Apelação Cível Nº 5011510-19.2018.4.04.9999/RS
RELATOR: Juiz Federal ARTUR CÉSAR DE SOUZA
APELANTE: MARGARETE MARIA MENEGASSI
ADVOGADO: KATIUCIA RECH
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RELATÓRIO
Trata-se de recursos da parte autora de sentença publicada na vigência do NCPC em 10/04/2018, cujo dispositivo tem o seguinte teor:
Por tais razões,julgo improcedente, com fulcro no artigo 487, inciso I, do Código de Processo Civil, o pedido aduzido por Margarete Maria Menegassi nos autos da Ação Previdenciária proposta em face do Instituto Nacional DA Seguridade Social - INSS. Sucumbente, condeno a parte autora ao pagamento das custas, restando suspensa a exigibilidade, pois litiga sob o pallium da gratuidade judiciária.
Sustentou, em apertada síntese, que antes de ficar incapacitada era trabalhadora rural em regime de economia familiar.
Alegou que está acometida de por CID 10: M47.2, M50.9, G40.9, que a impossibilitam de fazer esforços físicos, e, por conseguinte, trabalhar na lavoura.
Requereu a reforma da sentença pela procedência dos pedidos e que que sejam os honorários de sucumbência fixados em 10%, sobre o valor da condenação, desde a data de Entrada do Requerimento Administrativo - DER.
Apresentada as contrarrazões, vieram os autos ao Tribunal.
É o relatório
VOTO
Juízo de admissibilidade
Os apelos preenchem os requisitos legais de admissibilidade.
Objeto da ação
Pugna a parte autora, Margarete Maria Menegassi para que seja reconhecido o direito ao benefício a concessão de auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez. Para fins de clareza, transcrevo excerto do relatório da sentença (evento 3, SENT24, p.3):
MARGARETE MARIA MENEGASSI ajuizou AÇÃO PREVIDENCIÁRIA em face do INSTITUTO NACIONAL DE SEGURIDADE SOCIAL - INSS, todos qualificados nos autos. Narrou que possui patologias que lhe impedem de exercer sua atividade laborativa. Frisou que postulou administrativamente a concessão do auxílio-doença, mas o beneficio foi indeferido. Discorreu sobre a legislação aplicável. Requereu, em antecipação de tutela, a concessão da benesse auxilio-doença ou a aposentadoria por invalidez. Postulou pela concessão da AJG (fls. 02/09). Colacionou documentos (fls. 10/73). ._ Deferida a AJG e indeferida antecipação de tutela (fls. 120/121).
Citado, o INSS contestou o pedido (fls. 77/89). Asseriu que a requerente perdeu a qualidade de segurada. Frisou que incabível o benefício por incapacidade se a doença é anterior ao ingresso no RGPS. Referiu que a parte autora não preenche o requisito de incapacidade laboral para a concessão do benefício de auxilio-doença ou de aposentadoria por invalidez. Narrou sobre a legislação incidente. Postulou pela improcedência do pleito autoral e apresentou quesitos. Acostou documento (fl. 90).
Dos requisitos para a concessão do benefício
Os benefícios por incapacidade laboral estão previstos nos artigos 42 e 59 da Lei 8.213/91:
Art. 42. A aposentadoria por invalidez, uma vez cumprida, quando for o caso, a carência exigida, será devida ao segurado que, estando ou não em gozo de auxílio-doença, for considerado incapaz e insusceptível de reabilitação para o exercício de atividade que lhe garanta a subsistência, e ser-lhe-á paga enquanto permanecer nesta condição.
Art. 59. O auxílio-doença será devido ao segurado que, havendo cumprido, quando for o caso, o período de carência exigido nesta Lei, ficar incapacitado para o seu trabalho ou para a sua atividade habitual por mais de 15 dias consecutivos.
