APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 5042640-32.2015.4.04.9999/PR
RELATOR | : | Des. Federal AMAURY CHAVES DE ATHAYDE |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELADO | : | LENI DE AZEVEDO LEMOS BORDIN |
ADVOGADO | : | Ana Paula Verona |
: | LIZ REJANE SOUZA TAZONIERO | |
MPF | : | MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL |
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO POR INCAPACIDADE. COISA JULGADA. INOCORRÊNCIA. AUXÍLIO-DOENÇA. REQUISITOS. CAPACIDADE LABORATIVA. PROVA PERICIAL. CUSTAS PROCESSUAIS. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. HONORÁRIOS PERICIAIS. GRATUIDADE DA JUSTIÇA.
1. Para o reconhecimento da coisa julgada, é necessário que haja tríplice identidade entre as ações - de partes, de pedido e de causa de pedir.
2. Ainda que a ação se baseie em requerimento administrativo posterior, cumpre ao segurado demonstrar que houve mudança na situação fática (superveniência de nova moléstia ou agravamento da doença preexistente), o que sucede quando junta aos autos documentos médicos posteriores ao trânsito em julgado da primeira ação.
3. Havendo o laudo pericial concluído que a parte autora, mesmo acometida por enfermidades de ordem psiquiátrica (episódio depressivo leve e transtorno ansioso inespecífico), não está incapacitada para o exercício de sua atividade habitual (agricultura) - e não havendo prova robusta em sentido contrário -, deve ser indeferido o pedido de concessão de auxílio-doença.
4. Embora o magistrado não esteja vinculado ao laudo pericial, a formação do convencimento judicial se dá predominantemente a partir das conclusões do perito; apenas em hipóteses excepcionais é que cabe ao juiz, com base em sólida prova em contrário, afastar-se da conclusão apresentada pelo expert.
5. Cabe à parte vencida arcar com os honorários advocatícios sucumbenciais e com as custas processuais, restando suspensa a exigibilidade da cobrança quando a parte litiga sob o pálio da Gratuidade da Justiça.
6. Quando a parte sucumbente goza da Gratuidade da Justiça, incumbe ao próprio Poder Judiciário arcar com os honorários periciais.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 1a. Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento à apelação e à remessa necessária, nos termos do relatório, votos e notas taquigráficas que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Curitiba, 04 de setembro de 2017.
Desembargador Federal AMAURY CHAVES DE ATHAYDE
Relator
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RELATÓRIO
O Sr. Desembargador Federal
AMAURY CHAVES DE ATHAYDE (Relator):
Trata-se de remessa necessária e de recurso de apelação interposto contra sentença que, em ação ordinária, julgou procedente o pedido, determinando a concessão do benefício de auxílio-doença à parte autora desde a data do requerimento administrativo, com o pagamento das parcelas vincendas.
A parte apelante alega, inicialmente, que o exame do mérito da presente demanda está obstado pela existência de coisa julgada. Refere, nessa linha, que a parte autora propôs ação com o mesmo objeto perante a Justiça Federal, em que restou assentada - em decisão transitada em julgado - a capacidade da autora para o exercício de sua atividade habitual. Rejeita a existência de qualquer mudança no quadro fático, tendo em vista o curtíssimo espaço de tempo entre a baixa da primeira ação e o ajuizamento da segunda. No mérito, aponta que o laudo pericial concluiu pela capacidade laboral da autora, o que afasta a concessão de auxílio-doença. Sublinha que apenas a incapacidade total para o labor autoriza a concessão de auxílio-doença, sendo insuficiente a mera redução dessa capacidade. Requer, assim, a reforma da sentença a fim de que o processo seja extinto sem resolução do mérito em razão da coisa julgada; sucessivamente, pretende que o pedido deduzido na inicial seja julgado improcedente.
Sem contrarrazões, vieram os autos a este Tribunal.
É o relatório. Peço dia.
Desembargador Federal AMAURY CHAVES DE ATHAYDE
Relator
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APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 5042640-32.2015.4.04.9999/PR
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VOTO
O Sr. Desembargador Federal
AMAURY CHAVES DE ATHAYDE (Relator):
Coisa julgada
Cuida-se de perquirir se o exame do mérito do pedido deduzido na petição inicial está obstado pela coisa julgada material (pressuposto processual negativo), ex vi do art. 267, V, do CPC/1973 (art. 485, V, do CPC/2015).
