Apelação Cível Nº 5000629-02.2023.4.04.7123/RS
RELATOR: Desembargador Federal ALEXANDRE GONÇALVES LIPPEL
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
APELADO: IZAIR PEREIRA FIGUEIRA (AUTOR)
RELATÓRIO
Instituto Nacional do Seguro Social interpõe recurso de apelação contra sentença que julgou procedente o pedido realizado em ação revisional, nos seguintes termos:
Ante o exposto:
I - Declaro incidentalmente a inconstitucionalidade do inciso III do §2º do artigo 26 da EC 103/2019;
II - julgo PROCEDENTE o pedido formulado na inicial para:
a) DETERMINAR o recálculo da RMI do benefício de aposentadoria por incapacidade permanente fixando-a em 100% (cem por cento) da média aritmética simples dos salários de contribuição contidos no período básico de cálculo (PBC);
b) DESCONSTITUIR o débito apurado, nos termos da fundamentação;
c) CONDENAR o INSS a pagar à parte autora as diferenças vencidas, acrescidas de correção e juros moratórios, nos termos da fundamentação.
As partes são isentas de custas (art. 4, I, da Lei 9.289/96).
Em atenção aos vetores do artigo 85, §2º, I a IV, do Código de Processo Civil, condeno o INSS ao pagamento de honorários advocatícios, fixados em 10%, tendo por base de cálculo o valor das parcelas vencidas até a data da sentença (Súmulas 111 do STJ e 76 do TRF4).
Sustenta a autarquia recorrente que os requisitos para a concessão da aposentadoria por incapacidade permanente só foram preenchidos após a vigência da EC 103/2019, razão pela qual não pode ser aplicada a legislação anterior à reforma constitucional. Aduz não haver direito adquirido a regime jurídico, tendo em vista que apenas por ocasião da reunião de todos os requisitos operou-se o efetivo direito. Refere que a forma de cálculo da benesse é estabelecida segundo as regras vigentes no momento em que se tornaram presentes todas as exigências à sua concessão. Importante mencionar que auxílio-doença e aposentadoria por incapacidade permanente são benefícios diversos, com pressupostos diversos (do contrário, a lei não traria regramentos específicos para cada um). Não se pode aplicar o regime jurídico vigente no momento da concessão de um, se já há um novo em vigor quando da concessão do outro.
Com contrarrazões, veio o processo concluso para julgamento.
VOTO
Admissibilidade
Recurso adequado e tempestivo. INSS isento de custas, nos termos do art. 4º, I, da Lei 9.289/1996.
No que tange ao cálculo da Renda Mensal Inicial do benefício de aposentadoria por invalidez, cumpre destacar que a alteração promovida a partir da EC 103/2019 teve reflexo direto em muitos benefícios previdenciários e, também, no ora em exame. A parte demandante, que teve fixada a data de início da incapacidade permanente após a Reforma Previdenciária, foi surpreendida pela nova fórmula de cálculo da RMI: 60% do salário de benefício, acrescido de 2% para cada ano de contribuição que exceder a 20 para homens (art. 26. da EC nº 103/2019).
Em casos análogos, este Regional ja entendeu que, se a incapacidade foi verificada antes da vigência da Emenda Constitucional 103 de 2019, a implantação da aposentadoria por invalidez deve se dar pelas regras vigentes anteriormente. Confira-se:
PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO DE INSTRUMENTO. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. VIGÊNCIA DA EC 103/19. INAPLICABILIDADE. INCAPACIDADE ANTERIOR À REFORMA PREVIDENCIÁRIA. Se a incapacidade foi constatada antes da vigência da reforma previdenciária de 2019, a RMI não deve ser calculada nos termos da redação do art. 26, § 2º, da EC 103/2019, em observância ao princípio tempus regit actum. Hipótese em que a aposentadoria por invalidez decorre de conversão de auxílio-doença concedido em 28/08/2018, ou seja, anterior a entrada em vigor da reforma, motivo pelo qual a renda mensal da aposentadoria deveria ser de 100% do salário de benefício que serviu de base para o cálculo da renda mensal inicial do auxílio-doença. Na conversão de auxílio-doença em aposentadoria por incapacidade permanente, após a EC 103/2019, o valor do novo benefício não pode ser inferior ao concedido anteriormente, sob pena de afronta ao princípio da proporcionalidade e da irredutibilidade do do valor dos benefícios previdenciários.
