Apelação Cível Nº 5009311-19.2021.4.04.9999/PR
RELATOR: Desembargador Federal MÁRCIO ANTONIO ROCHA
APELANTE: RAFAEL JUNIOR MATIAS DE SENA
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RELATÓRIO
A parte autora ajuizou ação pleiteando a condenação do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), em danos materiais e morais em razão de indeferimento de benefício por incapacidade.
Processado o feito, sobreveio sentença, publicada em 27.11.2020, por meio da qual o Juízo a quo julgou o pedido nos seguintes termos (ev. 60):
III. DISPOSITIVO
Diante do exposto e do que mais consta nos autos, com fundamento no art. 487, inciso I do CPC, JULGO IMPROCEDENTE a pretensão exposta por RAFAEL MATIAS DE SENA em face do INSS – INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL, nestes autos sob o nº 2570- 34.2019.8.16.0175.
Por consequência, CONDENO a parte autora ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios que fixo em 10% do valor da causa, nos termos do art. 85 §3º, inciso I do Código de Processo Civil.
Opostos embargos de declaração (ev. 66), foram, contudo, rejeitados (ev. 71).
Em suas razões recursais (ev. 77), a parte autora requer a reforma da sentença, sustentando, em síntese, ser trabalhador rural, diagnosticado com CID 10, N° 71.5, hepatopatia, moléstia que lhe acarreta grave problema no fígado. Incapaz para o trabalho, concedeu-lhe o INSS benefício previdenciário, cuja prorrogação requereu em 09.08.2019, sem êxito. Apresentou-se, então, à empresa, para reornar ao labor, que lhe foi negado, sob o argumento de que o trabalho poderia agravar-lhe o estado de saúde. Novamente, encaminhado ao INSS, em m 23/09/2019, 45 dias depois da negativa administrativa, teve deferido o benefício de auxílio-doença. Argumenta, pois, que o indeferimento fora decorrência da incúria do INSS, causando-lhe o não recebimento do salário por 45 dias. O que lhe causou enorme desespero. Afirma que A situação lhe infringiu temor, angústia, impotência e insegurança na manutenção das necessidades básicas de seus filhos e de sua família, resultando, inclusive, num quadro de desespero. Aduz ser incabível a solução jurídica adotada em primeira instância, isto porque entendeu o magistrado se tratar de doenças distinta, o que não convém ao caso.
Assim, entende que a cessação do benefício é um ato absolutamente ilegal, causando prejuízos morais e materiais, desde que ficou sem receber do INSS ou do empregador, durante o período em que perdurou a ilegalidade. O que resultou em inequívocos danos pessoais. De igual modo, entende que ser cabível a indenização em danos materiais, pagando-lhe o INSS o auxílio-doença devido entre a primeira interrupção indevida a partir de 09/08/2019 e o restabelecimento do benefício, em 23/09/2019. Quanto ao montante indenizatório decorrente de dano morais, estipula o valor de R$ 25.000,00 (vinte e cinco mil reais).
Sem contrarrazões, vieram os autos a esta Corte.
É o relatório.
Peço dia para julgamento.
VOTO
Pretende a parte a autora a condenação do INSS a título de reparação de danos morais e materiais, como decorrência de benefício previdenciário por incapacidade indeferido indevidamente.
O Juízo da causa assim se houve quanto ao pleito (ev. 60):
(...)
Neste sentido, tem-se o artigo 186 do Código Civil que consagra a regra da responsabilidade aquiliana: “Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito”.
Segundo Carlos Roberto Gonçalves, “a análise do artigo supratranscrito evidencia que quatro são os elementos essenciais da responsabilidade civil: ação ou omissão, culpa ou dolo do agente, relação de causalidade e o dano experimentado pela vítima”. (GONÇALVES, Carlos Roberto. Responsabilidade Civil. 11ª Edição. Editora Saraiva. São Paulo. 2009. pg.33).
O primeiro elemento a ser questionado quanto à pretensão de responsabilidade civil é a comprovação de ação ou omissão do agente. A lei estabelece que se alguém causar prejuízo a outrem por meio de ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, fica obrigado a reparar. De modo que, para que a responsabilidade se caracterize, mister se faz a prova de que o comportamento do agente causador do dano tenha sido doloso ou pelo menos culposo.
