Apelação Cível Nº 5012419-90.2020.4.04.9999/SC
RELATOR: Desembargador Federal SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ
APELANTE: SOLECI ALVES DE OLIVEIRA
ADVOGADO: CLAUDIOMIR GIARETTON (OAB SC013129)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RELATÓRIO
Trata-se de apelação interposta pela parte autora contra sentença que julgou improcedente pedido de concessão de benefício prvidenciário por incapacidade, condenando-a ao pagamento de honorários advocaticios, fixados em 10% sobre o valor atualizado da causa, com exigibilidade suspensa pela concessão da gratuidade da justiça.
Em suas razões, em síntese alega que, conforme documentos médicos anexados, faz jus aos benefícios pleiteados, requerendo, por fim:
(...) -No mérito para reformar a sentença para julgar procedente a presente ação, concedendo a aposentadoria por invalidez e/ou concessão de auxílio-doença à apelante, desde o indeferimento indevido do benefício NB 530.846.839-3 em 02/04/2019 com os consectários legais;
- Em não sendo esse o entendimento desta Colenda Turma requer-se seja declarada nula a perícia realizada, determinando a realização de outra perícia com médico especializado em ORTOPEDISTA, pelos motivos acima elencados;
- A condenação do recorrido no pagamento das parcelas vencidas e vincendas, acrescidas de correção monetária, juros moratórios, e honorários advocatícios;
Com contrarrazões, vieram os autos para Julgamento.
VOTO
Premissas
Trata-se de demanda previdenciária na qual a parte autora objetiva a concessão de AUXÍLIO-DOENÇA, previsto no art. 59 da Lei 8.213/91, ou APOSENTADORIA POR INVALIDEZ, regulado pelo artigo 42 da Lei 8.213/91.
São quatro os requisitos para a concessão desses benefícios por incapacidade: (a) qualidade de segurado do requerente (artigo 15 da LBPS); (b) cumprimento da carência de 12 contribuições mensais prevista no artigo 25, I, da Lei 8.213/91 e art. 24, parágrafo único, da LBPS; (c) superveniência de moléstia incapacitante para o desenvolvimento de atividade laboral que garanta a subsistência; e (d) caráter permanente da incapacidade (para o caso da aposentadoria por invalidez) ou temporário (para o caso do auxílio-doença).
Cabe salientar que os benefícios de auxílio-doença e aposentadoria por invalidez são fungíveis, sendo facultado ao julgador (e, diga-se, à Administração), conforme a espécie de incapacidade constatada, conceder um deles, ainda que o pedido tenha sido limitado ao outro. Dessa forma, o deferimento do amparo nesses moldes não configura julgamento ultra ou extra petita. Por outro lado, tratando-se de benefício por incapacidade, o Julgador firma a sua convicção, via de regra, por meio da prova pericial.
De qualquer sorte, o caráter da incapacidade, a privar o segurado do exercício de todo e qualquer trabalho, deve ser avaliado conforme as particularidades do caso concreto. Isso porque existem circunstâncias que influenciam na constatação do impedimento laboral (v.g.: faixa etária do requerente, grau de escolaridade, tipo de atividade e o próprio contexto sócio-econômico em que inserido o autor da ação).
Exame do caso concreto
A controvérsia cinge-se à verificação da incapacidade laboral da autora.
A perícia judicial realizada em 19/11/2019, por médico especialista em ortopedia e traumatologia, apurou que a autora, doméstica/do lar, nascida em 08/11/1963 (atualmente com 56 anos), ensino fundamental incompleto, apresenta queixas de Síndrome de lombocialtagia e Síndrome dolorosa de ombro esquerdo.
Em seu laudo (evento 43, OUT1), relata o sr. perito:
(...) Músculo Esquelético:
Dores articulares
X Ombro E
Joelho Cotovelo
Mãos Quadril
X Coluna lomba
Neurológicos:
Desmaios
Dor de cabeça
X Dormência em braços e pernas.
X Formigamento, mãos, pés, perna
X Tonturas
X Problemas no caminhar
(...)
