
Apelação Cível Nº 5027540-95.2019.4.04.9999/SC
RELATOR: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ
APELANTE: LEONARDO TEIXEIRA
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RELATÓRIO
Cuida-se de apelação interposta pela parte autora em face da sentença, publicada em 04/06/2019 (e. 2.60), que julgou procedente o pedido de benefício por incapacidade:
Com essas considerações, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos articulados nesta AÇÃO ORDINÁRIA deflagrada por LEONARDO TEIXEIRA em face do INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL – INSS, para:
(A) DETERMINAR que o réu restabeleça em favor da parte autora o benefício de auxílio-doença por acidente do trabalho nº 620.974.884-1, desde a data de 30.04.2018 (DCB), valendo ressaltar que tal benefício será devido pelo prazo de 04 (quatro) meses, a contar da data de hoje (04.06.2019);
(B) CONDENAR o réu a quitar as parcelas vencidas do benefício deferido nesta sentença, desde a data de 30.04.2018, de uma só vez, corrigidas monetariamente desde a data de vencimento de cada prestação.
Sustenta, em síntese, que preenche os requisitos necessários ao restabelecimento de AUXÍLIO-DOENÇA, desde 24/02/2015 (e. 2.64).
Embora intimado, o INSS não apresentou contrarrazões.
Vieram os autos a esta Corte para julgamento.
É o relatório.
VOTO
Preliminar de competência
Inicialmente, reputo imprescindível esclarecer que a parte autora nada referiu na petição inicial (e. 2.1) sobre eventual acidente do trabalho, limitando-se a articular a impossibilidade de continuidade do labor como mecânico de caminhões em razão dos problemas ortopédicos.
Diante disso, e tendo em vista que o Superior Tribunal de Justiça vem entendendo que "o pedido inicial deve ser interpretado em consonância com a pretensão deduzida, esta extraída da interpretação lógico-sistemática da exordial como um todo, e não apenas do capítulo relativo ao 'pedido" (STJ, REsp 1.104.357/RS, Rel.Ministra LAURITA VAZ, QUINTA TURMA, DJe de 05/03/12) e "a competência é definida com amparo na causa petendi e no pedido deduzido na demanda" (STJ, CC 128.982/DF, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, PRIMEIRASEÇÃO, DJe de 05/12/2013) e, ainda, "é imprescindível para determinar a natureza do benefício-acidente o exame do substrato fático que ampara o pedido e a causa de pedir deduzidos em juízo" (STJ, CC 37.435/SC, Rel. MinistroPAULO GALLOTTI, Rel. p/ Acórdão Ministra LAURITA VAZ, TERCEIRASEÇÃO, DJ de 25/02/2004), não há dúvida de que a espécie de benefício por incapacidade pretendida neste feito pela demandante é previdenciária, e não acidentária.
Por conseguinte, remanesce hígida a competência desta Corte para processar e julgar o pedido de retroação do termo inicial de auxílio-doença.
Exame do caso concreto
A parte autora (mecânico e 30 anos de idade atualmente) objetiva o restabelecimento do AUXÍLIO-DOENÇA NB 609.859.323-3, desde 24/02/2015, decorrente de doença ortopédica (Discopatia Degenerativa L3-4 e L4-5 com hérnias discais posterocentrais L3-4/L4-5 com dor lombar e transtorno de disco vertebral - M54.5/M51.9), comprovada pela seguinte documentação clínica:
a) e. 2.16:
b) e. 2.16:
c) e. 2.57:
Processado o feito, sobreveio sentença julgando improcedente a demanda em face de laudo pericial que considerou a parte autora apta ao labor.
Não obstante as considerações esposadas pelo expert, sabe-se que o juízo não está adstrito às conclusões do laudo médico pericial, nos termos do artigo 479 do NCPC (Art. 479. O juiz apreciará a prova pericial de acordo com o disposto no art. 371, indicando na sentença os motivos que o levaram a considerar ou a deixar de considerar as conclusões do laudo, levando em conta o método utilizado pelo perito), podendo discordar, fundamentadamente, das conclusões do perito em razão dos demais elementos probatórios coligidos aos autos, inclusive os aspectos socioeconômicos, profissionais e culturais do segurado, ainda que o laudo pericial apenas tenha concluído pela sua incapacidade parcial para o trabalho (AgRg no AREsp 35.668/SP, Rel. Ministro NEFI CORDEIRO, SEXTA TURMA, DJe 20-02-2015).