O desate da controvérsia passa pelo exame da semelhança entre as ações, uma vez que o óbice da coisa julgada exsurge apenas quando configurada a tríplice identidade das demandas, ou seja, a identidade de partes, de pedido e de causa de pedir (art. 301, § 2º, CPC/1973; art. 337, § 2º, CPC/2015). A alteração de quaisquer desses elementos identificadores afasta, com efeito, a incidência da coisa julgada.
No que tange à causa de pedir, é cediço que, pela teoria da substanciação, ela é composta pelos fundamentos jurídicos e fáticos que sustentam o pedido. Conforme assentou José Rogério Cruz e Tucci, "compõem a causa petendi o fato (causa remota) e o fundamento jurídico (causa próxima)" (in A causa petendi no processo civil. 2ª Ed. São Paulo: RT, 2001, p. 154).
A constatação é especialmente relevante em relações jurídicas continuativas, de que constitui exemplo aquela envolvendo o segurado e a Previdência Social, pois a alteração de uma circunstância fática, por representar modificação da própria causa de pedir, é capaz de justificar a propositura de nova ação. Afinal, por se lastrear em fatos novos, a nova ação não se confunde com a demanda anterior, já acobertada pelo manto da coisa julgada. Em ações que visam ao reconhecimento da incapacidade do segurado, a alteração dos fundamentos fáticos do pedido consubstancia-se no surgimento de nova moléstia ou mesmo no agravamento da enfermidade noticiada na primeira ação.
Note-se que, a rigor, não se está a falar em relativização da coisa julgada, pois as demandas são distintas. Ocorre, simplesmente, que a coisa julgada não incide na nova demanda, pois se trata de uma ação diversa daquela que ensejou a formação da res judicata.
Nesse sentido, ademais, sedimentou-se a jurisprudência desta Corte, conforme se percebe a seguir:
PREVIDENCIÁRIO. COISA JULGADA. AGRAVAMENTO DE DOENÇA INCAPACITANTE PARA O TRABALHO. Este Tribunal afasta a preliminar de coisa julgada em processos em que se requeria benefício por incapacidade quando comprovado agravamento do estado de saúde superveniente ao trânsito em julgado da decisão no processo anterior.
(TRF4, AC 5002000-91.2014.404.7001, 6ª Turma, rel. Juiz Federal Marcelo de Nardi, j. aos autos em 23/05/2017) - destaquei
........................................................................................................................
PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-DOENÇA. INCAPACIDADE PARCIAL E TEMPORÁRIA. COISA JULGADA. INOCORRÊNCIA. CORREÇÃO MONETÁRIA E JUROS DE MORA. FASE DE CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. DIFERIMENTO. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. 1. Comprovada a incapacidade total e permanente para o exercício das atividades laborativas, reconhece-se o direito à aposentadoria por invalidez. 2. Não afronta a coisa julgada o pedido de benefício por incapacidade cuja causa de pedir foi modificada pela superveniência de fato novo. O agravamento de doença ou nova situação de incapacidade após breve período de recuperação, é fato modificador da causa de pedir. 3. Deliberação sobre índices de correção monetária e taxas de juros diferida para a fase de cumprimento de sentença, a iniciar-se com a observância dos critérios da Lei 11.960/2009, de modo a racionalizar o andamento do processo, permitindo-se a expedição de precatório pelo valor incontroverso, enquanto pendente, no Supremo Tribunal Federal, decisão sobre o tema com caráter geral e vinculante. Precedentes do STJ e do TRF da 4ª Região. 4. Os honorários advocatícios são devidos à taxa 10% sobre as prestações vencidas até a data da decisão de procedência (sentença ou acórdão), nos termos das Súmulas n.º 76 deste Tribunal Regional e n.º 111 do Superior Tribunal de Justiça.
(TRF4, AC 0015002-12.2015.404.9999, 5ª Turma, rel. Juíza Federal Taís Schilling Ferraz, D.E. 24/04/2017) - destaquei
No caso em apreço, a parte autora requer, perante a Justiça Estadual (no exercício de competência delegada), a concessão de auxílio-doença, alegando estar incapacitada para o trabalho em razão das seguintes enfermidades: episódio depressivo moderado (CID 10 F. 32.1) e transtorno de pânico (CID 10 F 41.0). Aparelha a petição inicial com diversos atestados médicos, sendo que o mais recente é datado de 24/09/2012 (evento 1, OUT3, p. 1).
Ocorre que a parte autora também requereu benefício por incapacidade, em razão das mesmas enfermidades, no bojo do Processo nº 5003576-09.2011.404.7007, que tramitou perante a Justiça Federal. O pedido foi julgado improcedente pelo juízo de primeiro grau, em sentença que transitou em julgado em 19/07/2012 (evento 39).
