Apelação Cível Nº 5015357-24.2021.4.04.9999/SC
RELATOR: Desembargador Federal SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: FABIANO FERNANDES DE ANDRADE
ADVOGADO: KELLY SCHWINDEN DE FREITAS GARCIA (OAB SC034219)
RELATÓRIO
Trata-se de apelação do INSS, em face de sentença que julgou procedente pedido de auxílio-acidente, nos seguintes termos:
(...) À vista do exposto, JULGO PROCEDENTE o pedido formulado na inicial, o que faço com fulcro no artigo 487, I, do Código de Processo Civil, e, em consequência:
a) DETERMINO ao INSS que conceda à parte autora o auxílioacidente previdenciário desde o dia seguinte à cessação administrativa do benefício anterior (23.07.2013);
b) CONDENO o INSS a pagar integralmente à parte autora de uma só vez as parcelas vencidas, mais juros de mora e correção monetária, na forma exata estabelecida na fundamentação da sentença, excluídas as parcelas prescritas;
c) CONCEDO a tutela antecipada requerida pela parte autora (Evento 1, INIC1, fl. 09), para determinar que o INSS implemente, no prazo máximo de quinze dias, em favor da parte autora, o benefício previdenciário de auxílio-acidente, bem como mantenha a benesse até o trânsito em julgado, sob pena de sequestro;
d) CONDENO, ainda, o INSS ao pagamento dos honorários advocatícios e periciais. Os honorários sucumbenciais são arbitrados em 10% (dez por cento) sobre o montante das parcelas vencidas até a prolação da sentença, excluídas as vincendas. Sem custas judiciais, uma vez que a ação foi proposta após a data de entrada em vigor da Lei Estadual n. 17.654/2018 (1º/4/2019), que, em seu art. 7º, inciso I, concedeu isenção em favor da União, Estados, Municípios, Distrito Federal e respectivas autarquias e fundações. Requisitem-se os honorários periciais ao TRF4.
Considerando que o valor da condenação é de fácil identificação e não suplantará o montante previsto no art. 496, § 3º, I, do CPC, o feito não se submete ao instituto da remessa necessária.
Alega em suas razões, que o autor não faz jus ao benefício pleiteado, vez que verteu contribuições ao RGPS como contribuinte individual:
O acidente ocorreu em 23/03/2013, quando a parte autora mantinha qualidade de segurado da Previdência Social na modalidade contribuinte individual, conforme comprovam o CNIS e INFBEN do auxilio-doença, a ele concedido(...)
Aduz ainda:
Considerando a inexistência de previsão legal para concessão de benefício auxilio-acidente a contribuintes individuais, deve ser revogada a tutela antecipatória uma vez que não apresenta mais os requisitos para a sua concessão.
Corrobora com isso o disposto no artigo 296 do Código de Processo Civil, senão vejamos:
Art. 296. A tutela provisória conserva sua eficácia na pendência do processo,mas pode, a qualquer tempo, ser revogada ou modificada. Segundo leciona Ferdie Didier em sua obra " Curso de Direito Processual Civil".
Já que a tutela provisória satisfativa (antecipada) é concedida com base em cognição sumária, em juízo de verossimilhança – sendo passível de revogação ou modificação –, é prudente que seus efeitos sejam reversíveis. Afinal, caso ela não seja confirmada no final do processo, o ideal é que se retorne ao status quo ante, sem prejuízo para a parte adversária ( DIDIER JR., Fredie. Curso de Direito Processual Civil, vol. 2, 11. ed. Salvador: Ed. Jus Podivm, 2016)
Por tudo já exposto resta cristalino a necessidade da revogação imediata da tutela de urgencia, a fim de reduzir seu impacto no erário público.
Requer, por fim:
(...) Eventualmente, se mantida a condenação da autarquia na concessão do benefício, o que se admite tão somente para argumentar - vez que a decisão estaria contrariando frontalmente dispositivos da Lei 8.213/91 -, a matéria deverá ser enfrentada na decisão, para efeito de futura interposição de RECURSO ESPECIAL.
(...) requer seja CONHECIDO e PROVIDO o presente recurso de Apelação, a fim de reformar a sentença de mérito, nos termos da fundamentação.
Com contrarrazões, vieram os autos para Julgamento.
É o relatório.
VOTO
Premissas
A Lei nº 8.213/91 assim dispõe:
Art. 86. O auxílio-acidente será concedido, como indenização, ao segurado quando, após a consolidação das lesões decorrentes de acidente, resultarem sequelas que impliquem redução da capacidade para o trabalho que habitualmente exercia, conforme situações discriminadas no regulamento.
