Apelação Cível Nº 5007967-70.2017.4.04.7112/RS
RELATOR: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
APELANTE: CLAREL JOSE DA SILVA MARTINS (AUTOR)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
RELATÓRIO
Clarel José da Silva Martins interpôs apelação contra a sentença que julgou improcedente o pedido para conversão de aposentadoria por tempo de contribuição em aposentadoria por invalidez com adicional de 25%, condenando-o ao pagamento das custas e honorários, estes no percentual mínimo dos incisos do art. 85, §3 do CPC, cuja exigibilidade foi suspensa por ser beneficiário da justiça gratuita (Evento 98 - SENT1).
Preliminarmente, requereu a realização de novas perícias com neurocirurgião, ortopedista/traumatologista e cirurgião do aparelho digestivo. Alegou que os laudos são inconclusivos, repisando argumentos das petições de evento 56 e evento 96. No mérito, sustentou que há prova da incapacidade para o trabalho, pois o julgador deve observar não só o teor do laudo pericial como também o conjunto probatório e as condições pessoais do requerente (Evento 103 - APELAÇÃO1).
Sem contrarrazões, subiram os autos.
VOTO
Preliminar - realização de novos exames periciais
O apelante requereu preliminarmente seja anulada a sentença para a realização de novos exames médicos, uma vez que o autor deveria ser submetida a exames com profissionais diversos especialistas em neurocirurgia, ortopedia/traumatologia e cirurgia do aparelho digestivo.
Sem razão, todavia, pois o conjunto probatório é suficiente para a formação da convicção deste órgão julgador em relação ao pedido para concessão de benefício por incapacidade.
Ademais, os três laudos foram elaborados por médicos especialistas nas doenças mencionadas na inicial, estão completos, detalhados e são aptos a embasar o desfecho do caso ora em análise, não havendo necessidade de reabertura da instrução probatória, conforme adiante se verá, hipótese na qual não se verifica cerceamento de defesa, lesão ao contraditório ou à ampla defesa.
Frisa-se que foram realizadas três perícias com especialistas, todas custeadas pela Justiça Federal, em virtude do benefício da gratuidade de justiça. Os três peritos apresentaram respostas aos quesitos complementares do autor. A realização de três novas perícias atenta contra os princípios da celeridade, da razoável duração do processo, da eficiência e do acesso à Justiça por exigir que a Justiça Federal arque com novos custos em processo que já está devidamente instruído.
Deve-se ressaltar que a realização de nova perícia somente é recomendada quando a matéria não parecer ao juiz suficientemente esclarecida, a teor do disposto no art. 480, caput, do CPC, o que não é a hipótese dos autos.
Por fim, registre-se que o resultado contrário ao interesse da parte não é causa suficiente ao reconhecimento de cerceamento de defesa em circunstâncias nas quais o laudo judicial é elaborado de forma completa, coerente e sem contradições internas.
Rejeita-se, portanto, a preliminar.
Benefício por incapacidade
Cumpre, de início, rememorar o tratamento legal conferido aos benefícios de auxílio-doença e de aposentadoria por invalidez.
O art. 59 da Lei n.º 8.213/91 (Lei de Benefícios da Previdência Social - LBPS) estabelece que o auxílio-doença será devido ao segurado que, havendo cumprido, quando for o caso, o período de carência exigido em lei, ficar incapacitado para o seu trabalho ou para a sua atividade habitual por mais de 15 (quinze) dias consecutivos. Por sua vez, o art. 42 da Lei nº 8.213/91 estatui que a aposentadoria por invalidez será concedida ao segurado que, tendo cumprido a carência, for considerado incapaz e insuscetível de reabilitação para o exercício de atividade que lhe garanta a subsistência. O art. 25 desse diploma legal esclarece, a seu turno, que a carência exigida para a concessão de ambos os benefícios é de 12 (doze) meses, salvo nos casos em que é expressamente dispensada (art. 26, II).
