Apelação Cível Nº 5007752-03.2017.4.04.7110/RS
RELATOR: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
APELANTE: CARMO SILVA FILHO (AUTOR)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
RELATÓRIO
Carmo Silva Filho interpôs apelação em face de sentença que julgou improcedente o pedido para concessão de auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez, condenando-o ao pagamento das custas e honorários advocatícios, arbitrados pelo juízo em 10% sobre o valor atualizado da causa, suspendendo a exigibilidade de ambas as verbas por ser o autor beneficiário da justiça gratuita (Evento 31).
Sustentou que os atestados médicos e exames anexados autos autos comprovam a incapacidade, embora o laudo pericial oficial seja em sentido contrário. Postulou, ao final, a reforma da sentença a fim de que lhe seja concedido benefício por incapacidade (Evento 36).
Sem contrarrazões, subiram os autos.
VOTO
Benefício por incapacidade
Cumpre, de início, rememorar o tratamento legal conferido aos benefícios de auxílio-doença e de aposentadoria por invalidez.
O art. 59 da Lei n.º 8.213/91 (Lei de Benefícios da Previdência Social - LBPS) estabelece que o auxílio-doença será devido ao segurado que, havendo cumprido, quando for o caso, o período de carência exigido em lei, ficar incapacitado para o seu trabalho ou para a sua atividade habitual por mais de 15 (quinze) dias consecutivos. Por sua vez, o art. 42 da Lei nº 8.213/91 estatui que a aposentadoria por invalidez será concedida ao segurado que, tendo cumprido a carência, for considerado incapaz e insuscetível de reabilitação para o exercício de atividade que lhe garanta a subsistência. O art. 25 desse diploma legal esclarece, a seu turno, que a carência exigida para a concessão de ambos os benefícios é de 12 (doze) meses, salvo nos casos em que é expressamente dispensada (art. 26, II).
Em resumo, portanto, a concessão dos benefícios depende de três requisitos: (a) a qualidade de segurado do requerente à época do início da incapacidade (artigo 15 da LBPS); (b) o cumprimento da carência de 12 contribuições mensais, exceto nas hipóteses em que expressamente dispensada por lei; (c) o advento, posterior ao ingresso no RGPS, de moléstia incapacitante para o desenvolvimento de atividade laboral que garanta a subsistência do segurado.
Note-se que a concessão do auxílio-doença não exige que o segurado esteja incapacitado para toda e qualquer atividade laboral; basta que esteja incapacitado para a sua atividade habitual. É dizer: a incapacidade pode ser total ou parcial. Além disso, pode ser temporária ou permanente. Nisso, precisamente, é que se diferencia da aposentadoria por invalidez, que deve ser concedida apenas quando constatada a incapacidade total e permanente do segurado. Sobre o tema, confira-se a lição doutrinária de Daniel Machado da Rocha e de José Paulo Baltazar Júnior:
A diferença, comparativamente à aposentadoria por invalidez, repousa na circunstância de que para a obtenção de auxílio-doença basta a incapacidade para o trabalho ou atividade habitual do segurado, enquanto para a aposentadoria por invalidez exige-se a incapacidade total, para qualquer atividade que garanta a subsistência. Tanto é assim que, exercendo o segurado mais de uma atividade e ficando incapacitado para apenas uma delas, o auxílio-doença será concedido em relação à atividade para a qual o segurado estiver incapacitado, considerando-se para efeito de carência somente as contribuições relativas a essa atividade (RPS, art. 71, § 1º) (in ROCHA, Daniel Machado da. BALTAZAR JÚNIOR, José Paulo. Comentários à Lei de Benefícios da Previdência Social. 15. ed. rev., atual. e ampl. - São Paulo: Atlas, 2017).
De qualquer sorte, o caráter da incapacidade (total ou parcial) deve ser avaliado não apenas por um critério médico, mas conforme um juízo global que considere as condições pessoais da parte autora - em especial, a idade, a escolaridade e a qualificação profissional - a fim de se aferir, concretamente, a sua possibilidade de reinserção no mercado de trabalho.