(TRF4, AG 5047574-47.2021.4.04.0000, NONA TURMA, Relator PAULO AFONSO BRUM VAZ, juntado aos autos em 25/03/2022)
DECISÃO: Trata-se de agravo de instrumento interposto contra decisão que, em mandado de segurança, indeferiu a antecipação de tutela visando à implantação da aposentadoria por invalidez (evento 10, DESPADEC1 ). A impetrante agrava sustentando, em síntese, o evidente direito à conversão do benefício de auxílio-doença n.º 31/629.116.215-0 em aposentadoria por invalidez, com pagamento do adicional de 25% sobre o benefício desde a DER, em 12/08/2019, haja vista que a própria administração pública reconheceu o direito no âmbito administrativo. Requer a concessão de liminar determinando de imediato ao Impetrado que converta o benefício de auxílio-doença n.º 31/629.116.215-0 em aposentadoria por invalidez, com pagamento do adicional de 25% sobre este, tudo desde 12/08/2019, na forma de complementação positiva, conforme restou devidamente reconhecido pelo INSS na esfera administrativa. A liminar requerida no agravo foi deferida em parte para determinar a implantação da aposentadoria por invalidez (evento 2, DESPADEC1 ). Peticiona a parte agravante (ev. 12) aduzindo que o INSS implantou o benefício de aposentadoria por invalidez com renda mensal de R$2.634,28, inferior ao valor que vinha recebendo a título de auxílio-doença, que era de R$ 4.400,09. Diz que o procedimento do INSS é errado por qualquer ângulo que se olhe, porquanto o quadro incapacitante teve início antes da promulgação da EC 103/2019. Ressalta que, mesmo que a incapacidade tivesse iniciado após a promulgação da EC 103/2019, a regra prevista no art. 26, §§ 2º e 5º, da EC nº 103/2019 não poderia ser aplicada, visto que é manifestamente inconstitucional, o que vem sendo reconhecido pelo Poder Judiciário inclusive de ofício. Requer seja determinado ao INSS e à CEAB-DJ que implantem, com urgência, em prazo de 48 horas, a aposentadoria por invalidez, com adicional de 25%, com base nas regas de cálculo anteriores à promulgação da EC 103/19, seja em razão da preexistência do quadro incapacitante (tempus regit actum), seja em razão da inconstitucionalidade da regra prevista no art. 26, §§ 2º e 5º, da referida Emenda. Decido. Com razão a agravante. A implantação da aposentadoria por invalidez deve se dar pelas regras anteriores à EC 103, de 13/11/19, tendo em vista que a incapacidade total e permanente da autora pode ser aferida em momento pretérito à vigência da reforma da previdência. A situação é de especial prejuízo, considerando que o agravamento do quadro de saúde da autora hoje justifica, inclusive, o pagamento do adicional de grande invalidez, por necessitar de acompanhamento permanente de terceiros para os atos da vida diária, fato reconhecido pela própria autarquia. Veja-se que ela foi diagnosticada, em 08/17, com doença grave (neoplasia maligna), com toxicidade elevada, baixa tolerência e quase nenhuma resposta desde o tratamento inicial, que só se agravou com o tempo, resultando em metástase em leptomeninge, o que se verifica ocorreu antes mesmo de de 09/19, quando houve introdução de novo protocolo (evento 1, ATESTMED11 ). Por essa razão, qual seja a gravidade da doença desde o estágio inicial em 2017, quando já se antevia a necessidade de tratamento prolongado, é possível aferir a definitividade do quadro de incapacidade da autora. Não fosse isso, a aplicação da norma constante do art. 26, §2º, a EC nº 103/2019, aos benefícios de aposentadoria por incapacidade permanente não se afigura compatível com o direito fundamental à previdência e à isonomia, na sua acepção material. A reforma desconsidera que, diferentemente das demais aposentadorias, não se trata de benefício programado. O caso dos autos, porém, resolve-se independentemente do reconhecimento de inconstitucionalidade, já que, como se colhe da prova produzida, há havia situação de incapacidade total e permanente antes mesmo da vigência da Emenda Constitucional, que alterou os critérios de cálculo da aposentadoria por invalidez, devendo-se respeitar o direito adquirido sob a égide da normatividade anterior. Ante o exposto, defiro a medida requerida para o fim de determinar, via CEAB, a implantação da aposentadoria por invalidez (conversão do auxílio-doença 6291162150) em valor a ser apurado pelas regras anteriores à EC 103/19, bem como a implantação do adicional de 25% em decorrência do reconhecimento de hipótese de necessidade de auxílio permanente de terceiros. Fizo o prazo de 5 dias para o cumprimento da determinação. Requisite a Secretaria da 6ª Turma, à CEAB-DJ-INSS-SR3, o cumprimento da decisão e a comprovação nos presentes autos. Intimem-se. (TRF4, AG 5048850-16.2021.4.04.0000, SEXTA TURMA, Relatora TAÍS SCHILLING FERRAZ, juntado aos autos em 07/12/2021)
