APELAÇÃO CÍVEL Nº 5006631-68.2016.4.04.7111/RS
RELATOR | : | ARTUR CÉSAR DE SOUZA |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELADO | : | ELITON VIEIRA DE LIMA (Relativamente Incapaz (Art. 4º CC)) |
: | ROSANE DE SOUZA VIEIRA (Pais) | |
ADVOGADO | : | GERALDO ALVES RIBEIRO |
MPF | : | MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL |
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. VIABILIDADE. TERMO INCIAL. CONSECTÁRIOS.
1. Comprovados os requisitos da deficiência para o labor e hipossuficiência econômica do grupo familiar, cabível a concessão do benefício assistencial.
2. Comprovado o preenchimento dos requisitos legais, é devida a concessão do benefício assistencial, desde a DER.
3. O Supremo Tribunal Federal reconheceu no RE 870947, com repercussão geral, a inconstitucionalidade do uso da TR, determinando, no recurso paradigma, a adoção do IPCA-E para o cálculo da correção monetária.
4. Considerando que o recurso que originou o precedente do STF tratava de condenação da Fazenda Pública ao pagamento de débito de natureza administrativa, o Superior Tribunal de Justiça, no REsp 1495146, em precedente também vinculante, e tendo presente a inconstitucionalidade da TR como fator de atualização monetária, distinguiu os créditos de natureza previdenciária, em relação aos quais, com base na legislação anterior, determinou a aplicação do INPC.
5. Os juros de mora, a contar da citação, devem incidir à taxa de 1% ao mês, até 29-06-2009. A partir de então, incidem uma única vez, até o efetivo pagamento do débito, segundo o índice oficial de remuneração básica aplicado à caderneta de poupança.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 6ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação da ré, mantida a antecipação de tutela, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 18 de julho de 2018.
Juiz Federal Artur César de Souza
Relator
| Documento eletrônico assinado por Juiz Federal Artur César de Souza, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 9414255v33 e, se solicitado, do código CRC C9DFB335. | |
| Informações adicionais da assinatura: | |
| Signatário (a): | Artur César de Souza |
| Data e Hora: | 19/07/2018 16:37 |
APELAÇÃO CÍVEL Nº 5006631-68.2016.4.04.7111/RS
RELATOR | : | ARTUR CÉSAR DE SOUZA |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELADO | : | ELITON VIEIRA DE LIMA (Relativamente Incapaz (Art. 4º CC)) |
: | ROSANE DE SOUZA VIEIRA (Pais) | |
ADVOGADO | : | GERALDO ALVES RIBEIRO |
MPF | : | MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL |
RELATÓRIO
Trata-se de apelação do INSS contra sentença (prolatada em 06/02/2018 na vigência do NCPC) que julgou parcialmente procedente o pedido de benefício assistencial, cujo dispositivo reproduzo a seguir:
Ante o exposto, julgo PARCIALMENTE PROCEDENTE o pedido formulado na ação proposta pela parte autora em face do INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL extinguindo o feito com resolução de mérito, com fulcro no art. 487, inciso I, do Código de Processo Civil para o fim de:
[a] reconhecer o direito da parte autora ao recebimento do benefício assistencial à pessoa com deficiência, determinando ao INSS que conceda o benefício desde a DER (23/12/2012);
[b] condenar o INSS ao pagamento das parcelas vencidas, desde a DER (23/12/2012), com acréscimo de correção monetária e juros, nos termos da fundamentação.
Em razão da decisão antecipatória, deverá o INSS comprovar nos autos a concessão do benefício assistencial no prazo improrrogável de 15 (quinze) dias. No entanto, o pagamento das parcelas e diferenças vencidas deverá ser realizado somente após o trânsito em julgado.
Condeno o INSS ao pagamento de honorários advocatícios, fixados em 10% sobre o valor das parcelas vencidas até a data da sentença, nos termos da Súmula nº 111 do STJ, considerando os critérios elencados no art. 85, §§ 2° e 3°, do CPC.
Sem condenação em custas, em razão da isenção prevista no art. 4°, I, da Lei n° 9.289/1996.