Em resumo, portanto, a concessão dos benefícios depende de três requisitos: (a) a qualidade de segurado do requerente à época do início da incapacidade (artigo 15 da LBPS); (b) o cumprimento da carência de 12 contribuições mensais, exceto nas hipóteses em que expressamente dispensada por lei; (c) o advento, posterior ao ingresso no RGPS, de moléstia incapacitante para o desenvolvimento de atividade laboral que garanta a subsistência do segurado.
Note-se que a concessão do auxílio-doença não exige que o segurado esteja incapacitado para toda e qualquer atividade laboral; basta que esteja incapacitado para a sua atividade habitual. É dizer: a incapacidade pode ser total ou parcial. Além disso, pode ser temporária ou permanente. Nisso, precisamente, é que se diferencia da aposentadoria por invalidez, que deve ser concedida apenas quando constatada a incapacidade total e permanente do segurado. Sobre o tema, confira-se a lição doutrinária de Daniel Machado da Rocha e de José Paulo Baltazar Júnior:
A diferença, comparativamente à aposentadoria por invalidez, repousa na circunstância de que para a obtenção de auxílio-doença basta a incapacidade para o trabalho ou atividade habitual do segurado, enquanto para a aposentadoria por invalidez exige-se a incapacidade total, para qualquer atividade que garanta a subsistência. Tanto é assim que, exercendo o segurado mais de uma atividade e ficando incapacitado para apenas uma delas, o auxílio-doença será concedido em relação à atividade para a qual o segurado estiver incapacitado, considerando-se para efeito de carência somente as contribuições relativas a essa atividade (RPS, art. 71, § 1º) (in ROCHA, Daniel Machado da. BALTAZAR JÚNIOR, José Paulo. Comentários à Lei de Benefícios da Previdência Social. 15. ed. rev., atual. e ampl. - São Paulo: Atlas, 2017).
De qualquer sorte, o caráter da incapacidade (total ou parcial) deve ser avaliado não apenas por um critério médico, mas conforme um juízo global que considere as condições pessoais da parte autora - em especial, a idade, a escolaridade e a qualificação profissional - a fim de se aferir, concretamente, a sua possibilidade de reinserção no mercado de trabalho.
Cumpre demarcar, ainda, a fungibilidade entre as ações previdenciárias, tendo em vista o caráter eminentemente protetivo e de elevado alcance social da lei previdenciária. De fato, a adoção de soluções processuais adequadas à relação jurídica previdenciária constitui uma imposição do princípio do devido processo legal, a ensejar uma leitura distinta do princípio dispositivo e da adstrição do juiz ao pedido (SAVARIS, José Antônio. Direito processual previdenciário. 6 ed., rev. atual. e ampl. Curitiba: Alteridade Editora, 2016, p. 67). Por isso, aliás, o STJ sedimentou o entendimento de que "não constitui julgamento extra ou ultra petita a decisão que, verificando não estarem atendidos os pressupostos para concessão do benefício requerido na inicial, concede benefício diverso cujos requisitos tenham sido cumpridos pelo segurado" (AgRG no AG 1232820/RS, Rel. Min. Laurita Vaz, 5ª Turma, j. 26/10/20, DJe 22/11/2010).
Conversão de aposentadoria
A jurisprudência do Tribunal Regional Federal da 4ª Região e, especialmente, desta Turma é firme no tópico.
