APELAÇÃO CÍVEL Nº 5018023-71.2016.4.04.9999/PR
RELATOR | : | Des. Federal AMAURY CHAVES DE ATHAYDE |
APELANTE | : | APARECIDA DE FATIMA PASSETTI TORRES |
ADVOGADO | : | MONICA MARIA PEREIRA BICHARA |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO POR INCAPACIDADE. RESTABELECIMENTO. INTERESSE DE AGIR. ALTA PROGRAMADA. PRÉVIO REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO. DESNECESSIDADE. CONTESTAÇÃO DE MÉRITO. TEORIA DA CAUSA MADURA. INCAPACIDADE. PROVA PERICIAL. CONCESSÃO ADMINISTRATIVA DE NOVO BENEFÍCIO POR INCAPACIDADE. ÔNUS SUCUMBENCIAIS. AJG.
1. À luz da tese fixada pelo STF no Tema nº 350 (RE nº 631.240), o pedido de restabelecimento do benefício previdenciário pode ser feito diretamente em juízo, revelando-se desnecessária a realização de prévio requerimento administrativo, salvo se se fundar em fato novo.
2. O cancelamento do benefício por incapacidade com base na alta programada é suficiente para a caracterização do interesse de agir do segurado que busca a tutela jurisdicional, não se podendo exigir do segurado, como condição de acesso ao Judiciário, que formule novo pleito administrativo.
3. Resta configurado o interesse de agir quando, embora a parte autora não tenha formulado prévio requerimento administrativo, o INSS contesta o mérito da ação.
4. À luz do art. 515, § 3º, do CPC e da jurisprudência do STJ, o mérito do pedido pode ser examinado diretamente por este Tribunal quando a causa está em condições de imediato julgamento, mesmo que envolva questões de fato e não haja pedido da parte recorrente nesse sentido.
5. A concessão dos benefícios por incapacidade depende de três requisitos: (a) a qualidade de segurado do requerente à época do início da incapacidade (artigo 15 da LBPS); (b) o cumprimento da carência de 12 contribuições mensais, exceto nas hipóteses em que expressamente dispensada por lei; (c) o advento, posterior ao ingresso no RGPS, de moléstia incapacitante para o desenvolvimento de atividade laboral que garanta a subsistência do segurado.
6. Não estando demonstrada a incapacidade laborativa do autor entre a cessação do benefício de auxílio-doença e a concessão de novo benefício por incapacidade, não é devido o restabelecimento do benefício nesse interregno.
7. Embora o magistrado não esteja vinculado ao laudo pericial, a formação do convencimento judicial se dá predominantemente a partir das conclusões do perito; apenas em hipóteses excepcionais é que cabe ao juiz, com base em sólida prova em contrário, afastar-se da conclusão apresentada pelo expert.
8. O benefício concedido administrativamente, no curso da demanda, em virtude de incapacidade provocada por enfermidades diversas, não integra o objeto da demanda.
9. Cabe à parte vencida arcar com o pagamento dos honorários advocatícios sucumbenciais e das custas processuais, restando suspensa a exigibilidade da cobrança quando a parte é beneficiária de Assistência Judiciária Gratuita.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Turma Regional Suplementar do Paraná do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento à apelação, para, afirmando a existência de interesse de agir, resolver o mérito e julgar improcedente o pedido de restabelecimento do benefício de auxílio doença, nos termos do relatório, votos e notas taquigráficas que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Curitiba, 14 de novembro de 2017.
Desembargador Federal AMAURY CHAVES DE ATHAYDE
Relator
| Documento eletrônico assinado por Desembargador Federal AMAURY CHAVES DE ATHAYDE, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 9207443v4 e, se solicitado, do código CRC 2BCC0C52. | |
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RELATÓRIO
O Sr. Desembargador Federal
AMAURY CHAVES DE ATHAYDE (Relator):
Trata-se de recurso de apelação interposto contra sentença que, em ação ordinária, julgou o processo extinto sem resolução do mérito, tendo em vista a ausência de interesse de agir (art. 267, IV, CPC/1973).