Ainda, para apreciação da possibilidade de concessão, devem estar presentes a qualidade de segurado e o respeito ao período de carência (número mínimo de contribuições mensais indispensáveis para que o beneficiário faça jus ao benefício), regulados nos arts. 15 e 25 na Lei de Benefícios da Previdência Social:
Art. 15. Mantém a qualidade de segurado, independentemente de contribuições:
I - sem limite de prazo, quem está em gozo de benefício;
II - até 12 (doze) meses após a cessação das contribuições, o segurado que deixar de exercer atividade remunerada abrangida pela Previdência Social ou estiver suspenso ou licenciado sem remuneração;
III - até 12 (doze) meses após cessar a segregação, o segurado acometido de doença de segregação compulsória;
IV - até 12 (doze) meses após o livramento, o segurado retido ou recluso;
V - até 3 (três) meses após o licenciamento, o segurado incorporado às Forças Armadas para prestar serviço militar;
VI - até 6 (seis) meses após a cessação das contribuições, facultativo.
§ 1º O prazo do inciso II será prorrogado para até 24 (vinte e quatro) meses se o segurado já tiver pago mais de 120 (cento e vinte) contribuições mensais sem interrupção que acarrete a perda da qualidade de segurado.
§ 2º Os prazos do inciso II ou do § 1º serão acrescidos de 12 (doze) meses para o segurado desempregado, desde que comprovada essa situação pelo registro no órgão próprio do Ministério do Trabalho e da Previdência Social.
§ 3º Durante os prazos deste artigo, o segurado conserva todos os seus direitos perante a Previdência Social.
§ 4º A perda da qualidade de segurado ocorrerá no dia seguinte ao do término do prazo fixado no Plano de Custeio da Seguridade Social para recolhimento da contribuição referente ao mês imediatamente posterior ao do final dos prazos fixados neste artigo e seus parágrafos.
Na hipótese de ocorrer a cessação do recolhimento das contribuições, prevê o art. 15 da Lei nº 8.213/91 o denominado "período de graça", que permite a prorrogação da qualidade de segurado durante um determinado lapso temporal.
Art. 25. A concessão das prestações pecuniárias do Regime Geral de Previdência Social depende dos seguintes períodos de carência:
I - auxílio-doença e aposentadoria por invalidez: 12 contribuições mensais;
Salvo nos casos de acidente, doença profissional ou do trabalho, e de algumas doenças graves relacionadas em lista elaborada pelos Ministérios da Saúde e do Trabalho e da Previdência Social, surgidas após a filiação ao RGPS, em relação aos quais não é exigida nenhuma carência (art. 26, inciso II).
Art. 26. Independe de carência a concessão das seguintes prestações:
I - pensão por morte, auxílio-reclusão, salário-família, salário-maternidade, auxílio-acidente e pecúlios
I - pensão por morte, auxílio-reclusão, salário-família e auxílio-acidente; (Redação dada pela Lei nº 9.876, de 26.11.99) (Vide Medida Provisória nº 664, de 2014) (Vigência)
I - pensão por morte, salário-família e auxílio-acidente; (Redação dada pela Medida Provisória nº 871, de 2019)
II - auxílio-doença e aposentadoria por invalidez nos casos de acidente de qualquer natureza ou causa e de doença profissional ou do trabalho, bem como nos casos de segurado que, após filiar-se ao Regime Geral de Previdência Social, for acometido de alguma das doenças e afecções especificadas em lista elaborada pelos Ministérios da Saúde e do Trabalho e da Previdência Social a cada três anos, de acordo com os critérios de estigma, deformação, mutilação, deficiência, ou outro fator que lhe confira especificidade e gravidade que mereçam tratamento particularizado; (Vide Medida Provisória nº 664, de 2014) (Vigência)
II - auxílio-doença e aposentadoria por invalidez nos casos de acidente de qualquer natureza ou causa e de doença profissional ou do trabalho, bem como nos casos de segurado que, após filiar-se ao Regime Geral de Previdência Social, for acometido de alguma das doenças e afecções especificadas em lista elaborada pelos Ministérios da Saúde e da Previdência Social, de acordo com os critérios de estigma, deformação, mutilação, deficiência ou outro fator que lhe confira especificidade e gravidade que mereçam tratamento particularizado;
(Redação dada pela Medida Provisória nº 664, de 2014) (Vigência)
II - auxílio-doença e aposentadoria por invalidez nos casos de acidente de qualquer natureza ou causa e de doença profissional ou do trabalho, bem como nos casos de segurado que, após filiar-se ao RGPS, for acometido de alguma das doenças e afecções especificadas em lista elaborada pelos Ministérios da Saúde e da Previdência Social, atualizada a cada 3 (três) anos, de acordo com os critérios de estigma, deformação, mutilação, deficiência ou outro fator que lhe confira especificidade e gravidade que mereçam tratamento particularizado; (Redação dada pela Lei nº 13.135, de 2015)...