O encargo de comprovar a existência da culpa, imposto à vítima, mostra-se por vezes extremamente difícil, restando muitas vezes insatisfeitas pretensões legítimas pela não desincumbência do ônus da prova.
Importa ressaltar, neste caso, as precisas lições de Candido Rangel Dinamarco acerca do ônus da prova: “Nunca os encargos probatórios devem ser tão pesados para uma das partes, que cheguem ao ponto de dificultar excessivamente a defesa de seus possíveis direitos. Considera-se cumprido o ônus probandi quando a instrução processual houver chegado à demonstração razoável da existência do fato, sem os extremos da exigência de uma certeza absoluta que muito dificilmente se atingirá. A certeza, em termos absolutos, não é o requisito para julgar. Basta que, segundo o juízo comum do homo medius, a probabilidade seja tão grande que os riscos de erro se mostrem suportáveis”. (DINAMARCO, Cândido Rangel. Instituições de Direito Processual Civil. Vol III. Editora Malheiros. São Paulo, 2002, pg. 81).
Destaca-se ainda, a diferença entre convicção e certeza. Enquanto a certeza é objetiva, sendo uma qualidade de fato, a convicção é subjetiva e se forma na mente do magistrado. Para a obtenção de provimento favorável de mérito, cabe à parte promover à convicção do juiz quanto aos fatos alegados, nos casos em que a certeza não emana de uma disposição.
Inarredável neste caso estabelecer a devida distinção entre responsabilidade objetiva e responsabilidade subjetiva.
Segundo Carlos Roberto Gonçalves, “diz-se, pois, ser “subjetiva” a responsabilidade quando se esteia na idéia de culpa. A prova da culpa do agente passa a ser pressuposto necessário do dano indenizável. Dentro desta concepção, a responsabilidade do causador do dano somente se configura se agiu com dolo ou culpa.” (Responsabilidade Civil. 11 ed. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 22).
Note-se, portanto, que a responsabilidade subjetiva tem como elemento preciso a prova robusta de que àquele em que se imputa a causa do ato ilícito, tenha agido para tanto com dolo ou culpa.
Em outra vertente, a responsabilidade objetiva prescinde da comprovação de dolo ou culpa, pois a mesma agrega-se a teoria do risco.
“ Para esta teoria, toda pessoa que exerce alguma atividade cria um risco de dano a terceiros. E deve ser obrigada a repará-lo, ainda que sua conduta seja isenta de culpa. A responsabilidade civil desloca-se da noção de culpa para a idéia de risco, ora encarada como “risco-proveito”, que se funda no princípio segundo o qual é reparável o dano causado a outrem em conseqüência de uma atividade realizada em benefício do responsável (ubi emolumentum, ibi ônus); ora mais genericamente como “risco criado”, a que se subordina todo aquele que, sem indagação de culpa, expuser alguém a suportá-lo. (Carlos Roberto Gonçalves. Responsabilidade Civil. 11 ed. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 22). ”
A regra que dispõe a responsabilidade objetiva está consagrada no artigo 927, parágrafo único do Código Civil, assim disposto:
“Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo. Parágrafo único. Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem.”
Em casos envolvendo o Direito Previdenciário, a relação entre os segurados/dependentes e o INSS demonstra uma relação institucional regida por normas de direito social, de caráter público.
Neste sentido, trata-se de responsabilidade objetiva, que está condicionada ao nexo causal entre o fato e o dano.
Sendo assim, ressalta-se que é perfeitamente possível que o instituto do dano moral seja aplicado ao âmbito previdenciário, desde que um fato praticado pelo agente público cause dano a dignidade, à honra, imagem, etc, do segurado ou dependente.
Por outro lado, o dano moral deve ser analisado no caso concreto, vez que o mero dissabor não caracteriza dano moral, sendo necessário que haja a lesão ao direito da personalidade.
No caso em tela, em que pese a pretensão da parte autora, bem como argumentação dispendida, inexiste qualquer elemento de prova que demonstre que a conduta do INSS ao indeferir o benefício tenha decorrido de ato ilícito.
Nota-se que a decisão do INSS se embasou na perícia realizada na esfera administrativa e esta, por sua vez, não constatou a incapacidade alegada pelo autor.
Quanto a referido ponto, importa tecer algumas considerações.
Nota-se que o benefício que o autor vinha recebendo e fora cessado por conta da perícia realizada no dia 08/08/2019 se referia a incapacidade gerada pela CID R10 – Dor abdominal e pélvica.
