Apelação Cível Nº 5014307-30.2017.4.04.7112/RS
RELATORA: Juíza Federal TAIS SCHILLING FERRAZ
APELANTE: ISIDORO ROSA CARNEIRO (AUTOR)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
RELATÓRIO
Trata-se de apelação interposta contra sentença que julgou improcedente pedido de auxílio-doença, por não comprovada incapacidade, condenando a parte autora em honorários de 10% sobre o valor atualizado da causa, suspensa a exigibilidade, em virtude da gratuidade da justiça.
A parte autora sustenta a necessidade de reabertura da instrução para a realização de perícia por especialistas nas doenças de que acometido o autor, quais sejam, gastroenterologista, cardiologista, endocrinologiasta e ortopedista.
Sem contrarrazões, subiram os autos ao Tribunal para julgamento.
É o relatório.
VOTO
Juízo de admissibilidade
O apelo preenche os requisitos de admissibilidade.
Benefício por incapacidade
Conforme o disposto no art. 59 da Lei n.º 8.213/91, o auxílio-doença é devido ao segurado que, havendo cumprido o período de carência, salvo as exceções legalmente previstas, ficar incapacitado para o seu trabalho ou para a sua atividade habitual por mais de 15 (quinze) dias consecutivos.
A aposentadoria por invalidez, por sua vez, será concedida ao segurado que, uma vez cumprida, quando for o caso, a carência exigida, for considerado incapaz e insuscetível de reabilitação para o exercício de atividade que lhe garanta a subsistência, sendo-lhe paga enquanto permanecer nessa condição, nos termos do art. 42 da Lei de Benefícios da Previdência Social.
A lei de regência estabelece que a carência exigida para a obtenção desses benefícios é de 12 (doze) contribuições mensais (art. 25, I), salvo nos casos legalmente previstos.
Em sendo a incapacidade anterior à filiação ao RGPS, ou à recuperação da condição de segurado, resulta afastada a cobertura previdenciária (art. 42, §2º e art. 59, §1º).
Caso concreto
O autor, pedreiro, desempregado, nascido em 16/12/66, ajuizou ação objetivando o restabelecimento do auxílio-doença (NB 517.692.655-1 - 23/08/06 a 06/04/17), recebido, inicialmente, em razão de pseudocisto do pâncreas, e, na sequência, por epicondilite (ev. 40).
- Incapacidade
A prova pericial é fundamental nos casos de benefício por incapacidade e tem como função elucidar os fatos trazidos ao processo. Submete-se ao princípio do contraditório, oportunizando-se, como no caso dos autos, a participação das partes na sua produção e a manifestação sobre os dados e conclusões técnicas apresentadas. Não importa, por outro lado, que seu resultado não atenda à expectativa de um dos demandantes ou mesmo de ambos, porque se destina a colher elementos necessários à formação do convencimento do juízo, ao qual incumbe decidir sobre a sua realização e eventual complementação e, posteriormente, apreciar seu poder de esclarecimento dos fatos, cotejando a perícia com os demais elementos carreados ao processo.
O juiz não está adstrito ao laudo pericial, nos termos do art. 479 do CPC, mas se entender por não acolher as conclusões do perito, à luz dos demais elementos presentes nos autos, deverá indicar os motivos que o levam a entendimento diverso.
Durante a instrução processual, em 20/02/18, foi realizada perícia médica por especialista em medicina do trabalho que atestou capacidade laboral.
Da perícia, extrai-se:
Motivo alegado da incapacidade: Cirurgia de vesícula, diabetes e infarto.
Histórico da doença atual: Início de vida laboral aos dez anos de idade como ajudante de pedreiro por dez anos, pedreiro oito anos, pintor industrial dez anos e a partir de 2003 como pedreiro autônomo. Refere que em 2003 teve problemas de pâncreas e vesícula, esta operada um mês após o início do quadro, e que ficou com pancreatite crônica. Refere infarto do miocárdio em 2015com colocação de dois stents, seguindo depois com tratamento medicamentoso e acompanhamento médico regular. Refere cansaço, dor nos braços e pernas, parece que os ossos estão quebrando. Refere tabagismo de dez cigarros por dia. Refere uso de insulina, metformina, AAS, enalapril, sinvastatina, atenolol e clopidogrel. Solicitado, apresenta CNH de tipo B, emitida em 27/04/2017, sem restrições.
Exames físicos e complementares: Deambulação: Normal.
Lúcido, coerente, com bom estado geral.
Aparência adequada. Cuidados pessoais mantidos.