Postura: Normal
Medidas: Simétricas
Aspecto de saúde geral: Normal
Tônus muscular: Normal
Pele: Normal
Deformidades: Ausente
Calosidade palmar: Ausente
Sujidade ungueal: Ausente
Palpação:
Pontos dolorosos: VER DESENHO PINTADO
Crepitação: Ausente
Pulso radial: Normal
Pulso cubital: Normal
Testes e Manobras Especiais:
DO SUPRAESPINHOSO: NEGATIVO: POSITIVO:
Impacto de Neer: X
Supraespinhal: X
Jobe: X
(...)
Código Internacional de Doenças:
M51.3 Discopatia degenerativa lombar.
M75.1 Síndrome do manguito rotador de ombro E.
Componentes do dano:
Regiões afetadas: VER ACIMA.
Alterações: Degenerativas.
Queixas: Refere dor e impotência funcional.
Particularidades da patologia:
Etiologias: Degenerativas.
Prognóstico: Bom se realizar as atividades ergonomicamente correto.
Datas e Análises Documentais: Foi considerado as datas do agravamento das doenças, segundo a parte autora , início e fim do auxílio doença e datas dos exames complementares.
Estado Atual das Alterações:
Consolidadas.
Compensadas.
Estabilizadas.
Estado de saúde geral: [ Ver revisão dos sistemas ].
Bom
Dano estético:
X inexistente
Perda da Autonomia: (instrumental, pessoal).
X inexistente
Conclusão:
Vejo que apresenta redução da capacidade funcional sem repercussão na capacidade laboral. Sua lesão está compensada e estabilizada.
Aos quesitos, respondeu:
(...) c) Qual a causa provável da (s) doença/moléstia (s) / incapacidade?
R: Degenerativa.
d) As doenças, moléstias ou lesões decorrem do trabalho exercido? Justifique indicando o agente de riso ou agente nocivo causador.
R: São alterações degenerativas que podem ser precipitadas pelos labores braçais e sedentários.
e) As doenças, moléstias ou lesões decorrem de acidente de trabalho? Em caso positivo, circunstanciar o fato, com data e local, bem como se reclamou assistência médica ou hospitalar. R: Ver acima.
f) As doenças, moléstias ou lesões tornam a parte periciada incapacitada para o exercício do último trabalho ou atividade habitual? Justifique a resposta, descrevendo os elementos nos quais se baseou a conclusão.
R: Não. Justificado em laudo pericial.
(...) o) O (a) periciado (a) está realizando tratamento? Qual a previsão de duração do tratamento? Há previsão ou foi realizado tratamento cirúrgico? O tratamento é oferecido pelo SUS?
R: Referiu que sim. Indeterminado. Não há indicação cirúrgica. Sim.
p) É possível estimar qual o tempo e o eventual tratamento necessários para que o (a) periciado (a) se recupere e tenha condições de voltar a exercer seu trabalho ou atividade habitual (data de cessação da incapacidade)?
R: Não vejo impedimentos ao labor
Em que pese a parte autora ter apresentado documentos médicos somente após a realização da perícia judicial.. (...)
Conclui que a parte autora não apresenta incapacidade laboral.
O laudo, como se vê, é conclusivo no sentido da ausência de incapacidade para o trabalho.
Anote-se que o perito judicial é o profissional de confiança do juízo, cujo compromisso é examinar a parte com imparcialidade. Embora seja certo que o juiz não fique adstrito às conclusões do perito, a prova em sentido contrário ao laudo judicial, para prevalecer, deve ser suficientemente robusta e convincente, o que não ocorreu no presente feito.
A parte autora recebeu benefício de auxílio-doença nos períodos de 21/8/2002 a 31/3/2006, 14/9/2006 a 31/3/2007, 26/11/2007 a 18/5/2018 e 04/6/2019 a 04/9/2019, conforme documentos anexados, evento 12, CERT1.
Ajuizou a presente ação em 07/05/2019.
