Apelação Cível Nº 5006943-71.2020.4.04.9999/SC
RELATOR: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: LUIZA HELENA GONCALVES DE AQUINO
RELATÓRIO
Cuida-se de apelações interpostas pelo INSS e pela parte autora em face da sentença (e. 61 - OUT1), publicada em 18/09/2019 (e. 61 - CONTRAZ3), que, com fulcro no artigo 487, inciso I, do Código de Processo Civil, julgou improcedentes os pedidos contidos na inicial.
Alega o INSS que o pedido de concessão/restabelecimento de auxílio-doença foi julgado improcedente e revogada a decisão que deferiu a tutela de urgência. Todavia, a sentença vedou a cobrança dos valores pagos em decorrência da decisão antecipatória revogada.
Pede a reforma do decisum para que seja permitida a cobrança dos valores recebidos pela recorrida por força de tutela de urgência posteriormente revogada, consoante entendimento do STJ (e. 80 - APELAÇÃO1).
A seu turno, aduz a parte autora que se encontra totalmente incapaz para realizar suas atividades laborais desde 2014, devido aos seus problemas ortopédicos. Refere, inclusive, que precisou se submeter a dois processos cirúrgicos, mas, continua incapacitada para o trabalho.
Sustenta que, de acordo com os documentos médicos juntados aos autos, desde 2014, ela não tem condições de exercer qualquer tipo de atividade laborativa necessitando de afastamento do trabalho em razão do seu grave quadro clínico.
Observa que a perícia judicial concluiu estar ela incapacitada para o trabalho. Contudo, estabeleceu a data de início da incapacidade em 19/04/2018. Com base nessa conclusão, foi julgada improcedente a demanda.
Aponta que os exames realizados ao longo dos últimos anos comprovam ser a incapacidade ininterrupta e de longa data. Ao contrário do que afirma o perito, não teve início em 2018 e sim em 2014.
Requer a reforma da sentença para que seja fixado o termo inicial da incapacidade na DER de 04/11/2016 (e. 86 - APELAÇÃO1).
Sem contrarrazões, subiram os autos a esta Corte para julgamento.
É o relatório.
VOTO
Exame do caso concreto
No que tange ao mérito, trago à colação trecho da solução encontrada pelo juízo de origem (e. 61 - OUT1):
Quanto ao cerne da controvérsia, pretende a parte autora, diante de sua incapacidade laborativa, a concessão de auxílio-doença previdenciário.
Nesse norte, ressalta-se que o auxílio-doença exige a incapacidade total para o trabalho, podendo esta ser tão somente temporária. Extrai-se da Lei de Benefícios da Previdência Social (Lei n. 8.213/91):
"Art. 59. O auxílio-doença será devido ao segurado que, havendo cumprido, quando for o caso, o período de carência exigido nesta Lei, ficar incapacitado para o seu trabalho ou para a sua atividade habitual por mais de 15 (quinze) dias consecutivos."
Em contrapartida, a aposentadoria por invalidez deve ser concedida apenas àqueles que, em decorrência de moléstia, restaram indefinidamente incapacitados, sendo difícil ou impossível a constatação de alta médica.
"Art. 42. A aposentadoria por invalidez, uma vez cumprida, quando for o caso, a carência exigida, será devida ao segurado que, estando ou não em gozo de auxílio-doença, for considerado incapaz e insusceptível de reabilitação para o exercício de atividade que lhe garanta a subsistência, e ser-lhe-á paga enquanto permanecer nesta condição.
§ 1º A concessão de aposentadoria por invalidez dependerá da verificação da condição de incapacidade mediante exame médico- pericial a cargo da Previdência Social, podendo o segurado, às suas expensas, fazer-se acompanhar de médico de sua confiança."
Assim, será devida a aposentadoria por invalidez em caso de incapacidade total e permanente para qualquer trabalho que garanta a subsistência do segurado e o auxílio-doença para incapacidade total e temporária para o exercício da função habitual.