Observa-se que o autor se queixava de dores abdominais, sem melhora.
Constata-se, inclusive, que o início da incapacidade pela doença se deu em 11/01/2019.
Entretanto, na perícia realizada no dia 08/08/2019, não fora mais constatada a incapacidade em razão da referida doença.
Por sua vez, ao apresentar o novo pedido administrativo (09/09/2019), com exame datado de 11/09/2019, fora constatada uma nova doença/incapacidade, qual seja, a CID K719 (doença hepática tóxica, sem outra especificação.
Portanto, verifica-se que o benefício fora novamente concedido, todavia, em razão da constatação dessa nova doença e não por causa da anterior (CID R10).
Nota-se que constou a data de início da incapacidade gerada pela CID K719, qual seja, 16/08/2019, sendo que nas considerações, inclusive, houve menção de que o benefício anterior era por conta da dor abdominal.
Observa-se, ainda, que na ocasião da perícia foram apresentados novos exames que demonstraram a alteração da função hepática.
De tal maneira, não houve qualquer ilicitude na conduta do INSS ao indeferir o benefício anteriormente, uma vez que quanto a CID R10 fora constatada a capacidade laborativa, todavia, no momento posterior, em razão da CID K719 fora comprovada a incapacidade, com data de inicio em 16/08/2019, o que ensejou uma nova concessão.
Soma-se a isso que o mero indeferimento de benefício ou cancelamento não se presta a caracterizar o dano moral.
Da mesma forma, não houve qualquer demonstração do efetivo abalo moral.
Vale ressaltar que a mera alegação genérica de prejuízo ou sofrimento não demonstra o dano passível de indenização.
Em outras palavras, cabe a parte interessada/ofendido demonstrar a exposição à situação relevante de constrangimento, humilhação ou outra semelhante, o que não ocorreu no caso concreto.
Sobre o tema:
EMENTA: RESPONSABILIDADE CIVIL. DANO MORAL. INDEFERIMENTO/CASSAÇÃO DE BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. ATO ILÍCITO, NEXO CAUSAL E DANO GRAVE INDENIZÁVEL. INEXISTÊNCIA. São três os elementos reconhecidamente essenciais na definição da responsabilidade civil – a ilegalidade, o dano e o nexo de causalidade entre um e outro. O indeferimento de benefício previdenciário, ou mesmo o cancelamento de benefício por parte do INSS, não se prestam para caracterizar dano moral. Somente se cogita de dano moral quando demonstrada violação a direito subjetivo e efetivo abalo moral, em razão de procedimento flagrantemente abusivo ou ilegal por parte da Administração, o que no caso concreto inocorreu. (TRF4, AC 5000848-40.2017.4.04.7215, QUARTA TURMA, Relatora VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA, juntado aos autos em 21/09/2018)
Sendo assim, não demonstrado o dano e tampouco a ilicitude da conduta da requerida, não há que se falar em indenização por dano moral.
No mesmo sentido, o pedido de indenização por dano material com o pagamento do benefício no período de 09/08/2019 (cessação) e 23/09/2019 (novo deferimento), também não merece acolhimento.
Conforme mencionado anteriormente, a cessação do benefício se deu por ato lícito e correto do INSS, uma vez que quando realizada a pericia, não mais se constatou a incapacidade em razão da CID R10.
Em verdade, se mostra errôneo até mesmo dizer que o benefício fora reestabelecido. Pois embora o autor tenha voltado a receber o benefício de mesma natureza , o motivo que ensejou a nova concessão fora outro , qual seja uma nova incapacidade decorrente de outra doença (CID K719).
De tal maneira, o período em que foi cessado e não houve o recebimento não é devido, uma vez em razão daquela doença (CID R10) que ensejou o término do benefício, de fato, não fora encontrada a incapacidade.
Sendo assim, tal parcela do pedido também há de ser improcedente.
A questão está em que, a juízo da parte autora, havendo reconhecimento do direito ao benefício 45 dias depois de negado, haveria a comprovação da incúria da Autarquia, o que, em conjugação com os dissabores sofridos e com o não percebimento de salário ou benefício resultara em danos morais e materiais.
Pois bem.
O autor esteve em gozo de auxílio-doença no período de 23/11/2018 a 08/08/2019 (NB 6257525830).