Incabível a remessa necessária, nos termos da Súmula 490 do STJ, pois ainda que ilíquida a sentença o valor da condenação jamais ultrapassará mil salários mínimos, conforme Art. 496, §3º, I, do NCPC (TRF4 5023876-53.2015.404.7200, QUINTA TURMA, Relator ROGER RAUPP RIOS, juntado aos autos em 08/09/2016 e TRF4 5074445-13.2014.404.7000, QUINTA TURMA, Relator TAÍS SCHILLING FERRAZ, juntado aos autos em 06/09/2016).
Em suas razões recursais requereu, a autarquia previdenciária, a reforma da sentença, porquanto a limitação física que acomete o autor não restringe sua capacidade intelectual ou mental, sendo possível o exercício de atividade remunerada apta a assegurar a sua subsistência.
Subsidiariamente, caso não reformada a sentença, requer seja estabelecido o prazo máximo de 06 (seis) meses para que o autor busque a sua inserção no mercado de trabalho, com a consequente cassação da prestação assistencial.
Apresentada as contrarrazões, vieram os autos para esta Corte para julgamento.
O Ministério Público Federal opinou pelo desprovimento do recurso de apelação.
É o relatório.
VOTO
Juízo de admissibilidade
O apelo preenche os requisitos legais de admissibilidade.
Benefício de prestação continuada ao idoso e ao deficiente (LOAS)
A Constituição Federal de 1988 dispôs em seu artigo 203:
Art. 203. A assistência social será prestada a quem dela necessitar, independentemente da contribuição à seguridade social, e tem por objetivos:
(...)
V - a garantia de um salário mínimo de benefício mensal à pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, conforme dispuser a lei.
A regulamentação desse dispositivo constitucional veio com a Lei nº 8.742, de 7 de dezembro de 1993, denominada Lei Orgânica da Assistência Social (LOAS), que, em seu artigo 20, passou a especificar as condições para a concessão do benefício, no valor de um salário mínimo mensal, à pessoa com deficiência e ao idoso com 70 anos ou mais comprovadamente carentes.
Após as alterações promovidas pelas Leis nº 9.720, de 30 de novembro de 1998, e nº 10.741, de 1º de outubro de 2003 (Estatuto do Idoso), relativas à redução do critério etário para 67 e 65 anos, respectivamente, sobrevieram as Leis nº 12.435, de 06 de julho de 2011, e nº 12.470, de 31 de agosto de 2011, as quais conferiram ao aludido artigo 20, da LOAS, a seguinte redação, ora em vigor:
Art. 20. O benefício de prestação continuada é a garantia de um salário-mínimo mensal à pessoa com deficiência e ao idoso com 65 (sessenta e cinco) anos ou mais que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção nem de tê-la provida por sua família. (Redação dada pela Lei nº 12.435, de 2011)
(...)
Portanto, o direito ao benefício assistencial pressupõe o preenchimento dos seguintes requisitos:
1.a) idoso (assim considerado aquele com 65 anos ou mais, a partir de 1º de janeiro de 2004, data da entrada em vigor do Estatuto do Idoso) ou
1.b) condição de deficiente (incapacidade para o trabalho e para a vida independente, conforme redação original do artigo 20, da LOAS, e, após as alterações da Lei nº 12.470, de 31-10-2011, tratar-se de pessoa com impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas) ;
2) Situação de risco social (ausência de meios para, dignamente, prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família).
Requisito etário
Tratando-se de benefício requerido na vigência do Estatuto do Idoso, é considerada idosa a pessoa com 65 (sessenta e cinco) anos ou mais que comprove não possuir meios de prover a própria manutenção nem de tê-la provida por sua família. O requisito é objetivo, ou seja, comprovado o atributo etário, a análise do requisito incapacitante é desnecessária, bastando apenas verificar a situação de vulnerabilidade socioeconômica a que submetido o idoso.