Portanto, para a concessão de auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez devem ser preenchidos os seguintes requisitos:
a) qualidade de segurado do requerente;
b) cumprimento da carência de 12 contribuições mensais;
c) superveniência de moléstia incapacitante para o desenvolvimento de atividade laboral que garanta a subsistência;
d) caráter permanente da incapacidade (para o caso da aposentadoria por invalidez) ou temporário (para o caso do auxílio-doença).
Ademais, a concessão do auxílio-doença não exige que o segurado esteja incapacitado para toda e qualquer atividade laboral; basta que esteja incapacitado para a sua atividade habitual. É dizer: a incapacidade pode ser total ou parcial. Além disso, pode ser temporária ou permanente. Nisso, precisamente, é que se diferencia da aposentadoria por invalidez, que deve ser concedida apenas quando constatada a incapacidade total e permanente do segurado.
Fixados os parâmetros de valoração da prova, passo ao exame da situação específica dos autos.
Tratando-se de benefício por incapacidade, o julgador firma sua convicção, via de regra, por meio da prova pericial. Tal assertiva, todavia, não é absoluta, uma vez que o julgador não está adstrito ao laudo pericial (art. 479, CPC).
Durante a instrução processual foi realizada perícia médica em 27/01/2016, pela Dra. Bianca Helena Brum Batista CRM26208, especialista em neurologia, e cujo laudo transcrevo excerto (evento 1, LAUDPERI1, p.1):
Margarete Maria Menegassi, com ensino fundamental incompleto, 53 anos de idade, sustentando problemas na coluna e epilepsia. Refere que há uns 8 anos apresentou alguns episódios de desmaios, sendo que após a realização de exames, recebeu diagnóstico de epilepsia e passou a fazer uso de anticonvulsivantes.
Exames:
Ressonância encéfalo 13/10/2013 - minima microangiopatia;
Eletroencefalograma 12/09/2012 - descarga focal esquerda
Ressonância coluna lombar 11/11/2015 - discopatia degenerativa / anterolistese de L3 e L4 (espondilolise) / abaulamento discal difuso L3-L4 e L4- L5
Justificativa/conclusão: epilepsia em tratamento com monoterapia, sem evidencia de quadro refratário ou epilepsia de difícil controle, sem internações recentes. Dor lombar sem associação com quadro de radiculopatia. Exame físico sem déficits - Lasegue negativo. Exames complementares com alterações compatíveis com idade, sem hérnia discal extrusa, sem incapacidade laborativa de ordem neurológica.
data do início da doença: há 8 anos.
data de início da incapacidade: inexistente.
Sem embargo, há indícios no conjunto probatório de que a epilepsia era recorrente, quadro que está controlado com o uso de medicamentos que, sabidamente, causam efeitos colaterais indesejado, que dependendo da atividade exercida, colocam sob risco a pessoa.
Ora, trata-se de requerente com 53 anos de idade, baixa escolaridade, agricultora, que está sujeita a trabalho que exija esforço físico, manuseio de equipamentos e ferramentas que possam causar ferimentos diante de uma crise.
Nesse diapasão, a fim de que se possa decidir com segurança, entendo prudente que seja realizada nova perícia judicial, com outro médico neurologista, devendo as partes ser intimadas para, querendo, apresentar novos quesitos, assim como devendo o expert responder a todos os quesitos formulados pelas partes e pelo juízo, e prestar todas as informações relativas ao quadro da paciente, sequelas e limitações eventualmente constatadas, condições de trabalho para a atividade habitual desenvolvida, existência (ou não) de incapacidade laboral (parcial ou total, temporária ou definitiva).
Registro que, nos termos do art. 480 do CPC/2015, o magistrado pode determinar a realização de nova perícia quando a matéria não estiver suficientemente esclarecida.
