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PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO POR INCAPACIDADE. REGISTRO DE RECOLHIMENTO COMO CONTRIBUINTE INDIVIDUAL. DEVOLUÇÃO DE VALORES. INEXIGIBILIDADE. RESTABELECIMENTO ...

Data da publicação: 26/12/2023, 07:16:57

EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO POR INCAPACIDADE. REGISTRO DE RECOLHIMENTO COMO CONTRIBUINTE INDIVIDUAL. DEVOLUÇÃO DE VALORES. INEXIGIBILIDADE. RESTABELECIMENTO DO AUXÍLIO-DOENÇA. RECURSO PROVIDO. 1. Não ficando comprovado o retorno ao trabalho habitual, mas apenas a realização de atividades ligadas à área cultural compatíveis com a incapacidade laboral do autor, não é exigível a devolução dos valores recebidos a título de auxílio-doença no período de registro - equivocado - no CNIS de recolhimento de contribuições como contribuinte individual. 2. Se, a despeito da persistência da incapacidade laboral reconhecida administrativamente, e confirmada pelo perito judicial, foi decisivo para a cessação do benefício uma questão formal (registro de recolhimentos no CNIS), desconsiderando-se a objetividade fática da incapacidade para o exercício da atividade habitual, deve ser restabelecido o auxílio-doença NB 31/540.432.010-5. 3. Dar provimento ao recurso. (TRF4, AC 5001561-33.2017.4.04.7112, DÉCIMA PRIMEIRA TURMA, Relator ALCIDES VETTORAZZI, juntado aos autos em 19/12/2023)

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5001561-33.2017.4.04.7112/RS

RELATOR: Juiz Federal ALCIDES VETTORAZZI

APELANTE: JOAO MAXIMO DA SILVA (AUTOR)

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)

RELATÓRIO

Trata-se de apelação contra sentença com o seguinte dispositivo:

"III - DISPOSITIVO

Ante o exposto, afasto a preliminar suscitada, e, no mérito, ACOLHO PARCIALMENTE os pedidos formulados na ação, resolvendo o mérito (art. 487, I, do Código de Processo Civil - Lei 13.105/2015), para CONDENAR o INSS a:

a) declarar inexigível o débito apurado em desfavor da parte autora, referente ao período de 16/07/2015 a 31/08/2015 (NB 31/540.432.010-5);

b) condenar o INSS a restituir à parte autora, os valores já descontados a titulo do NB 31/540.432.010-5, no período de 16/07/2015 a 31/08/2015, se for o caso, atualizados conforme critérios descritos na fundamentação.

Consoante dispõe o Código de Processo Civil (Lei n. 13.105/2015), por ser ilíquida a presente sentença, os honorários advocatícios serão arbitrados em desfavor do autor, em virtude da sucumbência mínima do INSS, ao ensejo da liquidação do julgado, nos termos do § único do artigo 86 do Código de Processo Civil.

Sem embargo, no que se refere ao autor, resta suspensa a respectiva exigibilidade, porquanto beneficiário da gratuidade da Justiça, incumbindo ao credor, no prazo assinalado no § 3.º do art. 98 do Código de Processo Civil, comprovar que deixou de existir a situação de insuficiência de recursos que justificou a concessão de gratuidade.

Quanto às custas processuais, igualmente, o autor ficará com a exigibilidade suspensa em virtude do deferimento da gratuidade da Justiça.

Incabível a remessa necessária visto que invariavelmente as demandas em curso neste Juízo não superam o patamar que dispensa esse mecanismo processual, em conformidade ao disciplinado no inciso I do § 3.º do art. 496 do CPC.

Em caso de eventual interposição de recurso voluntário de uma das partes, sendo preenchidos seus requisitos de admissibilidade, intime-se a parte contrária para contrarrazões, e remetam-se os autos ao Tribunal.