A parte apelante alega, inicialmente, que gozou do benefício de auxílio-doença até 09/04/2012, quando foi cessado em pelo decurso do prazo fixado na esfera administrativa. Entende que a cessação do benefício sem que seja a realização de nova perícia administrativa é suficiente para caracterizar a existência de pretensão resistida. Refere, outrossim, que o INSS apresentou contestação. Destaca, ainda, que a instrução processual, com a realização de perícia judicial, deixou evidente a permanência do quadro incapacitante. Requer, portanto, a reforma da sentença, determinando-se a baixa dos autos ao juízo de origem e o regular prosseguimento do feito.
Sem contrarrazões, subiram os autos a este Tribunal.
É o relatório. Peço dia.
Desembargador Federal AMAURY CHAVES DE ATHAYDE
Relator
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VOTO
O Sr. Desembargador Federal
AMAURY CHAVES DE ATHAYDE (Relator):
Interesse de agir
Discute-se, como visto, acerca da existência de interesse de agir.
Inicialmente, ressalto que o Supremo Tribunal Federal fixou, no julgamento do RE nº 631.240, importantes balizas para o exame da existência de interesse processual em demandas que visam à concessão, à revisão, à manutenção ou ao restabelecimento de benefícios previdenciários. Em decorrência do julgamento do referido recurso, foi editada Tese de Repercussão Geral (Tema nº 350), que transcrevo a seguir:
I - A concessão de benefícios previdenciários depende de requerimento do interessado, não se caracterizando ameaça ou lesão a direito antes de sua apreciação e indeferimento pelo INSS, ou se excedido o prazo legal para sua análise. É bem de ver, no entanto, que a exigência de prévio requerimento não se confunde com o exaurimento das vias administrativas;
II - A exigência de prévio requerimento administrativo não deve prevalecer quando o entendimento da Administração for notória e reiteradamente contrário à postulação do segurado;
III - Na hipótese de pretensão de revisão, restabelecimento ou manutenção de benefício anteriormente concedido, considerando que o INSS tem o dever legal de conceder a prestação mais vantajosa possível, o pedido poderá ser formulado diretamente em juízo - salvo se depender da análise de matéria de fato ainda não levada ao conhecimento da Administração -, uma vez que, nesses casos, a conduta do INSS já configura o não acolhimento ao menos tácito da pretensão;
IV - Nas ações ajuizadas antes da conclusão do julgamento do RE 631.240/MG (03/09/2014) que não tenham sido instruídas por prova do prévio requerimento administrativo, nas hipóteses em que exigível, será observado o seguinte: (a) caso a ação tenha sido ajuizada no âmbito de Juizado Itinerante, a ausência de anterior pedido administrativo não deverá implicar a extinção do feito; (b) caso o INSS já tenha apresentado contestação de mérito, está caracterizado o interesse em agir pela resistência à pretensão; e (c) as demais ações que não se enquadrem nos itens (a) e (b) serão sobrestadas e baixadas ao juiz de primeiro grau, que deverá intimar o autor a dar entrada no pedido administrativo em até 30 dias, sob pena de extinção do processo por falta de interesse em agir. Comprovada a postulação administrativa, o juiz intimará o INSS para se manifestar acerca do pedido em até 90 dias. Se o pedido for acolhido administrativamente ou não puder ter o seu mérito analisado devido a razões imputáveis ao próprio requerente, extingue-se a ação. Do contrário, estará caracterizado o interesse em agir e o feito deverá prosseguir;
V - Em todos os casos acima - itens (a), (b) e (c) -, tanto a análise administrativa quanto a judicial deverão levar em conta a data do início da ação como data de entrada do requerimento, para todos os efeitos legais.
Importa, aqui, delimitar a distinção, efetuada nesse precedente de observância obrigatória (art. 927, III, CPC), entre as ações relativas à concessão de benefício previdenciário e aquelas em que se pretende a revisão, o restabelecimento ou a manutenção do benefício. É que, nas primeiras, exige-se a realização de prévio requerimento administrativo (item I), ao passo que, nas demais, a parte pode requerer diretamente em juízo a tutela do seu direito (item III). A distinção repousa num critério relativamente simples: como o INSS tem o dever legal de conceder a prestação mais vantajosa possível ao segurado, se ele opta por conceder prestação menos vantajosa (a ensejar pedido de revisão do benefício) ou por cancelar o benefício (a justificar pedido de restabelecimento ou de manutenção), já se manifestou sobre o tema, descabendo exigir-se o exaurimento da via administrativa. Quando se trata da concessão de benefício previdenciário, por sua vez, é preciso, em regra, que o interessado formule requerimento administrativo, a fim de que se possa apurar a efetiva existência de pretensão resistida.