Normovigil, normotenaz.
Humor: Eutímico.
Pressão arterial de 140 x 90 mm de Hg, ausculta cardíaca com ritmo regular, dois tempos e bulhas normofonéticas.
Ausculta pulmonar sem ruídos adventícios.
Teste de Romberg: Negativo.
Coordenação motora e equilíbrio normais.
Coluna cervical: Movimentos de flexo-extensão e lateralização normais.
Elevação de escápulas: Normal.
Amplitude articular dos ombros: Preservada e simétrica.
Elevação dos braços: Simétricamente diminuída, sem comprometimento funcional significativo.
Cotovelos, punhos e mãos dentro da normalidade. Força das mãos preservada e simétrica. Presença de calosidades palmares bilaterais.
Abdução, adução, flexão e extensão normais.
Coluna lombar: Movimentos de flexo-extensão, lateralização e rotação normais.
Abdome: Plano, timpânico, sem defesas ou megalias palpáveis. Sinais de Blumberg e Murphy negativos.
Membros inferiores sem edemas.
Quadris com mobilidade preservada.
Joelhos com amplitude articular ativa e passiva preservadas, simétricas.
Elevação de MMII: Normal e simétrica.
Sinal de Laségue: Negativo.
Agachamento: Normal.
Tornozelos e pés: Normais.Apresenta:
-Laudos médicos de 10/02/2006, 02/05/2006, 03/08/2006, 04/01/2007, Dr. José N. Filho, cemers 27670, de cid K86.3, E10, R56.8 e M75.0.
-Cateterismo cardíaco de 18/08/20105 com lesão de 80 % de artéria descendente anterior esquerda. Angioplastia com colocação de stent na mesma data, com sucesso.
-Ecografia de 21/09/2016, ombros, compatívelcom tendinopatia de supraespinhoso e subescapular bilateral.
-Laudo médico de 20/03/2017, Dr. Márcio Oliveira, cremers 21914, de portador de insuficiência pancreática crônica, cid K86.
-Laudo médico de 27/03/2017, Dra. Célia Sanches, cremers 11652, de cid I20.0, I25.2, IAM em agosto de 2015, colocação de dois stents.
-ECG 28/07/2017 com zona inativa inferior e ritmo sinusal.
-Laudo médico de 26/09/2017, Dr. Alan Pinheiro, cremers 26989, de cid M75.1 e M75.5 com indicação de tratamento cirúrgico.
-Ecografia de 26/09/2017, ombro direito sugestivo de tendinopatia de supraespinhoso sem sinais de ruptura.
-Laudo médico de 14/11/2017, Dra. Anna Mineto, cremers 42058, de atendimento por dor torácica atípica, ECG sem alterações isquêmicas agudas e enzimas negativas.
-Laudo médico de 15/12/2017, Dra. Paula Sassi, cremers 39444, de acompanhamento na UBS e por endocrinologista por cid K86.9, e tratamento para cid E10.
Diagnóstico/CID:
- Diabetes mellitus insulino-dependente (E10)
- Infarto antigo do miocárdio (I252)
- Outras doenças do pâncreas (K86)
- Lesão não especificada do ombro (M759)
Justificativa/conclusão: Portador de diabetes insulino-dependente e cardiopatia, patologias crônicas sem sinais de descompensação clínica atual, síndrome do manguito rotador direito sem limitação física ou funcional atual, não apresentando sinais conclusivos de incapacidade laboral.
Avaliação pericial realizada por anamnese, exame físico e análise documental anexada e apresentada.
A parte autora impugnou o laudo, reiterando o pedido feito na inicial, de realização de perícia por especialistas nas doenças de que acometido o autor, o que restou indeferido (ev. 42).
Assiste-lhe razão.
Com efeito, a perícia médica realizada nos autos não é suficiente à resolução da lide, tendo em vista que, além de não terem sidos respondidos os quesitos do juízo, necessário sejam analisadas de forma especializada as diversas doenças de que acometido o autor, especialmente a cardiológica. Veja-se que há, nos autos, laudo médico recente indicando dor torácica e pedido de autorização para cateteristmo cardíaco, datado de 14/05/18 (ev. 53), o que contradiz a afirmação do perito de que as patologias encontravam-se compensadas.
O entendimento deste Tribunal é pacífico no sentido de que, nos casos em que a situação exija conhecimento especializado, o que ocorre em geral nas áreas da psiquiatria e cardiologia e em casos pontuais, há a necessidade de designação de especialista, médico reconhecido como apto a realizar o encargo.