Não havendo interposição de recurso, após a certificação do trânsito em julgado da sentença, intime-se a parte interessada para que dê prosseguimento à fase executiva.

Publicação e registro pelo processo eletrônico. Intimem-se."

O apelante alega ser inexigível a devolução dos valores recebidos a título de auxílio-doença no período coincidente com o recolhimento de contribuições como contribuinte individual, pois atuava na área cultural, ministrando aulas e dirigindo espetáculos teatrais, numa frequência de uma vez por semana, sendo que os pagamentos recebidos destinavam-se apenas a ressarcir despesas com locomoção, sendo da responsabilidade do contador o erro pelo recolhimento ao INSS, não tendo sido comprovada a sua má-fé. Aduz que ainda persiste a sua incapacidade laboral, fazendo jus ao auxílio-doença ou auxílio-acidente (evento 75, APELAÇÃO1).

Sem contrarrazões.

É o relatório.

VOTO

Juízo de admissibilidade

A apelação preenche os requisitos legais de admissibilidade.

MÉRITO

O apelante ajuizou a presente demanda requerendo: a) a concessão de auxílio-acidente nos períodos de 01/02/2011 a 31/07/2011, 01/09/2011 a 31/03/2012, 01/03/2015 a 15/07/2015 e a partir de 01/09/2015; b) a declaração da nulidade do lançamento dos débitos apontados pelo INSS em relação aos períodos de 01/10/2010 a 31/01/2011, de 01/08/2011 a 31/08/2011, de 01/09/2014 a 30/09/2014, de 01/04/2012 a 28/02/2015 - nos quais estava em gozo de auxílio-doença, mas em que há registro de recolhimento de contribuições como contribuinte individual - e de 16/07/2015 a 31/08/2015, quando recebeu benefício depois da sua cessação; c) ou, subsidiariamente, a compensação dos valores com a verba devida a título de auxílio-acidente, na ordem de 50%, em relação aos valores cobrados pelo INSS.

Extrai-se do contexto probatório dos autos que não houve má-fé do autor, carecendo de comprovação neste sentido pelo INSS. Com efeito, o seu vínculo empregatício foi com a Prefeitura Municipal de Esteio, de 10/2001 a 11/2016 (evento 7, CNIS2); com a Prefeitura de Canoas, a vinculação era relacionada a atividades culturais, sendo remunerado por meio de cachês, como demonstram as "notas de empenho" juntadas no processo administrativo instaurado pelo INSS (evento 1, PROCADM6); a mesma vinculação ocorreu com a Associação da Horta Comunitária União dos Operários, voltada a projetos de inserção social e cidadania com crianças e adolescentes e de assistência social, para o que conta com a parceria do poder público muncipais e de pessoas voluntárias, para viabilizar oficinas de teatro, informática, dança, violão e preparação para o trabalho.

Há referência ao "voluntário João Máximo da Silva" por sua longa atuação na área do teatro e da cultura afro-brasileira, "tendo sido parceiro assíduo ao longo deste último período", auxiliando "oficinas semanalmente, comparecendo nas segundas e quintas-feiras...", recebendo pagamentos provenientes dos recursos do Projeto do Ponto de Cultura, sendo "utilizada forma legal da RPA e nesta, a contabilidade também voluntária, acabou realizando o recolhimento ao INSS." (declaração do presidente da HOCOUNO).

A declaração de serviço voluntário na HOCOUNO assinada pelo autor, menciona que o "serviço voluntário não gera vínculo empregatício nem obrigação de natureza trabalhista, previdenciária ou afim, de acordo com a Lei Federal nº 9.608/98, e que "possíveis gastos com deslocamento, alimentação e possíveis insumos investidos na execução das ações que porventura vierem a ser combinadas com os participantes das ações nos projetos serão ressarcidos na medida em que a instituição receber recursos de projetos públicos ou privados destinados às ações do Ponto de Cultura." Também houve a participação do autor em atividades culturais da Fundação Cultural de Canoas, recebendo verbas de representação.

