação, devem incidir à taxa de 1% ao mês, até 29-06-2009. A partir de então, incidem uma única vez, até o efetivo pagamento do débito, segundo o índice oficial de remuneração básica aplicado à caderneta de poupança.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 6ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, dar provimento à apelação, determinando o cumprimento imediato do acórdão, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 13 de junho de 2018.
Juiz Federal Artur César de Souza
Relator
| Documento eletrônico assinado por Juiz Federal Artur César de Souza, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 9402252v34 e, se solicitado, do código CRC 7DD87674. | |
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| Data e Hora: | 15/06/2018 11:04 |
APELAÇÃO CÍVEL Nº 5006606-53.2018.4.04.9999/RS
RELATOR | : | ARTUR CÉSAR DE SOUZA |
APELANTE | : | JEDIELSON SANTOS DE QUADROS |
ADVOGADO | : | ELESIO ROBERTO DA SILVA |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
MPF | : | MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL |
RELATÓRIO
Trata-se de apelação da parte autora de sentença (prolatada em 17/10/2017 na vigência do NCPC) que julgou improcedente o pedido de benefício assistencial, cujo dispositivo reproduzo a seguir:
Diante do exposto com fundamento no art. 487 inciso I do CPC Julgo improcedente o pedido formulado por JEDIELSON SANTOS DE QUADROS em Ação de Beneficio Assistencial em face do INSTITUTO NACIONAL DA SEGURIDADE SOCIAL -INSS Em razão da sucumbência condeno 0 autor ao pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios os quais fixo em R$ 1 500 00 (um mil quinhentos reais) considerando a natureza da demanda 0 tempo de tramitação do feito e o trabalho realizado (art. 85 §§ 39 e 69 do CPC) suspensa a exigibilidade pois e beneficiário da gratuidade judiciária (art. 98 §§ 19 e 29 do CPC)
Irresignado, a parte autora apelou, sustentando, em síntese, que possui doença que provoca dores e impotência funcional de toda a coluna vertebral e dispnéia, que a incapacidade e total e permanente, e que o grau de incapacidade do Autor e de 80%, devido a deformidade na região do tórax, na região da bacia, e na coluna vertebral, CIDs M47 8, M41 2, M43 8, o que impossibilita inclusive de exercer atividade de motorista até porque a doença do Autor esta em fase evolutiva. Ademais, alega que o requerente titulava o amparo à pessoa portadora de deficiência desde 01/08/1996 até 04/02/1999, quando foi indevidamente cessado pelo INSS. Asseverou, que de lá para cá requereu inúmeras vezes a liberação do benefício, sendo a última em 08/12/2006, sendo todas indeferidas. Finalizou afirmando que o grupo familiar se enquadra no requisito renda, pugnando pela reforma da sentença.
Apresentada as contrarrazões, vieram os autos ao Tribunal.
O Ministério Público Federal opinou pelo provimento da apelação.
É o relatório.
VOTO
Juízo de admissibilidade
O apelo preenche os requisitos legais de admissibilidade.
Benefício de prestação continuada ao idoso e ao deficiente (LOAS)
A Constituição Federal de 1988 dispôs em seu artigo 203:
Art. 203. A assistência social será prestada a quem dela necessitar, independentemente da contribuição à seguridade social, e tem por objetivos:
(...)
V - a garantia de um salário mínimo de benefício mensal à pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, conforme dispuser a lei.
A regulamentação desse dispositivo constitucional veio com a Lei nº 8.742, de 7 de dezembro de 1993, denominada Lei Orgânica da Assistência Social (LOAS), que, em seu artigo 20, passou a especificar as condições para a concessão do benefício, no valor de um salário mínimo mensal, à pessoa com deficiência e ao idoso com 70 anos ou mais comprovadamente carentes.