Por sua vez, os documentos médicos apresentados nos autos ( eventos 50, CERT 1 e evento 58, APELAÇÃO1, ou seja, anexados após a juntada do laudo pericial), são relativos ao período em que, efetivamente, percebeu benefício de auxílio doença e/ou não se prestam a comprovar a alegada incapacidade laboral da autora:
06/6/2018 - laudo de exame de imagem de coluna cervical e ombro direito;
11/6/2018 - atestado de médico ortopedista assistente, relata diagnóstico, tratamento e sugere afastamento por 180 dias de auxílio-doença;
17/8/2018 - laudo de exame de imagem RM coluna lombo-sacra;
28/2/2019 - laudo de exame de imagem RM de coluna e US ombro esquerdo;
27/7/2019 - documento de protocolo médico pré-operatório de coluna;
A existência de patologia ou lesão nem sempre significa que está o segurado incapacitado para o trabalho. Doença e incapacidade podem coincidir ou não, dependendo da gravidade da moléstia, das atividades inerentes ao exercício laboral e da sujeição e resposta ao tratamento indicado pelo médico assistente. Portanto, nem toda enfermidade gera a incapacidade que é pressuposto para a concessão dos benefícios previdenciários postulados.
Além disso, a parte autora não trouxe aos autos nenhum elemento suficiente para infirmar a conclusão da perícia judicial.
Ressalta-se que não há qualquer atestado médico contemporâneo à data da perícia judicial, que possa comprovar diagnóstico, tratamento ou a incapacidade alegada.
O conjunto probatório, portanto, não aponta a existência de incapacidade, razão pela qual se tem por indevida a concessão do benefício previdenciário, conforme requerido.
Nova perícia judicial - desnecessidade
A perícia judicial concluiu que a parte autora não apresenta patologia que a incapacite para o trabalho no momento.
Com relação à qualificação do expert, observa-se que o perito nomeado é especialista em ortopedia e traumatologia, isto é, profissional especializado justamente na área da patologia suscitada na exordial, o que robustece a idoneidade de suas conclusões.
O laudo judicial foi claro, objetivo e coerente. O perito descreveu de forma satisfatória o quadro de saúde da autora, por meio do histórico da doença, anamnese e exame físico, bem como respondeu aos quesitos apresentados. Não há, pois, razão que justifique qualquer dúvida relativa à credibilidade ou à legitimidade profissional do perito designado.
Ora, a simples discordância da parte com a conclusão apresentada pelo "expert" não é motivo suficiente para nomeação de outro perito e a realização de novo laudo técnico, nem caracteriza cerceamento de defesa.
Nesse passo, segue a jurisprudência deste Tribunal:
PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-DOENÇA. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. LAUDO PERICIAL. MÉDICO ESPECIALISTA. DESNECESSIDADE. INCAPACIDADE LABORAL. NÃO COMPROVAÇÃO. IMPROCEDÊNCIA. 1. A simples discordância da parte com a conclusão apresentada pelo "expert" não é motivo suficiente para a nomeação de outro perito e a realização de novo laudo técnico, nem caracteriza cerceamento de defesa. 2. No caso dos autos, o laudo pericial, elaborado por médico de confiança do Juízo, concluiu pela inexistência de incapacidade para a atividade da requerente, razão pela qual é indevida a concessão dos benefícios requeridos. (TRF4, AC 0011755-86.2016.404.9999, Quinta Turma, Relator Roger Raupp Rios, D.E. de 09-06-2017).
Assim, deve ser mantida a sentença que adotou as conclusões da perícia.
Honorários recursais
Os honorários recursais estão previstos no artigo 85, § 11, do Código de Processo Civil, que possui a seguinte redação:
Art. 85. A sentença condenará o vencido a pagar honorários ao advogado do vencedor.
(...)
§ 11. O tribunal, ao julgar recurso, majorará os honorários fixados anteriormente levando em conta o trabalho adicional realizado em grau recursal, observando, conforme o caso, o disposto nos §§ 2º a 6º, sendo vedado ao tribunal, no cômputo geral da fixação de honorários devidos ao advogado do vencedor, ultrapassar os respectivos limites estabelecidos nos §§ 2º e 3º para a fase de conhecimento.
No julgamento do Agravo Interno nos Embargos de Divergência em REsp nº 1.539.725, o Superior Tribunal de Justiça estabeleceu os requisitos para que possa ser feita a majoração da verba honorária, em grau de recurso.