Os depoimentos testemunhais, transcritos na sentença apelada, só fazem confirmar que não houve duplo e simultâneo vínculo empregatício, in verbis:

"Em audiência de instrução realizada no dia 24/04/2018, o autor declarou que na época da concessão do benefício de auxílio-doença, trabalhava na Prefeitura de Esteio. Era concursado. O autor tem prótese de quadril. Está aguardando outra cirurgia. A procuradora do autor informa que ele está aposentado, benefício pelo Regime Próprio da Prefeitura de Esteio. O INSS cancelou o benefício do autor. O autor trabalha com teatro e nos períodos em que houve recolhimento, trabalhava, esporadicamente. Era um trabalho social. O Contador foi quem fez as informações. Trabalha por conta própria. Tem uma associação, e o autor ia fazer trabalho social. Organiza peça, é diretor de teatro. Atualmente não trabalha mais. Antes era nas segundas-feiras. Fez por 30 anos. Nunca parou de fazer. Ainda faz. Era paralelo ao trabalho da Prefeitura de Esteio. Trabalhava de manhã na Prefeitura, como professor, concursado desde 2001. Questionado para explicar o motivo pelo qual a saúde foi afetada para o trabalho de professor, mas não foi afetada para o trabalho no teatro, referiu que tem provas de que ia nos locais de muleta, sem condições físicas, mas ia porque é um trabalho que acha muito importante. O trabalho com as crianças é sentado, nas segundas-feiras, das 18hs até as 19hs. Quanto ao trabalho na Prefeitura de Esteio, lhe foi dito, que nas condições em que estava, não poderia trabalhar. Recebia ajuda de custo para transporte, pago pela horta comunitária. O valor era variável, de acordo com o tempo que ficava a disposição. Era um trabalho social, não era um emprego. Ficava numa cadeira, com um violão e o tambor, e as crianças faziam as cenas. Se locomovia de carro, quando buscavam, as vezes de ônibus, de muleta. O autor refere que nunca omitiu essas informações, por isso está em Juízo. Caso tivesse omitido, não estaria presente. Era uma ajuda de custo o valor que recebia. Comprou medicação pra não sentir dores, pagou táxi, comprou muletas.

A testemunha Lucy informou que o autor foi indicado pra dar teatro na Associação da Horta Comunitária União dos Operários. A depoente mora no local há 34 anos, é zeladora. A maioria das pessoas que lá trabalham são voluntários. Tem atualmente, uma professora de dança e um estagiário. Atende pessoas carentes, crianças e adultos. O trabalho do autor era eventual. Recebia ajuda apenas para as passagens. O dinheiro vinha dos associados apenas, sem incentivos. O autor trabalhava nas terças e quintas. Não sabe como era feito o pagamento. A associação tem um contador. São umas 20 ou 30 crianças. Tem adultos também.

A testemunha Alcindo declarou que conhece o autor da horta comunitária. O depoente faz parte da diretoria da horta, como voluntário. Coordena o plantio dos canteiros. É metalúrgico. A associação começou nos anos 80. Fizeram projetos com jovens. Começou com o plantio dos canteiros. A D. Lucy é a presidente. Atualmente tem uma pessoa contratada apenas, que é assistente social. O autor começou como voluntário em 2013, como oficineiro de teatro. Dava oficina de teatro para crianças e adolescentes. Viu várias vezes. Tinha outros voluntários que davam aula de teatro. O autor ia as vezes, uma ou duas vezes na semana. Recebia ajuda de custo para ônibus, não era salário. Saía do caixa da associação. Cada aula durava 1h em média. Um escritório de Porto Alegre fazia o pagamento. O autor recebia porque vinha de longe. Acredita que foram recolhidas as contribuições porque tinha que fazer a saída do dinheiro do caixa. Não dava nem R$ 200,00.