Ademais, o Tribunal Regional Federal da 4ª Região - TRF4, em reiterados julgados, manifestou-se pela necessidade de renovação da prova pericial quando o laudo se mostra insuficiente para o deslinde do feito:
PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-DOENÇA E APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. INCAPACIDADE LABORATIVA. DÚVIDA. ANULAÇÃO DA SENTENÇA. REABERTURA DA INSTRUÇÃO PROCESSUAL. Anulada a sentença a fim de ser aberta a instrução, para que seja realizada nova perícia com médico ortopedista avaliando as implicações decorrentes da patologia e as influências desta na capacidade laborativa da parte autora. (AC nº 0000542-54.2014.404.9999, 5ª TURMA, Rel. Des. Federal LUIZ CARLOS DE CASTRO LUGON, unânime, D.E. 10-03-2015).
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO POR INCAPACIDADE. LAUDO LACÔNICO. NECESSIDADE DE REABERTURA DA INSTRUÇÃO. ANULAÇÃO DA SENTENÇA(...) 2.Sendo a prova pericial lacônica, é necessária a complementação da prova, impondo-se a anulação da sentença, a fim de que seja reaberta a instrução processual, com a realização de nova perícia, juntados exames e autorizada a formulação de quesitos pelas partes. (TRF4, AC 0005591-47.2012.404.9999, Quinta Turma, Relator Ricardo Teixeira do Valle Pereira, D.E. 21/06/2012)
Diante de tais considerações tenho por anular a sentença para a reabertura da instrução processual.
Conclusão
Sentença anulada, de ofício, para a reabertura da instrução processual, com a realização de perícia com médico neurologista.
Dispositivo
Ante o exposto, voto por anular, de ofício, a sentença, prejudicada a apelação.
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Apelação Cível Nº 5011510-19.2018.4.04.9999/RS
RELATOR: Juiz Federal ARTUR CÉSAR DE SOUZA
APELANTE: MARGARETE MARIA MENEGASSI
ADVOGADO: KATIUCIA RECH
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO POR INCAPACIDADE. QUALIDADE DE SEGURADA ESPECIAL. COMPROVAÇÃO. PERÍCIA MÉDICA JUDICIAL. AUSÊNCIA DE DADOS SEGUROS E CONCLUSIVOS PARA A SOLUÇÃO DA LIDE. SENTENÇA ANULADA PARA A REABERTURA DA INSTRUÇÃO PROCESSUAL.
1. Considerando os elementos probatórios constantes dos autos, é possível aferir a qualidade de segurada especial da parte autora.
2. Nas ações em que se objetiva a concessão de auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez o julgador firma seu convencimento, de regra, através da prova pericial.
3. Verificada a necessidade de reabertura da instrução processual, visando à obtenção de dados seguros e conclusivos para a solução da lide.
4. Sentença anulada de ofício.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 6ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, anular, de ofício, a sentença, prejudicada a apelação, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 15 de abril de 2019.
Documento eletrônico assinado por ARTUR CÉSAR DE SOUZA, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40000997847v7 e do código CRC b9cbfe0b.Informações adicionais da assinatura:
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 15/04/2019
Apelação Cível Nº 5011510-19.2018.4.04.9999/RS
RELATOR: Juiz Federal ARTUR CÉSAR DE SOUZA
PRESIDENTE: Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA
APELANTE: MARGARETE MARIA MENEGASSI
ADVOGADO: KATIUCIA RECH
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Certifico que este processo foi incluído no 2º Aditamento do dia 15/04/2019, na sequência 917, disponibilizada no DE de 01/04/2019.
Certifico que a 6ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A 6ª TURMA, DECIDIU, POR UNANIMIDADE, ANULAR, DE OFÍCIO, A SENTENÇA, PREJUDICADA A APELAÇÃO.
RELATOR DO ACÓRDÃO: Juiz Federal ARTUR CÉSAR DE SOUZA
Votante: Juiz Federal ARTUR CÉSAR DE SOUZA
Votante: Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA
Votante: Juíza Federal TAIS SCHILLING FERRAZ
LIDICE PEÑA THOMAZ
Secretária
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