A perícia administrativa que deu causa à cessação do benefício, datada de 08/08/2019, não reconhecera incapacidade laborativa, referindo exame clínico com anormalidades discretas, com a notação de que não havia diagnóstico ainda, muito embora conste CID R10 (dor abdominal e pélvica). Destaque-se que as perícias realizadas em 03/01/2019, 29/03/2019, 04/06/2019, todas elas identificaram a mesma patologia. Tais perícias, contudo, à uma, referem dor abdominal.
Pouco mais de um mês depois da perícia que não reconheceu a incapacidade, em 11/09/2019, submetido o segurado a nova perícia administrativa, reconheceu-se a existência da incapacidade, decorrente de CID K719 - Doença hepática tóxica, sem outra especificação.
A modo ilustrativo, a conclusão a que chegou o perito (ev. 4):
Note-se que a doença hepática atestada tem como característica uma condição que danifica o fígado e impede seu bom funcionamento. Tanto pode originar no fígado ou ser resultado de uma metástase de câncer com início em outro órgão. Dentre os vários sintomas de tal patologia, refere-se a dor abdominal.
A conclusão a que se chegou na última pericial administrativa não aberra das maneiras apontadas para diagnóstico da hepatite tóxica. Existindo a possibilidade de identificá-la em anamnese e exame físico.
Releva notar que o INSS na última perícia identificou o início da doença em 05.11.2018 e o início da incapacidade em 16.08.2019:
Ou seja, a seguir-se a linha de raciocínio do INSS, o segurado ficou incapacitado apenas oito dias após a perícia de cessação do benefício. Não se mostra razoável, pois. a solução adotada na origem.
Não se trata, diga-se, de nova patologia, apenas se procedera a um diagnóstico mais específico. A dor abdominal era a consequência da doença hepática tóxica.
Raciocínio que tal não é só corroborado pelas regras de experiência, como também pela prova técnica documental acostada aos autos, tendo em vista que há atestado médico, que muito embora não datado, está subscrito por médico do trabalho, aludindo ao tratamento do segurado quanto a doença hepática (ev. 1.5):
Por tais razões, persuade-se que o segurado estava realmente incapacitado ao tempo da negativa administrativa, fazendo jus ao benefício entre a cessação do benefício (NB 6257525830), DCB em 08/08/2019, e DIB em 09/09/2019 (NB 6294729320).
Tem neste ponto razão o apelante.
Procede-se ao exame da configuração dos danos morais.
Indenização por danos morais
A indenização por danos morais prevista no art. 5º, V, da Constituição Federal, visa compensar lesão causada à imagem, à honra ou à estética da pessoa que sofreu o dano, mediante pagamento de um valor estimado em pecúnia. Deste modo, deve ser analisado o caso concreto para aferir se houve a ocorrência de algum ato ilícito, e esse ato causou dano, e, ainda, se há nexo causal entre o ato e o dano, que implicaria responsabilidade do INSS em reparar os prejuízos resultantes do procedimento em sua atuação administrativa.
Observa-se que, em regra, os atos administrativos relativos à concessão, manutenção e revisão de benefícios previdenciários não ensejam, por si só, direito à indenização por danos morais, uma vez que se trata de regular atuação da Administração, podendo conceder, indeferir, revisar e cessar os benefícios concedidos.
O indeferimento ou a cessação do benefício concedido gera, sem dúvida, transtorno ou aborrecimento, que não se confundem, no entanto, com violência ou dano à esfera subjetiva do segurado, quando não há demonstração de que a Administração, por ato de seus prepostos, tenha desbordado dos limites legais de atuação.