A testemunha Genildes afirmou que conhece o autor da instituição em que trabalha, na Horta Comunitária. No momento tem um projeto como assistente social. É contratada. Tem um convênio da Prefeitura que recebe verba do governo federal. Trabalha lá desde 18/04/2011. O autor era voluntário, dava aula de teatro para as crianças. Viu o autor fazendo o trabalho. O autor trabalhava nas terças e quintas. Não sabe se os voluntários recebiam pagamentos. Já entrou como contratada, da entidade.

Logo, fica claro que o autor não teve filiações diversas e concomitantes, com contribuições para ambos os regimes previdenciários (Geral e Estatutário).

Na verdade, não houve retorno ao trabalho habitual, mas sim que foi possível ao autor compatibilizar a sua incapacidade laboral para o exercício da atividade de auxiliar de creche (que exigia esforço físico) decorrente do vínculo empregatício com o Município de Esteio com as atividades ligadas à área cultural, sendo razoável deduzir que superou as limitações físicas em prol da atuação comunitária, pela qual é grande o seu apreço. Para dar uma noção disso, vale transcrever a conclusão do perito judicial, em laudo apresentado na data de 22/04/2017 (evento 25, LAUDOPERIC1):

"Data da perícia: 22/04/2017 00:00:59

Examinado: JOAO MAXIMO DA SILVA

Data de nascimento: 26/05/1957

Idade: 59

Estado Civil: Solteiro

Sexo: Masculino

UF: RS

CPF: 29814812072

Escolaridade: Ens. Sup. Incompleto

Complemento Escolaridade: Curso de pedagogia

Profissão: Professor afastado

Última Atividade: Professor

Data Última Atividade: 23/12/2016

(...)

Diagnóstico/CID:

- Exame médico e consulta com finalidades administrativas (Z02)

- Complicações de dispositivos protéticos (T84)

Justificativa/conclusão: Incapacidade total temporária para as atividades laborais e habituais.
Pós-operatório tardio de revisão de artroplastia de quadril à direita.
Exame físico alterado, com marcha claudicante, mobilização do quadril prejudicada e dor local. O membro inferior direito encontra-se diminuído em 2cm.
Os exames de imagem demonstram soltura asséptica do material de prótese do quadril à direita. Tal soltura gera dor e impotência funcional do membro inferior.
O tratamento definitivo passa por nova cirurgia no quadril direito.
Foram concedidos dois benefícios previdenciários em relação aos quadris:
Em benefício previdenciário:
B31 11/05/2006 a 31/12/2006 (prótese do quadril direito)
B31 11/04/2010 a 15/07/2015 (prótese de ambos os quadris)
Após o retorno do segundo benefício previdenciário, a parte autora não apresentava capacidade laboral. Dessa forma, trabalhou de forma prejudicada.
A avaliação da DII levou em consideração a data do segundo benefício previdenciário.
A DCB levou em consideração o tempo necessário e suficiente para recuperação completa e retorno às atividades laborais.
Não apresenta restrições para os atos da vida civil. As queixas/comorbidades não afetam o discernimento para a prática dos atos da vida civil.
Não necessita do auxílio de terceiros para realizar as atividades de rotina (vestuário, alimentação e higiene).

Data de Início da Doença: 2005

Data de Início da Incapacidade: 11/04/2010

Data de Cancelamento do Benefício: 28/04/2018

- Incapacidade temporária.

(...)."

Boa-fé

Conquanto não exista um conceito claro a respeito da boa-fé, é inegável que suas vertentes orbitam sobre a ética e a moralidade.

Doutrinariamente, a boa-fé pode ser tida como objetiva e subjetiva. Aquela se identifica pelo padrão de conduta a ser tomado pelo cidadão. Já esta emerge do aspecto anímico do agente, suas convicções internas, conhecimentos e desconhecimentos (FIUZA, Cesar. Direito Civil: Curso Completo. 12. Ed- Belo Horizonte: Del Rey, 2008, fl. 410). O caso dos autos envolve a boa-fé subjetiva, referente a um estado psicológico do beneficiário que recebe valores que supostamente não faz jus.