Essa redação, que lhe foi conferida pela Medida Provisória nº 905/2019, substancialmente não discrepa das redações anteriores do mesmo dispositivo.
São pressupostos, portanto, para a concessão do auxílio-acidente: a) qualidade de segurado; b) comprovação da ocorrência de acidente de qualquer natureza; c) sequelas que impliquem redução (ainda que mínima) da capacidade para o trabalho que o segurado habitualmente exercia; d) o nexo entre o acidente e as sequelas.
Pontua-se, ainda, que o auxílio-acidente independe de carência, consoante estabelece o artigo 26, inciso I, da Lei nº 8.213/91.
Todavia, não são todos os segurados que fazem jus a tal benefício, conforme artigo 18, § 1º, da Lei nº 8.213/91, que remete ao artigo 11, incisos I, II, VI e VII, da mesma Lei.
Com efeito, o benefício somente é devido ao empregado (inciso I), ao empregado doméstico (inciso II), ao trabalhador avulso (inciso VI) e ao segurado especial (inciso VII).
O contribuinte individual e microempreendedor individual (MEI), portanto, não tem direito a esse benefício.
Caso concreto
Conforme extrai-se dos autos, a parte autora sofreu acidente de qualquer natureza em 23/3/2013.
Percebeu benefício de auxílio-doença em 23/3/2013 a 23/7/2013 (evento 9).
A perícia judicial, realizada na data 24/9/2020, por médico especialista em ortopedia, conclui que o autor, nascido em 15/7/1976 (45 anos), ensino médio, caminhoneiro autônomo, sofreu acidente de motocicleta em 23/3/2013 que resultou em fratura de pé esquerdo.
A sentença julgou procedente o pedido de concessão do benefício de auxílio-doença.
Pois bem.
Ao analisar o extrato do CNIS, verifica-se que o autor verteu contribuições ao RGPS como contribuinte individual desde 2004.
Assim, é possível concluir que o autor, à época do acidente, no ano de 2013, não possuía a qualidade de segurado beneficiário do auxílio-acidente, nos termos do § 1º do artigo 18 da Lei nº 8.213/1991, na medida em que o benefício somente é devido ao empregado, empregado doméstico, trabalhador avulso e segurado especial.
Neste sentido, recentes julgados desta Turma:
PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-ACIDENTE. CONTRIBUINTE INDIVIDUAL. DESCABIMENTO 1. O auxílio-acidente é prestação previdenciária destinada aos segurados empregado, doméstico, avulso e especial (art. 18, §1º, da Lei n. 8.213). 2. Não é devido auxílio-acidente a quem, na condição de contribuinte individual, na data do infortúnio, experimenta redução da capacidade para o seu trabalho habitual. 3. Apelação do INSS provida. (TRF4, AC 5000060-82.2019.4.04.7206, TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DE SC, Relator PAULO AFONSO BRUM VAZ, juntado aos autos em 18/03/2021)
PREVIDENCIÁRIO. CONCESSÃO DE AUXÍLIO-ACIDENTE. CONTRIBUINTE INDIVIDUAL. 1. Quatro são os requisitos para a concessão do benefício em tela: (a) qualidade de segurado; (b) a consolidação das lesões decorrentes de acidente de qualquer natureza; (c) a redução permanente da capacidade de trabalho; e (d) a demonstração do nexo de causalidade entre o acidente e a redução da capacidade. 2. O contribuinte individual não está inserido entre os beneficiários do auxílio-acidente, nos termos do § 1º do art. 18 da Lei nº 8.213/1991. (TRF4, AC 5012357-84.2019.4.04.9999, TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DE SC, Relatora ELIANA PAGGIARIN MARINHO, juntado aos autos em 21/07/2020)
PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-ACIDENTE. CONTRIBUINTE INDIVIDUAL. AUXÍLIO-DOENÇA. AUSÊNCIA DE INCAPACIDADE. 1. Uma vez filiado ao Regime Geral de Previdência Social como contribuinte individual, o autor não faz jus à concessão de benefício de auxílio-acidente, nos termos do artigo 18, §1º e artigo 19, caput, ambos da Lei nº 8.213/91. 2. Não havendo nos autos comprovação da ocorrência de incapacidade laboral após a cessação do benefício de auxílio-doença, descabe seu restabelecimento. (TRF4, AC 5013089-31.2020.4.04.9999, TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DE SC, Relator SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ, juntado aos autos em 18/03/2021)
Portanto, sendo contribuinte individual desde o ano de 2004, tendo sofrido acidente em 23/3/2013, a parte autora não possuía direito ao percebimento do auxílio-acidente, pois não preenchidos os requisitos ensejadores do benefício pleiteado.
