Apelação Cível Nº 5024431-44.2017.4.04.9999/RS
RELATOR: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
APELANTE: DILAMAR MOREIRA MENDONCA
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RELATÓRIO
Dilamar Moreira Mendonça interpôs apelação em face de sentença que julgou improcedente o pedido, condenado-o ao pagamento de custas e honorários advocatícios (fixados em R$ 934,00), ficando suspensa a exigibilidade por ser beneficiário da assistência judiciária gratuita (Evento 3 - SENT29).
Nas razões da apelação, alegou que o benefício deve ser concedido, uma vez que é esquizofrênico e não consegue trabalhar, bastando ver sua CTPS para concluir-se que o apelante tenta trabalhar, mas não consegue, pois fica empregado apenas por pequenos períodos. Destacou que a incapacidade está devidamente comprovada pela perícia médica oficial, realizada por psiquiatra, e que, por tal motivo, deve ser concedida a aposentadoria por invalidez ou o auxílio-doença (Evento 3 - APELAÇÃO32).
Sem contrarrazões, subiram os autos.
VOTO
A matéria devolvida no recurso diz respeito à possibilidade de concessão de benefício por incapacidade ao autor, comprovadamente portador de esquizofrenia (Evento 3 - LAUDPERI25), embora não detenha qualidade de segurado ou carência, conforme referido pelo juiz quando da prolação da sentença, nos seguintes termos:
No caso dos autos, conforme se extrai do laudo pericial, a parte autora é portadora de esquizofrenia, cuja patologia lhe acarreta incapacidade total e temporária para o trabalho (fl. 67 - quesitos "d" e "e").
A data do início da incapacidade, fixada pelo expert, remonta a 25/05/2015 (um ano da data da perícia médica - quesito fl. 67). Registro que não houve impugnação pela parte autora acerca do resultado da prova pericial.
Assim, para fazer jus ao benefício de auxílio-doença, deveria o autor ostentar, no dia fixado como sendo o início da incapacidade, além de qualidade de segurado, a carência necessária à obtenção do benefício. Sucede que, examinando a CTPS do autor, juntada às fls. 46/57, verifico que após o término do vínculo empregatício, desenvolvido entre 05/11/2012 e 22/11/2012, operou-se a perda da qualidade de segurado em 16/01/2014, nos termos dos arts. 15, inciso Vl, e art. 15, § 49, da Lei nº 8.213/91, clc art. 14 do Decreto nº 3.048/99.
Após a nova filiação do autor, em 27/01/2014 (fls. 14/16), não houve o cumprimento do requisito estabelecido no (atualmente revogado) §49 do art. 24 da lei de benefício que previa a necessidade de o segurado contar, a partir da nova filiação à Previdência Social, com, no mínimo. 1/3 (um terço) do número de contribuições exigidas para o cumprimento da carência definida para o benefício a ser requerido (no caso, 4 novas contribuições), para que as contribuições anteriores fossem computadas para efeito de carência.
Com efeito, o vínculo empregatício iniciou em 27/01/2014 e encerrou em 12/03/2014, totalizando apenas 3 contribuições mensais.
Não bastasse, da data-fim do referido labor (12/03/2014) até a data fixada como sendo do início da incapacidade (25/05/2015), operou-se nova perda da qualidade de segurado, sendo imperativo, pois, proclamar a improcedência da demanda.
Frente ao conjunto probatório, conclui-se que o requerente não detinha qualidade de segurado e também não preenchia o requisito da carência necessária à concessão do benefício de auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez, conforme pretendido.
Não obstante isso, trata-se de portador de esquizofrenia, conforme destacado no laudo pericial, situação que o impede de exercer suas atividades a contento. Do relato do autor e de sua irmã, destacou o perito:
PREÂMBULO
Data de Nascimento: 09 de outubro de 1989.
Autor comparece acompanhado da irmã (Dileusa) que aguarda na sala de espera. Diz que veio consultar, que faz tratamento com remédios, que a mãe é que lhe dá os medicamentos, que não sabe o nome dos mesmos. Solicitado a falar sobre seu trabalho, disse que era "doutor do hospital da sua cidade", posteriormente disse que era prefeito de Panambi, que era um guri bom, que ficava sempre em casa. Não soube informar sobre seu último trabalho, mas disse que tem muitas pessoas que são contra ele, que sempre tem barulho das pessoas que o perseguem, que à noite ouve vozes que o ameaçam. Irmã, solicitada a colaborar disse que autor teve crise em 2008 ou 2009 e desde então "nunca voltou ao normal". Disse que o mesmo faz uso dos medicamentos obtidos no posto de saúde, mas que faz muito tempo que não consulta com psiquiatra, que permanece longo tempo na cama, que não faz nenhuma atividade em casa, que necessita auxilio dos irmãos para ir cortar a barba e o cabelo, que muitas vezes se nega a tomar banho e que não tem contatos sociais. É o primeiro de 5 irmãos, mora com os pais (ele desempregado e ela diarista 2x/semana) e com a irmã mais nova.