Os limites da boa-fé subjetiva como óbice à restituição de valores recebidos por erro no pagamento administrativo, situação que ocorreu na hipótese em liça, foram bem delineados pelo Desembargador Federal Rômulo Pizzolatti, em artigo intitulado A restituição de benefícios previdenciários pagos indevidamente e seus requisitos, publicado na Revista do Tribunal Regional Federal da 4ªRegião, nº 78, p. 111/115.

O referido magistrado pontua que não se cabe cogitar presunções, uma vez que "a boa-fé e a má-fé se incluem no âmbito das questões de fato e provam-se por indícios e circunstâncias, incumbindo a quem as alegar o ônus da prova". Pondera que, "se o beneficiário alegar que recebeu os valores indevidos de boa-fé, não estando por isso obrigado a restituí-los, caber-lhe-á prová-lo". Em contrapartida, "se o INSS alegar que o beneficiário recebeu os valores indevidos de má-fé, devendo por isso restituir os valores de uma só vez, caber-lhe-á então a prova do que alega". A seguir, trata de questão crucial para a configuração do caso concreto, conforme o seguinte excerto:

"(...) Adotada a concepção ética da boa-fé, predominante no nosso direito, caberá então a restituição de valores indevidamente pagos pela Previdência Social, em decorrência de erro administrativo, sempre que a ignorância do erro pelo beneficiário não for desculpável. A meu ver, não é desculpável o recebimento de benefícios inacumuláveis (Lei nº 8.213, de 1991, art. 124), porque a lei é bastante clara, sendo de exigir-se o seu conhecimento pelo beneficiário. Também não será escusável o recebimento, em virtude de simples revisão, de valor correspondente a várias vezes o valor do benefício. Do mesmo modo, não cabe alegar boa-fé o pensionista que recebe pensão de valor integral e continua a receber o mesmo valor, ciente de que outro beneficiário se habilitou e houve o desdobramento da pensão. De qualquer modo, serão os indícios e circunstâncias que indicarão, em cada caso concreto, se a ignorância do erro administrativo pelo beneficiário é escusável ou não."

Portanto, se a ignorância do erro administrativo pelo beneficiário for desculpável, extrai-se a ilação de que agira com boa-fé, inviabilizando a restituição. Caso contrário, tratando-se de ignorância indesculpável, haverá indício de má-fé e consequente necessidade de repetição. Tal distinção fixa-se na premissa que o negligente não pode lograr posição jurídica igual ou melhor que aquele que age com prudência e temperamento.

Transpondo tais conclusões para o presente caso, concluo que não há prova de que o apelante tenha recebido os valores de má-fé (em seu sentido ético).

Aplica-se, pois, ao caso em foco o entendimento jurisprudencial no sentido da irrepetibilidade dos valores recebidos a título de benefício previdenciário ante a ausência de prova de má-fé do beneficiário, considerando-se que a má-fé deve ser provada, enquanto a boa-fé pode ser presumida. Nesta senda:

PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO CONCEDIDO IRREGULARMENTE. RESSARCIMENTO INDEVIDO. MÁ-FÉ DO BENEFICIÁRIO NÃO COMPROVADA. Ausente comprovação de que a parte beneficiada tenha participado da fraude para a percepção do benefício previdenciário posteriormente cancelado, ou que tenha agido de má-fé, incabível o ressarcimento ao erário dos valores recebidos. (TRF4, AC 5007408-59.2016.4.04.7206, NONA TURMA, Relator CELSO KIPPER, juntado aos autos em 28/11/2022)

PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. RECEBIMENTO INDEVIDO. ERRO ADMINISTRATIVO. BOA-FÉ. IRREPETIBILIDADE. Não havendo prova de má-fé do beneficiário no recebimento indevido de benefício na via administrativa, decorrente de má aplicação de norma jurídica, interpretação equivocada ou erro da Administração, não cabe a devolução dos valores, considerando a natureza alimentar e o recebimento de boa-fé. (TRF4, AC 5000277-43.2020.4.04.7028, DÉCIMA TURMA, Relator MÁRCIO ANTÔNIO ROCHA, juntado aos autos em 01/12/2022)

PREVIDENCIÁRIO. RESSARCIMENTO. PAGAMENTOS INDEVIDOS AOS SEGURADOS. BOA-FÉ DO SEGURADO. 1. O STJ tem aditado o entendimento de que a boa-fé se presume e a má-fé se prova. Ou seja, atribuir má-fé à conduta do réu, mostra-se como medida claramente desproporcional, ao passo que o INSS, órgão federal, reconhecidamente aparelhado de diversos sistemas de fiscalização, deixou de agir, com maior cuidado, à época dos fatos. 2. Tendo a segurada recebido os valores de boa-fé, fica, por ora, afastada a obrigação de restituir os valores à Autarquia Previdenciária, não havendo razões para modificar o julgado. (TRF4, AC 5001256-23.2015.4.04.7014, DÉCIMA TURMA, Relatora CLÁUDIA CRISTINA CRISTOFANI, juntado aos autos em 30/11/2022)

Então, neste contexto, afigura-se inexigível a devolução dos valores recebidos pelo autor pelo auxílio-doença do NB 31/540.432.010-5, nos períodos de 01/10/2010 a 31/01/2011, de 01/08/2011 a 31/08/2011, de 01/09/2014 a 30/09/2014, de 01/04/2012 a 28/02/2015.

Outrossim, constata-se que a cessação do auxílio-doença foi indevida. Isso porque, como consignado no processo administrativo instaurado pelo INSS (evento 1, PROCADM6 - fl. 03)), na perícia médica realizada em 01/07/2015, o médico sugeriu a aposentadoria por invalidez do autor, o que somente não acolhido pelo setor Controle Médico Operacional da Agência (APS de São Leopoldo), por causa dos registros no CNIS do recolhimento de contribuições como contribuinte individual.

Infere-se claramente que, a despeito da persistência da incapacidade laboral reconhecida administrativamente, e confirmada pelo perito judicial, foi decisivo para a cessação do benefício uma questão formal (registro de recolhimentos no CNIS), desconsiderando-se a objetividade fática da incapacidade para o exercício da atividade habitual, tendo ficado esclarecido nos autos a impropriedade da condição de contribuinte individual que levou ao equivocado recolhimento das respectivas contribuições.

Por conseguinte, tendo em linha de consideração que a incapacidade laboral permanecia, que o autor é idoso (nasceu em 1957), que não consta que tenha se reabilitado, deve, com base no princípio da fungibilidade (a postulação inicial era de concessão de auxílio-acidente), ser restabelecido o auxílio-doença NB 31/540.432.010-5 desde o dia seguinte à cessação, isto é, 16-07-2015.

Consectários da Condenação

Os consectários legais incidentes sobre os valores devidos são os seguintes, ressalvada a aplicabilidade, na fase de cumprimento de sentença, de eventuais disposições legais posteriores que vierem a alterar os critérios atualmente vigentes.

Correção Monetária

A correção monetária incide a contar do vencimento de cada prestação, aplicando-se o INPC a partir de setembro de 2006 (Lei 11.430/06, que acrescentou o artigo 41-A à Lei 8.213/91), conforme decisão do Supremo Tribunal Federal no Tema 810, RE 870.947, Pleno, Rel. Min. Luiz Fux, DJE de 20.11.2017, item "2" (embargos de declaração rejeitados sem modulação dos efeitos em 03.10.2019, trânsito em julgado em 03.03.2020), e do Superior Tribunal de Justiça no Tema 905, REsp. 1.492.221/PR, 1ª Seção, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, DJe de 20.03.2018 , item "3.2" da decisão e da tese firmada.