Ressalto que cada ação tem por origem a negativa administrativa à concessão de benefícios de números distintos, a denotar a existência de diversos pedidos administrativos. Entretanto, a existência de novo pedido administrativo, formulado após o trânsito em julgado da primeira demanda, é insuficiente para configurar a alteração dos fatos que embasam o pedido e, por conseguinte, da causa de pedir. Para tanto, é indispensável que seja demonstrado o surgimento de nova moléstia ou o agravamento da enfermidade, o que exige, naturalmente, a apresentação de novos documentos médicos.
Friso que tais documentos médicos devem ser posteriores ao trânsito em julgado da demanda, pois, enquanto tramitava o processo, poderiam ser acostados aos autos, por se destinarem a comprovar fato novo (arts. 397 e 517 do CPC/1973; arts. 435 e 1.014 do CPC/2015). Logo, a juntada de documento que não foi apresentado na primeira ação mas poderia tê-lo sido (por ser anterior ao trânsito em julgado) não autoriza, por si só, a propositura de nova demanda.
A corroborar o exposto, transcrevo precedentes desta Corte:
PREVIDENCIÁRIO E PROCESSO CIVIL. BENEFÍCIO POR INCAPACIDADE. COISA JULGADA. OCORRÊNCIA. SENTENÇA DE EXTINÇÃO SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO MANTIDA. 1. Para o reconhecimento da coisa julgada é necessário que entre uma e outra demanda seja caracterizada a chamada "tríplice identidade" - de partes, de pedido e de causa de pedir -, sendo que a variação de quaisquer desses elementos identificadores afasta a ocorrência de coisa julgada. 2. Em ações objetivando benefício por incapacidade a modificação do suporte fático dá-se pela superveniência de nova moléstia ou pelo agravamento de moléstia preexistente que justifique a concessão de novo benefício. 3. Ainda que a ação se baseie em requerimento administrativo posterior, o segurado não se desincumbe do dever de demonstrar que houve mudança na situação fática, que se dá pelo agravamento da doença já existente ou pela constatação de patologia incapacitante diversa, o que na espécie não ocorreu. 4. Mantida a sentença que extinguiu o feito pela existência da coisa julgada, com base no art. 485, V, do CPC/2015.
(TRF4, AC 5006030-74.2016.404.7107, 6ª Turma, rel. Des. Federal Vânia Hack de Almeida, j. aos autos em 05/06/2017) - destaquei
........................................................................................................................
PREVIDENCIÁRIO. COISA JULGADA - INEXISTÊNCIA. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ/AUXÍLIO-DOENÇA. REQUISITOS. INCAPACIDADE. COMPROVAÇÃO. 1. Não há falar em coisa julgada quando o processo anterior envolve fatos posteriores ao trânsito em julgado da ação pretérita. 2. Quatro são os requisitos para a concessão do benefício em tela: (a) qualidade de segurado do requerente; (b) cumprimento da carência de 12 contribuições mensais; (c) superveniência de moléstia incapacitante para o desenvolvimento de qualquer atividade que garanta a subsistência; e (d) caráter definitivo/temporário da incapacidade. 3. Hipótese em que restou comprovada a incapacidade laborativa. (TRF4, AC 0000867-24.2017.404.9999, 5ª Turma, rel. Des. Federal Paulo Afonso Brum Vaz, D.E. 01/06/2017) - destaquei
Compulsando os autos, vejo que a inicial veio instruída com atestado médico emitido em 24/09/2012, ou seja, em momento posterior ao trânsito em julgado da primeira demanda (19/07/2012). Note-se, ainda, que esse atestado médico conclui pela incapacidade laboral temporária ("sugiro afastamento laboral pelo momento" - evento 1, OUT3, p. 1).
Logo, há evidência segura do agravamento da moléstia, representando genuína alteração da causa de pedir, a afastar o óbice da coisa julgada. Portanto, não há obstáculo ao exame do mérito do pedido deduzido na petição inicial.
Mérito - concessão de auxílio-doença
Cumpre, de início, rememorar o tratamento legal conferido aos benefícios de auxílio-doença e de aposentadoria por invalidez.
O art. 59 da Lei n.º 8.213/91 (Lei de Benefícios da Previdência Social - LBPS) estabelece que o auxílio-doença será devido ao segurado que, havendo cumprido, quando for o caso, o período de carência exigido em lei, ficar incapacitado para o seu trabalho ou para a sua atividade habitual por mais de 15 (quinze) dias consecutivos. Por sua vez, o art. 42 da Lei nº 8.213/91 estatui que a aposentadoria por invalidez será concedida ao segurado que, tendo cumprido a carência, for considerado incapaz e insuscetível de reabilitação para o exercício de atividade que lhe garanta a subsistência. O art. 25 desse diploma legal esclarece, a seu turno, que a carência exigida para a concessão de ambos os benefícios é de 12 (doze) meses, salvo nos casos em que é expressamente dispensada (art. 26, II).