Condição de deficiente
Mister salientar, por oportuno, que a incapacidade para a vida independente a que se refere a Lei 8.742/93, na redação original, deve ser interpretada de forma a garantir o benefício assistencial a uma maior gama possível de pessoas com deficiência, consoante pacífica jurisprudência do STJ (v.g. STJ, 5ª Turma, RESP 360.202/AL, Rel. Min. Gilson Dipp, DJU de 01-07-2002) e desta Corte (v.g. AC n. 2002.71.04.000395-5/RS, 6ª Turma, Rel. Des. Federal João Batista Pinto Silveira, DJU de 19-04-2006).
Desse modo, a incapacidade para a vida independente:
a) não exige que a pessoa possua uma vida vegetativa ou seja incapaz de se locomover;
b) não significa incapacidade para as atividades básicas do ser humano, tais como alimentar-se, fazer a higiene pessoal e vestir-se sozinho;
c) não impõe a incapacidade de se expressar ou se comunicar; e
d) não pressupõe dependência total de terceiros.
Situação de risco social
Tendo em vista a inconstitucionalidade dos artigos 20, § 3º, da Lei 8.742/1993 e do artigo 34, § único, da Lei 10.741/2003, reconhecida no julgamento dos REs 567985 e 580963 em 18.04.2013, a miserabilidade para fins de benefício assistencial deve ser verificada em cada caso concreto.
Nesse sentido, os cuidados necessários com a parte autora, em decorrência de sua deficiência, incapacidade ou avançada idade, que acarretarem gastos - notadamente com medicamentos, alimentação especial, fraldas descartáveis, tratamento médico, psicológico e fisioterápico, entre outros -, configuram despesas a ser consideradas na análise da condição de risco social da família do demandante (TRF4, APELREEX 5002022-24.2011.404.7012, Sexta Turma, Relator p/ Acórdão Celso Kipper, juntado aos autos em 27/06/2013).
A jurisprudência desta Corte Regional, bem como do Superior Tribunal de Justiça, é pacífica no sentido de que qualquer benefício de valor mínimo recebido por idoso de 65 anos ou mais (salvo quando recebido por força de deficiência, quando então o requisito etário é afastado) deve ser excluído da apuração da renda familiar, bem como essa renda mínima não é o único critério a balizar a concessão do benefício, devendo ser examinado juntamente com outros meios de aferição do estado de miserabilidade, hipossuficiência econômica ou situação de desamparo do autor e de sua família (Pet n.º 7203/PE - 3ª Seção - Unânime - Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura - DJe 11-10-2011; TRF4 - AC n.º 0019220-88.2012.404.9999 - 6ª T. - unânime - Rel. Des. Celso Kipper - D.E. 22-03-2013; REsp n.º 1112557/MG - 3ª Seção - unânime - Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho - DJe 20-11-2009).
Também, o fato de a parte autora ser beneficiária e perceber renda proveniente do Programa Bolsa Família, não só não impede a percepção do benefício assistencial do art. 203, V, da Constituição Federal, como constitui forte indicativo de que a unidade familiar encontra-se em situação de risco social (TRF4, APELREEX 2009.71.99.006237-1, Sexta Turma, Relator p/ Acórdão Celso Kipper, D.E. 07/10/2014).
Logo, em linhas gerais, para efeito de concessão do benefício de prestação continuada, a situação de risco social a que se encontra exposta a pessoa idosa ou portadora de deficiência e sua família deve ser analisada em cada caso concreto (TRF4, EINF 0016689-58.2014.404.9999, Terceira Seção, Relator Ricardo Teixeira do Valle Pereira, D.E. 29/05/2015).
Fixados os parâmetros de valoração da prova, passo ao exame da situação específica dos autos.
No caso em tela, decidiu o julgador a quo pela procedência em parte do pedido inicial. Nesse diapasão, nenhum reparo há a considerar na sentença recorrida. Para evitar tautologia, transcrevo excerto dos fundamentos, fazendo-os parte integrante de minhas razões de decidir, in verbis (evento 108, SENT1):
(...)
Uma vez estabelecidos os critérios gerais de concessão do benefício assistencial de prestação continuada, passo ao exame do caso concreto.
O requisito da incapacidade laborativa restou satisfeito, porquanto o perito médico concluiu pela incapacidade total e permanente para o trabalho, referindo o caráter congênito da doença.
A propósito confira-se trecho do laudo (grifos meus):
"[...]