Juros Moratórios

Os juros de mora se aplicam desde a citação, nos termos Súmula nº 204/STJ, ressalvados os casos específicos em que incidam as teses fixadas no Tema 995/STJ em razão de reafirmação da DER. Os índices são os seguintes:

a) até 29.06.2009, 1% (um por cento) ao mês;

b) a partir de 30.06.2009, de acordo com os índices oficiais de remuneração básica e juros aplicados à caderneta de poupança, conforme dispõe o artigo 5º da Lei 11.960/09, que deu nova redação ao artigo 1º-F da Lei 9.494/97, consoante decisão do STF no RE 870.947, DJE de 20.11.2017.

SELIC

A partir de 09.12.2021, nos termos do art. 3º da Emenda Constitucional nº 113/2021, nas condenações que envolvam a Fazenda Pública, independentemente de sua natureza, para fins de atualização monetária, remuneração do capital e compensação da mora, haverá a incidência do índice da taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia (Selic), acumulado mensalmente.

Tutela Específica

Nas ações previdenciárias deve-se, em regra, determinar a imediata implementação do benefício concedido, valendo-se da tutela específica da obrigação de fazer prevista no artigo 461 do Código de Processo Civil de 1973 (TRF4, QOAC 2002.71.00.050349-7, Rel. p/Ac. Des. Federal Celso Kipper, 3ª S., j. 09.08.2007), e nos artigos 497, 536 e parágrafos e 537, do Código de Processo Civil de 2015, independentemente de requerimento expresso por parte do segurado ou beneficiário, considerando-se também a ausência de efeito suspensivo a eventuais recursos cabíveis em face do presente acórdão.

Assim, é determinado ao INSS (obrigação de fazer) que implante à parte autora, via CEAB (Central Especializada de Análise de Benefício), o benefício abaixo descrito, no prazo máximo de 20 (vinte) dias para cumprimento:

TABELA PARA CUMPRIMENTO PELA CEAB
CUMPRIMENTORestabelecer Benefício
NB5404320105
ESPÉCIE
DIB17/07/2015
DIPPrimeiro dia do mês da decisão que determinou a implantação/restabelecimento do benefício
DCB
RMIA apurar
OBSERVAÇÕES

Na hipótese de a parte autora já estar em gozo de benefício previdenciário inacumulável, o INSS deverá implantar o benefício deferido judicialmente apenas se o valor de sua renda mensal atual for superior ao daquele.

Faculta-se à parte beneficiária manifestar eventual desinteresse quanto ao cumprimento desta determinação.

Honorários advocatícios

Em razão do provimento ao apelo da parte autora, a sucumbência preponderante é do INSS, fixando-se os honorários advocatícios no patamar de 10%, observados os percentuais mínimos previstos em cada faixa do § 3º do art. 85 do Código de Processo Civil, considerando as parcelas vencidas até a data deste acórdão, nos termos das Súmulas nº 111 do Superior Tribunal de Justiça e nº 76 deste Tribunal Regional Federal da 4ª Região, respectivamente:

Os honorários advocatícios, nas ações previdenciárias, não incidem sobre as prestações vencidas após a sentença.

Os honorários advocatícios, nas ações previdenciárias, devem incidir somente sobre as parcelas vencidas até a data da sentença de procedência ou do acórdão que reforme a sentença de improcedência.

