Apelação Cível Nº 5014379-05.2012.4.04.7108/RS
RELATOR: Juiz Federal JULIO GUILHERME BEREZOSKI SCHATTSCHNEIDER
APELANTE: NOELI TEREZINHA FROHLICH FILLMANN
ADVOGADO: ARTUR FERNANDO WAGNER JUNIOR (OAB RS087887)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RELATÓRIO
A segurada ajuizou esta demanda com o intuito de declarar a nulidade de imputação de débito relativo a benefício cancelado por fraude. Os fatos que efetivamente importam para a compreensão da controvérsia foram descritos na sentença:
Alegou que o INSS, em razão de cancelamento do benefício de aposentadoria de que foi titular no período de 31-01-2005 a 30-04-2010 (NB 42/135.622.2193), apurou valores a pagar no montante de R$ 81.057,29. Referiu ter sido notificada para pagamento dos valores, inclusive sob ameaça de inscrição em dívida ativa e seqüestro de verbas alimentares e desconto no seu atual benefício (NB 41/157.818.999-0). Narrou que, em razão do indeferimento do NB 129.674.786-4 pela Autarquia Ré, buscou assessoria para obtenção do benefício. Referiu não ter ciência dos atos praticados pela quadrilha, destacando que somente teve conhecimento da inserção de dados inverídicos no sistema da Autarquia após o cancelamento do benefício 135.622.219-3. Alegou ter prestado depoimento na condição de testemunha perante o INSS e Polícia Federal, colaborando com as autoridades estatais, não havendo falar em má-fé na percepção indevida do benefício. Alegou a nulidade do procedimento administrativo, ressaltando que a responsabilidade pela fraude do benefício e o lançamento de débito administrativo devem ser apurados mediante processo judicial (imparcial), não podendo ser objeto de procedimento administrativo promovido pela própria Autarquia.
O INSS também apresentou reconvenção e, por fim, as demandas foram resolvidas conforme o seguinte dispositivo (apenas no que interessa à questão):
(a) julgo improcedentes os pedidos ventilados pela parte autora e;
(b) julgo parcialmente procedentes os pedidos deduzidos pela Autarquia Ré em sede de reconvenção, para o fim de condenar a autora reconvinda a devolver os valores recebidos indevidamente (NB 135.622.219-3) no período de 31/01/2005 a 30/4/2010, abatendo-se os valores já descontados do benefício previdenciário NB 157.818.999-0 e atualizados de acordo com os índices utilizados para os reajustamentos dos benefícios do RGPS (art. 175 do Dec. 3.048/99), assegurada a possibilidade de parcelamento do débito pela Parte Autora (arts. 154 e 244 do Decreto n.º 3.048), nos termos da fundamentação.
A apelação está fundamentada nas seguintes premissas: [a] há nulidade, pois as provas requeridas na resposta à reconvenção não foram produzidas; [b] os valores, em suma, foram recebidos de boa-fé; [c] ainda que não fosse o caso, a Autarquia teria que ter ajuizado ação própria, pois não incide o inciso II do artigo 115 da Lei n. 8.213/1991 ("Podem ser descontados dos benefícios pagamento de benefício além do devido") nos casos de benefício decorrente de fraude; [d] as parcelas anteriores a 7-2007 "decaíram para cobrança", pois o lançamento do débito é de 7-2012; e, de qualquer forma, [e] as parcelas relativas ao período de 13-9-2008 a 30-4-2010 estão prescritas.
É o relatório.
VOTO
De acordo com o artigo 130 do CPC revogado, "[caberá] ao juiz, de ofício ou a requerimento da parte, determinar as provas necessárias à instrução do processo, indeferindo as diligências inúteis ou meramente protelatórias". É bem evidente, de acordo com a sentença, que a segurada não agiu de boa-fé:
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Caso dos autos
Analisando detidamente estes autos, verifico que sobejam indícios de que a Parte Autora tinha conhecimento da inserção fraudulenta de tempo de serviço para concessão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição.