Todavia, deve-se estar atento ao fato de que: "enquanto a incapacidade 'total' da aposentadoria por invalidez refere-se à impossibilidade do 'exercício de atividade que lhe garanta a subsistência', a 'total' incapacidade prevista pelo auxílio-doença é aquela que incapacita o segurado 'para o seu trabalho ou para a sua vida habitual'. Assim, de um lado temos uma incapacidade total propriamente dita, que impede todo e qualquer labor caso da aposentadoria por invalidez, e do outro uma incapacidade 'total relativa', pois somente será total no tocante ao trabalho hodiernamente realizado, mas será parcial se apreciada em relação ao universo de profissões caso do auxílio-doença." (TJSC, Apelação Cível n. 2011.001223-6, de Videira, rel. Des. Pedro Manoel Abreu , j. 20-11-2012).
Em ambos os casos, além da qualidade de segurado, a caracterização da incapacidade é requisito indispensável para que o segurado faça jus ao benefício. Contudo, Hermes Arrais Alencar assevera que "o diagnóstico da doença, por si só, não é corolário de incapacidade laborativa" e, nesta senda, "os benefícios auxílio-doença e aposentadoria são devidos unicamente se presente a incapacidade laborativa" ( in Benefícios previdenciários. 4. ed. São Paulo: Liv. e Ed. Universitária de Direito, 2009. p. 372). No mesmo sentido, Fábio Zambitte Ibrahim afirma que "pode um segurado ter uma doença, como miopia, mas nem por isso ser incapacitado" ( in Curso de direito previdenciário. 17. ed. Rio de Janeiro: Impetus, 2012. p. 638).
A concessão dos benefícios requeridos pressupõe, ainda, o cumprimento da carência, que configura " o número mínimo de contribuições mensais indispensáveis para que o beneficiário faça jus ao benefício (...)" (art. 24, Lei n. 8.213/91).
Conforme disposto no inciso I do artigo 25 da Lei n. 8.213/91, para os benefícios pleiteados pela autora exige-se o pagamento de 12 (doze) contribuições mensais anteriores ao requerimento.
Contudo, conforme extrato de fls.162/171, observa-se que a parte autora não verte contribuições ao Regime Público de Previdência Social desde 30/9/2016, razão pela qual não ostentava, na data do início da incapacidade aferida pelo perito, ou seja, em 19/04/2018, qualidade de segurada.
Não se olvida que a norma do art. 15 da Lei n. 8.213/91 estabelece prazo de manutenção da qualidade de segurado, independentemente de contribuições, por até 12 (doze) meses após a cessação das contribuições para o segurado que deixar de exercer atividade remunerada abrangida pela Previdência Social ou estiver suspenso ou licenciado sem remuneração.
Entretanto, mesmo aplicando-se o período excedente previsto na legislação previdenciária, ainda assim resta afastada a qualidade de segurada da parte autora.
Assim, embora o laudo pericial tenha concluído que há incapacidade laborativa a partir de 19/04/2018, tendo em vista que na data referida a parte autora não ostentava qualidade de segurada, a improcedência dos pedidos impõe-se.
Em situação semelhante:
"PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. QUALIDADE DE SEGURADO. NÃO PREENCHIMENTO. INCAPACIDADE PREEXISTENTE. IMPROCEDÊNCIA. 1. São três os requisitos para a concessão dos benefícios por incapacidade: a) a qualidade de segurado; b) o cumprimento do período de carência de 12 contribuições mensais, salvo as exceções legais (art. 26, II, da referida lei); c) a incapacidade para o trabalho, de caráter permanente (aposentadoria por invalidez) ou temporária (auxílio-doença). 2. Não demonstrada a qualidade de segurada na DII fixada no laudo pericial, a parte autora já havia perdido a qualidade de segurado (art. 15 da LBPS), inexistindo elementos de prova que possibilitem a retroação da DII. 3. Comprovado nos autos que a incapacidade laborativa da parte autora é preexistente ao seu reingresso no RGPS, é de ser reformada a sentença a quo para ser julgada improcedente a ação" (TRF4, AC 5030821-98.2015.404.9999, SEXTA TURMA, Relator (AUXILIO SALISE) ÉZIO TEIXEIRA, juntado aos autos em 22/05/2017).
"PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-DOENÇA. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. REQUISITOS. LAUDO PERICIAL. INCAPACIDADE PREEXISTENTE EM RELAÇÃO À FILIAÇÃO AO RGPS. IMPROCEDÊNCIA. 1. São três os requisitos para a concessão dos benefícios por incapacidade: a) a qualidade de segurado; b) o cumprimento do período de carência de 12 contribuições mensais; c) a incapacidade para o trabalho, de caráter permanente (aposentadoria por invalidez) ou temporária (auxílio-doença). 2. A Lei nº 8.213/91 veda a concessão de benefício previdenciário quando a doença ou lesão geradora de incapacidade é preexistente à filiação ao Regime Geral de Previdência Social, salvo se o impedimento laboral sobrevier por motivo de progressão ou agravamento. 3. No caso dos autos, as provas apontam que a parte autora já estava incapaz do ponto de vista laboral no momento de seu ingresso ao RGPS, razão pela qual não faz jus aos benefícios previdenciários por incapacidade" (TRF4, AC 0004056-20.2011.404.9999, QUINTA TURMA, Relator ROGER RAUPP RIOS, D.E. 28/04/2017).
Deste modo, a pretensão não pode ser acolhida.
De fato, a partir da perícia médica, que realizou em 03/05/2019, o Dr. Luciano de Mello, CRM/SC 9.516, perito de confiança do juízo (laudo juntado no e. 51 - TERMOAUD1 e VIDEO2), deixou consignado que:
Trata-se de autora de 54 anos, ensino médio completo, qualificada como secretária, sem trabalhar há cerca de 4 anos. Alega incapacidade em decorrência de lombalgia, com irradiação para o membro inferior direito. Possui histórico de cirurgia de Artrodese Lombar, realizadas em 2016 e dezembro de 2018. Apresentou nos autos ressonância magnética de coluna lombar de 19/4/2018 que evidencia hérnia discal com toque em raiz nervosa. Comprova bloqueio pericutâneo realizada em 08/08/2018. Realizado exame físico, mantém sinais de radiculopatia para o membro inferior direito e alteração no reflexo aquileu. Ante ao exposto, concluo por incapacidade temporária para atividade habitual pelos CIDs (M54.5 e M54.1) desde 19/04/2018, data da ressonância magnética, e por mais 4 meses a partir da data dessa perícia. Não conclui por incapacidade definitiva em virtude do histórico laboral da autora onde predominam as atividades administrativas. Questiona a advogada da parte autora se a mesma se encontrava incapaz para suas atividades habituais no ano de 2016 e 2017. O perito informa que não há como afirmar se em 2016 e 2017 a autora estava incapaz.
Insurge-se a autora em relação à data de início da inapacidade, fixada pelo perito em 19/04/2018, que considerou para esse fim o documento médico juntado no e. 1 - DEC24, p. 3.
Da mesma forma, o INSS alegando que pedido de concessão de auxílio-doença foi julgado improcedente (porquanto, na DII estabelecida pelo perito, a autora não detinha mais a qualidade de segurada) e revogada a decisão que deferiu a tutela de urgência. Contudo, a sentença vedou a cobrança dos valores pagos em decorrência da decisão antecipatória revogada.
Não obstante as considerações esposadas pelo expert, sabe-se que o juízo não está adstrito às conclusões do laudo médico pericial, nos termos do artigo 479 do NCPC (Art. 479. O juiz apreciará a prova pericial de acordo com o disposto no art. 371, indicando na sentença os motivos que o levaram a considerar ou a deixar de considerar as conclusões do laudo, levando em conta o método utilizado pelo perito), podendo discordar, fundamentadamente, das conclusões do perito em razão dos demais elementos probatórios coligidos aos autos, inclusive os aspectos socioeconômicos, profissionais e culturais do segurado, ainda que o laudo pericial apenas tenha concluído pela sua incapacidade parcial para o trabalho (AgRg no AREsp 35.668/SP, Rel. Ministro NEFI CORDEIRO, SEXTA TURMA, DJe 20-02-2015).