Após as alterações promovidas pelas Leis nº 9.720, de 30 de novembro de 1998, e nº 10.741, de 1º de outubro de 2003 (Estatuto do Idoso), relativas à redução do critério etário para 67 e 65 anos, respectivamente, sobrevieram as Leis nº 12.435, de 06 de julho de 2011, e nº 12.470, de 31 de agosto de 2011, as quais conferiram ao aludido artigo 20, da LOAS, a seguinte redação, ora em vigor:
Art. 20. O benefício de prestação continuada é a garantia de um salário-mínimo mensal à pessoa com deficiência e ao idoso com 65 (sessenta e cinco) anos ou mais que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção nem de tê-la provida por sua família. (Redação dada pela Lei nº 12.435, de 2011)
(...)
Portanto, o direito ao benefício assistencial pressupõe o preenchimento dos seguintes requisitos:
1.a) idoso (assim considerado aquele com 65 anos ou mais, a partir de 1º de janeiro de 2004, data da entrada em vigor do Estatuto do Idoso) ou
1.b) condição de deficiente (incapacidade para o trabalho e para a vida independente, conforme redação original do artigo 20, da LOAS, e, após as alterações da Lei nº 12.470, de 31-10-2011, tratar-se de pessoa com impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas) ;
2) Situação de risco social (ausência de meios para, dignamente, prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família).
Requisito etário
Tratando-se de benefício requerido na vigência do Estatuto do Idoso, é considerada idosa a pessoa com 65 (sessenta e cinco) anos ou mais que comprove não possuir meios de prover a própria manutenção nem de tê-la provida por sua família. O requisito é objetivo, ou seja, comprovado o atributo etário, a análise do requisito incapacitante é desnecessária, bastando apenas verificar a situação de vulnerabilidade socioeconômica a que submetido o idoso.
Condição de deficiente
Mister salientar, por oportuno, que a incapacidade para a vida independente a que se refere a Lei 8.742/93, na redação original, deve ser interpretada de forma a garantir o benefício assistencial a uma maior gama possível de pessoas com deficiência, consoante pacífica jurisprudência do STJ (v.g. STJ, 5ª Turma, RESP 360.202/AL, Rel. Min. Gilson Dipp, DJU de 01-07-2002) e desta Corte (v.g. AC n. 2002.71.04.000395-5/RS, 6ª Turma, Rel. Des. Federal João Batista Pinto Silveira, DJU de 19-04-2006).
Desse modo, a incapacidade para a vida independente:
a) não exige que a pessoa possua uma vida vegetativa ou seja incapaz de se locomover;
b) não significa incapacidade para as atividades básicas do ser humano, tais como alimentar-se, fazer a higiene pessoal e vestir-se sozinho;
c) não impõe a incapacidade de se expressar ou se comunicar; e
d) não pressupõe dependência total de terceiros.
Situação de risco social
Tendo em vista a inconstitucionalidade dos artigos 20, § 3º, da Lei 8.742/1993 e do artigo 34, § único, da Lei 10.741/2003, reconhecida no julgamento dos REs 567985 e 580963 em 18.04.2013, a miserabilidade para fins de benefício assistencial deve ser verificada em cada caso concreto.
Nesse sentido, os cuidados necessários com a parte autora, em decorrência de sua deficiência, incapacidade ou avançada idade, que acarretarem gastos - notadamente com medicamentos, alimentação especial, fraldas descartáveis, tratamento médico, psicológico e fisioterápico, entre outros -, configuram despesas a ser consideradas na análise da condição de risco social da família do demandante (TRF4, APELREEX 5002022-24.2011.404.7012, Sexta Turma, Relator p/ Acórdão Celso Kipper, juntado aos autos em 27/06/2013).