Com efeito, em se tratando de revisão, restabelecimento ou manutenção do benefício, a exigência de requerimento só se justifica quando o pedido se fundamenta em fato novo, que não foi exposto perante a autarquia previdenciária. Nos demais casos, porém, dispensa-se o requerimento administrativo prévio.
No caso em apreço, a parte autora esteve em gozo de auxílio-doença de 12/02/2012 a 09/04/2012 (evento 1, OUT2, p. 2). A cessação do benefício foi prevista no próprio ato de concessão, por meio da prática comumente denominada de alta programada.
Percebe-se, portanto, que se está diante de pedido de restabelecimento de benefício previdenciário - e não propriamente de concessão de benefício, o que atrai a aplicação do entendimento previsto no item III da tese fixada no Tema nº 350. Ou seja, dispensa-se a realização de prévio requerimento administrativo de restabelecimento do benefício, salvo se o pleito se fundamentar em fato novo.
Na hipótese, não se trata de fato novo, pois a enfermidade incapacitante a justificar a prorrogação do benefício é a mesma que ensejou a sua concessão. Logo, aplica-se a regra da dispensabilidade de prévio requerimento administrativo.
A solução conta, ainda, com o aval da doutrina, conforme se depreende do magistério de José Antonio Savaris (in Direito processual previdenciário. 6ª Ed., rev., atual. ampl. Curitiba: Alteridade Editora, p. 253):
Nas ações de restabelecimento, o autor da demanda buscará a revisão judicial do ato administrativo que decidiu pela cessação, cancelamento ou redução do valor do benefício. A lesão, em tese, ao direito já foi consumada, com a comunicação da decisão administrativa de cessação, cancelamento ou redução da renda mensal do benefício. Nada há que ser requerido administrativamente para viabilizar o ajuizamento da ação de restabelecimento, porque a necessidade e a utilidade do provimento jurisdicional estão caracterizadas. Como não se exige o exaurimento da instância administrativa, não é de se condicionar o acesso à jurisdição para a interposição de recurso administrativo. Se isso fosse exigido, estaríamos então separando o indivíduo que sofre os efeitos imediatos de um ato administrativo da possibilidade de buscar judicialmente a realização de seu direito material.
Saliento, outrossim, que a jurisprudência desta Corte está sedimentada no sentido de que, cancelado o benefício em razão da alta programada, está configurada a pretensão resistida do INSS, a justificar a propositura de ação judicial. Nesse sentido, confiram-se os precedentes abaixo:
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSO CIVIL. RESTABELECIMENTO DE AUXÍLIO-DOENÇA OU CONCESSÃO DE APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. INTERESSE DE AGIR. ALTA PROGRAMADA. SENTENÇA ANULADA. 1. Possui interesse de agir o segurado que ingressa com a ação judicial após o cancelamento administrativo de benefício por incapacidade. 2. Caracteriza resistência à pretensão a "alta programada" no caso em que não haja a devida justificação da cessação do benefício mediante a realização de perícia médica para aferir a recuperação da capacidade laborativa dão segurado. 3. Sentença anulada e determinado o prosseguimento do processo. (TRF4, AC 5054676-72.2016.404.9999, SEXTA TURMA, Relatora SALISE MONTEIRO SANCHOTENE, juntado aos autos em 30/03/2017)
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSO CIVIL. AUXÍLIO-DOENÇA. ALTA PROGRAMADA. RESTABELECIMENTO. INTERESSE DE AGIR. EXAURIMENTO DA VIA ADMINISTRATIVA. DESNECESSIDADE. SÚMULAS 213, TFR E 89 DO STJ. 1. Sendo a autora beneficiária de auxílio-doença, com cancelamento previamente estabelecido, ainda que não tenha havido pedido de prorrogação, não resta descaracterizada a resistência à pretensão, pois se alega indevida a suspensão programada. 2. O exaurimento da via administrativa é desnecessário para a propositura de ação judicial, na linha das Súmulas 213 do extinto TFR e 89 do STJ. (TRF4, AC 5034665-56.2015.404.9999, QUINTA TURMA, Relator PAULO AFONSO BRUM VAZ, juntado aos autos em 19/10/2016)
AGRAVO DE INSTRUMENTO. AUXÍLIO-DOENÇA. ALTA PROGRAMADA. REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO. PRETENSÃO RESISTIDA CONFIGURADA. O cancelamento do benefício é suficiente para caracterização do interesse de agir do segurado que busca a tutela jurisdicional, não se podendo exigir do segurado que teve cessado seu benefício por alta programada, novo pleito administrativo como condição de acesso ao Judiciário. (TRF4, AG 0000202-66.2016.404.0000, QUINTA TURMA, Relator LUIZ ANTONIO BONAT, D.E. 25/04/2016)