É possível a concessão de aposentadoria por invalidez a quem já receba aposentadoria por tempo de contribuição, desde que preenchidos os requisitos para concessão do benefício por incapacidade ao tempo em que deferida a aposentadoria por tempo de contribuição:
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. CONVERSÃO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. POSSIBILIDADE. PREENCHIMENTO DE REQUISITOS. DATA. CONCESSÃO. ADICIONAL DE 25%. CABIMENTO. 1. Cabível a conversão de aposentadoria por tempo de contribuição em aposentadoria por invalidez desde que a parte autora preencha os requisitos para concessão do benefício por incapacidade na época em que concedida a aposentadoria por tempo de contribuição. 2. No caso em tela, o autor sofria de doença de Alzheimer desde antes do deferimento da aposentadoria, estando incapacitado para o labor de forma total e permanente e necessitando do auxílio de terceiros quando concedido o benefício. Preenchidos os requisitos, cabível a conversão pleiteada desde a DER. (...) (TRF4, AC 5002505-92.2018.4.04.7114, QUINTA TURMA, Relatora GISELE LEMKE, juntado aos autos em 12/06/2020)
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE. TRANSFORMAÇÃO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. PREENCHIMENTO DOS REQUISITOS. MOMENTO. ADICIONAL DE 25%. 1. A conversão da aposentadoria por idade em aposentadoria por invalidez é admitida por este Tribunal, desde que comprovado o preenchimento dos requisitos para a concessão da aposentadoria por invalidez na época em que foi concedida a aposentadoria por idade ou aposentadoria por tempo de contribuição. 2. O STJ, ao apreciar o Tema repetitivo nº 982, fixou a seguinte tese jurídica: Comprovadas a invalidez e a necessidade de assistência permanente de terceiro, é devido o acréscimo de 25% (vinte e cinco por cento), previsto no art. 45 da Lei n. 8.213/91, a todos os aposentados pelo RGPS, independentemente da modalidade de aposentadoria. (TRF4, AC 5003337-39.2015.4.04.7112, SEXTA TURMA, Relator ARTUR CÉSAR DE SOUZA, juntado aos autos em 01/03/2019)
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. CONVERSÃO EM APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. possibilidade. INCAPACIDADE NÃO COMPROVADA. 1. É possível a conversão de aposentadoria por tempo de contribuição em aposentadoria por invalidez, desde que comprovados os requisitos para a concessão desse último benefício na época em que foi deferida a aposentadoria por tempo de contribuição. Precedentes deste Tribunal. 2. Hipótese em que não há comprovação da existência de invalidez ao tempo da aposentação. (TRF4, AC 5003142-90.2016.4.04.7121, QUINTA TURMA, Relatora LUCIANE MERLIN CLÈVE KRAVETZ, juntado aos autos em 26/10/2017)
Não é possível, porém, a conversão da aposentadoria por tempo de contribuição em aposentadoria por invalidez (com ou sem acréscimo) quando a incapacidade surge após a implantação do benefício, por vedação expressa do art. 18, § 2º da Lei nº 8.213:
Art. 18. O Regime Geral de Previdência Social compreende as seguintes prestações, devidas inclusive em razão de eventos decorrentes de acidente do trabalho, expressas em benefícios e serviços:
(...)
§ 2º O aposentado pelo Regime Geral de Previdência Social–RGPS que permanecer em atividade sujeita a este Regime, ou a ele retornar, não fará jus a prestação alguma da Previdência Social em decorrência do exercício dessa atividade, exceto ao salário-família e à reabilitação profissional, quando empregado
Cabe ressaltar que esta artigo foi considerado constitucional pelo STF no julgamento do Tema 503 (RE 661.256), no qual foi fixada a seguinte tese:
"No âmbito do Regime Geral de Previdência Social - RGPS, somente lei pode criar benefícios e vantagens previdenciárias, não havendo, por ora, previsão legal do direito à 'desaposentação' ou à ‘reaposentação’, sendo constitucional a regra do art. 18, § 2º, da Lei nº 8.213/91"
Por fim, cumpre ressaltar que a possibilidade de concessão de acréscimo de 25% por necessidade de assistência permanente de terceiro em aposentadorias diversas da por invalidez é questão que se encontra sobrestada por determinação do Ministro Luiz Fux, do STF, no julgamento do Tema 1.095 da Repercussão Geral 1.
Caso concreto
No mérito, discute-se a possibilidade de concessão de aposentadoria por invalidez com acréscimo de 25% desde 25/09/2014.
A parte autora alega estar permanentemente incapacitada para o trabalho por sofrer de "CID 10 K40.9 – Hérnia inguinal unilateral ou não especificada, sem obstrução ou gangrena, M54.4 – Lumbago com ciática, K40 – Hérnia inguínal, M51.1 – Transtorno de discos lombares e de outros discos intervertebrais com radiculopatia, M54.2 - Cervicalgia)".