Confira-se, a propósito, o seguinte item da ementa do referido acórdão:
5. É devida a majoração da verba honorária sucumbencial, na forma do art. 85, § 11, do CPC/2015, quando estiverem presentes os seguintes requisitos, simultaneamente: a) decisão recorrida publicada a partir de 18.3.2016, quando entrou em vigor o novo Código de Processo Civil; b) recurso não conhecido integralmente ou desprovido, monocraticamente ou pelo órgão colegiado competente; e c) condenação em honorários advocatícios desde a origem no feito em que interposto o recurso.
No presente caso, tais requisitos se encontram presentes.
Logo, considerando o trabalho adicional em grau recursal, arbitro os honorários recursais no patamar de 10% (dez por cento) sobre o valor dos honorários fixados na sentença, com exigibilidade suspensa pela concessão da gratuidade da justiça.
Ante o exposto, voto por negar provimento à apelação.
Documento eletrônico assinado por SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40001927178v36 e do código CRC 25defbce.Informações adicionais da assinatura:
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Apelação Cível Nº 5012419-90.2020.4.04.9999/SC
RELATOR: Desembargador Federal SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ
APELANTE: SOLECI ALVES DE OLIVEIRA
ADVOGADO: CLAUDIOMIR GIARETTON (OAB SC013129)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO POR INCAPACIDADE. AUSÊNCIA DE INCAPACIDADE. PERITO ESPECIALISTA NA PATOLOGIA SUSCITADA. ausencia de ELEMENTOS PARA INFIRMAR O LAUDO.
1. Tratando-se de auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez, o Julgador firma sua convicção, via de regra, por meio da prova pericial.
2. O perito nomeado é profissional especializado justamente na área da patologia suscitada na exordial, o que robustece a idoneidade de suas conclusões.
3. Além disso, embora o julgador não esteja jungido à literalidade do laudo pericial, sendo-lhe facultada a ampla e livre avaliação da prova, não há nos autos elemento que autorize o afastamento da prova técnica elaborada.
4. Hipótese em que, considerando as conclusões do perito judicial de que a parte autora não está incapacitada para o exercício de atividades laborativas, não é devido o benefício pleiteado.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia Turma Regional Suplementar de Santa Catarina do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por maioria, vencido o Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ, negar provimento à apelação, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Florianópolis, 11 de setembro de 2020.
Documento eletrônico assinado por SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40001927179v4 e do código CRC ded998fe.Informações adicionais da assinatura:
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO Virtual DE 13/08/2020 A 20/08/2020
Apelação Cível Nº 5012419-90.2020.4.04.9999/SC
RELATOR: Desembargador Federal SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ
PRESIDENTE: Desembargador Federal CELSO KIPPER
PROCURADOR(A): WALDIR ALVES
APELANTE: SOLECI ALVES DE OLIVEIRA
ADVOGADO: CLAUDIOMIR GIARETTON (OAB SC013129)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 13/08/2020, às 00:00, a 20/08/2020, às 16:00, na sequência 1433, disponibilizada no DE de 03/08/2020.
Certifico que a Turma Regional suplementar de Santa Catarina, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
APÓS O VOTO DO DESEMBARGADOR FEDERAL SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ NO SENTIDO DE NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO, DA DIVERGÊNCIA INAUGURADA PELO DESEMBARGADOR FEDERAL PAULO AFONSO BRUM VAZ, E O VOTO DO DESEMBARGADOR FEDERAL CELSO KIPPER ACOMPANHANDO O RELATOR, O JULGAMENTO FOI SOBRESTADO NOS TERMOS DO ART. 942 DO CPC/2015.
Votante: Desembargador Federal SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ
Votante: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ
Votante: Desembargador Federal CELSO KIPPER
ANA CAROLINA GAMBA BERNARDES
Secretária
MANIFESTAÇÕES DOS MAGISTRADOS VOTANTES
Divergência - GAB. 91 (Des. Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ) - Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ.
Com a devida vênia do ilustre Relator, entendo que deve ser anulada a sentença de improcedência de benefício por incapacidade, amparada em laudo pericial padronizado feito pelo perito Rafael Ricardo Lazzari, que, invariavelmente, reconhece a aptidão laboral de segurados que exercem atividades que consabidamente demandam esforços físicos (v.g. agricultores, pedreiros, serventes, empregados domésticos), independentemente do estágio da doença e das condições pessoais do periciando.