Não bastasse isso, cumpre sublinhar que o INSS apresentou contestação de mérito, o que revela, igualmente, a existência de pretensão resistida, pois indica que o pedido administrativo, se tivesse sido formulado, teria sido indeferido. Cuida-se de entendimento não só sedimentado pelo STF no item IV, "b", da tese acima transcrita, mas também de orientação reiteradamente seguida por esta Corte, conforme se percebe a seguir:
PREVIDENCIÁRIO. AUSÊNCIA DE PRÉVIO REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO. CONTESTAÇÃO NO MÉRITO. INTERESSE DE AGIR CONFIGURADO. TEMPO DE SERVIÇO RURAL. REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR. TEMPO DE SERVIÇO ESPECIAL. APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO/CONTRIBUIÇÃO. AVERBAÇÃO. 1. Resta configurado o interesse de agir quando, embora a parte autora não tenha formulado prévio requerimento administrativo, o INSS contesta o mérito da ação. Ao contestar o mérito da demanda o INSS se opõe à pretensão, caracterizando a pretensão resistida. Nesse sentido, ademais, os julgados desta Corte, do Superior Tribunal de Justiça e, ainda, do Supremo Tribunal Federal ao apreciar o Tema 350 (prévio requerimento administrativo como condição para o acesso ao judiciário). 2. Comprovado o labor rural em regime de economia familiar, mediante a produção de início de prova material, corroborada por prova testemunhal idônea, o segurado faz jus ao cômputo do respectivo tempo de serviço. 3. Comprovada a exposição do segurado a agente nocivo, na forma exigida pela legislação previdenciária aplicável à espécie, possível reconhecer-se a especialidade da atividade laboral por ele exercida. 4. Não tem direito ao reconhecimento da especialidade do tempo de serviço o segurado que não comprova a efetiva exposição a agentes nocivos ou o exercício de atividade profissional enquadrável como especial. 5. Não tem direito à aposentadoria por tempo de serviço/contribuição o segurado que, somados os períodos reconhecidos judicialmente àqueles já computados na esfera administrativa, não possui tempo de serviço suficiente à concessão do benefício. Faz jus, no entanto, à averbação dos períodos judicialmente reconhecidos para fins de obtenção de futuro benefício. (TRF4, APELREEX 0004340-23.2014.404.9999, QUINTA TURMA, Relator ROGERIO FAVRETO, D.E. 09/06/2017)
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. PRÉVIO REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO. INTERESSE DE AGIR. REPERCUSSÃO GERAL. RE 631.240/MG. TEMPO ESPECIAL. APOSENTADORIA ESPECIAL. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. CORREÇÃO MONETÁRIA E JUROS DE MORA. FASE DE CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. DIFERIMENTO. 1. Face ao julgamento do RE 631.240, em sede de recurso repetitivo, o Supremo Tribunal Federal assentou entendimento no sentido da indispensabilidade do prévio requerimento administrativo de benefício previdenciário como pressuposto para que se possa acionar legitimamente o Poder Judiciário, ressaltando ser prescindível o exaurimento daquela esfera. 2. O STF fixou uma fórmula de transição a ser aplicável a todas as ações ajuizadas até a data do julgamento da repercussão geral. Nas ações em que o INSS tiver apresentado contestação de mérito, estará caracterizado o interesse de agir pela resistência à pretensão, implicando na possibilidade de julgamento do mérito, independentemente do prévio requerimento administrativo 3. No caso em tela, houve oposição expressa ao reconhecimento de períodos especiais em apelação. Ocorrend contestação de mérito, caracterizado o interesse de agir. 4. Tem direito a parte à concessão de aposentadoria especial/aposentadoria por tempo de contribuição, por reconhecimento dos períodos especiais postulados. 5. Deliberação sobre índices de correção monetária e taxas de juros diferida para a fase de cumprimento de sentença, a iniciar-se com a observância dos critérios da Lei 11.960/2009, de modo a racionalizar o andamento do processo, permitindo-se a expedição de precatório pelo valor incontroverso, enquanto pendente, no Supremo Tribunal Federal, decisão sobre o tema com caráter geral e vinculante. Precedentes do STJ e do TRF da 4ª Região. (TRF4 5055554-12.2012.404.7000, SEXTA TURMA, Relator (AUXILIO VANIA) BIANCA GEORGIA CRUZ ARENHART, juntado aos autos em 08/06/2017)
Está presente, portanto, o interesse de agir.