2) A parte autora se encontra acometida por alguma doença? Em caso afirmativo, qual a moléstia e a CID correspondente?
Sim. Ausência congênita do membro superior esquerdo, CID Q71.2.
3) A que data remonta a doença? Congênita.
4) A doença que acomete a parte autora é a mesma ou se vincula àquela que levou ao requerimento do benefício na esfera administrativa? Sim.
5) Considerando a evolução da doença, o quadro clínico do (a) examinado(a) melhorou, piorou ou permanece inalterado, desde a data do requerimento administrativo perante o INSS? Inalterado.
6) Esta doença implica impedimentos (por exemplo, de natureza física, mental, intelectual ou sensorial) que geram limitação para o desempenho de atividade laborativa e restringem a participação social em igualdade de condições com as demais pessoas? Sim
7) Tratando-se de criança/adolescente, há limitação para o desempenho de atividades próprias à faixa etária e à etapa de desenvolvimento e restrição da participação social em igualdade de condições com as demais pessoas? Sim.
8) O(s) impedimento(s) observado(s) ocasiona(m) a incapacidade para as atividades (laborativas ou próprias da faixa etária) pelo prazo mínimo de dois anos? Há limitação para as atividades próprias da idade.
9) A que data remonta a limitação (incapacidade) observada? Em não havendo possibilidade de fixar a data exata, o perito deverá, à vista dos exames e documentos juntados, da literatura médica, do relato da parte autora e da sua experiência profissional, estimar o momento mais aproximado. Desde o nascimento.
10) A moléstia demanda a utilização de produtos/equipamentos especiais? Quais? Não.
11) A doença diagnosticada implica deficiência nas funções e estruturas do corpo que enquadram a parte autora no conceito de pessoa portadora de deficiência, nos termos do art. 4º do Decreto nº 3.298/99? Sim.
[...]
Ante a conclusão do médico perito designado, no sentido da existência de deficiência física congênita que impeça a adequada inserção do autor no mercado de trabalho, entendo que esteja caracterizada a incapacidade para a concessão do benefício. Nesta senda, a atividade laborativa que exija trabalhos físicos, especialmente manuais, está comprometida pela ausência de parte de um braço.
Ademais, o próprio TRF4 já decidiu pela possibilidade de ampliação da interpretação do conceito de deficiente, não se limitando apenas à desordens que consubstanciem incapacidade de locomoção, de comunicação ou dependência absoluta de terceiro, mas sim levando em conta a proteção à dignidade da pessoa humana no sentido do resguardo do deficiente sob o viés social, removendo as barreiras que dificultam sua inserção na sociedade (TRF4, AC 0001478-74.2017.4.04.9999, Sexta Turma, Desembargador João Batista Pinto Silveira, D.E 08/08/2017).
Quanto ao requisito socioeconômico, também restou satisfeito, porquanto o autor não aufere nenhuma renda atualmente.
Sua genitora está desempregada e o único membro da família que desenvolve atividade remunerada é o pai do autor, que vive de "biscates" e percebe, aproximadamente, R$650,00 por mês, consoante informações do laudo pericial (evento 40).
Ainda que a assistente social tenha sinalizado pela prescindibilidade do benefício ao grupo familiar, aduzindo que "o jovem está com 17 anos e não possui impedimentos em procurar pelo primeiro emprego (mesmo como PcD - Pessoa com Deficiência). O rapaz está recebendo gratuitamente atendimento médico psiquiátrico, transporte para as consultas e medicamento. A família não possui gasto extra com Eliton referente à sua saúde", há que se analisar a realidade fática do autor, que conta com 17 anos e cursa a 6ª série junto ao sistema de Educação de Jovens e Adultos (EJA). Desta forma, dada a baixa escolaridade da parte, presume-se que eventual atividade laborativa que viesse a desenvolver dificilmente fosse de caráter intelectual, restando como alternativa o labor que exija esforço físico - o que, justamente, sua deficiência lhe impede de fazer. Grifo meu.
Outrossim, dado o contexto do grupo familiar externado nas fotografias anexadas ao laudo socioeconômico, percebe-se a situação de miserabilidade na qual a família vive, sendo a casa de aparência simples e os móveis de situação precária, tendo apenas o essencial para a sobrevivência.