Por oportuno, colaciono julgado promovido pelo rito do art. 942 do CPC:
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR INCAPACIDADE PERMANENTE. RMI. VIGÊNCIA DA EC 103/19. INAPLICABILIDADE. INCAPACIDADE ANTERIOR À REFORMA PREVIDENCIÁRIA. JULGAMENTO NA FORMA DO ART. 942 DO CPC. 1. Se a incapacidade foi constatada antes da vigência da reforma previdenciária de 2019, a RMI não deve ser calculada nos termos da redação do art. 26, § 2º, da EC 103/2019, em observância ao princípio tempus regit actum. 2. Na conversão de auxílio-doença em aposentadoria por incapacidade permanente, após a EC 103/2019, o valor do novo benefício não pode ser inferior ao concedido anteriormente, sob pena de afronta ao princípio da proporcionalidade e da irredutibilidade do do valor dos benefícios previdenciários. 3. Hipótese em que a parte autora vinha auferindo benefício previdenciário por incapacidade desde setembro de 2016 (TRF4, AC 5005522-52.2021.4.04.7205, NONA TURMA, Relator para Acórdão PAULO AFONSO BRUM VAZ, juntado aos autos em 02/06/2022)
In casu, ainda que a incapacidade remonta a 10/06/2017, a verificação da incapacidade permanente da parte autora, somente ocorreu em momento posterior à vigència da EC 103/2019. Assim, considerando que a inconstitucionalidade do art. 26, §2º, III, da EC 103/2019 é objeto da ADI 6279 distribuída no Supremo Tribunal Federal em 05/12/2019, bem como tenha a matéria sido submetida à Corte Especial, nos autos do Incidente de Arguição de Inconstitucionalidade n.º 50388684120224040000, o cálculo da Renda Mensal Inicial (RMI) deve observar a legislação vigente (art. 26, §2º, III, da EC 103/2019) diferindo a definição do modo de cálculo para a fase de execução, a fim de ser aplicada a solução então determinada pelo Pretório Excelso, com a apuração de eventuais diferenças, se for o caso.
O recurso comporta provimento.
Honorários advocatícios
Considerando a sucumbência da parte autora, deve esta última ser condenada ao pagamento de honorários de advogado fixados nos percentuais mínimos de cada uma das faixas de valor, considerando as variáveis previstas nos incisos I a IV do § 2º e § 3º do artigo 85 do CPC/2015, incidente sobre o valor atribuído à causa. Suspensa a execução enquanto perdurarem os efeitos da gratuidade de justiça.
Dispositivo. Pelo exposto, voto por dar provimento ao apelo.
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Apelação Cível Nº 5000629-02.2023.4.04.7123/RS
RELATOR: Desembargador Federal ALEXANDRE GONÇALVES LIPPEL
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
APELADO: IZAIR PEREIRA FIGUEIRA (AUTOR)
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO POR INCAPACIDADE PERMANENTE. CÁLCULO DA RENDA MENSAL INICIAL. EC Nº 103/2019.
A constitucionalidade do modo de cálculo da Renda Mensal Inicial (RMI) determinada pelo art. 26, §2º, III, da EC 103/2019 encontra-se sob análise do Supremo Tribunal Federal, na Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 6.279/DF, razão pela qual deve ser mantido o referido cálculo pela norma atualmente vigente (EC 103/2019) e diferida a definição do modo de cálculo para a fase de execução, a fim se ser aplicada a solução então determinada pelo Pretório Excelso, com ressalva de eventual cobrança de diferenças advindas da decisão do STF.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, dar provimento ao apelo, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 23 de abril de 2024.
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 16/04/2024 A 23/04/2024
Apelação Cível Nº 5000629-02.2023.4.04.7123/RS
RELATOR: Desembargador Federal ALEXANDRE GONÇALVES LIPPEL
PRESIDENTE: Desembargador Federal ALEXANDRE GONÇALVES LIPPEL
PROCURADOR(A): ANDREA FALCÃO DE MORAES
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
APELADO: IZAIR PEREIRA FIGUEIRA (AUTOR)
ADVOGADO(A): TATIANA FERNANDES PEREIRA (OAB RS068233)
ADVOGADO(A): RAQUEL BARBOSA DE CASTRO (OAB RS080138)
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 16/04/2024, às 00:00, a 23/04/2024, às 16:00, na sequência 921, disponibilizada no DE de 05/04/2024.
Certifico que a 5ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A 5ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, DAR PROVIMENTO AO APELO.
RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal ALEXANDRE GONÇALVES LIPPEL
Votante: Desembargador Federal ALEXANDRE GONÇALVES LIPPEL
Votante: Desembargador Federal HERMES SIEDLER DA CONCEIÇÃO JÚNIOR
Votante: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
LIDICE PENA THOMAZ
Secretária
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