Julgamento do mérito - art. 515, § 3º, CPC/1973
Embora a parte recorrente mencione que pretende a "reforma" da sentença, postula a baixa dos autos para que se dê regular prosseguimento ao feito, a denotar que o pedido, em verdade, é de anulação da sentença.
Não obstante, constato que o mérito dos embargos pode - e, a rigor, deve, tendo em vista o princípio da economia processual - ser julgado diretamente por este Tribunal. É que a causa está em condições de imediato julgamento, conforme prevê o art. 515, § 3º do CPC/1973 (aplicável à hipótese, já que a sentença recorrida foi publicada sob a sua vigência), que positiva a teoria da causa madura, verbis:
§ 3o Nos casos de extinção do processo sem julgamento do mérito (art. 267), o tribunal pode julgar desde logo a lide, se a causa versar questão exclusivamente de direito e estiver em condições de imediato julgamento.
Reconheço que o exame do mérito do pedido não envolve questão exclusivamente de direito - como exige o texto normativo. Todavia, de acordo com precedente da Corte Especial do STJ, "a regra do art. 515, § 3º, do CPC deve ser interpretada em consonância com a preconizada pelo art. 330, I, do CPC, razão pela qual, ainda que a questão seja de direito e de fato, não havendo necessidade de produzir prova (causa madura), poderá o Tribunal julgar desde logo a lide, no exame da apelação interposta contra a sentença que julgara extinto o processo sem resolução de mérito" (EREsp 874.507/SC, Rel. Ministro Arnaldo Esteves Lima, Corte Especial, DJe 1°/7/2013). E, no caso, a prova de interesse das partes já foi produzida, com a realização, inclusive, de prova pericial.
Friso, noutro giro, que a inexistência de pedido da parte recorrente para que o mérito seja julgado por este Tribunal não o impede de examiná-lo. Nessa linha, veja-se que o STJ tem assentado ser "firme o entendimento desta Corte no sentido de ser dispensável pedido expresso da parte recorrente para que, afastada a extinção do processo sem resolução do mérito, possa o Tribunal julgar de imediato o feito" (AgRg no REsp 1086080/AL, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, DJe 11/12/2013).
Isso posto, passo ao exame do mérito da controvérsia.
Benefício por incapacidade
Cumpre, de início, rememorar o tratamento legal conferido aos benefícios de auxílio-doença e de aposentadoria por invalidez.
O art. 59 da Lei n.º 8.213/91 (Lei de Benefícios da Previdência Social - LBPS) estabelece que o auxílio-doença será devido ao segurado que, havendo cumprido, quando for o caso, o período de carência exigido em lei, ficar incapacitado para o seu trabalho ou para a sua atividade habitual por mais de 15 (quinze) dias consecutivos. Por sua vez, o art. 42 da Lei nº 8.213/91 estatui que a aposentadoria por invalidez será concedida ao segurado que, tendo cumprido a carência, for considerado incapaz e insuscetível de reabilitação para o exercício de atividade que lhe garanta a subsistência. O art. 25 desse diploma legal esclarece, a seu turno, que a carência exigida para a concessão de ambos os benefícios é de 12 (doze) meses, salvo nos casos em que é expressamente dispensada (art. 26, II).