Cumpre demarcar, ainda, a fungibilidade entre as ações previdenciárias, tendo em vista o caráter eminentemente protetivo e de elevado alcance social da lei previdenciária. De fato, a adoção de soluções processuais adequadas à relação jurídica previdenciária constitui uma imposição do princípio do devido processo legal, a ensejar uma leitura distinta do princípio dispositivo e da adstrição do juiz ao pedido (SAVARIS, José Antônio. Direito processual previdenciário. 6 ed., rev. atual. e ampl. Curitiba: Alteridade Editora, 2016, p. 67). Por isso, aliás, o STJ sedimentou o entendimento de que "não constitui julgamento extra ou ultra petita a decisão que, verificando não estarem atendidos os pressupostos para concessão do benefício requerido na inicial, concede benefício diverso cujos requisitos tenham sido cumpridos pelo segurado" (AgRG no AG 1232820/RS, Rel. Min. Laurita Vaz, 5ª Turma, j. 26/10/20, DJe 22/11/2010).
Caso concreto
A matéria devolvida diz respeito à aptidão laboral do autor para seguir trabalhando como motorista de caminhão, sua atividade habitual, uma vez que a sentença julgou improcedente o pedido com fundamento em laudo médico que atestou a ausência de incapacidade. Alegou o apelante, todavia, que permaneceu em auxílio-doença desde 31 de agosto de 2005 até 18 de abril de 2017, quando foi cessado administrativamente por parecer contrário da perícia.
Segundo consta do laudo pericial (Evento 18), Carmo Silva Filho, nascido em 28 de outubro de 1954, é motorista profissional em caminhões carreta e ônibus, sendo portador de dor lombar (Lumbago) com irradiação (Lombociatalgia) residual pós-tratamento cirúrgico adequado de Hérnia de Disco. O diagnóstico é de M 54.4 Lumbago com ciática, mas não há incapacidade para o trabalho habitual. Do detalhado laudo, deve-se destacar:
No exame neurológico aplicado no ato pericial observou-se massas musculares dos quatro membros com bom trofismo e de bom volume, sem cicatrizes ou alteração do tônus de repouso o que demonstra serem massas musculares ativas, sem déficit de força nos quatro membros, reflexo osteotendinoso Aquiliano esquerdo (tornozelo esquerdo) diminuído que se refere ao nível da Hérnia tratada inicialmente, os outros reflexos osteotendinosos estão presentes e simétricos nos quatro membros, articulações livres, músculos paravertebrais enrijecidos que limitam os movimentos do tronco em antero-flexão além dos movimentos de inclinação lateral para esquerda e direita e os movimentos de rotação.
Quadro neurológico de algia residual em região lombar onde foi operado uma Hérnia de Disco L4-L5 com visualização por Ressonância do tecido cicatricial local se posicionar sem comprometer as raízes lombares, músculos paravertebrais enrijecidos mas sem contratura e também sem perda de volume, se mostrando como músculos ativos, permaneceu período prolongado (mais de 10 anos) afastado do labor sem realizar fisioterapia motora de recuperação muscular da coluna, apesar disto os músculos dos membros inferiores se mostram com força e sem perda de massa (atrofia de desuso).
QUESITOS DO JUÍZO
[...]
Quesito nº 13 Outros esclarecimentos que o(a) Sr.(a) Perito(a) entender pertinentes, especialmente quanto ao indicativo do(s) tipo(s) de tratamento (clinico, cirúrgico, fisioterápico ou medicamentoso) que é(são) ou poderia(m) ser feito(s) pelo(s) autor(a), bem como os efeitos desse(s) sobre eventual incapacidade detectada.
Resposta: Autor apresenta dor lombar residual pós tratamento cirúrgico de Hérnia Discal, com longo período afastado do labor mas sem apresentar trabalho físico de recuperação muscular da musculatura paravertebral, sem apresentar déficit de força ou perda de massas musculares dos membros que limite ou impeça o labor habitual.
QUESITOS DO AUTOR
1)A parte autora é portadora de CID M 51.1: TRANSTORNOS DE DISCOS LOMBARES E DE OUTROS INTERVERTEBRAIS COM RADICULOPATIA?
Resposta: Não; os transtornos dos discos lombares era uma Hérnia de Disco localizada a nível L4-L5 que ensejou uma neurocirurgia de Hemilaminectomia, erradicando o transtorno; Autor hoje padece de Lombociatalgia Esquerda.
[...]