Assim, tendo a perícia certificado a existência da patologia alegada pela parte autora, o juízo de incapacidade pode ser determinado, sem sombra de dúvidas, pelas regras da experiência do magistrado, consoante preclara disposição do artigo 375 do NCPC (O juiz aplicará as regras de experiência comum subministradas pela observação do que ordinariamente acontece e, ainda, as regras de experiência técnica, ressalvado, quanto a estas, o exame pericial.).
Destaca-se que tal orientação vem prevalecendo no âmbito do Egrégio STJ ao ratificar, monocraticmente, decisões que levaram em consideração os aspectos socioeconômicos, profissionais e culturais do segurado para superar o laudo pericial, consoante excerto abaixo transcrito:
" [...] 10. Na hipótese dos autos, Corte de origem firmou sua convicção acerca do preenchimento dos requisitos legais para a concessão da prestação, com base no exame do acervo probatório, entendendo que a incapacidade do Segurado em cotejo com as atividades por ele desenvolvidas e suas condições pessoais são suficientes para reconhecer o quadro de incapacidade absoluta.
11. Convém esclarecer, ainda, que o Magistrado não fica vinculado à prova pericial, podendo decidir contrário a ela quando houver nos autos outros elementos que assim o convençam, como ocorre na presente demanda.
12. Dessa forma, em face das limitações impostas pelo seu estado de saúde, bem como pelas demais peculiaridades do caso, é de ser deferida a aposentadoria por invalidez, ainda que o Segurado não seja incapaz para todas as atividades, uma vez que não possui condições de ser inserido no mercado de trabalho. Corroborando esse entendimento, os seguintes julgados desta Corte:
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. ACÓRDÃO DE ORIGEM QUE, À LUZ DAS PROVAS DOS AUTOS, CONCLUIU PELA NÃO COMPROVAÇÃO DA INCAPACIDADE LABORAL DEFINITIVA E PERMANENTE. ART. 42 DA LEI 8.213/91. REVISÃO DA CONCLUSÃO ADOTADA NA ORIGEM. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA 7/STJ. AGRAVO REGIMENTAL IMPROVIDO.
I. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça alinhou-se no sentido de que, "para a concessão da aposentadoria por invalidez, o magistrado não está vinculado à prova pericial e pode concluir pela incapacidade laboral levando em conta os aspectos socioeconômicos, profissionais e culturais do segurado" (STJ, AgRg no AREsp 103.056/MG, Rel. Ministro BENEDITO GONÇALVES, PRIMEIRA TURMA, DJe de 02/08/2013).
II. No caso, contudo, o Tribunal de origem analisou as provas dos autos e concluiu pela inexistência de incapacidade laboral definitiva e permanente do recorrente. Destacou que os documentos carreados aos autos corroboram as conclusões do perito e concluiu que "o exame do conjunto probatório mostra que o autor não logrou comprovar a existência de incapacidade total e permanente para o exercício de qualquer atividade laborativa, que autorizaria a concessão da aposentadoria por invalidez, nos termos do art. 42 da Lei nº 8.213/91".
III. Diante desse quadro, a inversão do julgado, para concluir pela eventual existência dos requisitos necessários à concessão da aposentadoria por invalidez, demandaria incursão na seara fático-probatória dos autos, inviável, na via eleita, a teor da Súmula 7 do STJ. IV. Agravo Regimental improvido (AgRg no AREsp. 712.011/SP, Rel. Min. ASSUSETE MAGALHÃES, DJe 4.9.2015).PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. REEXAME DOS REQUISITOS PARA CONCESSÃO DO BENEFÍCIO. REEXAME DO CONJUNTO FÁTICO-PROBATÓRIO DOS AUTOS. SÚMULA 7/STJ. CONSIDERAÇÃO DOS ASPECTOS SOCIOECONÔMICOS, PROFISSIONAIS E CULTURAIS DO SEGURADO. DESNECESSIDADE DE VINCULAÇÃO DO MAGISTRADO À PROVA PERICIAL.