Em resumo, portanto, a concessão dos benefícios depende de três requisitos: (a) a qualidade de segurado do requerente à época do início da incapacidade (artigo 15 da LBPS); (b) o cumprimento da carência de 12 contribuições mensais, exceto nas hipóteses em que expressamente dispensada por lei; (c) o advento, posterior ao ingresso no RGPS, de moléstia incapacitante para o desenvolvimento de atividade laboral que garanta a subsistência do segurado.
Note-se que a concessão do auxílio-doença não exige que o segurado esteja incapacitado para toda e qualquer atividade laboral; basta que esteja incapacitado para a sua atividade habitual. É dizer: a incapacidade pode ser total ou parcial. Além disso, pode ser temporária ou permanente. Nisso, precisamente, é que se diferencia da aposentadoria por invalidez, que deve ser concedida apenas quando constatada a incapacidade total e permanente do segurado. Sobre o tema, confira-se a lição doutrinária de Daniel Machado da Rocha e de José Paulo Baltazar Júnior:
A diferença, comparativamente à aposentadoria por invalidez, repousa na circunstância de que para a obtenção de auxílio-doença basta a incapacidade para o trabalho ou atividade habitual do segurado, enquanto para a aposentadoria por invalidez exige-se a incapacidade total, para qualquer atividade que garanta a subsistência. Tanto é assim que, exercendo o segurado mais de uma atividade e ficando incapacitado para apenas uma delas, o auxílio-doença será concedido em relação à atividade para a qual o segurado estiver incapacitado, considerando-se para efeito de carência somente as contribuições relativas a essa atividade (RPS, art. 71, § 1º) (in ROCHA, Daniel Machado da. BALTAZAR JÚNIOR, José Paulo. Comentários à Lei de Benefícios da Previdência Social. 15. ed. rev., atual. e ampl. - São Paulo: Atlas, 2017).
De qualquer sorte, o caráter da incapacidade (total ou parcial) deve ser avaliado não apenas por um critério médico, mas conforme um juízo global que considere as condições pessoais da parte autora - em especial, a idade, a escolaridade e a qualificação profissional - a fim de se aferir, concretamente, a sua possibilidade de reinserção no mercado de trabalho.
Cumpre demarcar, ainda, a fungibilidade entre as ações previdenciárias, tendo em vista o caráter eminentemente protetivo e de elevado alcance social da lei previdenciária. De fato, a adoção de soluções processuais adequadas à relação jurídica previdenciária constitui uma imposição do princípio do devido processo legal, a impor uma leitura distinta do princípio dispositivo e da adstrição do juiz ao pedido (José Antônio Savaris. Direito processual previdenciário. 6 ed., rev. atual. e ampl. Curitiba: Alteridade Editora, 2016, p. 67). Por isso, aliás, o STJ sedimentou o entendimento de que "não constitui julgamento extra ou ultra petita a decisão que, verificando não estarem atendidos os pressupostos para concessão do benefício requerido na inicial, concede benefício diverso cujos requisitos tenham sido cumpridos pelo segurado" (AgRG no AG 1232820/RS, Rel. Min. Laurita Vaz, 5ª Turma, j. 26/10/20, DJe 22/11/2010).
No caso em comento, controverte-se sobre a capacidade laboral da parte autora. Não obstante, o laudo pericial é conclusivo no sentido de que a parte autora não apresenta incapacidade para o exercício de sua atividade habitual (agricultura). De fato, o perito assegurou que o episódio depressivo apresentado pela autora é leve (e não moderado, como alegado na inicial) e que, "nos casos de depressão leve o trabalho é salutar e benéfico para o tratamento" (evento 46, quesito 10 do INSS). Ressaltou tratar-se de "doença não incapacitante, controlada com medicamentos" (quesito 1 do INSS). Noutra oportunidade, em termos inequívocos, concluiu: "não se caracteriza incapacidade laboral" (quesito 6 do INSS).