Inicialmente, deve-se mencionar que o autor recebeu auxílio-doença de 03/12/2013 a 25/09/2014 e recebe aposentadoria por tempo de contribuição desde 06/10/2014 (Evento 4, CNIS2, Página 8).
O benefício por incapacidade foi concedido por quadro de hérnia inguinal com indicação cirúrgica (Evento 10, RESPOSTA1, Página 6), mantido no período pós-operatório (Evento 10, RESPOSTA1, Página 7) e cessado pela recuperação (Evento 10, RESPOSTA1, Página 8). A conclusão da última perícia administrativa, realizada em 25/09/2014 foi a seguinte:
Recuperado da cirurgia de herniorrafia inguinal D, em condições de retomar suas atividades. Também portador de patologias ortopédicas, epicondilite lateral e discopatia degenerativa da coluna lombar com protrusão discal, porém estas não tem repercussão clínica incapacitante, observando-se função preservada. Pode realizar tratamento de manutenção em concomitância com suas atividades. Apta para retorno ao trabalho. DCB hoje.
Estabelecidas tais premissas, passa-se a analisar o quadro incapacitante.
Incapacidade laboral
O autor, atualmente com 67 anos, está aposentado por tempo de contribuição desde 2014. Sua última atividade laboral registrada foi como gerente de loja no período de 01/11/2006 a 26/04/2013 (Evento 1, CTPS14, Página 6). Foram realizadas três perícias, com três laudos complementares. Todas concluíram pela ausência de incapacidade total e permanente do autor. Pela complexidade, faz-se necessária a análise de cada uma separadamente.
(a) Perícia com ortopedista
Segundo consta do laudo pericial (Evento 21), o autor apresenta lombalgia crônica e pós-operatório tardio de artrodese da coluna cervical (2015), que não o incapacitam para o trabalho. Confira-se:
Justificativa/conclusão: Não apresenta incapacidade física, habitual e laboral.
Refere lombalgia crônica há 5 anos, sem história de trauma. Refere queixas secundárias relacionadas à coluna cervical, tendo sido submetido a artrodese no ano de 2015. Exercia atividade habitual de comerciário.
Encontra-se aposentado por tempo de serviço desde 2014, prévio ao procedimento cirúrgico. Não há justificativa para a transformação do benefício da aposentadoria por tempo de serviço para o benefício de aposentadoria por invalidez.
Não confirma – através de documentação anexada ao processo e/ou apresentada na perícia médica – acompanhamento e/ou tratamento médico continuado prévio a 2014 e durante o ano de 2016. Tal descontinuidade pode significar períodos pretéritos de capacidade laboral ou simples desinteresse na resolução das queixas apresentadas na perícia médica atual.
Exame físico não demonstra alterações que justifiquem o afastamento das atividades laborais. A perimetria muscular demonstra ausência de desuso dos membros inferiores.
Exames de imagem demonstram discopatia degenerativa difusa da coluna lombossacra, sem compressão radicular ou medular, e artrodese cervical C6C7 via anterior. Tais alterações são achados de imagem e não possuem repercussão ao exame físico, não incapacitando, não reduzindo a capacidade laboral e não exigindo maior esforço físico – por parte da autora – para a realização das atividades laborais habituais.
Nega tratamento atual.
Avaliação: lombalgia crônica e pós-operatório tardio de artrodese da coluna cervical (2015). Quadro clínico estabilizado com melhora dos sintomas em relação ao ano da cirurgia da coluna cervical. Não há comorbidade ortopédica. Dessa forma, não necessita de tratamento médico ortopédico, seja conservador ou cirúrgico.
As conclusões da perícia foram ratificadas pelo perito no Evento 90.