I - A inversão do julgado, na espécie, demandaria o reexame do conjunto fático-probatório dos autos, razão pela qual incide o enunciado da Súmula 7/STJ.
III - Esta Corte Superior firmou entendimento no sentido de que a concessão da aposentadoria por invalidez deve considerar, além dos elementos previstos no art. 42 da Lei n. 8.213/91, os aspectos socioeconômicos, profissionais e culturais do segurado, ainda que o laudo pericial apenas tenha concluído pela sua incapacidade parcial para o trabalho (AgRg no AREsp 574.421/SP, Rel. Ministro Humberto Martins, Segunda Turma, DJe 14/11/2014).
III - Agravo regimental improvido (AgRg no AREsp. 35.668/SP, Rel. Min. NEFI CORDEIRO, DJe 20.2.2015).PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. AUSÊNCIA DE VIOLAÇÃO DO ART. 535 DO CPC. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. INCAPACIDADE PARCIAL. CONSIDERAÇÃO DOS ASPECTOS SÓCIO-ECONÔMICOS, PROFISSIONAIS E CULTURAIS. POSSIBILIDADE. PRECEDENTES. 1. O Tribunal de origem deixou claro que, na hipótese dos autos, o autor não possui condições de competir no mercado de trabalho, tampouco desempenhar a profissão de operadora de microônibus. 2. necessário consignar que o juiz não fica adstrito aos fundamentos e à conclusão do perito oficial, podendo decidir a controvérsia de acordo o princípio da livre apreciação da prova e do livre convencimento motivado. 3. A concessão da aposentadoria por invalidez deve considerar, além dos elementos previstos no art. 42 da Lei n. 8.213/91, os aspectos socioeconômicos, profissionais e culturais do segurado, ainda que o laudo pericial apenas tenha concluído pela sua incapacidade parcial para o trabalho. Precedentes das Turmas da Primeira e Terceira Seção. Incidência da Súmula 83/STJ. Agravo regimental improvido (AgRg no AREsp. 384.337/SP, Rel. Min. HUMBERTO MARTINS, DJe 9.10.2013).PROCESSUAL. PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. ACÓRDÃO EMBASADO EM OUTROS ELEMENTOS ALÉM DO LAUDO PERICIAL. POSSIBILIDADE.
1. A concessão da aposentadoria por invalidez deve considerar, além dos elementos previstos no art. 42 da Lei nº 8.213/91, os aspectos socioeconômicos, profissionais e culturais do segurado, ainda que o laudo pericial apenas tenha concluído pela sua incapacidade parcial para o trabalho. Precedentes. 2. O Tribunal a quo entendeu existir comprovação de que a ora agravada ficou incapacitada de maneira permanente e definitiva para exercer suas atividades laborativas, nada obstante o laudo pericial ter concluído pela incapacidade apenas parcial. Inteligência da Súmula 83/STJ. 3. A revisão das premissas fáticas de julgamento esbarra na Súmula 7/STJ. 4. Agravo regimental não provido (AgRg no AREsp. 318.761/PR, Rel. Min. CASTRO MEIRA, DJe 5.6.2013). 13. Tal compreensão encontra-se em consonância com as novas
orientações da Organização Mundial de Saúde, que preconiza a junção da análise clínica com a análise social como ferramenta ideal na aferição de incapacidades.
A propósito, a doutrina do Professor ANDRÉ LUIZ MORO BITTENCOURT:
Questões sociais e novas síndrome ou patologias, além da questão da inclusão de pessoas estigmatizadas, vêm reiteradamente surgindo, necessitando de uma resposta do legislador e do operador do direito. Certamente, uma resposta adequada dependerá de um bom e completo instrumento de verificação e, no caso dos benefícios por incapacidade, a perícia deverá se basear em instrumento com essas características. Diante desse quadro é que vem crescendo a corrente que defende uma quebra de paradigmas da perícia médica, para que se passe a adotar não só a Classificação Internacional de Doença, como também a Classificação Internacional de Funcionalidade, Incapacidade e Saúde.