Ressalto que os demais documentos acostados aos autos não possuem o condão de infirmar a conclusão esboçada pelo expert, o qual, como é sabido, além do conhecimento técnico, possui eqüidistância das partes. Reconheço, por certo, que o juiz não está vinculado ao laudo pericial judicial (art. 479, CPC). Todavia, conforme reiteradamente afirmado por esta Corte, "a concessão de benefício previdenciário por incapacidade decorre da convicção judicial formada predominantemente a partir da produção de prova pericial" (TRF4, APELREEX 0013571-06.2016.404.9999, SEXTA TURMA, Relatora SALISE MONTEIRO SANCHOTENE, D.E. 11/07/2017). Apenas em situações excepcionais é que o magistrado pode, com base em sólida prova em contrário, afastar-se da conclusão apresentada pelo perito - hipótese de que, aqui, não se cuida.
Desse modo, não estando configurada a incapacidade laboral, não é devida a concessão de benefício por incapacidade. Resta prejudicado, por conseguinte, o exame do preenchimento dos demais requisitos para a concessão do benefício.
Ônus sucumbenciais
A reforma da sentença impõe, naturalmente, a inversão dos ônus sucumbenciais. Cumpre, assim, que a parte autora seja condenada ao pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios sucumbenciais. Passo, então, à quantificação da verba honorária sucumbencial.
Tendo em vista os critérios elencados no art. 20, § 3º, do CPC/1973 (aplicável ao feito, pois vigente à época da publicação da sentença) - o grau de zelo do profissional, o lugar de prestação do serviço, a natureza e a importância da causa, bem como o trabalho realizado pelo advogado e o tempo exigido para o seu serviço -, bem assim a apreciação equitativa a que se refere o § 4º desse dispositivo legal (uma vez que se trata de causa de pequeno valor), arbitro a verba honorária em R$ 1.000,00, devidamente corrigidos pelos índices oficiais de remuneração básica aplicados à caderneta de poupança, nos termos do art. 1º-F da Lei n. 9.494/1997, com a redação dada pela Lei n. 11.960/2009, desde a data da lavratura deste acórdão até o efetivo pagamento.
No entanto, considerando que a parte autora litiga sob o amparo da Gratuidade da Justiça, a execução da verba sucumbencial fica com a exigibilidade suspensa, na forma do art. 12 da Lei nº 1.060/50.
Ressalto, ainda, que os honorários periciais se enquadram no conceito de despesas processuais, as quais devem ser suportadas pela parte vencida. Todavia, quando o sucumbente é beneficiário da Gratuidade da Justiça, os honorários são suportados pelo próprio Judiciário, que inclusive adianta o numerário, conforme previsto pela Resolução nº 541/2007 do CJF. Cuida-se, aliás, de entendimento sedimentado pela jurisprudência desta Corte (TRF4, AC 0000745-45.2016.404.9999, SEXTA TURMA, Relator JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA, D.E. 24/05/2017; TRF4, APELREEX 0009021-65.2016.404.9999, QUINTA TURMA, Relator ROGERIO FAVRETO, D.E. 09/03/2017).
Em arremate, consigno que o enfrentamento das questões suscitadas em grau recursal, assim como a análise da legislação aplicável, são suficientes para prequestionar junto às instâncias Superiores os dispositivos que as fundamentam. Assim, deixo de aplicar os dispositivos legais ensejadores de pronunciamento jurisdicional distinto do que até aqui foi declinado. Desse modo, evita-se a necessidade de oposição de embargos de declaração tão somente para este fim, o que evidenciaria finalidade procrastinatória do recurso, passível de cominação de multa.
Ante o exposto, voto no sentido de dar parcial provimento à apelação e à remessa necessária, consoante fundamentação supra.
Desembargador Federal AMAURY CHAVES DE ATHAYDE
Relator
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 04/09/2017
APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 5042640-32.2015.4.04.9999/PR
ORIGEM: PR 00039862820138160052
RELATOR | : | Des. Federal AMAURY CHAVES DE ATHAYDE |
PRESIDENTE | : | Luiz Fernando Wowk Penteado |
PROCURADOR | : | Ausente |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELADO | : | LENI DE AZEVEDO LEMOS BORDIN |
ADVOGADO | : | Ana Paula Verona |
: | LIZ REJANE SOUZA TAZONIERO | |
MPF | : | MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 04/09/2017, na seqüência 119, disponibilizada no DE de 18/08/2017, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) Turma Regional suplementar do Paraná, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU DAR PARCIAL PROVIMENTO À APELAÇÃO E À REMESSA NECESSÁRIA, CONSOANTE FUNDAMENTAÇÃO SUPRA.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Des. Federal AMAURY CHAVES DE ATHAYDE |
VOTANTE(S) | : | Des. Federal AMAURY CHAVES DE ATHAYDE |
: | Des. Federal FERNANDO QUADROS DA SILVA | |
: | Des. Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO |
Suzana Roessing
Secretária de Turma
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