Em síntese, o apelante afirmou que "o próprio perito informou no corpo do laudo que o autor já possuía documentos médicos acerca do seu problema na coluna desde no mínimo 02/06/2014, data esta anterior a concessão da aposentadoria por tempo de contribuição (06/10/2014)" e apresentou dois atestados médicos de 2017. Um dos atestados havia sido analisado pelo perito. O outro é posterior à data do exame.
Assiste razão ao perito quando ele afirma que não há comprovação de tratamento ortopédico prévio a 2014. Os exames médicos daquele ano, por sua vez não demonstram qualquer patologia incapacitante e foram adequadamente avaliados pelo expert.
Deve-se ressaltar que o exame físico realizado durante a perícia não constatou alterações significativas em 2017 e não indicou qualquer incapacidade em 2014.
A existência de atestado médico mencionando necessidade de realização de procedimento cirúrgico em 2017 é indiferente para o processo. Isso porque não é possível a conversão da aposentadoria por tempo de contribuição em aposentadoria por invalidez quando a incapacidade surge após o recebimento daquela. Ademais, o atestado não indica incapacidade total e permanente com necessidade de auxílio de terceiros.
(b) Perícia com neurocirurgião
O laudo pericial emitido por neurocirurgião também concluiu que, embora o autor tenha quadro de dor lombar baixa, não há incapacidade (Evento 32, LAUDOPERIC1). Confira-se:
Justificativa/conclusão: O paciente apresenta história de lombalgia. De um modo simples tal condição representa dor nas costas, na região lombar, na grande maioria das vezes gerada por problemas osteo-musculares. Entende-se por esse desgaste ósseo, alterações dos discos e fraqueza muscular causados, principalmente, pelo envelhecimento da coluna e ausência de cuidados adequados.
Para simplificar e facilitar o entendimento da conclusão enumero:
1) CID 10 : M54.5 (Dor lombar)
2) Tal condição motivou a solicitação do benefício.
3) Quadro estabilizado.
4) Patologia não decorre de acidente.
5) A simples presença de uma condição neurológica ou neurocirúrgica não representa incapacidade. Para isso é de suma relevância verificar-se limitações objetivas ao exame neurológico. E isso não é evidenciado no caso em questão. Ao exame clinico não observo sinais passíveis de inaptidão e não existe contratura muscular significativa. Em outras palavras a pragmática análise especializada encontra-se plenamente normal. Desse modo, defino que NÃO existe incapacidade do ponto de vista neurológico/neurocirúrgico para exercer qualquer atividade que garanta subsistência.
Em manifestação complementar, o perito foi sucinto e claro ao afirmar que "A questão neurológica / neurocirúrgica está muito clara e fundamentada em laudo pericial quanto a datas e patologia".
O conjunto probatório não traz elementos suficientes para a desconsideração do laudo pericial.
(c) Perícia com gastroenterologista
Por fim, a perícia com médica especialista em gastroenterologia, medicina intensiva e clínica médica concluiu que o autor estava curado da hérnia inguinal (Evento 47, LAUDOPERIC1):
Histórico da doença atual: O autor foi submetido à Hernioplastia inguinal direita em 09/06/2014. Desde esta data, não possui mais a Hérnia inguinal à direita. Recebeu benefício na convalescença até 25/09/2014, período adequado para este fim. Traz atestado médico de 20/02/2018 informando que mantém desconforto em região inguinal direita ao esforço físico, mas não informa incapacidade laborativa para qualquer atividade de sustento. Ao exame físico, a cicatriz cirúrgica está bem consolidada. Concluo que não existe motivo para conversão de aposentadoria convencional para a por invalidez pela presença da cicatriz cirúrgica em região inguinal direita. Não se trata de uma das patologias citadas na Portaria Interministerial de nº 2998/2001. Não se trata de acidente de trabalho. A hérnia inguinal não permite esforço físico abdominal por dor local e pela possibilidade de aumento de seu diâmetro. No momento, está curado,pois já fez o tratamento cirúrgico curativo. O autor é capaz de atos da vida civil. Não necessita de auxílio de terceiros para atos da vida cotidiana. Os dados foram obtidos através de anamnese, exame físico, laudos de atestados médicos, perícias administrativas do INSS e judiciais.