A jurisprudência desta Corte Regional, bem como do Superior Tribunal de Justiça, é pacífica no sentido de que qualquer benefício de valor mínimo recebido por idoso de 65 anos ou mais (salvo quando recebido por força de deficiência, quando então o requisito etário é afastado) deve ser excluído da apuração da renda familiar, bem como essa renda mínima não é o único critério a balizar a concessão do benefício, devendo ser examinado juntamente com outros meios de aferição do estado de miserabilidade, hipossuficiência econômica ou situação de desamparo do autor e de sua família (Pet n.º 7203/PE - 3ª Seção - Unânime - Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura - DJe 11-10-2011; TRF4 - AC n.º 0019220-88.2012.404.9999 - 6ª T. - unânime - Rel. Des. Celso Kipper - D.E. 22-03-2013; REsp n.º 1112557/MG - 3ª Seção - unânime - Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho - DJe 20-11-2009).
Também, o fato de a parte autora ser beneficiária e perceber renda proveniente do Programa Bolsa Família, não só não impede a percepção do benefício assistencial do art. 203, V, da Constituição Federal, como constitui forte indicativo de que a unidade familiar encontra-se em situação de risco social (TRF4, APELREEX 2009.71.99.006237-1, Sexta Turma, Relator p/ Acórdão Celso Kipper, D.E. 07/10/2014).
Logo, em linhas gerais, para efeito de concessão do benefício de prestação continuada, a situação de risco social a que se encontra exposta a pessoa idosa ou portadora de deficiência e sua família deve ser analisada em cada caso concreto (TRF4, EINF 0016689-58.2014.404.9999, Terceira Seção, Relator Ricardo Teixeira do Valle Pereira, D.E. 29/05/2015).
Fixados os parâmetros de valoração da prova, passo ao exame da situação específica dos autos.
Para comprovação da deficiência foi realizada perícia médica em 13/09/2012, na qual o expert afirma que o autor apresenta espondiloartrose torácica e lombar (CID M47.8), espondilolistese L4/L5 (CID M43.1), escoliose tóracico-lombar de convexidade à direita (CID M41.2) e deformidade do tórax conhecida como "peito de pombo", bem como deformidade da bacia, enfermidades as quais provocam incapacidade laborativa total e permanente(evento 4, LAUDPERI26, p.2); entretanto, no laudo pericial complementar, realizado em 27/03/2015, o mesmo profissional reforça que a incapacidade laboral do impetrante é uniprofissional, restringindo-se às atividades habitualmente exercidas (Evento 4 - LAUDPERI33)
Nessa senda, o Juízo de origem entendeu que para a concessão de beneficio assistencial deve estar presente a condição de deficiência e não simples diminuição de capacidade laborativa e não há como enquadrar a enfermidade de que é acometido o autor no conceito de deficiência na forma como exige a legislação.
Todavia, pronunciou-se o parecer ministerial em sentido contrário (evento 12-PARECER1):
Como se observa, o expert indicado para a realização de perícia médica, Dr. Adelman Ferreira de Freitas, aponta que o autor possui complicações em sua coluna dorsal, bem como deformidades na região do tórax e bacia, comprometendo sua capacidade laboral no tocante a profissões que necessitem de esforço físico de qualquer intensidade. Da mesma maneira, atesta que as patologias que acometem o autor provocam impotência funcional de toda a coluna vertebral e dispnéia, sendo seu grau de incapacidade de 80% (oitenta por cento), o que impede o exercício de sua profissão habitual...
Ocorre que, da análise do conceito de pessoa portadora de deficiência trazido pela Lei nº 13.146/15 (Estatuto da Pessoa Portadora de Deficiência), verifica-se que restou superado o enfoque anterior, centrado exclusivamente nos aspectos físicos, passando-se a considerar as limitações da pessoa portadora de deficiência a partir de sua inserção específica no meio social, em consonância com a definição contida na Convenção de Nova York, da qual o Brasil é signatário.