Em resumo, portanto, a concessão dos benefícios depende de três requisitos: (a) a qualidade de segurado do requerente à época do início da incapacidade (artigo 15 da LBPS); (b) o cumprimento da carência de 12 contribuições mensais, exceto nas hipóteses em que expressamente dispensada por lei; (c) o advento, posterior ao ingresso no RGPS, de moléstia incapacitante para o desenvolvimento de atividade laboral que garanta a subsistência do segurado.
Note-se que a concessão do auxílio-doença não exige que o segurado esteja incapacitado para toda e qualquer atividade laboral; basta que esteja incapacitado para a sua atividade habitual. É dizer: a incapacidade pode ser total ou parcial. Além disso, pode ser temporária ou permanente. Nisso, precisamente, é que se diferencia da aposentadoria por invalidez, que deve ser concedida apenas quando constatada a incapacidade total e permanente do segurado. Sobre o tema, confira-se a lição doutrinária de Daniel Machado da Rocha e de José Paulo Baltazar Júnior:
A diferença, comparativamente à aposentadoria por invalidez, repousa na circunstância de que para a obtenção de auxílio-doença basta a incapacidade para o trabalho ou atividade habitual do segurado, enquanto para a aposentadoria por invalidez exige-se a incapacidade total, para qualquer atividade que garanta a subsistência. Tanto é assim que, exercendo o segurado mais de uma atividade e ficando incapacitado para apenas uma delas, o auxílio-doença será concedido em relação à atividade para a qual o segurado estiver incapacitado, considerando-se para efeito de carência somente as contribuições relativas a essa atividade (RPS, art. 71, § 1º) (in ROCHA, Daniel Machado da. BALTAZAR JÚNIOR, José Paulo. Comentários à Lei de Benefícios da Previdência Social. 15. ed. rev., atual. e ampl. - São Paulo: Atlas, 2017).
De qualquer sorte, o caráter da incapacidade (total ou parcial) deve ser avaliado não apenas por um critério médico, mas conforme um juízo global que considere as condições pessoais da parte autora - em especial, a idade, a escolaridade e a qualificação profissional - a fim de se aferir, concretamente, a sua possibilidade de reinserção no mercado de trabalho.
Cumpre demarcar, ainda, a fungibilidade entre as ações previdenciárias, tendo em vista o caráter eminentemente protetivo e de elevado alcance social da lei previdenciária. De fato, a adoção de soluções processuais adequadas à relação jurídica previdenciária constitui uma imposição do princípio do devido processo legal, a ensejar uma leitura distinta do princípio dispositivo e da adstrição do juiz ao pedido (SAVARIS, José Antônio. Direito processual previdenciário. 6 ed., rev. atual. e ampl. Curitiba: Alteridade Editora, 2016, p. 67). Por isso, aliás, o STJ sedimentou o entendimento de que "não constitui julgamento extra ou ultra petita a decisão que, verificando não estarem atendidos os pressupostos para concessão do benefício requerido na inicial, concede benefício diverso cujos requisitos tenham sido cumpridos pelo segurado" (AgRG no AG 1232820/RS, Rel. Min. Laurita Vaz, 5ª Turma, j. 26/10/20, DJe 22/11/2010).
Isso posto, passo a examinar o preenchimento dos requisitos para o gozo do benefício pretendido.
Incapacidade
Como visto acima, a autora recebeu auxílio-doença de 12/02/2012 a 09/04/2012 (NB 5501036084), em virtude de doença na coluna, postulando, aqui, o restabelecimento do benefício desde a sua cessação.
No entanto, não restou demonstrada a incapacidade da autora desde a data de cessação do benefício. Com efeito, embora o laudo pericial (evento 40), elaborado em 13/06/2015, tenha reconhecido a incapacidade total e temporária da autora, referiu que a incapacidade teve início somente em 2014 (quando realizada operação cirúrgica) e decorreu de enfermidades de natureza diversa - tendinopatia no ombro direito (CID M75.1) e epicondilite lateral no cotovelo direito (CID M77.1). O laudo menciona, inclusive, que, a autora teria retornado ao trabalho em 2012, nele permanecendo até 2014, o que é corroborado pelos dados constantes no CNIS.