(...)
Justificativa/conclusão: Não existe justificativa para troca de aposentadoria proporcional para por invalidez no que diz respeito à cicatriz da Herniorrafia inguinal direita. Esta está bem consolidada.
Houve complementação do laudo nos seguintes termos (Evento 60, LAUDO1):
Retifico a conclusão do laudo médico judicial prévio, pois, segundo atestado médico de 20/02/2018, existe limitação de sua atividade no que se refere a esforço físico. Porém, apesar de sua escolaridade informada, Ensino Fundamental incompleto (2º ano ginasial), já exerceu atividades como gerente, balconista, auxiliar de escritório, situações em que não exerce esforço físico “continuado”. Pela cicatriz cirúrgica e o desconforto que ela causa poderia exercer as atividades acima descritas. (...)
Como mencionado anteriormente, a atividade do autor na data da concessão da aposentadoria por invalidez era de gerente de loja. Portanto, a capacidade laboral em 2014 deve ser analisada para essa atividade.
A perita foi instada a informar "se havia incapacidade laboral permanente na data de cessação do benefício de auxílio-doença (DCB 25/09/2014), levando-se em consideração a função exercida à época de gerente de loja de materiais de construção.". Eliminando qualquer dúvida, a expert apresentou a seguinte resposta (Evento 77, LAUDO1):
Não. O autor tinha se submetido à cirurgia de Hérnia inguinal em 09/06/2014 e na data de 25/09/2014 já tinha passado noventa dias de convalescença, bem mais do que o solicitado pelo médico assistente que era um período de trinta dias.
O período de recebimento de auxílio-doença foi suficiente para o afastamento pré-operatório e para a recuperação pós-cirúrgica, sendo, inclusive, superior àquele indicado pelo médico assistente do autor (Evento 1, LAUDO19, Página 16).
A perita analisou todos os documentos médicos apresentados e concluiu pela ausência de incapacidade. Não há qualquer documento nos autos que indique a persistência da incapacidade por hérnia inguinal após a cessação do benefício por incapacidade.
Por fim, cumpre mencionar que o autor apresenta interpretação equivocada do laudo. O atestado médico mencionado na apelação é exatamente o que foi mencionado na primeira complementação do laudo pericial. A perita explicou claramente que a limitação para esforço físico é compatível com a atividade exercida pelo autor antes da aposentadoria.
(d) Conclusão
Feitas tais considerações, deve-se negar provimento à apelação, mantendo-se integralmente a sentença, pois, ausente a incapacidade, é incabível a concessão de auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez. Segundo foi esclarecido nos laudos periciais, os sintomas relatados pelo autor não o impediam de exercer suas lides habituais. Destaca-se, no ponto, que os documentos apresentados no processo não são suficientes a comprovar a alegada incapacidade.
A conclusão de laudo pericial oficial, realizado em juízo e em observação aos princípios do contraditório e da ampla defesa, tem prevalência sobre atestados médicos e exames produzidos unilateralmente pela parte autora, pois o perito nomeado pelo juízo, além de ser pessoa de sua confiança, está equidistante das partes.
As respostas aos quesitos detalham, fundamentadamente, as razões por que o autor encontrava-se apto a trabalhar, sendo que suas condições pessoais foram levadas em consideração pelos médicos peritos para fins de expedição dos referidos documentos. Os laudos são válidos e suficientes, portanto, a embasar a presente decisão, até mesmo porque cabia a ele, na condição de parte interessada, fazer prova em contrário, ônus do qual não se desincumbiu.