Vale aqui destacar que seria uma violência contra o segurado, que exerce atividade que exige intenso esforço físico exigir-se que persista desempenhando trabalhos rudes e que exigem flexões posturais incompatíveis com suas patologias que são progressivas.
Há um princípio pouco conhecido e utilizado do Direito Previdenciário que é o princípio da prevenção do estado de higidez do segurado. Ora, é certo que se o segurado especial, servente, auxiliar de serviços gerais, faxineira continuar trabalhando, seu estado de saúde deverá agravar-se. A concessão do benefício funciona, então, como mecanismo de prevenção de risco. Vale dizer, o risco de agravamento de doenças diagnosticadas na perícia e que, se hoje não incapacitam integralmente o segurado, na medida em que der continuidade ao labor, poderão vir a incapacitá-lo, com ônus para a própria seguridade social.
O princípio da prevenção-precaução está direcionado para proteger bens jurídicos de hierarquia constitucional: vida e saúde. E aqui, ao contrário do que se tem corriqueiramente, não há outro bem jurídico que esteja a periclitar diante desses. Não há qualquer colidência de princípios ou direitos fundamentais. Ao contrário, a prevenção/precaução impõe-se como inafastável justamente na medida em que preserva o conteúdo essencial dos direitos humanos fundamentais e constitucionais à vida e à saúde. Note-se, por outro lado, que o princípio da precaução tem aplicabilidade quando existe a dúvida científica e a prevenção quando existe a certeza do dano. Esta diferença vai ter importância porque muitas vezes sequer a perícia consegue identificar a relação de causalidade entre a atividade desenvolvida pelo segurado e as patologias ou morbidades que o acometem.
Com efeito, a parte autora é portadora de patologias que no seu conjunto (somadas) recomendam a cessação de determinadas atividades físicas (trabalho) que possam, pelo esforço ou tipo de movimento, levar ao agravamento ou mesmo à irreversibilidade do quadro sintomático, desencadeando a incapacidade definitiva. Sobre esse quadro fático, apurado pericialmente (não sendo, portanto, um palpite infeliz do juiz), é que vai incidir o enunciado do princípio da prevenção/precaução, consubstanciado na possibilidade (não certeza) de a continuidade do trabalho potencialmente agravar a patologia.
Assim, tendo a perícia certificado a existência da patologia alegada pela parte autora, o juízo de incapacidade pode ser determinado, sem sombra de dúvidas, pelas regras da experiência do magistrado, consoante preclara disposição do artigo 375 do NCPC (O juiz aplicará as regras de experiência comum subministradas pela observação do que ordinariamente acontece e, ainda, as regras de experiência técnica, ressalvado, quanto a estas, o exame pericial.). Destaca-se que tal orientação vem prevalecendo no âmbito do Egrégio STJ ao ratificar, monocraticmente, decisões que levaram em consideração os aspectos socioeconômicos, profissionais e culturais do segurado para superar o laudo pericial (v.g. AREsp 1409049, Rel. Min. NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, DJ 21-02-2019).
Portanto, ainda que o laudo pericial realizado tenha concluído pela aptidão laboral da parte autora, a confirmação da existência da moléstia incapacitante referida na exordial (Discopatia Degenerativa L3-4 e L4-5 com hérnias discais posterocentrais L3-4/L4-5 com dor lombar e transtorno de disco vertebral - M54.5/M51.9), corroborada pela documentação clínica supra, associada às suas condições pessoais - habilitação profissional (mecânico) e idade atual (30 anos de idade) - demonstra a efetiva incapacidade temporária para o exercício da atividade profissional, o que enseja, indubitavelmente, o restabelecimento do AUXÍLIO-DOENÇA NB 609.859.323-3 à autora, desde 24/02/2015 (DCB - e. 2.33), descontadas as parcelas eventualmente recebidas administrativamente durante o período, a título de benefício por incapacidade.