Nesse sentido, ressalte-se que a própria assistente social referiu que raramente compram peças de vestuário, corroborando que o benefício é, sim, indispensável ao adequado desenvolvimento do portador de deficiência.
Nesse sentido, consta informação no laudo de que Eliton faz uso de medicamentos antidepressivos, assim como sua mãe, que aduziu não trabalhar em função de ter de cuidar de sua genitora, atualmente acometida por doença. Ainda que os medicamentos sejam concedidos gratuitamente, é imperioso que a família tenha um respaldo financeiro mínimo para garantir as necessidades mais básicas, tais quais eventuais consultas médicas, produtos de higiene e afins.
Portanto, entendo preenchidos os requisitos para a concessão do benefício assistencial.
(...)
Destarte, no que se refere à incapacidade restou comprovada através da perícia realizada nos autos, que o autor possui quadro de ausência congênita de membro superior esquerdo, nos seguintes termos: Membro superior esquerdo com ausência congênita de cotovelo, antebraço, punho e mão. Mobilidade de coto umeral com boa amplitude.
Sem embargo, acertada a posição do Juízo de origem que mesmo diante de um laudo que não atesta a incapacidade definitiva do requerente, ponderou que a incapacidade para a vida independente, referida pela Lei n° 8.742/93, não deve ser interpretada de forma restritiva, inflexível.
No tocante ao requisito econômico, importa referir que a situação de vulnerabilidade social é aferida não apenas com base na renda familiar, que não deve ser considerada a única forma de se comprovar que a pessoa não possui outros meios para prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família. Deverá ser analisado o contexto socioeconômico em que o autor se encontra inserido.
Nessa esteira, foi elaborado, em 05/05/2017, estudo socioeconômico, do qual se destaca que o grupo familiar é composto pelo autor e seus pais, sendo que a única renda é proveniente de "biscates" realizados pelo genitor, com valor mensal aproximado de R$ 650,00 (seiscentos e cinquenta reais) para fazer frente aos gastos mensais básicos com luz R$ 131,17, água R$ 231,44 (para a casa do autor e do irmão que mora nos fundos), gás R$ 70,00, alimentação R$ 400,00, transporte R$ 50,00. Deflui do laudo, o estado de miserabilidade em que se encontra o grupo social que está inserido o autor.
Assim, observada a razoabilidade ao considerar o valor numérico conjugado com outros fatores indicativos da situação de risco social, e considerando que o direito ao benefício de prestação continuada não pressupõe a verificação de um estado de miserabilidade extremo - bastando estar demonstrada a insuficiência de meios para o beneficiário, dignamente, prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família -, tenho por configurada a situação de risco social necessária à concessão do benefício.
Por tudo exposto, preenchidos os requisitos imprescindíveis à concessão do benefício, deve ser mantida hígida a sentença que concedeu o benefício de prestação continuada à pessoa portadora de deficiência (LOAS) a Eliton Vieira de Lima.
Termo inicial
Presentes os requisitos à concessão do benefício assistencial de prestação continuada desde a data da DER, em 23/12/2012. Como a ação foi distribuída em 01/12/2016, não há parcelas atingidas pela prescrição.
Não procede o requerimento do INSS, formulado em apelação, para que fosse estabelecido o prazo máximo de 06 (seis) meses para que o autor busque a sua inserção no mercado de trabalho, com a consequente cassação da prestação assistencial.