Muito embora viesse adotando o entendimento de avaliar, caso a caso, a situação, é de rigor a anulação as decisões amparadas nos laudos periciais padronizados e inconclusos realizados pelo referido expert, porquanto, apesar deles serem formalmente estruturados, inclusive com razoável apresentação estética, ao longo desses anos na jurisdição da Turma Regional Suplementar de Santa Catarina, verificou-se uma sucessão de laudos repetidos, estereotipados, padronizados, de conclusões idênticas e incompatíveis com o papel de um "expert" auxiliar da justiça. Invariavelmente, o perito se limita a concluir que os tais segurados que exercem atividades eminentemente braçais, que consabidamente demandam intenso esforço físico, podem trabalhar desde que ergonomicamente!
Inexiste liberdade absoluta na elaboração da prova pericial por parte do expert, que deve se empenhar em elucidar ao juízo e às partes todos os elementos necessários à verificação do real estado de saúde do segurado que objetiva a concessão de benefício por incapacidade. A propósito do tema, leciona o eminente Juiz Federal José Antonio Savaris (Curso sobre perícia judicial previdenciária. Curitiba: Alteridade Editora, 2014, p. 32-33):
Com efeito, o médico perito nomeado pelo Juízo, nada obstante - formalmente - atue como perito de confiança em processo judicial, tem o dever inderrogável de prestar todos os esclarecimentos de forma racional, de molde a permitir real debate sobre a prova que é crucial para os processos previdenciários por incapacidade.
O perito não é um senhor absoluto erigido acima de todos os postulados processo-constitucionais. Não pode ser tido tampouco como um ser mítico que acessa o impenetrável e revela a verdade oculta e que somente por ele pode ser obtida. A prova técnica, como qualquer outra etapa processual, não pode ser arbitrária e assim será toda vez que não se mostrar devidamente justificada ou, tanto quanto possível, fundamentada em dados técnicos objetivos ou que possam ser obtidos por sua experiência profissional (não se pretende excluir aqui, evidentemente, o elemento subjetivo do exame pericial).
Não se exigirá do perito, qualquer que seja sua especialidade, que realize diagnóstico para prescrição do tratamento, faça prognóstico da evolução clínica, oriente ou acompanhe o periciando (o que seria ideal numa perspectiva de atendimento não fracionado à pessoa), mas é atribuição do perito determinar, com a necessária fundamentação, a aptidão laboral para fins do benefício por incapacidade.
O laudo técnico pericial, reconhecidamente a mais relevante prova nas ações previdenciárias por incapacidade, deve conter, pelo menos: as queixas do periciando; a história ocupacional do trabalhador; a história clínica e exame clínico (registrando dados observados nos diversos aparelhos, órgãos e segmentos examinados, sinais, sintomas e resultados de testes realizados); os principais resultados e provas diagnósticas (registrar exames realizados com as respectivas datas e resultados); o provável diagnóstico (com referência à natureza e localização da lesão); o significado dos exames complementares em que apoiou suas convicções; as consequências do desempenho de atividade profissional à saúde do periciando.
Quando a perícia judicial não cumpre os pressupostos mínimos de idoneidade da prova técnica, ela é produzida, na verdade, de maneira a furtar do magistrado o poder de decisão, porque respostas periciais categóricas, porém sem qualquer fundamentação, revestem um elemento autoritário que contribui para o que se chama decisionismo processual. Em face da ausência de referências fáticas determinadas, a solução judicial se traduziria em uma subjetividade desvinculada aos fatos, resultando mais de valorações e suspeitas subjetivas do que de circunstâncias de fato (FERRAJOLI, Luigi. Direito e Razão: teoria do garantismo penal. São Paulo: RT, 2002. p. 36).
Definir o que é tarefa do perito e o que é tarefa do juiz não é mister simplório quando se trata da definição da (in)capacidade. O certo é que perícias incompletas obrigam o juiz a avançar por uma seara que não tem o domínio seguro.