Nesse sentido:
PREVIDENCIÁRIO. RESTABELECIMENTO DE PENSÃO POR MORTE. DEPENDÊNCIA ECONÔMICA. REQUISITO INCONTROVERSO. QUALIDADE DE SEGURADO. DEMONSTRAÇÃO. INEXIGIBILIDADE DE DÉBITO. ATUALIZAÇÃO MONETÁRIA. DANO MORAL. (...) 2. Incabível indenização por dano moral em razão do indevido indeferimento/cancelamento de benefício previdenciário, pois não possui o ato administrativo o condão de provar danos morais experimentados pelo segurado (...) (TRF4, REOAC 0006502-20.2016.404.9999, 6ª T., Relator Des. Federal João Batista Pinto Silveira, D.E. 02.08.2016)
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO CESSADO POR EQUÍVOCO ADMINISTRATIVO. DESCONTO INDEVIDO. RESTABELECIMENTO. DANO MORAL. CASO DE INCABIMENTO. (...). Os atos administrativos relativos à concessão, manutenção e revisão de benefícios previdenciários, por si só não implicam ao INSS indenização por danos morais. Ausente a comprovação de ofensa ao patrimônio subjetivo do segurado, bem como de o ato administrativo ter sido desproporcionalmente desarrazoado, inexiste direito à indenização por dano moral (...) (TRF4, AC 5003795-21.2017.4.04.7004, TRS/PR, Relator Des. Federal Márcio Antônio Rocha, 26.04.2019)
PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-RECLUSÃO. DANOS MORAIS. INOCORRÊNCIA. (...) Para que se reconheça o dever de pagamento de indenização por danos morais, deve haver prova de transtorno psicológico causado ao ofendido, que transcenda aos fatos cotidianos, bem como deve restar comprovada a relação causal entre a conduta supostamente ilícita do ofensor e o prejuízo extrapatrimonial experimentado pela vítima o que, no caso em tela, não se verificou. A jurisprudência tem se manifestado no sentido de que o mero indeferimento do benefício previdenciário não configura dano moral. (...) (TRF4, AC 5020619-57.2018.4.04.9999, TRS/PR, Relator Des. Federal Márcio Antônio Rocha, 31.10.2018)
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIOS POR INCAPACIDADE. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ E AUXÍLIO-DOENÇA. DESCUMPRIMENTO DE DETERMINAÇÃO JUDICIAL NÃO GERA INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. A jurisprudência é unânime no sentido do não cabimento de indenização por danos morais no caso de não concessão ou de não restabelecimento de benefício previdenciário, ainda que por descumprimento de determinação judicial. O desconforto gerado pelo não-recebimento temporário do benefício resolve-se na esfera patrimonial, mediante o pagamento de todos os atrasados, com juros e correção monetária. Precedentes. (TRF4, AC 5016362-86.2018.4.04.9999, TRS/PR, Relator Juiz Federal Marcos Josegrei da Silva, 28.03.2019)
DIREITO PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO/CONTRIBUIÇÃO. AVERBAÇÃO DE TEMPO DE SERVIÇO ESPECIAL. HABITUALIDADE. EPI. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. (...). 6. Incabível o direito à reparação pelos danos morais sofridos pelo Autor porquanto não há prova nos autos de que tenham ocorrido os alegados abalos de ordem moral, bem como o respectivo nexo causal. O indeferimento do benefício na via administrativa, por si só, não implica direito à indenização. (...) (TRF4 5035184-75.2013.4.04.7000, TRS/PR, Relator Des. Federal Luiz Fernando Wowk Penteado, 20.08.2018)
Com efeito, a teor do entendimento jurisprudencial deste Tribunal traduzido nos precedentes citados, inexiste no caso concreto fundamento para o reconhecimento da ocorrência de dano moral, pois a conduta da administração não desbordou dos limites de sua atuação, ou seja, não é o caso de dano moral in re ipsa, porque não convém em termos presumir-se ilegal ato legalmente praticado.
De toda sorte, o provimento ora obtido restabelece os ganhos e as parcelas que lhe foram negadas, corrigindo a distorção financeira causada.