Sobretudo porque cabe à autarquia previdenciária a função de realizar a revisão do benefício assistencial, visando à verificação das condições que justificam a sua concessão, conforme se depreende dos arts. 21 e 21-A da Lei nº 8.742/93, cujos termos regem a relação jurídico assistencial, verbis:
Art. 21. O benefício de prestação continuada deve ser revisto a cada 2 (dois) anos para avaliação da continuidade das condições que lhe deram origem. (Vide Lei nº 9.720, de 30.11.1998) § 1º O pagamento do benefício cessa no momento em que forem superadas as condições referidas no caput, ou em caso de morte do beneficiário. § 2º O benefício será cancelado quando se constatar irregularidade na sua concessão ou utilização. § 3º O desenvolvimento das capacidades cognitivas, motoras ou educacionais e a realização de atividades não remuneradas de habilitação e reabilitação, entre outras, não constituem motivo de suspensão ou cessação do benefício da pessoa com deficiência. (Incluído pela Lei nº 12.435, de 2011) § 4º A cessação do benefício de prestação continuada concedido à pessoa com deficiência não impede nova concessão do benefício, desde que atendidos os requisitos definidos em regulamento. (Redação dada pela Lei nº 12.470, de 2011) Art. 21-A. O benefício de prestação continuada será suspenso pelo órgão concedente quando a pessoa com deficiência exercer atividade remunerada, inclusive na condição de micro empreendedor individual § 1º Extinta a relação trabalhista ou a atividade empreendedora de que trata o caput deste artigo e, quando for o caso, encerrado o prazo de pagamento do seguro desemprego e não tendo o beneficiário adquirido direito a qualquer benefício previdenciário, poderá ser requerida a continuidade do pagamento do benefício suspenso, sem necessidade de realização de perícia médica ou reavaliação da deficiência e do grau de incapacidade para esse fim, respeitado o período de revisão previsto no caput do art. 21. (Incluído pela Lei nº 12.470, de 2011) § 2º A contratação de pessoa com deficiência como aprendiz não acarreta a suspensão do benefício de prestação continuada, limitado a 2 (dois) anos o recebimento concomitante da remuneração e do benefício. (Sem grifos no original).
Nego provimento à apelação no ponto.
Correção monetária
A correção monetária, segundo o entendimento consolidado da 3ª Seção deste Tribunal, incidirá a contar do vencimento de cada prestação e será calculada pelos seguintes índices oficiais:
- IGP-DI de 05/96 a 03/2006, de acordo com o art. 10 da Lei n. 9.711/98, combinado com o art. 20, §§5º e 6º, da Lei n. 8.880/94;
- INPC a partir de 04/2006, de acordo com a Lei n. 11.430/06, precedida da MP nº316, de 11/08/2006, que acrescentou o art. 41-A à Lei n. 8.213/91, sendo que o art. 31 da Lei nº 10.741/03, determina a aplicabilidade do índice de reajustamento dos benefícios do RGPS às parcelas pagas em atraso.
A incidência da TR como índice de correção monetária dos débitos judiciais da Fazenda Pública foi afastada pelo Supremo Tribunal Federal, no julgamento do RE 870947, com repercussão geral, tendo-se determinado, no recurso paradigma a utilização do IPCA-E, como já havia sido determinado para o período subsequente à inscrição em precatório, por meio das ADIs 4.357 e 4.425.
Interpretando a decisão do STF, e tendo presente que o recurso paradigma que originou o precedente tratava de condenação da Fazenda Pública ao pagamento de débito de natureza não previdenciária (benefício assistencial), o Superior Tribunal de Justiça, em precedente também vinculante (REsp 149146), distinguiu, para fins de determinação do índice de atualização aplicável, os créditos de natureza previdenciária, para estabelecer que, tendo sido reconhecida a inconstitucionalidade da TR como fator de atualização, deveria voltar a incidir, em relação a tal natureza de obrigação, o índice que reajustava os créditos previdenciários anteriormente à Lei 11.960/09, ou seja, o INPC.
Importante ter presente, para a adequada compreensão do eventual impacto sobre os créditos dos segurados, que os índices em referência - INPC e IPCA-E tiveram variação praticamente idêntica no período transcorrido desde julho de 2009 até setembro de 2017, quando julgado o RE 870947, pelo STF (IPCA-E: 64,23%; INPC 63,63%), deforma que a adoção de um ou outro índice nas decisões judiciais já proferidas não produzirá diferenças significativas sobre o valor da condenação.
A conjugação dos precedentes acima resulta na aplicação do INPC aos benefícios previdenciários,a partir de abril de 2006, reservando-se a aplicação do IPCA-E aos benefícios de natureza assistencial.
Juros de mora
Os juros de mora devem incidir a partir da citação.