A prevenção/ precaução, enquanto princípio superior de aplicação subjetiva e objetivamente universalizada, que deveria ter sido aplicada pelo perito, se não o for, resulta submetida ao juiz, ao qual é vedado declarar o non liquet, pois precisa decidir o indecidível (Luhmann).
Embora o juiz utilize a sua condição de ser-no-mundo, experiência, vivência e a tradição, como subsídios para encontrar a melhor compreensão da relação fato-direito, o ideal é que tais supostos sejam previamente manejados e avaliados pelo profissional médico, vale dizer, pelo próprio sistema sanitário (médico). A experiência, embora com ele não se confunda, sempre é subsídio do conhecimento científico. É, podemos dizer, um pressuposto inafastável para a ele se chegar. É isso que os peritos recusam: deixar-se levar pela experiência e a vivência como suportes do conhecimento científico que precisam ter, auscultando os sentidos das inconfundíveis observações individuais sobre o mesmo fenômeno como movimento dialético que altera o seu saber e respectivo objeto, e que precisam ser levados à tona e desvelados. Melhor dizendo, submetidos ao crivo do processo dialógico, para debate das partes e avaliação judicial. A experiência, enquanto essência histórica do homem, permite uma melhor aproximação com a coisa (mesma) como ela é.
Ao que vejo, tem faltado aos peritos judiciais um pouco mais de outridade (alteridade). A decisão judicial não precisa ser consequencialista apenas do ponto de vista econômico. O consequencialismo para valer é aquele que reflete as consequências da decisão em um sentido amplo (holístico). O segurado, como qualquer autor de uma demanda judicial, sofre os efeitos negativos e positivos da decisão judicial. A pergunta é: até que ponto se pode, respeitada a dignidade da pessoa, impingir ao segurado o castigo de ter que trabalhar com sofrimento, com dores, falta de forças e submetido a tratamentos fármacos (analgesia) que atenuem as dores resultantes de suas limitações para determinadas atividades, que, consabidamente, não podem jamais ser exercidas ergonomicamente, mas que sempre impõem efeitos colaterais graves?
Esses laudos periciais que asseveram ser possível o trabalho de rural, nada obstante os problemas sérios na coluna, mediante adoção de postura ergonômica ou tratamentos analgésicos, como se tais paliativos não tivessem custo e não demandassem tempo, muitas vezes incompatível como as condições e local de trabalho, precisam ser repensados.
Outro vício dos mais graves das perícias está em referir o perito que “no momento da perícia o segurado não apresentou sintomas que pudessem induzir à incapacidade”. Quando assim age, o perito culmina por congelar (em uma fotografia!) o quadro como se as doenças não tivessem “antes”, “durante” e “depois” (passado, presente e futuro). Esta atitude apaga o passado, celebra o presente e mata o futuro.
Com efeito, a perícia é muito mais uma anamnese qualificada e estudo da patologia desde o seu início (instalação), progressão e projeção para o futuro (perspectiva de cura, estabilização ou avanço da doença), do que outra coisa. Perícias incompletas, vai-se repetir à exaustão, ao invés de ajudarem, tornam a decisão judicial mais complicada e, às vezes, impossível. Ao olvidar o futuro, conectado com o passado e o presente, o perito-médico atua de forma imprevidente. Vale dizer, sem a devida atenção aos princípios universais da prevenção/precaução. Não cogita os riscos (evitáveis) de sua decisão (laudo é tomada de decisão) na perspectiva daqueles que serão afetados por sua decisão (as consequências).
Ora, não havendo a menor dúvida de que este profissional não está efetivamente auxiliando o juízo, e aqui se deve considerar esta Corte, limitando-se a responder objetivamente os quesitos formulados e, neste sentido, evidenciado que a prova técnica mostra-se insuficiente para firmar o convencimento do Juízo, ante a sua deficiência, mister se faz a reabertura da instrução processual, não sendo o caso de baixa em diligência para complementação do laudo.