Solução semelhante adotou-se em precedente desta Turma:
PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. RESTABELECIMENTO. REVISÃO ADMINISTRATIVA. DECADÊNCIA. CANCELAMENTO DO BENEFÍCIO ORIGINÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE. QUALIDADE DE SEGURADO ESPECIAL. IRREGULARIDADE. MÁ-FÉ. NÃO COMPROVAÇÃO. PROTEÇÃO PREVIDENCIÁRIA. RESTABELECIMENTO DO BENEFÍCIO DE PENSÃO. DETERMINAÇÃO. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. NÃO CABIMENTO. CONSECTÁRIOS LEGAIS DA CONDENAÇÃO. PRECEDENTES DO STF (TEMA 810) E STJ (TEMA 905). CONSECTÁRIOS DA SUCUMBÊNCIA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. MAJORAÇÃO. 1. A possibilidade de o INSS rever e anular seus próprios atos, quando eivados de vícios que o tornem ilegais (buscando ou não a devolução de valores percebidos indevidamente) é consagrada nas Súmulas 346 e 473 do Supremo Tribunal Federal, passando posteriormente a contar com previsão legal expressa (artigo 53 da Lei nº 9.784/99 e art. 103-A, da Lei nº 8.213/91, introduzido pela Lei nº 10.839/04). Malgrado este poder-dever não ser ilimitado no tempo, tem-se que a má-fé do segurado/beneficiário - quando da concessão do benefício - afasta a decadência. 2. Caso em que fora cancelada a pensão por morte em razão da perda da qualidade de segurado da instituidora, com base em suposta fraude na concessão de sua aposentadoria por idade. Refutada a nulidade aventada e confirmada a higidez da condição de segurado da falecida, a cessação do benefício decorrente (pensionamento) mostra-se incorreto sendo devido seu imediato restabelecimento, quando cancelado de ofício na esfera administrativa. 3. A fim de caracterizar os requisitos para a existência do dano moral, é necessária uma conjunção de circunstâncias, quais sejam: fato gerador e a ocorrência do dano, bem como o nexo causal entre a conduta e o resultado danoso. Não se configura a hipótese de ilícito quando a conduta administrativa é pautada na aplicação da lei, segundo entende cabível e conforme apurado pelo órgão previdenciário, não havendo má-fé na conduta que logrou estar corrigindo um possível ilícito para com o erário. 4. Critérios de correção monetária e juros de mora conforme decisão do STF no RE nº 870.947/SE (Tema 810) e do STJ no REsp nº 1.492.221/PR (Tema 905). 5. Improvido o recurso do INSS, majora-se a verba honorária, elevando-a de 10% para 15% sobre o montante das parcelas vencidas (Súmulas 111 do STJ e 76 do TRF/4ª Região), consideradas as variáveis dos incisos I a IV do § 2º e o § 11, ambos do artigo 85 do CPC. (TRF4, AC 5018472-58.2018.4.04.9999, TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DO PR, Relator FERNANDO QUADROS DA SILVA, juntado aos autos em 02/10/2020)
Nos termos das razões que venho de expender, julga-se parcialmente procedente o apelo, apenas quanto ao direito ao benefício de auxílio-doença no período de 08/08/2019 e 09/09/2019.
Consectários da Condenação
Correção Monetária
A correção monetária incidirá a contar do vencimento de cada prestação e será calculada pelo INPC a partir de abril de 2006 (Lei 11.430/06, que acrescentou o artigo 41-A à Lei 8.213/91), conforme decisão do Supremo Tribunal Federal no Tema 810, RE 870.947, Pleno, Rel. Min. Luiz Fux, DJE de 20.11.2017, item "2" (embargos de declaração rejeitados sem modulação dos efeitos em 03.10.2019, trânsito em julgado em 03.03.2020), e do Superior Tribunal de Justiça no Tema 905, REsp. 1.492.221/PR, 1ª Seção, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, DJe de 20.03.2018 , item "3.2" da decisão e da tese firmada.
Juros Moratórios
a) os juros de mora, de 1% (um por cento) ao mês, serão aplicados a contar da citação (Súmula 204 do STJ), até 29.06.2009;
b) a partir de 30.06.2009, os juros moratórios serão computados de acordo com os índices oficiais de remuneração básica e juros aplicados à caderneta de poupança, conforme dispõe o artigo 5º da Lei 11.960/09, que deu nova redação ao artigo 1º-F da Lei 9.494/97, consoante decisão do STF no RE 870.947, DJE de 20.11.2017.
Honorários Advocatícios
Os honorários advocatícios são devidos, em regra, no patamar de 10%, observados os percentuais mínimos previstos em cada faixa do § 3º do art. 85 do Código de Processo Civil para as condenações proferidas a partir de 18.03.2016, considerando as parcelas vencidas até a data da sentença de procedência ou do acórdão que reforma a sentença de improcedência, nos termos das Súmulas nº 111 do Superior Tribunal de Justiça e nº 76 deste Tribunal Regional Federal da 4ª Região, respectivamente:
Os honorários advocatícios, nas ações previdenciárias, não incidem sobre as prestações vencidas após a sentença.
Os honorários advocatícios, nas ações previdenciárias, devem incidir somente sobre as parcelas vencidas até a data da sentença de procedência ou do acórdão que reforme a sentença de improcedência.