Nesse sentido, confiram-se precedentes desta Turma:
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO POR INCAPACIDADE. AUXÍLIO-DOENÇA/APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. DOR LOMBAR. LAUDO PERICIAL. AUSÊNCIA DE INCAPACIDADE. 1. São três os requisitos para a concessão dos benefícios por incapacidade: (1) qualidade de segurado; (2) cumprimento do período de carência; (3) a incapacidade para o trabalho, de caráter permanente (aposentadoria por invalidez) ou temporário (auxílio-doença). 2. Somente contexto probatório muito relevante, constituído por exames que conclusivamente apontem para a incapacidade do segurado, pode desfazer a credibilidade que se deve emprestar a laudo pericial elaborado por profissional qualificado a servir como auxiliar do juízo. 3. Não obstante seja o autor portador de um quadro de dor lombar de origem mecânica, não está caracterizada a incapacidade para o trabalho, motivo pelo qual é imprópria a concessão de auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez. (TRF4, AC 5008539-27.2019.4.04.9999, QUINTA TURMA, Relator OSNI CARDOSO FILHO, juntado aos autos em 04/12/2019)
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSO CIVIL. PERÍCIA. AUSÊNCIA DE INCAPACIDADE. Não sendo reconhecida a incapacidade para o labor pelo perito judicial, auxiliar do juízo que é equidistante das partes, e não havendo razão para a anulação da perícia, deve ser mantida a sentença de improcedência. (TRF4, AC 5002943-62.2019.4.04.9999, QUINTA TURMA, Relatora GISELE LEMKE, juntado aos autos em 18/12/2019)
PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-DOENÇA. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. INCAPACIDADE LABORAL. AUSÊNCIA. 1. A concessão de benefício previdenciário por incapacidade decorre da convicção judicial formada predominantemente a partir da produção de prova pericial. 2. Considerando que a prova pericial não confirma a existência de patologia que incapacite a parte autora para o exercício de atividades laborais, não é devido qualquer dos benefícios pleiteados. (TRF4, AC 5013409-18.2019.4.04.9999, QUINTA TURMA, Relator ALTAIR ANTONIO GREGÓRIO, juntado aos autos em 12/12/2019)
Sabe-se que o juiz não está vinculado ao laudo pericial judicial (art. 479, CPC). Todavia, conforme reiteradamente afirmado por esta Corte, "a concessão de benefício previdenciário por incapacidade decorre da convicção judicial formada predominantemente a partir da produção de prova pericial" (TRF4, APELREEX 0013571-06.2016.404.9999, SEXTA TURMA, Relatora SALISE MONTEIRO SANCHOTENE, D.E. 11/07/2017). Apenas em situações excepcionais é que o magistrado pode, com base em sólida prova em contrário, afastar-se da conclusão apresentada pelo perito, do que aqui não se trata.
Conclui-se, assim, que o autor se encontra em condições para o trabalho, motivo pelo qual não faz jus à concessão do benefício postulado, o que leva à improcedência do pedido, e, portanto, ao desprovimento da apelação.
Honorários advocatícios
Desprovido o recurso interposto pelo autor da sentença de improcedência do pedido, devem os honorários de advogado ser majorados em 20% (vinte por cento) sobre o valor fixado pela sentença, com o fim de remunerar o trabalho adicional do procurador da parte em segundo grau de jurisdição (art. 85, §11, do CPC), mantendo-se a inexigibilidade da verba em face da concessão da assistência judiciária gratuita.
Prequestionamento
O enfrentamento das questões suscitadas em grau recursal, assim como a análise da legislação aplicável, são suficientes para prequestionar junto às instâncias Superiores os dispositivos que as fundamentam. Assim, deixo de aplicar os dispositivos legais ensejadores de pronunciamento jurisdicional distinto do que até aqui foi declinado. Desse modo, evita-se a necessidade de oposição de embargos de declaração tão somente para este fim, o que evidenciaria finalidade procrastinatória do recurso, passível de cominação de multa.
Dispositivo
Em face do que foi dito, voto no sentido de negar provimento à apelação, nos termos da fundamentação.
Documento eletrônico assinado por OSNI CARDOSO FILHO, Desembargador Federal, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40002055969v16 e do código CRC a5fa91ac.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): OSNI CARDOSO FILHO
Data e Hora: 10/11/2020, às 17:41:36
Conferência de autenticidade emitida em 18/11/2020 04:01:00.