A Organização Mundial de saúde, quando da edição da referida classificação, deixou claro que, entre suas funções, estaria a ferramenta de política social, pelo que seria utilizada não só para aspectos relacionados à saúde, como também na segurança social, trabalho, desenvolvimento de políticas sociais e alterações ambientais.
No que pertence ao universo de verificação da CIF, percebe-se que ela engloba não só questões relacionadas com a saúde, como também fatores socioeconômicos, como por exemplo, aquela ligadas ao sexo, orientação religiosa, orientação sexual, tendo, então, aplicação universal, pois verifica funcionalidade, incapacidade (corpo, atividades e participação, tanto de forma individual como social) e fatores contextuais (fatores ambientais e fatores pessoais).
Necessário, então enfrentar a quebra de paradigmas entre o modelo médico e o modelo social (BITTENCOURT, André Luiz Moro. Manual dos Benefícios por incapacidade laboral e deficiência. Curitiba: Alteridade, 2018, p. 384/385).
14. Ante o exposto, nega-se provimento ao Agravo em Recurso
Especial do INSS.
15. Publique-se.
16. Intimações necessárias.
Brasília (DF), 18 de fevereiro de 2019.
NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO MINISTRO RELATOR" (STJ, AREsp 1409049, DJ 21-02-2019)
Pois bem. No caso em tela, a parte autora autora juntou aos autos a seguinte documentação clínica:
a) (e. 1 - DEC8, pp. 1 e 2):
b) (e. 1 - DEC9):
c) (e. 1 - DEC20):
d) (e. 1 - DEC38, p. 1):
e) (e. 1 - DEC47, p. 5):
f) (e. 1 - DEC48, pp. 1 e 2):
g) (e. 1 - DEC49, p. 1):
h) (e. 1 - DEC58):
Portanto, ainda que o laudo pericial realizado tenha concluído pela aptidão laboral anterior a 19/04/2018, a confirmação da existência das moléstias incapacitantes referidas na exordial (CID 10 - G50 Transtornos do nervo trigêmeo; M51.2 Outros deslocamentos discais intervertebrais especificados; M54.4 Lumbago com ciática; M54.5 Dor lombar baixa; R52.1 Dor crônica intratável; S82.6 Fratura do maléolo lateral; Z98.1 Artrodese), corroborada pela documentação clínica supra, associada às suas condições pessoais - habilitação profissional (secretária) e idade atual (55 anos) - demonstra a efetiva incapacidade para o exercício da atividade profissional, o que enseja, indubitavelmente, a concessão de auxílio por incapacidade temporária, desde a DER em 04/11/2016 (e. 1 - DEC27).
Vale destacar que as moléstias que incapacitam a autora estão relacionadas às mesmas patologias que a incapacitaram quando houve a concessão de auxílio-doença NB 612.595.888-8, DIB em 09/11/2015 e cessado em 30/09/2016 (e. 1 - DEC28, p. 1)
Ou seja, parece razoável entender que os sintomas incapacitantes, presentes naquela época, não cessaram. Ao contrário, foram se tornando cada vez mas intensos, sendo necessário, inclusive, aguardar pelas cirurgias, já realizadas. É evidente que a autora sofre desde sempre de problemas ortopédicos, que foram se agravando com o tempo até torná-la totalmente incapaz para as atividades laborais.
Ou seja, é possível afirmar que a autora sofre dos problemas já elencados, tendo havido progressivo agravamento do mesmo quadro de saúde que a incapacitava em 2014, 2015. Submeteu-se a diversas consultas, exames e cirurgias no decorrer dos anos, procurando a rede pública de saúde e também a particular por inúmeras vezes em razão das patologias de coluna das quais padece.
Todos esses dados corroboram o fato de que a autora, efetivamente, se encontra incapacitada para suas atividades laborais e que, à época em que o auxílio-doença que ela requereu foi negado, a incapacidade não cessou. Ao contrário, ela continuou padecendo das mesmas doenças constatadas pelo perito judicial no seu laudo, que confirmou a incapacidade total para o trabalho.