Improvido o apelo, majoro a verba honorária, elevando-a de 10% para 15% sobre o valor atualizado da causa, cuja exigibilidade fica suspensa em face do benefício da gratuidade da justiça.
Custas
O INSS é isento do pagamento das custas processuais no Foro Federal (artigo 4.º, I, da Lei n.º 9.289/96), mas não quando demandado na Justiça Estadual do Paraná (Súmula 20 do TRF/4ª Região).
Prequestionamento
Objetivando possibilitar o acesso das partes às Instâncias Superiores, considero prequestionadas as matérias constitucionais e/ou legais suscitadas nos autos, conquanto não referidos expressamente os respectivos artigos na fundamentação do voto, nos termos do art. 1.025 do Código de Processo Civil.
Conclusão
- apelação: provida parcialmente para reconhecer o direito ao benefício de auxílio-doença no período compreendido entre 08/08/2019 e 09/09/2019.
Dispositivo
Ante o exposto, voto por dar parcial provimento à apelação.
Documento eletrônico assinado por MÁRCIO ANTÔNIO ROCHA, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40002615598v32 e do código CRC c2f74cb1.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): MÁRCIO ANTÔNIO ROCHA
Data e Hora: 2/7/2021, às 14:39:15
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Apelação Cível Nº 5009311-19.2021.4.04.9999/PR
RELATOR: Desembargador Federal MÁRCIO ANTONIO ROCHA
APELANTE: RAFAEL JUNIOR MATIAS DE SENA
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. benefício por incapacidade. AUXÍLIO-DOENÇA. REQUISITOS. qualidade de segurado. INCAPACIDADE laboral. PROVA. DANOS MORAIS. INOCORRÊNCIA
1. São requisitos para a concessão dos benefícios previdenciários por incapacidade: a qualidade de segurado; o cumprimento do período de carência, salvo nos casos excepcionados por lei; e a incapacidade para o trabalho, de caráter permanente (aposentadoria por invalidez) ou temporário (auxílio-doença).
2. O segurado portador de enfermidade que o incapacita temporariamente para o exercício de sua atividade laboral tem direito à concessão do benefício de auxílio-doença.
3. Para que se reconheça o dever de pagamento de indenização por danos morais, deve haver prova de transtorno psicológico causado ao ofendido, que transcenda aos fatos cotidianos, bem como deve restar comprovada a relação causal entre a conduta supostamente ilícita do ofensor e o prejuízo extrapatrimonial experimentado pela vítima o que, no caso em tela, não se verificou. A jurisprudência tem se manifestado no sentido de que o mero indeferimento do benefício previdenciário não configura dano moral.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia Turma Regional Suplementar do Paraná do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, dar parcial provimento à apelação, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Curitiba, 29 de junho de 2021.
Documento eletrônico assinado por MÁRCIO ANTÔNIO ROCHA, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40002615599v5 e do código CRC 3f8e4a69.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): MÁRCIO ANTÔNIO ROCHA
Data e Hora: 2/7/2021, às 14:39:15
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO Virtual DE 22/06/2021 A 29/06/2021
Apelação Cível Nº 5009311-19.2021.4.04.9999/PR
RELATOR: Desembargador Federal MÁRCIO ANTONIO ROCHA
PRESIDENTE: Desembargadora Federal CLAUDIA CRISTINA CRISTOFANI
PROCURADOR(A): SERGIO CRUZ ARENHART
APELANTE: RAFAEL JUNIOR MATIAS DE SENA
ADVOGADO: WALTER FRANCISCO LAUREANO (OAB PR018003)
ADVOGADO: LUCAS GOES DOS SANTOS (OAB PR068378)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 22/06/2021, às 00:00, a 29/06/2021, às 16:00, na sequência 1236, disponibilizada no DE de 11/06/2021.
Certifico que a Turma Regional suplementar do Paraná, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DO PARANÁ DECIDIU, POR UNANIMIDADE, DAR PARCIAL PROVIMENTO À APELAÇÃO.
RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal MÁRCIO ANTONIO ROCHA
Votante: Desembargador Federal MÁRCIO ANTONIO ROCHA
Votante: Juiz Federal ARTUR CÉSAR DE SOUZA
Votante: Desembargadora Federal CLAUDIA CRISTINA CRISTOFANI
SUZANA ROESSING
Secretária
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