Saliente-se, por oportuno, que deve ser oportunizado ao segurado e ao próprio Instituto Previdenciário o serviço de reabilitação para outra profissão, previsto nos artigos 18, III, alínea "c", 62 e 89 a 93 da Lei 8.213/91, haja vista o problema ortopédico crônico que sofre a apelante, desde 2015.
Com efeito, a reabilitação profissional é uma das prestações compreendidas pelo RGPS a que tem direito os segurados e destina-se a promovera reinserção no mercado de trabalho daqueles que tenham ficado incapazes de voltar a exercer a sua atividade profissional.
De outro lado, a submissão do segurado ao processo de reabilitação profissional é uma obrigação legal, e o seu descumprimento acarreta uma sanção administrativa - a suspensão do pagamento do benefício (art. 101 da Lei 8.213/91) - ou, quando o benefício de auxílio-doença é concedido judicialmente e é determinada a reabilitação profissional, a recusa ou o abandono configuram, também, um descumprimento de decisão judicial.
Dos consectários
Segundo o entendimento das Turmas previdenciárias do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, estes são os critérios aplicáveis aos consectários:
Correção monetária
A correção monetária incidirá a contar do vencimento de cada prestação e será calculada pelos índices oficiais e aceitos na jurisprudência, quais sejam:
- INPC no que se refere ao período posterior à vigência da Lei 11.430/2006, que incluiu o art. 41-A na Lei 8.213/91, conforme deliberação do STJ no julgamento do Tema 905 (REsp mº 1.495.146 - MG, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, D DE 02-03-2018), o qual resta inalterada após a conclusão do julgamento de todos os EDs opostos ao RE 870947 pelo Plenário do STF em 03-102019 (Tema 810 da repercussão geral), pois foi rejeitada a modulação dos efeitos da decisão de mérito.
Juros moratórios
Os juros de mora incidirão à razão de 1% (um por cento) ao mês, a contar da citação (Súmula 204 do STJ), até 29/06/2009.
A partir de 30/06/2009, incidirão segundo os índices oficiais de remuneração básica e juros aplicados à caderneta de poupança, conforme art. 5º da Lei 11.960/09, que deu nova redação ao art. 1º-F da Lei 9.494/97, cuja constitucionalidade foi reconhecida pelo STF ao julgar a 1ª tese do Tema 810 da repercussão geral (RE 870.947), julgado em 20/09/2017, com ata de julgamento publicada no DJe n. 216, de 22/09/2017.
Honorários advocatícios recursais
Incide, no caso, a sistemática de fixação de honorários advocatícios prevista no art. 85 do NCPC, porquanto a sentença foi proferida após 18/03/2016 (data da vigência do NCPC definida pelo Pleno do STJ em 02/04/2016).
Deixo de aplicar a regra do art. 85, §11, do NCPC. Isso porque os honorários advocatícios recursais previstos pela nova sistemática do § 11 do artigo 85 do Código de Processo Civil de 2015 decorrem não apenas do trabalho adicional posterior à sentença, mas, igualmente, da própria sucumbência da parte em seu pleito recursal. Com efeito, a majoração da verba honorária é estabelecida no intuito de desestimular a interposição de recurso manifestamente improcedente interposto pela parte sucumbente na ação.
Logo, no caso, não tendo havido recurso da parte sucumbente, o percentual da verba honorária deve ser mantida no patamar estipulado pelo juízo de origem, consoante precedente deste Colegiado:
PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-DOENÇA. TERMO FINAL. HONORÁRIOS RECURSAIS. [...] 2. Não tendo havido recurso da parte sucumbente, incabível a majoração dos honorários advocatícios prevista no art. 85, §11, do CPC. (TRF4, AC 5026720-13.2018.4.04.9999, TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DE SC, Relator JORGE ANTONIO MAURIQUE, juntado aos autos em 11/10/2019)
Custas Processuais
O INSS é isento do pagamento de custas (art. 4º, inciso I, da Lei nº 9.289/96 e Lei Complementar Estadual nº 156/97, com a redação dada pelo art. 3º da LCE nº 729/2018).