4) Em relação às atividades efetivamente desenvolvidas pela parte autora, existe incapacidade laborativa em razão das doenças citadas acima?
Resposta: Não há incapacidade laboral.
Diante da conclusão do expert acima transcrita, percebe-se que o autor, embora tenha permanecido em gozo de auxílio-doença desde o ano de 2005, não apresenta atrofia muscular ou qualquer outro indício que comprove que, durante tal período, tenha permanecido sem trabalhar ou em repouso, pois o tônus muscular está preservado.
Dito isso, é o caso de negar provimento à apelação, mantendo-se a irretocável sentença, pois, não havendo a necessária incapacidade, incabível a concessão de aposentadoria por invalidez ou auxílio-doença. As patologias apresentadas pelo autor, segundo o laudo pericial elaborado por especialista em neurologia, não o impedem de exercer suas lides habituais.
Demais disso, o laudo está muito bem elaborado e as respostas aos quesitos formulados detalham, fundamentadamente, as razões por que o autor está apto a trabalhar. O laudo é válido, portanto, a embasar a presente decisão, até mesmo porque cabia ao autor, na condição de parte interessada, fazer prova em contrário, ônus do qual não se desincumbiu. No ponto, ressalte-se que os atestados médicos e exames juntados aos autos não se prestam a invalidar o quanto constou do laudo pericial.
Nesse sentido, confiram-se precedentes desta Corte:
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO POR INCAPACIDADE. AUXILIO-DOENÇA. INCAPACIDADE NÃO COMPROVADA. HONORÁRIOS. 1. O acesso aos benefícios previdenciários de aposentadoria por invalidez e de auxílio-doença pressupõe a presença de 3 requisitos: (1) qualidade de segurado ao tempo de início da incapacidade, (2) carência de 12 contribuições mensais, salvo as hipóteses previstas no art. 26, II, da Lei nº 8.213/91, que dispensam o prazo de carência, e (3) requisito específico, relacionado à existência de incapacidade impeditiva para o labor habitual em momento posterior ao ingresso no RGPS, aceitando-se, contudo, a derivada de doença anterior, desde que agravada após o ingresso no RGPS, nos termos do art. 42, § 2º, e art. 59, parágrafo único, ambos da Lei nº 8.213/91. 2. Embora o magistrado não esteja vinculado ao laudo pericial, a formação do convencimento judicial se dá predominantemente a partir das conclusões do perito; apenas em hipóteses excepcionais é que cabe ao juiz, com base em sólida prova em contrário, afastar-se da conclusão apresentada pelo expert. 3. Não obstante a parte autora seja portadora de moléstias de ordem ortopédica, não há comprometimento da sua capacidade de trabalho a impedir o desempenho das atividades na agricultura. 4. Não comprovada a incapacidade para o labor, deve ser indeferido o pedido para concessão de auxílio-doença. 5. Confirmada a sentença no sentido da improcedência do pedido, impõe-se a adequação da verba honorária, nos termos dos incisos I a IV do § 2º e o § 11, ambos do artigo 85 do CPC. (TRF4, AC 5071189-81.2017.4.04.9999, QUINTA TURMA, Relator OSNI CARDOSO FILHO, juntado aos autos em 18/07/2018)
PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-DOENÇA. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. REQUISITOS. INCAPACIDADE NÃO COMPROVADA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. 1. Quatro são os requisitos para a concessão do benefício em tela: (a) qualidade de segurado do requerente; (b) cumprimento da carência de 12 contribuições mensais; (c) superveniência de moléstia incapacitante para o desenvolvimento de qualquer atividade que garanta a subsistência; e (d) caráter definitivo/temporário da incapacidade. 2. Hipótese em que não restou comprovada a incapacidade laboral da autora para exercer seu trabalho habitual. 3. Honorários advocatícios majorados, considerando as variáveis dos incisos I a IV do § 2º do artigo 85 do CPC, cuja exigibilidade fica suspensa em face da concessão de gratuidade da justiça. (TRF4, AC 5057119-59.2017.4.04.9999, TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DO PR, Relator LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO, juntado aos autos em 09/07/2018)
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIOS POR INCAPACIDADE. Não comprovada a alegada incapacidade para o trabalho, improcede o pedido de concessão de auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez. (TRF4, AC 5010366-10.2018.4.04.9999, QUINTA TURMA, Relatora GISELE LEMKE, juntado aos autos em 29/06/2018)
Sabe-se que o juiz não está vinculado ao laudo pericial judicial (art. 479, CPC). Todavia, conforme reiteradamente afirmado por esta Corte, "a concessão de benefício previdenciário por incapacidade decorre da convicção judicial formada predominantemente a partir da produção de prova pericial" (TRF4, APELREEX 0013571-06.2016.404.9999, SEXTA TURMA, Relatora SALISE MONTEIRO SANCHOTENE, D.E. 11/07/2017). Apenas em situações excepcionais é que o magistrado pode, com base em sólida prova em contrário, afastar-se da conclusão apresentada pelo perito - hipótese de que, aqui, não se cuida.