Dito isso, em observação às anotações constantes na Carteira de Trabalho e Previdência Social do ora apelante, constata-se que este sempre exerceu atividades como "Trabalhador Rural" e "Tratorista de Safra", ambas profissões que exigem o esforço físico por parte do empregado (Evento 4 - LAUDOPERI39, fl. 5). Logo, percebe-se que o autor, apesar de ser jovem, atualmente com 25 anos, trata-se de pessoa com baixa escolaridade (estudou até a 8ª série do Ensino Fundamental, conforme apurado no Estudo Social) e sem qualquer profissionalização ou qualificação, tendo sua experiência profissional limitada ao labor rural. Soma-se isso ao fato de que o impetrante reside em Inhacorá, município com 2.267 habitantes, segundo dados do IBGE2, onde a atividade predominante é a agricultura, razão pela qual considera-se o mercado de trabalho extremamente restrito àquelas ocupações de caráter intelectual, ou que não exijam qualquer tipo de esforço físico. Tais cargos, em sua grande maioria, demandam qualidades, escolares ou profissionais, as quais o autor não possui. Grifo meu
Evidenciam-se, pois, as barreiras, tanto físicas, quanto intelectuais, enfrentadas pelo autor, impedindo sua participação de maneira plena e efetiva na sociedade, em igualdade de condições com as demais pessoas. Ademais, importante frisar que, de acordo com os esclarecimentos prestados pelo médico perito, a doença que o acomete não é passível de cura, sendo possível unicamente o controle das dores com uso de analgésicos e anti-inflamatórios. Atenta-se, também, ao fato de que parte das patologias encontram-se em fase evolutiva; o médico perito confirma, inclusive, que a incapacidade do autor é decorrente do agravamento dessas doenças. Prova disso é que o autor deixou de trabalhar em novembro de 2011 em decorrência das fortes dores em sua coluna e dificuldade respiratória, voltando a laborar por curtos intervalos de tempo em 2015 e 2016, quando, segundo o médico perito, vinha trabalhando com dificuldade.
Entende-se, portanto, que, com a negativa do benefício, é pouco provável que o autor deixará de exercer seu ofício de costume, afinal, é sua ocupação profissional desde a maioridade. Da mesma maneira, pondera-se que, mesmo em atos da vida comum, é evidente a imprescindibilidade de esforços físicos, ainda que de maneira mínima. Por conseguinte, torna-se inevitável a intensificação das patologias apresentadas, com o aumento de dores e dispnéia, podendo, até mesmo, majorar a incapacidade funcional de sua coluna vertebral, apenas postergando a concessão do benefício ao qual faz jus desde já. Tais fatos, aliados à qualificação escolar e profissional e às condições sociais e pessoais do autor, revelam o seu enquadramento no conceito de pessoa com deficiência exigido para a concessão de benefício assistencial.
(...)
Outrossim, em que pese às conclusões do expert, há que se ponderar que a incapacidade para vida independente, referida na Lei nº 8.742/93, não deve ser interpretada de forma restritiva, inflexível. Ora, não obstante tratar-se de pessoa jovem, constata-se que tem pouca instrução, sempre exerceu atividades como trabalhador rural e tratorista de safra, profissões que demandam esforço físico, e que diante das moléstias que o acometem, as possibilidades de inserção no mercado de trabalho são limitadas, sobretudo pelo fato de viver em região predominantemente agrícola.
Assim, forçoso concluir que a incapacidade da parte autora à vida independente e para o trabalho restou evidenciada.
No tocante ao requisito econômico, importa referir que a situação de vulnerabilidade social é aferida não apenas com base na renda familiar, que não deve ser considerada a única forma de se comprovar que a pessoa não possui outros meios para prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família. Deverá ser analisado o contexto socioeconômico em que o(a) autor(a) se encontra inserido(a).