Da antecipação de tutela
Pelos fundamentos anteriormente elencados, é de ser mantida a antecipação da tutela deferida, uma vez presentes os requisitos da verossimilhança do direito e o risco de dano irreparável ou de difícil reparação, bem como o caráter alimentar do benefício, porquanto relacionado diretamente com a subsistência, propósito maior dos proventos pagos pela Previdência Social.
Conclusão
Reforma-se parcialmente a sentença, para restabelecer o AUXÍLIO-DOENÇA NB 609.859.323-3 à autora, desde 17/03/2015 (DCB - e. 2.32) até sua reabilitação profissional, descontadas as parcelas eventualmente recebidas administrativamente durante o período, a título de benefício por incapacidade.
Dispositivo
Ante o exposto, voto por, de ofício, fixar os critérios de correção monetária e juros, conforme o Tema 810/STF e 905/STJ, bem como dar provimento à apelação da parte autora.
Documento eletrônico assinado por PAULO AFONSO BRUM VAZ, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40002076909v13 e do código CRC 55a8bb0f.Informações adicionais da assinatura:
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Apelação Cível Nº 5027540-95.2019.4.04.9999/SC
RELATOR: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ
APELANTE: LEONARDO TEIXEIRA
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO POR INCAPACIDADE. VINCULAÇÃO AO LAUDO. INOCORRÊNCIA. PROVA INDICIÁRIA. AUXÍLIO-DOENÇA. CONCESSÃO.
1. O juízo não está adstrito às conclusões do laudo médico pericial, nos termos do artigo 479 do NCPC ( O juiz apreciará a prova pericial de acordo com o disposto no art. 371, indicando na sentença os motivos que o levaram a considerar ou a deixar de considerar as conclusões do laudo, levando em conta o método utilizado pelo perito), podendo discordar, fundamentadamente, das conclusões do perito em razão dos demais elementos probatórios coligido aos autos.
2. Ainda que o caderno processual não contenha elementos probatórios conclusivos com relação à incapacidade do segurado, caso não se possa chegar a uma prova absolutamente conclusiva, consistente, robusta, é adequado que se busque socorro na prova indiciária e nas evidências.
3. Reforma-se parcialmente a sentença, para restabelecer o AUXÍLIO-DOENÇA até sua reabilitação profissional, descontadas as parcelas eventualmente recebidas administrativamente durante o período, a título de benefício por incapacidade.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia Turma Regional Suplementar de Santa Catarina do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, de ofício, fixar os critérios de correção monetária e juros, conforme o Tema 810/STF e 905/STJ, bem como dar provimento à apelação da parte autora, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Florianópolis, 08 de outubro de 2020.
Documento eletrônico assinado por PAULO AFONSO BRUM VAZ, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40002076910v4 e do código CRC 35455e47.Informações adicionais da assinatura:
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO Virtual DE 01/10/2020 A 08/10/2020
Apelação Cível Nº 5027540-95.2019.4.04.9999/SC
RELATOR: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ
PRESIDENTE: Desembargador Federal CELSO KIPPER
PROCURADOR(A): WALDIR ALVES
APELANTE: LEONARDO TEIXEIRA
ADVOGADO: JANAINA CARVALHO DE SOUZA (OAB SC033742)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 01/10/2020, às 00:00, a 08/10/2020, às 16:00, na sequência 792, disponibilizada no DE de 22/09/2020.
Certifico que a Turma Regional suplementar de Santa Catarina, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DE SANTA CATARINA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, DE OFÍCIO, FIXAR OS CRITÉRIOS DE CORREÇÃO MONETÁRIA E JUROS, CONFORME O TEMA 810/STF E 905/STJ, BEM COMO DAR PROVIMENTO À APELAÇÃO DA PARTE AUTORA.
RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ
Votante: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ
Votante: Desembargador Federal CELSO KIPPER
Votante: Juiz Federal JAIRO GILBERTO SCHAFER
ANA CAROLINA GAMBA BERNARDES
Secretária
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