A jurisprudência deste Tribunal Regional Federal da 4ª Região, deve-se destacar, consagrou a fungibilidade dos benefícios previdenciários de auxílio-doença, de aposentadoria por invalidez e do benefício assistencial ao deficiente, uma vez que todos possuem como requisito a redução ou supressão da capacidade para o trabalho. Logo, cabe ao INSS, administrativamente, ou ao magistrado, em juízo, conceder o benefício adequado à situação fática, ainda que tenha sido formulado pedido diverso, sem incorrer em julgamento extra petita. Nesse sentido:
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO POR INCAPACIDADE. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. QUALIDADE DE SEGURADO AUSENTE. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL DE PRESTAÇÃO CONTINUADA. FUNGIBILIDADE. INDEFERIMENTO DO PEDIDO DE PRODUÇÃO DE LAUDO SOCIOECONOMICO. NECESSIDADE DE REABERTURA DA INSTRUÇÃO. SENTENÇA ANULADA. 1. Ausente a qualidade de segurado, improcede o pedido de concessão de auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez. 2. O direito ao benefício assistencial pressupõe o preenchimento dos seguintes requisitos: condição de deficiente ou idoso (65 anos ou mais); e situação de risco social (estado de miserabilidade, hipossuficiência econômica ou situação de desamparo) da parte autora e de sua família. 3. Hipótese em que ausente a produção de prova de carência financeira. Anulada a sentença e reaberta a instrução para a realização de prova pericial de laudo socioeconômico. Precedentes. (TRF4, AC 0012108-63.2015.4.04.9999/RS, QUINTA TURMA, Relatora Juíza Federal GISELE LEMKE, D.E. 07/05/2018)
PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO POR INCAPACIDADE. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. QUALIDADE DE SEGURADO AUSENTE. SENTENÇA CASSADA. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL DE PRESTAÇÃO CONTINUADA. FUNGIBILIDADE. DEFICIENTE (INCAPACIDADE PARA O TRABALHO E PARA A VIDA INDEPENDENTE). INCAPACIDADE DE PROVER A PRÓPRIA MANUTENÇÃO OU TÊ-LA PROVIDA DE OUTRA FORMA. COMPROVAÇÃO. CONVERSÃO DA APOSENTADORIA POR INVALIDEZ EM BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. SISTEMÁTICA DE ATUALIZAÇÃO DO PASSIVO. TEMA Nº 810 DO STF. HONORÁRIOS. CUSTAS.1. Ausente a qualidade de segurado, não é possível a concessão de auxílio-doença/aposentadoria por invalidez, devendo ser cassada a sentença.2. Por outro lado, encontrando-se a autora em situação de vulnerabilidade social, na linha da jurisprudência dessa Corte, à luz da natureza pro misero do direito previdenciário, bem como dos princípios da proteção social e fungibilidade dos pedidos e por não consistir julgamento extra ou ultra petita o fato de conceder-se benefício diverso do pedido, possível a concessão de benefício assistencial.3. O direito ao benefício assistencial pressupõe o preenchimento dos seguintes requisitos: condição de deficiente ou idoso (65 anos ou mais); e situação de risco social (estado de miserabilidade, hipossuficiência econômica ou situação de desamparo) da parte autora e de sua família.4. O Supremo Tribunal Federal já decidiu que o critério definido pelo art. 20, § 3º, da Lei 8.742/1993 é apenas um indicativo objetivo, o qual não exclui a possibilidade de verificação da hipossuficiência econômica dos postulantes do benefício assistencial de prestação continuada.5. Comprovada a condição de pessoa deficiente (incapaz para o trabalho e para a vida independente) e de vulnerabilidade social, converte-se a aposentadoria por invalidez em benefício assistencial. 6. Sistemática da atualização do passivo observará a decisão do STF consubstanciada no seu Tema 810.7. Honorários devidos no percentual de 10% sobre parcelas vencidas até a sentença (Súmulas 111 STJ e 76 do TRF4).8. Não se aplica isenção das custas quando o INSS é demandado na Justiça Estadual do Paraná (Súmula 20 do TRF4). (TRF4, AC 5044948-07.2016.4.04.9999, QUINTA TURMA, Relator LUIZ CARLOS CANALLI, juntado aos autos em 22/02/2018)
Em virtude disso, a fim de que se analise se o autor preenche os requisitos à concessão do benefício assistencial previsto na Lei nº 8.742/93, é necessário que venham aos autos informações acerca de suas condições de vida e da renda per capita do núcleo familiar, de forma a ficar comprovada a condição de vulnerabilidade ou risco social, mediante a elaboração de um detalhado e consistente Estudo Socioeconômico.