Nessa esteira, foi elaborado parecer social realizado em 13/04/2011 (evento 4, LAUDPERI15, p.1) e complementar em 10/10/2016 (evento 4, LAUDPERI39, p.1), dos quais se destaca que o autor reside com os pais, em moradia própria de sete cômodos bem conservados, possuindo instalações elétricas, hidráulicas e sanitárias; que a renda mensal do grupo familiar, era composta do trabalho do genitor como diarista, que oscilou entre R$ 100,00 em 2006, R$800,00 em 2011 e R$ 30,00 a diária em 2016, complementada pelo benefício do Bolsa Família, na quantia de R$ 257,00.
Ora, há que se ter em conta o entendimento desta Corte quanto a valores recebidos em razão de programas oficiais de transferência de renda, devendo ser excluídos do calculo da renda familiar. Oportuno transcrever recente precedente do TRF4:
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. INCAPACIDADE. CRITÉRIO ECONÔMICO. CUSTAS. BOLSA FAMÍLIA. EXCLUSÃO. CORREÇÃO MONETÁRIA E JUROS DE MORA. O benefício assistencial é devido à pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família. Em relação ao pressuposto econômico, o art. 20, § 3º, da Lei nº 8.742/1993 - LOAS estabelecia que seria considerada hipossuficiente a pessoa com deficiência ou idoso cuja família possuísse renda per capita inferior a ¼ do salário mínimo. Entretanto, o Supremo Tribunal Federal, ao analisar os recursos extraordinários 567.985 e 580.963, ambos submetidos à repercussão geral, reconheceu a inconstitucionalidade do § 3º do art. 20 da Lei nº 8.742/1993, assim como do art. 34 da Lei 10.741/2003 - Estatuto do Idoso, permitindo que o requisito econômico, para fins de concessão do benefício assistencial, seja aferido caso a caso. Comprovado o preenchimento dos requisitos legais, é devida a concessão do benefício assistencial, desde a DER. O TJRS, nos autos do incidente de inconstitucionalidade 7004334053, concluiu pela inconstitucionalidade da Lei Estadual 13.471/2010, a qual dispensava as pessoas jurídicas de direito público do pagamento de custas e despesas processuais. Na ADIN estadual 70038755864, entretanto, a inconstitucionalidade reconhecida restringiu-se à dispensa, pela mesma lei, do pagamento de despesas processuais, não alcançando as custas. Em tais condições, e não havendo vinculação da Corte ao entendimento adotado pelo TJRS em incidente de inconstitucionalidade, de ser mantido o entendimento anteriormente já consagrado pelas Turmas de Direito Previdenciário, para reconhecer o direito da autarquia à isenção das custas, nos termos da Lei 13.471/2010. Os rendimentos concedidos por programas oficiais de transferência de renda devem ser excluídos do cálculo da renda mensal familiar. O Supremo Tribunal Federal reconheceu no RE 870947, com repercussão geral, a inconstitucionalidade do uso da TR, determinando a adoção do IPCA-E para o cálculo da correção monetária nas dívidas não-tributárias da Fazenda Pública. Os juros de mora, a contar da citação, devem incidir à taxa de 1% ao mês, até 29-06-2009. A partir de então, incidem uma única vez, até o efetivo pagamento do débito, segundo o índice oficial de remuneração básica aplicado à caderneta de poupança. (TRF4, APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 5024739-80.2017.404.9999, 6ª Turma, Juíza Federal MARINA VASQUES DUARTE DE BARROS FALCÃO, POR UNANIMIDADE, JUNTADO AOS AUTOS EM 06/02/2018) grifo meu
Destarte, restam apenas os ganhos aproximados de R$ 700,00 do genitor do requerente, abaixo do limite mínimo previsto no artigo 20, § 3º, da Lei 8.742/93, configurada a vulnerabilidade do grupo familiar.
Dessa forma, comprovados ambos os requisitos, a decisão recorrida merece ser reformada para conceder à autora o benefício requerido.
Termo inicial
Tem direito a parte autora à concessão do benefício assistencial de prestação continuada desde a data do requerimento administrativo em 08/12/2006 (evento 4, ANEXOS PET4, p.7). Não há parcelas atingidas pela prescrição, pois que a ação foi distribuída em 01/10/2009 (evento 4, CAPA1).