Conclui-se, assim, que o autor está apto para o trabalho, motivo pelo qual não faz jus à concessão dos benefícios postulados, o que leva à improcedência do pedido.
Custas - Honorários Advocatícios
Confirmada a sentença no sentido da improcedência, impõe-se a adequação da verba honorária.
Considerando as variáveis dos incisos I a IV do § 2º e o § 11, ambos do artigo 85 do CPC, majora-se, de ofício, o percentual de 10% (dez por cento) para 15% (quinze por cento) sobre o valor atualizado da causa, restando mantida a sua inexigibilidade temporária, no entanto, em face da concessão do benefício da assistência judiciária gratuita no início da demanda.
Custas na forma da sentença.
Prequestionamento
O enfrentamento das questões suscitadas em grau recursal, assim como a análise da legislação aplicável, são suficientes para prequestionar junto às instâncias Superiores os dispositivos que as fundamentam. Assim, deixo de aplicar os dispositivos legais ensejadores de pronunciamento jurisdicional distinto do que até aqui foi declinado. Desse modo, evita-se a necessidade de oposição de embargos de declaração tão somente para este fim, o que evidenciaria finalidade procrastinatória do recurso, passível de cominação de multa.
Dispositivo
Em face do que foi dito, voto no sentido de negar provimento à apelação, adequando, de ofício, a verba honorária, nos termos da fundamentação.
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Apelação Cível Nº 5007752-03.2017.4.04.7110/RS
RELATOR: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
APELANTE: CARMO SILVA FILHO (AUTOR)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO POR INCAPACIDADE. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. AUXILIO-DOENÇA. LAUDO PERICIAL. AUSÊNCIA DE INCAPACIDADE. HONORÁRIOS.
1. São três os requisitos para a concessão dos benefícios por incapacidade: (1) qualidade de segurado; (2) cumprimento do período de carência; (3) a incapacidade para o trabalho, de caráter permanente (aposentadoria por invalidez) ou temporário (auxílio-doença).
2. Somente contexto probatório muito relevante, constituído por exames que conclusivamente apontem para a incapacidade do segurado, pode desfazer a credibilidade que se deve emprestar a laudo pericial elaborado por profissional qualificado a servir como auxiliar do juízo.
3. Não caracterizada a incapacidade laboral do segurado, imprópria a concessão de auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez em seu favor.
4. Honorários advocatícios majorados (art. 85, §11, do CPC).
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade negar provimento à apelação, adequando, de ofício, a verba honorária, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 13 de novembro de 2018.
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 13/11/2018
Apelação Cível Nº 5007752-03.2017.4.04.7110/RS
RELATOR: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
PRESIDENTE: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
APELANTE: CARMO SILVA FILHO (AUTOR)
ADVOGADO: GETÚLIO JAQUES JÚNIOR
ADVOGADO: WILLIAM FERREIRA PINTO
ADVOGADO: ROBERT VEIGA GLASS
ADVOGADO: GABRIEL MATOS DA FONSECA
ADVOGADO: JULIANO FURTADO FERREIRA
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 13/11/2018, na sequência 350, disponibilizada no DE de 25/10/2018.
Certifico que a 5ª Turma , ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A 5ª TURMA , DECIDIU, POR UNANIMIDADE NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO, ADEQUANDO, DE OFÍCIO, A VERBA HONORÁRIA.
RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
Votante: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
Votante: Juiz Federal ALTAIR ANTONIO GREGORIO
Votante: Juíza Federal GISELE LEMKE
LIDICE PEÑA THOMAZ
Secretária
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