Corroborando esse entendimento, colaciono os seguintes julgados:
PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-DOENÇA. INCAPACIDADE LABORATIVA. PERÍCIA POR ESPECIALISTA. CERCEAMENTO DE DEFESA. SENTENÇA ANULADA. Não tendo sido realizada a perícia judicial por psiquiatra, apesar de requerida e deferida pelo juízo "a quo", é de ser dado provimento ao recurso para anular a sentença e determinar a reabertura da instrução para a realização dessa prova, em razão do cerceamento de defesa. (TRF4, AC 5050579-63.2015.404.9999, SEXTA TURMA, Relator JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA, juntado aos autos em 11/11/2016).
PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-DOENÇA. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. INCAPACIDADE. MÉDICO ESPECIALISTA. LAUDO PERICIAL INSUFICIENTE. SENTENÇA ANULADA. REABERTURA DA INSTRUÇÃO. 1. Em regra, a nomeação de profissional médico, ainda que não especialista na área de diagnóstico da moléstia apresentada, não determina a nulidade da perícia, uma vez que apresenta formação adequada à apreciação do caso. Em se tratando, todavia, de moléstia psiquiátrica, em que o quadro clínico exige uma análise mais aprofundada, tem-se entendido pela necessidade de se nomear especialista em psiquiatria para a realização da prova técnica. 2. Anulada a sentença e determinada a reabertura da instrução para realização de prova pericial por médico especialista em psiquiatria. (TRF4, AC 0004368-20.2016.404.9999, QUINTA TURMA, Relator ROGER RAUPP RIOS, D.E. 03/04/2017)
Dessa forma, não se encontrando o processo pronto para julgamento, e considerando a necessidade de realização de nova perícia, especialmente na área de cardiologia, deve ser anulada a sentença, determinando que seja reaberta a instrução processual, com a realização de perícia médica na especialidade mencionada.
Dispositivo
Ante o exposto, voto por dar provimento à apelação.
Documento eletrônico assinado por TAIS SCHILLING FERRAZ, Juíza Relatora, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40001760971v13 e do código CRC 084c5fe3.Informações adicionais da assinatura:
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Apelação Cível Nº 5014307-30.2017.4.04.7112/RS
RELATORA: Juíza Federal TAIS SCHILLING FERRAZ
APELANTE: ISIDORO ROSA CARNEIRO (AUTOR)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO POR INCAPACIDADE. PROVA PERICIAL. NECESSIDADE DE COMPLEMENTAÇÃO. ANULAÇÃO DA SENTENÇA.
1. A prova pericial é fundamental nos casos de benefício por incapacidade e tem como função elucidar os fatos trazidos ao processo. Submete-se ao princípio do contraditório, oportunizando-se a participação das partes na sua produção e a manifestação sobre os dados e conclusões técnicas apresentadas.
2. Não comprovada a real e atual condição de saúde do segurado nos autos, impõe-se a complementação da prova pericial, por perito especialista na moléstia alegada.
3. Sentença anulada, com a reabertura da instrução processual, para a realização de nova perícia.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 6ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, dar provimento à apelação, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 27 de maio de 2020.
Documento eletrônico assinado por TAIS SCHILLING FERRAZ, Juíza Relatora, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40001760972v3 e do código CRC b44f78bb.Informações adicionais da assinatura:
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO Virtual DE 19/05/2020 A 27/05/2020
Apelação Cível Nº 5014307-30.2017.4.04.7112/RS
RELATORA: Juíza Federal TAIS SCHILLING FERRAZ
PRESIDENTE: Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA
PROCURADOR(A): RICARDO LUÍS LENZ TATSCH
APELANTE: ISIDORO ROSA CARNEIRO (AUTOR)
ADVOGADO: ANILDO IVO DA SILVA (OAB RS037971)
ADVOGADO: JULIA CAROLINA LONGHI KOSCIUK (OAB RS076632)
ADVOGADO: ANILDO IVO DA SILVA
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 19/05/2020, às 00:00, a 27/05/2020, às 14:00, na sequência 388, disponibilizada no DE de 08/05/2020.
Certifico que a 6ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A 6ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, DAR PROVIMENTO À APELAÇÃO.
RELATORA DO ACÓRDÃO: Juíza Federal TAIS SCHILLING FERRAZ
Votante: Juíza Federal TAIS SCHILLING FERRAZ
Votante: Juiz Federal JULIO GUILHERME BEREZOSKI SCHATTSCHNEIDER
Votante: Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA
LIDICE PEÑA THOMAZ
Secretária
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