Apelação Cível Nº 5007967-70.2017.4.04.7112/RS
RELATOR: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
APELANTE: CLAREL JOSE DA SILVA MARTINS (AUTOR)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO POR INCAPACIDADE. conversão de aposentadoria por tempo de contribuição em APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. LAUDO PERICIAL. validade. desnecessidade de nova perícia. gerente de loja. hérnia inguinal. lombalgia. AUSÊNCIA DE INCAPACIDADE. HONORÁRIOS MAJORADOS.
1. O direito à aposentadoria por invalidez e ao auxílio-doença pressupõe o preenchimento de 3 (três) requisitos: (1) a qualidade de segurado ao tempo de início da incapacidade, (2) a carência de 12 (doze) contribuições mensais, ressalvadas as hipóteses previstas no art. 26, II, da Lei nº 8.213, que a dispensam, e (3) aquele relacionado à existência de incapacidade impeditiva para toda e qualquer atividade (aposentadoria por invalidez) ou para seu trabalho habitual (auxílio-doença) em momento posterior ao ingresso no RGPS, aceitando-se, contudo, a derivada de doença anterior, desde que agravada após esta data, nos termos dos arts. 42, §2º, e 59, parágrafo único; ambos da Lei nº 8.213.
2. A conversão da aposentadoria por tempo de contribuição em aposentadoria por invalidez é admitida, desde que comprovado o preenchimento dos requisitos para a concessão da aposentadoria por invalidez na época em que foi concedido o benefício.
3. Não é possível a conversão de aposentadoria por tempo de contribuição em aposentadoria por invalidez quando a incapacidade tem início após o recebimento do primeiro benefício (artigo 18, §2º, da Lei nº 8.213, considerado constitucional pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento do Tema 503).
4. O resultado contrário ao interesse da parte não é causa suficiente ao reconhecimento de cerceamento de defesa em circunstâncias nas quais o laudo judicial é elaborado de forma completa, coerente e sem contradições internas. A realização de nova perícia somente é recomendada quando a matéria não parecer ao juiz suficientemente esclarecida, a teor do disposto no art. 480, caput, do CPC.
5. A desconsideração da conclusão de laudo pericial, em exame de requisito para a concessão de benefício previdenciário, pode ocorrer apenas quando o contexto probatório em que se inclui, indicar maior relevo às provas contrapostas, a partir de documentos a respeito da incapacidade ou de limitação para o exercício de atividade laborativa.
6. Não caracterizada a incapacidade para o trabalho, imprópria a concessão de auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez.
7. Majorados os honorários advocatícios a fim de adequação ao que está disposto no art. 85, §11, do Código de Processo Civil.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, negar provimento à apelação, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 20 de outubro de 2020.
Documento eletrônico assinado por OSNI CARDOSO FILHO, Desembargador Federal, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40002055970v4 e do código CRC 87dd9c98.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): OSNI CARDOSO FILHO
Data e Hora: 10/11/2020, às 17:26:24
Conferência de autenticidade emitida em 18/11/2020 04:01:00.
EXTRATO DE ATA DA SESSÃO Virtual DE 13/10/2020 A 20/10/2020
Apelação Cível Nº 5007967-70.2017.4.04.7112/RS
RELATOR: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
PRESIDENTE: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
PROCURADOR(A): ADRIANA ZAWADA MELO
APELANTE: CLAREL JOSE DA SILVA MARTINS (AUTOR)
ADVOGADO: JULIA CAROLINA LONGHI KOSCIUK (OAB RS076632)
ADVOGADO: ANILDO IVO DA SILVA (OAB RS037971)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 13/10/2020, às 00:00, a 20/10/2020, às 14:00, na sequência 470, disponibilizada no DE de 01/10/2020.
Certifico que a 5ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A 5ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO.
RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
Votante: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
Votante: Juiz Federal ALTAIR ANTONIO GREGORIO
Votante: Juíza Federal GISELE LEMKE
LIDICE PEÑA THOMAZ
Secretária
Conferência de autenticidade emitida em 18/11/2020 04:01:00.