Saliento, inicialmente, que a Parte Autora encaminhou pedido de aposentadoria junto à APS de Campo Bom (NB 129.674.786-4), em 09/02/04, sendo o pleito indeferido em razão de não comprovação de tempo de serviço/contribuição suficiente para concessão do benefício. Comprovou tempo equivalente a 18a 02m 19d até a DER (PROCADM1-2 - E36);
Em 31/01/2005, houve registro de novo pedido de aposentadoria junto à APS de Novo Hamburgo (NB 135.622.219-3), sendo concedido o benefício de aposentadoria, em razão do cômputo de tempo de serviço equivalente a 31a 03m e 19d até a DER.
De acordo com o relatório produzido no âmbito da Autarquia (PROCADM4 - E36), o NB 135.622.219-3 foi concedido mediante inclusão dos seguintes períodos de contribuição:
- 01/03/80 a 30/06/90 Dreger Schul Cia Ltda - 10a 04m 00d;
- 01/01/94 a 31/03/96 Carnê n. 11385196259 - 02a 03m 00d,
totalizando, assim, inclusão indevida de tempo equivalente a 12 (doze) anos e 07 (sete) meses.
Trata-se de acréscimo substancial de tempo de serviço.
Por outro lado, analisando os depoimentos colhidos na via administrativa, verifico que a Requerente acreditava que o NB 135.622.219-3 tivesse sido deferido em razão do reconhecimento do tempo rural em regime de economia familiar, equivalente a 07 (sete) anos.
Contudo, o depoimento prestado indica que sequer houve requerimento formal pela Requerente junto à agência onde foi concedido o benefício (APS de Novo Hamburgo).
Alega a Autora, em apertada síntese, que teria entregue os documentos para um amigo conhecido, para submetê-lo à análise por um servidor do INSS, que apenas verificaria a plausibilidade de obtenção do benefício e indicaria os documentos que deveriam ser apresentados.
Embora alegue ter sido esse o seu objetivo, não se surpreendeu ao receber o comunicado de concessão de benefício de aposentadoria.
Destaco os seguintes excertos do depoimento (DEPOIM TESTEMUNHA7 - E01), que revelam as circunstâncias em que se deu o contato da Parte Autora com os demais envolvidos na fraude, verbis:
(...) Que foi umas 07 ou 08 vezes na APS de Campo Bom e não conseguiu obter todas as informações necessárias, e ao comentar esta situação na casa de seu compadre LEO, este falou para a DEPOENTE entrar em contato com VÉIO, que este conhecia o ALVARI RODRIGUES DO NASCIMENTO, que era chefe da APS de Novo Hamburgo e este faria a contagem do tempo de contribuição.
Que conhecia VÉIO de vista e que não sabia que ele trabalhava como intermediário.
Que procurou o VÉIO em sua casa e levou para este cópia do Processo de aposentadoria requerido e indeferido na APS de Campo Bom.
Que o objetivo da DEPOENTE ao entregar a sua documentação para o VÉIO era submeter a uma nova análise feita pelo servidor ALVARI (...)
Que o interesse da DEPOENTE era saber quanto tempo faltava para que tivesse jus a uma aposentadoria, pois tinha tempo trabalhado na colônia (...) tinha mais 07 (sete) anos de tempo rural. (...)
Que desconhecia que o benefício seria concedido. Que decorridos alguns dias, encontrou VÉIO, perguntou pelo seu processo e este informou que estava tudo certo e que a DEPOENTE iria 'ganhar a aposentadoria'.
Que não passou nenhuma procuração para o requerimento da aposentadoria e que não se recorda se assinou algum papel para o VÉIO. (...)
Que a Depoente nunca adentrou as dependências do INSS em Novo Hamburgo para tratar de sua aposentadoria. (...)