Correção monetária
A correção monetária, segundo o entendimento consolidado da 3ª Seção deste Tribunal,incidirá a contar do vencimento de cada prestação e será calculada pelos seguintes índices oficiais:
- IGP-DI de 05/96 a 03/2006, de acordo com o art. 10 da Lei n. 9.711/98, combinado com o art. 20, §§5º e 6º, da Lei n. 8.880/94;
- INPC a partir de 04/2006, de acordo com a Lei n. 11.430/06, precedida da MP nº316, de 11/08/2006, que acrescentou o art. 41-A à Lei n. 8.213/91, sendo que o art. 31 da Lei nº 10.741/03, determina a aplicabilidade do índice de reajustamento dos benefícios do RGPS às parcelas pagas em atraso.
A incidência da TR como índice de correção monetária dos débitos judiciais da Fazenda Pública foi afastada pelo Supremo Tribunal Federal, no julgamento do RE 870947, com repercussão geral, tendo-se determinado, no recurso paradigma a utilização do IPCA-E, como já havia sido determinado para o período subsequente à inscrição em precatório, por meio das ADIs 4.357 e 4.425.
Interpretando a decisão do STF, e tendo presente que o recurso paradigma que originou o precedente tratava de condenação da Fazenda Pública ao pagamento de débito de natureza não previdenciária (benefício assistencial), o Superior Tribunal de Justiça, em precedente também vinculante (REsp 149146), distinguiu, para fins de determinação do índice de atualização aplicável, os créditos de natureza previdenciária, para estabelecer que, tendo sido reconhecida a inconstitucionalidade da TR como fator de atualização, deveria voltar a incidir, em relação a tal natureza de obrigação, o índice que reajustava os créditos previdenciários anteriormente à Lei 11.960/09, ou seja, o INPC.
Importante ter presente, para a adequada compreensão do eventual impacto sobre os créditos dos segurados, que os índices em referência - INPC e IPCA-E tiveram variação praticamente idêntica no período transcorrido desde julho de 2009 até setembro de 2017, quando julgado o RE 870947, pelo STF (IPCA-E: 64,23%; INPC 63,63%), deforma que a adoção de um ou outro índice nas decisões judiciais já proferidas não produzirá diferenças significativas sobre o valor da condenação.
A conjugação dos precedentes acima resulta na aplicação do INPC aos benefícios previdenciários,a partir de abril de 2006, reservando-se a aplicação do IPCA-E aos benefícios de natureza assistencial.
Juros de mora
Os juros de mora devem incidir a partir da citação.
Até 29-06-2009, os juros de mora devem incidir à taxa de 1% ao mês, com base no art. 3º do Decreto-Lei n. 2.322/87, aplicável analogicamente aos benefícios pagos com atraso, tendo em vista o seu caráter eminentemente alimentar, consoante firme entendimento consagrado na jurisprudência do STJ e na Súmula 75 desta Corte.
A partir de então, deve haver incidência dos juros, uma única vez, até o efetivo pagamento do débito, segundo o índice oficial de remuneração básica aplicado à caderneta de poupança, nos termos estabelecidos no art. 1º-F, da Lei 9.494/97, na redação da Lei 11.960/2009, considerado hígido pelo STF no RE 870947, com repercussão geral reconhecida. Os juros devem ser calculados sem capitalização, tendo em vista que o dispositivo determina que os índices devem ser aplicados "uma única vez" e porque a capitalização, no direito brasileiro, pressupõe expressa autorização legal (STJ, 5ª Turma, AgRgnoAgRg no Ag 1211604/SP, Rel. Min. Laurita Vaz).
Honorários advocatícios
Incide, no caso, a sistemática de fixação de honorários advocatícios prevista no art. 85 do NCPC, porquanto a sentença foi proferida após 18/03/2016 (data da vigência do NCPC definida pelo Pleno do STJ em 02/04/2016).