Registro, outrossim, que a incapacidade constatada pelo perito ensejou, na esfera administrativa, a concessão de novo benefício de auxílio-doença (NB 6057388082 - evento 51), de 05/04/2014 a 21/01/2017. Consigno, igualmente, que, no trâmite do processo, a parte autora não fez qualquer referência ao novo benefício que lhe fora concedido, o que torna evidente que o objeto desta demanda está limitado ao restabelecimento do benefício anterior (NB 5501036084) - o qual, naturalmente, somente poderia perdurar, se devido fosse, até a concessão do novo benefício (05/04/2014). Esse, em verdade, constitui o limite da controvérsia.
E, nesse particular, não há prova a suportar o pleito da autora, já que o laudo pericial aponta o início da incapacidade apenas em 2014, quando a autora foi submetida a cirurgia no punho direito. Tampouco os documentos médicos acostados aos autos são capazes de evidenciar que a autora tenha permanecido incapaz no interregno de 2012 a 2014 - quando, aliás, aparenta ter exercido regularmente a sua atividade habitual.
Reconheço que o juiz não está vinculado ao laudo pericial judicial (art. 479, CPC). Todavia, conforme reiteradamente afirmado por esta Corte, "a concessão de benefício previdenciário por incapacidade decorre da convicção judicial formada predominantemente a partir da produção de prova pericial" (TRF4, APELREEX 0013571-06.2016.404.9999, SEXTA TURMA, Relatora SALISE MONTEIRO SANCHOTENE, D.E. 11/07/2017). Apenas em situações excepcionais é que o magistrado pode, com base em sólida prova em contrário, afastar-se da conclusão apresentada pelo perito -- hipótese de que, aqui, não se cuida.
Restando afastada a incapacidade laborativa no período examinado, fica prejudicado, naturalmente, o exame da qualidade de segurado e do preenchimento da carência.
Desse modo, o pedido deve ser julgado improcedente. Isso não impede, todavia, que o autor venha a discutir, em demanda diversa, a cessação do NB 6057388082, pois se trata de matéria que extrapola os limites desta lide.
Ônus sucumbenciais
Em razão da sucumbência, cabe à parte autora arcar com as custas processuais e com os honorários advocatícios. No que tange à verba honorária, arbitro-a - à luz dos critérios previstos no art. 20, § 3º, do CPC/1973 - em 10% sobre o valor atualizado da causa. Não obstante, a exigibilidade de ambas as verbas fica suspensa, pois o autor litiga sob o pálio da AJG.
Ante o exposto, voto no sentido de dar parcial provimento à apelação, para, afirmando a existência de interesse de agir, resolver o mérito e julgar improcedente o pedido de restabelecimento do benefício de auxílio doença (NB 5501036084).
Desembargador Federal AMAURY CHAVES DE ATHAYDE
Relator
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 14/11/2017
APELAÇÃO CÍVEL Nº 5018023-71.2016.4.04.9999/PR
ORIGEM: PR 00045194620138160097
RELATOR | : | Des. Federal AMAURY CHAVES DE ATHAYDE |
PRESIDENTE | : | Luiz Fernando Wowk Penteado |
PROCURADOR | : | Dr. João Heliofar Villar |
APELANTE | : | APARECIDA DE FATIMA PASSETTI TORRES |
ADVOGADO | : | MONICA MARIA PEREIRA BICHARA |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 14/11/2017, na seqüência 444, disponibilizada no DE de 30/10/2017, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) Turma Regional suplementar do Paraná, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU DAR PARCIAL PROVIMENTO À APELAÇÃO, PARA, AFIRMANDO A EXISTÊNCIA DE INTERESSE DE AGIR, RESOLVER O MÉRITO E JULGAR IMPROCEDENTE O PEDIDO DE RESTABELECIMENTO DO BENEFÍCIO DE AUXÍLIO DOENÇA (NB 5501036084).
RELATOR ACÓRDÃO | : | Des. Federal AMAURY CHAVES DE ATHAYDE |
VOTANTE(S) | : | Des. Federal AMAURY CHAVES DE ATHAYDE |
: | Des. Federal FERNANDO QUADROS DA SILVA | |
: | Des. Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO |
Suzana Roessing
Secretária de Turma
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