Inequívoco, portanto, que a Parte Autora tinha ciência de que não tinha direito ao benefício de aposentadoria NB 135.622.219-3, visto que:
(a) o pedido fora indeferido em 2004, justamente em razão de não computar tempo de serviço suficiente à concessão. Todavia, o benefício em comento foi deferido mediante cômputo de tempo de serviço urbano (que nunca prestou) equivalente a 12a 07m 00d;
(b) embora a Autora tivesse acreditado que o indeferimento do primeiro requerimento tenha ocorrido por não reconhecimento do tempo rural (07 anos), o benefício 135.622.619-3 foi concedido de forma integral (tempo superior a 30 anos), sem qualquer requerimento ou averbação de tempo rural;
(c) a Autora sequer formulou requerimento junto a APS de Novo Hamburgo (pessoalmente ou mediante procurador). Contudo, não se surpreendeu ao receber o comunicado de concessão de benefício de aposentadoria.
Diante de tais circunstâncias, reputo comprovada a má-fé da parte autora na percepção do NB 135.622.219-3, sendo devida a restituição dos valores recebidos aos cofres da Autarquia.
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Nesse aspecto, portanto, a sentença é mantida por seus próprios fundamentos.
Por outro lado, a alegação de que haveria necessidade do ajuizamento de ação própria está prejudicada, pois a Autarquia reconveio. Mas é a partir da reconvenção (13-9-2013) que deve ser contado o prazo prescricional. O recurso da segurada é provido nessa parte, pois a condenação deve abranger as parcelas vencidas a partir de 13-9-2008.
Em face da sucumbência recíproca (artigo 21 do CPC revogado), os honorários advocatícios, no valor de um salário mínimo vigente nesta data, são compensados de forma igualitária.
Ante o exposto, voto por dar parcial provimento à apelação.
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Apelação Cível Nº 5014379-05.2012.4.04.7108/RS
RELATOR: Juiz Federal JULIO GUILHERME BEREZOSKI SCHATTSCHNEIDER
APELANTE: NOELI TEREZINHA FROHLICH FILLMANN
ADVOGADO: ARTUR FERNANDO WAGNER JUNIOR (OAB RS087887)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
EMENTA
Benefício cancelado em decorrência de fraude. Ação da segurada contra a autarquia, declaratória da inexigibilidade do débito. Reconvenção da autarquia contra a segurada para se ressarcir do pagamento indevido. Nulidade (prova oral requerida e não produzida) que não se sustenta, em face da forte evidência, demonstrada pelo conjunto probatório, de que a segurada agiu de má-fé. Incidência do artigo 130 do CPC revogado: "caberá ao juiz, de ofício ou a requerimento da parte, determinar as provas necessárias à instrução do processo, indeferindo as diligências inúteis ou meramente protelatórias". A alegação de que haveria necessidade do ajuizamento de ação própria para o ressarcimento de valores está prejudicada, pois a autarquia reconveio. Mas é a partir da reconvenção que deve ser contado o prazo prescricional. Recurso da segurada provido em parte.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 6ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, dar parcial provimento à apelação, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 24 de julho de 2019.
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO Ordinária DE 24/07/2019
Apelação Cível Nº 5014379-05.2012.4.04.7108/RS
RELATOR: Juiz Federal JULIO GUILHERME BEREZOSKI SCHATTSCHNEIDER
PRESIDENTE: Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA
APELANTE: NOELI TEREZINHA FROHLICH FILLMANN
ADVOGADO: ARTUR FERNANDO WAGNER JUNIOR (OAB RS087887)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Ordinária do dia 24/07/2019, na sequência 158, disponibilizada no DE de 08/07/2019.
Certifico que a 6ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A 6ª TURMA, DECIDIU, POR UNANIMIDADE, DAR PARCIAL PROVIMENTO À APELAÇÃO.
RELATOR DO ACÓRDÃO: Juiz Federal JULIO GUILHERME BEREZOSKI SCHATTSCHNEIDER
Votante: Juiz Federal JULIO GUILHERME BEREZOSKI SCHATTSCHNEIDER
Votante: Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA
Votante: Juíza Federal TAIS SCHILLING FERRAZ
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