Invertidos os ônus sucumbenciais, estabeleço a verba honorária em 10% (dez por cento) sobre as parcelas vencidas até a data do presente julgado, considerando as variáveis dos incisos I a IV do § 2º do artigo 85 do NCPC.
Custas e despesas processuais e honorários periciais
O INSS é isento do pagamento das custas processuais quando demandado na Justiça Estadual do Rio Grande do Sul, devendo, contudo, pagar eventuais despesas processuais, como as relacionadas a correio, publicação de editais e condução de oficiais de justiça (artigo 11 da Lei Estadual nº 8.121/85, com a redação da Lei Estadual nº 13.471/2010, já considerada a inconstitucionalidade formal reconhecida na ADI nº 70038755864 julgada pelo Órgão Especial do TJ/RS).
Resta o INSS condenado a reembolsar à Justiça Federal o valor adiantado a título de honorários periciais. Na hipótese de não ter havido, por qualquer motivo, a antecipação dos honorários periciais pela Justiça Federal, o INSS deverá arcar com o pagamento dos referidos honorários diretamente quando da execução do julgado.
Cumprimento imediato do julgado (tutela específica)
Considerando a eficácia mandamental dos provimentos fundados no art. 497 do novo CPC, que repete dispositivo constante do art. 461 do antigo CPC, e tendo em vista que a presente decisão não está sujeita, em princípio, a recurso com efeito suspensivo (TRF4, 3ª Seção, Questão de Ordem na AC n. 2002.71.00.050349-7/RS,Rel. para o acórdão Des. Federal Celso Kipper, julgado em 09/08/2007),determino o cumprimento imediato do acórdão, a ser efetivado em 45 dias,mormente pelo seu caráter alimentar e necessidade de efetivação imediata dos direitos sociais fundamentais.
Prequestionamento
O prequestionamento da matéria segue a sistemática prevista no art. 1.025 do CPC/2015.
Conclusão
Dado provimento à apelação da autora. Invertidos os ônus sucumbenciais, estabeleço a verba honorária em 10% (dez por cento) sobre as parcelas vencidas até a data do presente julgado, considerando as variáveis dos incisos I a IV do § 2º do artigo 85 do NCPC, adequando consectários à orientação do STF no RE 870947, determinando o cumprimento imediato do acórdão.
Dispositivo
Ante o exposto, voto por dar provimento à apelação, determinando o cumprimento imediato do acórdão.
Juiz Federal Artur César de Souza
Relator
| Documento eletrônico assinado por Juiz Federal Artur César de Souza, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 9402251v31 e, se solicitado, do código CRC 4384A481. | |
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 13/06/2018
APELAÇÃO CÍVEL Nº 5006606-53.2018.4.04.9999/RS
ORIGEM: RS 00181013620098210123
RELATOR | : | Juiz Federal ARTUR CÉSAR DE SOUZA |
PRESIDENTE | : | Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA |
PROCURADOR | : | Dr. Flavio Augusto de Andrade Strapason |
APELANTE | : | JEDIELSON SANTOS DE QUADROS |
ADVOGADO | : | ELESIO ROBERTO DA SILVA |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
MPF | : | MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 13/06/2018, na seqüência 338, disponibilizada no DE de 24/05/2018, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, a DEFENSORIA PÚBLICA e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 6ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU DAR PROVIMENTO À APELAÇÃO, DETERMINANDO O CUMPRIMENTO IMEDIATO DO ACÓRDÃO.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Juiz Federal ARTUR CÉSAR DE SOUZA |
VOTANTE(S) | : | Juiz Federal ARTUR CÉSAR DE SOUZA |
: | Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA | |
: | Juíza Federal TAÍS SCHILLING FERRAZ |
Lídice Peña Thomaz
Secretária de Turma
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