De igual modo, o exame médico pericial deverá ser complementado pelo psiquiatra a fim de que diga em que grau a esquizofrenia compromete a vida profissional do autor, declinando nos autos se há possibilidade de controle contínuo e adequado da situação de maneira a permitir que fique empregado e possa exercer alguma atividade que lhe garanta o sustento.
A resposta a tal quesito é fundamental, pois, analisando-se os vínculos empregatícios da Carteira de Trabalho (Evento 3 - PET16), não há dúvidas de que o autor foi contratado por diversas empresas, mas não se manteve em nenhuma delas, o que denota a dificuldade na permanência das atividades, bem como que não poderia competir satisfatoriamente no mercado de trabalho justamente por ser portador de esquizofrenia, doença que não tem cura e é de caráter progressivo.
Há dúvidas, portanto, sobre o caráter temporário da doença, o que deve ser melhor examinado pelo expert na medida em que, após a ocorrência da primeira crise, há aproximadamente oito anos, o autor nunca mais conseguiu se manter em um emprego. Impõe-se analisar mais detidamente se poderá competir no mercado de trabalho, bem como se a doença pode ser definitivamente controlada, e, em caso positivo, se a medicação utilizada para tal finalidade causará ou não efeitos colaterais incompatíveis com o exercício de determinadas atividades de trabalho. Destaque-se, por oportuno, a resposta ao seguinte quesito do juízo:
b)Desde quando tais moléstias acometem o periciado? São doenças progressivas ou degenerativas? Descreva a evolução do quadro mórbido.
Trata-se de uma doença grave, com tendência à croniflcação, que evolui há, no mínimo, 8 anos.
Assim, anulo, de ofício, a sentença, e determino a remessa dos autos à origem para (a) elaboração de Estudo Socioeconômico e (b) complementação do laudo médico pericial, nos termos acima detalhados, ficando prejudicado o julgamento do recurso.
Dispositivo
Em face do que foi dito, voto por anular, de ofício, a sentença, determinando o retorno dos autos à origem para reabertura da instrução processual, nos termos do voto.
Documento eletrônico assinado por OSNI CARDOSO FILHO, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40000515440v17 e do código CRC 031aecc7.Informações adicionais da assinatura:
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Apelação Cível Nº 5024431-44.2017.4.04.9999/RS
RELATOR: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
APELANTE: DILAMAR MOREIRA MENDONCA
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO POR INCAPACIDADE. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. AUXÍLIO-DOENÇA. ESQUIZOFRENIA. AUSÊNCIA DE QUALIDADE DE SEGURADO E CARÊNCIA. FUNGIBILIDADE. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL DE PRESTAÇÃO CONTINUADA. NECESSIDADE DE ELABORAÇÃO DE LAUDO SOCIOECONOMICO E COMPLEMENTAÇÃO DA PERÍCIA MÉDICA. REABERTURA DA INSTRUÇÃO. SENTENÇA ANULADA.
1. Comprovado nos autos que o autor é portador de esquizofrenia, mas não detém qualidade de segurado e carência a possibilitar a concessão auxílio-doença e aposentadoria por invalidez, é o caso de perquirir acerca da possibilidade de concessão de benefício assistencial, com esteio nos princípios da proteção social e fungibilidade dos pedidos e por não consistir julgamento extra ou ultra petita o fato de conceder-se benefício diverso do pedido.
2. O direito ao benefício assistencial pressupõe o preenchimento dos seguintes requisitos: condição de deficiente ou idoso (65 anos ou mais); e situação de risco social (estado de miserabilidade, hipossuficiência econômica ou situação de desamparo) da parte autora e de sua família.
3. Anulada, de ofício, a sentença, determinando-se o retorno dos autos à origem para elaboração de laudo socioeconômico e complementação da perícia médica, ficando prejudicado o julgamento do recurso. Precedentes.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, decidiu anular, de ofício, a sentença, determinando o retorno dos autos à origem para reabertura da instrução processual, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 17 de julho de 2018.
Documento eletrônico assinado por OSNI CARDOSO FILHO, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40000515441v5 e do código CRC 7f320493.Informações adicionais da assinatura:
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 17/07/2018
Apelação Cível Nº 5024431-44.2017.4.04.9999/RS
INCIDENTE: QUESTÃO DE ORDEM
RELATOR: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
PRESIDENTE: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
APELANTE: DILAMAR MOREIRA MENDONCA
ADVOGADO: EDISON CLAUDINEI KUSTER
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 17/07/2018, na seqüência 90, disponibilizada no DE de 29/06/2018.
Certifico que a 5ª Turma , ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A 5ª Turma , por unanimidade, decidiu anular, de ofício, a sentença, determinando o retorno dos autos à origem para reabertura da instrução processual.
RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
Votante: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
Votante: Juiz Federal ALTAIR ANTONIO GREGORIO
Votante: Juíza Federal LUCIANE MERLIN CLÈVE KRAVETZ
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