Até 29-06-2009, os juros de mora devem incidir à taxa de 1% ao mês, com base no art. 3º do Decreto-Lei n. 2.322/87, aplicável analogicamente aos benefícios pagos com atraso, tendo em vista o seu caráter eminentemente alimentar, consoante firme entendimento consagrado na jurisprudência do STJ e na Súmula 75 desta Corte.
A partir de então,deve haver incidência dos juros, uma única vez, até o efetivo pagamento do débito, segundo o índice oficial de remuneração básica aplicado à caderneta de poupança, nos termos estabelecidos no art. 1º-F, da Lei 9.494/97, na redação da Lei 11.960/2009, considerado hígido pelo STF no RE 870947, com repercussão geral reconhecida. Os juros devem ser calculados sem capitalização, tendo em vista que o dispositivo determina que os índices devem ser aplicados"uma única vez" e porque a capitalização, no direito brasileiro,pressupõe expressa autorização legal (STJ, 5ª Turma, AgRgnoAgRg no Ag1211604/SP, Rel. Min. Laurita Vaz).
Honorários advocatícios
Incide, no caso, a sistemática de fixação de honorários advocatícios prevista no art. 85 do NCPC, porquanto a sentença foi proferida após 18/03/2016 (data da vigência do NCPC definida pelo Pleno do STJ em 02/04/2016).
Confirmada a sentença no mérito, majoro a verba honorária para 15% (quinze por cento) sobre as parcelas vencidas até a data da sentença, considerando as variáveis dos incisos I a IV do § 2º do artigo 85 do NCPC.
Custas e despesas processuais
O INSS é isento do pagamento das custas processuais no Foro Federal (art. 4º, I, da Lei n.º 9.289/96.
Antecipação de tutela
Uma vez confirmado o direito ao benefício, resta mantida a antecipação dos efeitos da tutela, concedida no juízo de origem.
Prequestionamento
O prequestionamento da matéria segue a sistemática prevista no art. 1.025 do CPC/2015.
Conclusão
Negado provimento a apelação do INSS. Majorada verba honorária em 15% sobre o valor das parcelas vencidas, adequando consectários à orientação do STF no RE 870947, mantida a antecipação de tutela.
Dispositivo
Ante o exposto, voto por negar provimento à apelação da ré, mantida a antecipação de tutela.
Juiz Federal Artur César de Souza
Relator
| Documento eletrônico assinado por Juiz Federal Artur César de Souza, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 9414254v30 e, se solicitado, do código CRC DC9C9700. | |
| Informações adicionais da assinatura: | |
| Signatário (a): | Artur César de Souza |
| Data e Hora: | 19/07/2018 16:37 |
EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 18/07/2018
APELAÇÃO CÍVEL Nº 5006631-68.2016.4.04.7111/RS
ORIGEM: RS 50066316820164047111
RELATOR | : | Juiz Federal ARTUR CÉSAR DE SOUZA |
PRESIDENTE | : | Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA |
PROCURADOR | : | Dr. Cícero Augusto Pujol Corrêa |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELADO | : | ELITON VIEIRA DE LIMA (Relativamente Incapaz (Art. 4º CC)) |
: | ROSANE DE SOUZA VIEIRA (Pais) | |
ADVOGADO | : | GERALDO ALVES RIBEIRO |
MPF | : | MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 18/07/2018, na seqüência 118, disponibilizada no DE de 02/07/2018, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 6ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO DA RÉ, MANTIDA A ANTECIPAÇÃO DE TUTELA.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Juiz Federal ARTUR CÉSAR DE SOUZA |
VOTANTE(S) | : | Juiz Federal ARTUR CÉSAR DE SOUZA |
: | Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA | |
: | Juíza Federal TAÍS SCHILLING FERRAZ |
Lídice Peña Thomaz
Secretária de Turma
| Documento eletrônico assinado por Lídice Peña Thomaz, Secretária de Turma, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 9442910v1 e, se solicitado, do código CRC C5391ED. | |
| Informações adicionais da assinatura: | |
| Signatário (a): | Lídice Peña Thomaz |
| Data e Hora: | 18/07/2018 12:49 |