É de se considerar, também, em casos como o da espécie, a nítida conotação social das ações de natureza previdenciária, as quais na sua grande maioria são exercitadas por pessoas hipossuficientes, circunstância que, via de regra, resulta na angularização de uma relação processual de certa forma desproporcional, devendo ser concedida a oportunidade de nova produção da prova pericial, como aliás, já vem sendo feito neste Colegiado em muitos processos em que atuou o referido médico (v.g. AC 5018145-16.2018.4.04.9999, Relator Des. Federal JORGE ANTONIO MAURIQUE, juntado aos autos em 11/10/2019; AC 5000800-66.2020.4.04.9999, Relator Juiz Federal Convocado JOÃO BATISTA LAZZARI, juntado aos autos em 08/06/2020).
Por conseguinte, deve ser anulada a sentença e reaberta a instrução com a realização de perícia judicial por ortopedista, para avaliar, exaustivamente, a alegada incapacidade da parte autora.
Ante o exposto, com a devida vênia do eminente Relator, voto por dar provimento à apelação para anular a sentença e determinar a realização de nova perícia com especialista em ortopedia.
Acompanha o(a) Relator(a) - GAB. 92 (Des. Federal CELSO KIPPER) - Desembargador Federal CELSO KIPPER.
Com a vênia da divergência, acompanho o e. Relator, não vislumbrando razão para o reconhecimento da nulidade - OBJETIVA - da perícia realizada. A meu pensar, o laudo emitido pelo expert, cotejado com a documentação clínica apresentada pela parte autora, possibilita a formação, com segurança, de adequado juízo acerca do quadro de saúde do segurado. Isto porque os atestados de médicos assistentes apresentados dizem respeito exatamente aos períodos em que o segurado recebeu auxílio-doença, não sinalizando, portanto, com possibilidade de desacerto da conclusão pericial.
Conferência de autenticidade emitida em 24/09/2020 12:01:56.
EXTRATO DE ATA DA SESSÃO Virtual DE 03/09/2020 A 11/09/2020
Apelação Cível Nº 5012419-90.2020.4.04.9999/SC
RELATOR: Desembargador Federal SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ
PRESIDENTE: Desembargador Federal CELSO KIPPER
APELANTE: SOLECI ALVES DE OLIVEIRA
ADVOGADO: CLAUDIOMIR GIARETTON (OAB SC013129)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 03/09/2020, às 00:00, a 11/09/2020, às 16:00, na sequência 1025, disponibilizada no DE de 25/08/2020.
Certifico que a Turma Regional suplementar de Santa Catarina, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
PROSSEGUINDO NO JULGAMENTO, APÓS OS VOTOS DO DESEMBARGADOR FEDERAL FERNANDO QUADROS DA SILVA E DO DESEMBARGADOR FEDERAL OSNI CARDOSO FILHO ACOMPANHANDO O RELATOR, A TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DE SANTA CATARINA DECIDIU, POR MAIORIA, VENCIDO O DESEMBARGADOR FEDERAL PAULO AFONSO BRUM VAZ, NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO.
RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ
Votante: Desembargador Federal FERNANDO QUADROS DA SILVA
Votante: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
ANA CAROLINA GAMBA BERNARDES
Secretária
MANIFESTAÇÕES DOS MAGISTRADOS VOTANTES
Acompanha o(a) Relator(a) - GAB. 53 (Des. Federal OSNI CARDOSO FILHO) - Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO.
Acompanho o(a) Relator(a)Pericia que afirmou a inexistência de incapacidade. A sentença foi bem adequada ao caso concreto de significativa indigência de provas, em situação para a qual a prova pericial, realizada por medico ortopedista, assinalou apenas a existência de degeneração natural pela faixa etária, sem que isso acarrete a impossibilidade de trabalhar.
Acompanha o(a) Relator(a) - GAB. 103 (Des. Federal FERNANDO QUADROS DA SILVA) - Desembargador Federal FERNANDO QUADROS DA SILVA.
Acompanho o Relator. No caso dos autos, a perícia já realizada é clara, objetiva e enfática quanto ao quadro de capacidade laboral da parte autora, tendo sido realizado detalhado exame físico, bem como analisados os exames apresentados pela parte autora, não havendo razão que justifique qualquer dúvida relativamente à credibilidade ou à legitimidade profissional do perito designado.
Conferência de autenticidade emitida em 24/09/2020 12:01:56.