Outrossim, nesta situação, não cabe majoração, em grau recursal, da verba honorária fixada na origem, pois ela está sendo substituída pelos honorários advocatícios fixados neste julgamento, em que se modificou a distribuição da sucumbência, atribuindo seus ônus ao INSS, bem como se majorou a base de cálculo da verba honorária ao prover o recurso da parte autora. Nesse sentido:

PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. OMISSÃO. HONORÁRIOS SUCUMBENCIAIS. MAJORAÇÃO. 1. Incabível a majoração dos honorários advocatícios em grau recursal, pois invertidos os ônus sucumbenciais, os quais passaram a ser integralmente suportados pelo INSS, que teve o seu recurso julgado prejudicado ante o provimento do apelo do autor. Sanada a omissão sem, contudo, alterar o julgado. (TRF4, AC 5017221-14.2019.4.04.7107, 5ª Turma, Relatora Juíza Federal Gisele Lemke, 13/04/2021)

Dispositivo

Ante o exposto, voto por dar provimento à apelação, nos termos da fundamentação.



Documento eletrônico assinado por ALCIDES VETTORAZZI, Juiz Federal Convocado, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40003667013v26 e do código CRC df00fc3f.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): ALCIDES VETTORAZZI
Data e Hora: 19/12/2023, às 18:13:40


5001561-33.2017.4.04.7112
40003667013.V26


Conferência de autenticidade emitida em 26/12/2023 04:16:57.

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5001561-33.2017.4.04.7112/RS

RELATOR: Juiz Federal ALCIDES VETTORAZZI

APELANTE: JOAO MAXIMO DA SILVA (AUTOR)

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)

EMENTA

previdenciário. benefício por incapacidade. registro de recolhimento como contribuinte individual. devolução de valores. inexigibilidade. restabelecimento do auxílio-doença. recurso provido.

1. Não ficando comprovado o retorno ao trabalho habitual, mas apenas a realização de atividades ligadas à área cultural compatíveis com a incapacidade laboral do autor, não é exigível a devolução dos valores recebidos a título de auxílio-doença no período de registro - equivocado - no CNIS de recolhimento de contribuições como contribuinte individual.

2. Se, a despeito da persistência da incapacidade laboral reconhecida administrativamente, e confirmada pelo perito judicial, foi decisivo para a cessação do benefício uma questão formal (registro de recolhimentos no CNIS), desconsiderando-se a objetividade fática da incapacidade para o exercício da atividade habitual, deve ser restabelecido o auxílio-doença NB 31/540.432.010-5.

3. Dar provimento ao recurso.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 11ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, dar provimento à apelação, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Florianópolis, 14 de dezembro de 2023.



Documento eletrônico assinado por ALCIDES VETTORAZZI, Juiz Federal Convocado, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40003667014v9 e do código CRC f5b258ad.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): ALCIDES VETTORAZZI
Data e Hora: 19/12/2023, às 18:13:40


5001561-33.2017.4.04.7112
40003667014 .V9


Conferência de autenticidade emitida em 26/12/2023 04:16:57.

Poder Judiciário
Tribunal Regional Federal da 4ª Região

EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 06/12/2023 A 14/12/2023

Apelação Cível Nº 5001561-33.2017.4.04.7112/RS

RELATOR: Juiz Federal ALCIDES VETTORAZZI

PRESIDENTE: Desembargadora Federal ANA CRISTINA FERRO BLASI

PROCURADOR(A): ELTON VENTURI

APELANTE: JOAO MAXIMO DA SILVA (AUTOR)

ADVOGADO(A): MARLISE SEVERO

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)

Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 06/12/2023, às 00:00, a 14/12/2023, às 16:00, na sequência 637, disponibilizada no DE de 27/11/2023.

Certifico que a 11ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:

A 11ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, DAR PROVIMENTO À APELAÇÃO.

RELATOR DO ACÓRDÃO: Juiz Federal ALCIDES VETTORAZZI

Votante: Juiz Federal ALCIDES VETTORAZZI

Votante: Desembargadora Federal ANA CRISTINA FERRO BLASI

Votante: Desembargadora Federal ELIANA PAGGIARIN MARINHO

LIGIA FUHRMANN GONCALVES DE OLIVEIRA

Secretária



Conferência de autenticidade emitida em 26/12/2023 04:16:57.

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