Quem postula a concessão de um benefício previdenciário deve comprovar que é segurado da Previdência Social, ou dependente de um segurado; além disso, se for o caso, ele deve comprovar o preenchimento da carência exigida.
Deve, ainda, comprovar o preenchimento dos requisitos específicos relativos ao benefício que pretende obter. No caso em análise, os seguintes:
Art. 86 - O auxílio-acidente será concedido, como indenização, ao segurado quando, após consolidação das lesões decorrentes de acidente de qualquer natureza, resultar sequelas que impliquem redução da capacidade para o trabalho que habitualmente exercia"):
(a) qualidade de segurado; (b) a superveniência de acidente de qualquer natureza; (c) a redução parcial da capacidade para o trabalho habitual, e (d) o nexo causal entre o acidente e a redução da capacidade.
Essa comprovação independe da ausência de manifestação da autarquia previdenciária acerca de tais requisitos, que decorrem de lei.
Assim, ainda que a autarquia previdenciária nada diga, na contestação, acerca da presença ou não de tais requisitos, não haverá nenhuma surpresa se a sentença ou o acórdão concluir que eles não foram preenchidos.
Feitas essas considerações consigno que a parte autora, sendo contribuinte individual, não está no rol dos segurados beneficiários do auxílio-acidente, conforme exigência legal.
Desta feita, não sendo satisfeitos os requisitos para a concessão do benefício pleiteado, deve ser indeferido o pedido inicial.
Por derradeiro, a reforma da sentença, é medida que se impõe.
Consequentemente, resta revogada a tutela concedida em sentença.
Honorários sucumbenciais
Com a improcedência do pedido, é impositiva a inversão dos ônus da sucumbência, com a condenação da parte autora ao pagamento dos honorários advocatícios, que são fixados em 10% sobre o valor atualizado da causa, com exigibilidade suspensa pela concessão da gratuidade da justiça.
Dispositivo
Ante o exposto, voto por dar provimento à apelação.
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Apelação Cível Nº 5015357-24.2021.4.04.9999/SC
RELATOR: Desembargador Federal SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: FABIANO FERNANDES DE ANDRADE
ADVOGADO: KELLY SCHWINDEN DE FREITAS GARCIA (OAB SC034219)
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. benefício por incapacidade. auxílio-acidente. comprovação dos requisitos. decorrente de lei. qualidade de segurado. contribuinte individual. ARTIGO 18, § 1º, dA lei Nº 8.213/1991. indevido.
1. São requisitos para a concessão do AUXÍLIO-ACIDENTE, previsto no art. 86 da LBPS: (a) qualidade de segurado; (b) a superveniência de acidente de qualquer natureza; (c) a redução parcial da capacidade para o trabalho habitual, e (d) o nexo causal entre o acidente e a redução da capacidade.
2. Quem postula a concessão de um benefício previdenciário deve comprovar o preenchimento dos requisitos específicos relativos ao benefício que pretende obter.
3. Essa comprovação independe da ausência de manifestação da autarquia previdenciária acerca de tais requisitos, que decorrem de lei.
4. A época do acidente sofrido, a parte autora vertia contribuições ao RGPS como contribuinte individual, não possuía, portanto, a qualidade de segurado beneficiário do auxílio-acidente, nos termos do § 1º do artigo 18 da Lei nº 8.213/1991, na medida em que o benefício somente é devido ao empregado, empregado doméstico, trabalhador avulso e segurado especial.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia Turma Regional Suplementar de Santa Catarina do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, dar provimento à apelação, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Florianópolis, 08 de outubro de 2021.
Documento eletrônico assinado por SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40002767172v6 e do código CRC 911a777e.Informações adicionais da assinatura:
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 01/10/2021 A 08/10/2021
Apelação Cível Nº 5015357-24.2021.4.04.9999/SC
RELATOR: Desembargador Federal SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ
PRESIDENTE: Desembargador Federal SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ
PROCURADOR(A): WALDIR ALVES
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: FABIANO FERNANDES DE ANDRADE
ADVOGADO: KELLY SCHWINDEN DE FREITAS GARCIA (OAB SC034219)
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 01/10/2021, às 00:00, a 08/10/2021, às 16:00, na sequência 1574, disponibilizada no DE de 22/09/2021.
Certifico que a Turma Regional suplementar de Santa Catarina, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DE SANTA CATARINA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, DAR PROVIMENTO À APELAÇÃO.
RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ
Votante: Desembargador Federal SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ
Votante: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ
Votante: Juíza Federal ELIANA PAGGIARIN MARINHO
ANA CAROLINA GAMBA BERNARDES
Secretária
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