Portanto, considerando que na cessação do auxílio-doença em 30/09/2016, a recorrente persistia com patologias incapacitantes de forma total e havendo agravamento, na sequência, resta evidente que esteve inapta para atividades laborais por todo o período, não havendo falar, inclusive, em ausência de qualidade de segurada.
Devidamente atendidos os requisitos de qualidade de segurada e incapacidade para o trabalho desde a DER em 04/11/2016, entendo que deve ser estabelecido o auxílio por incapacidade temporária desde então.
Logo, não há falar em devolução ou cobrança dos valores pagos em decorrência da decisão antecipatória revogada, conforme requerido pelo INSS
Dos consectários
Segundo o entendimento das Turmas previdenciárias do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, estes são os critérios aplicáveis aos consectários:
Correção monetária
A correção monetária incidirá a contar do vencimento de cada prestação e será calculada pelos índices oficiais e aceitos na jurisprudência, quais sejam:
- INPC no que se refere ao período posterior à vigência da Lei 11.430/2006, que incluiu o art. 41-A na Lei 8.213/91, conforme deliberação do STJ no julgamento do Tema 905 (REsp mº 1.495.146 - MG, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, D DE 02-03-2018), o qual resta inalterada após a conclusão do julgamento de todos os EDs opostos ao RE 870947 pelo Plenário do STF em 03-102019 (Tema 810 da repercussão geral), pois foi rejeitada a modulação dos efeitos da decisão de mérito.
Juros moratórios
Os juros de mora incidirão à razão de 1% (um por cento) ao mês, a contar da citação (Súmula 204 do STJ), até 29/06/2009.
A partir de 30/06/2009, incidirão segundo os índices oficiais de remuneração básica e juros aplicados à caderneta de poupança, conforme art. 5º da Lei 11.960/09, que deu nova redação ao art. 1º-F da Lei 9.494/97, cuja constitucionalidade foi reconhecida pelo STF ao julgar a 1ª tese do Tema 810 da repercussão geral (RE 870.947), julgado em 20/09/2017, com ata de julgamento publicada no DJe n. 216, de 22/09/2017.
Honorários advocatícios recursais
Incide, no caso, a sistemática de fixação de honorários advocatícios prevista no art. 85 do NCPC, porquanto a sentença foi proferida após 18/03/2016 (data da vigência do NCPC definida pelo Pleno do STJ em 02/04/2016).
Invertidos os ônus sucumbenciais, estabeleço a verba honorária em 10% (dez por cento) sobre as parcelas vencidas (Súmula 76 do TRF4), considerando as variáveis dos incisos I a IV do § 2º do artigo 85 do NCPC.
Custas Processuais
O INSS é isento do pagamento de custas (art. 4º, inciso I, da Lei nº 9.289/96 e Lei Complementar Estadual nº 156/97, com a redação dada pelo art. 3º da LCE nº 729/2018).
Implantação do benefício
Reconhecido o direito da parte, impõe-se a determinação para a imediata implantação do benefício, nos termos do art. 497 do NCPC [Art. 497. Na ação que tenha por objeto a prestação de fazer ou de não fazer, o juiz, se procedente o pedido, concederá a tutela específica ou determinará providências que assegurem a obtenção de tutela pelo resultado prático equivalente.] e da jurisprudência consolidada da Colenda Terceira Seção desta Corte (QO-AC nº 2002.71.00.050349-7, Rel. p/ acórdão Des. Federal Celso Kipper). Dessa forma, deve o INSS implantar o benefício em até 45 dias, a contar da publicação do presente acórdão, conforme os parâmetros acima definidos, incumbindo ao representante judicial da autarquia que for intimado dar ciência à autoridade administrativa competente e tomar as demais providências necessárias ao cumprimento da tutela específica.
Saliente-se, por oportuno, que, na hipótese de a parte autora estar auferindo benefício previdenciário, deve o INSS implantar o benefício ora deferido apenas se o valor da renda mensal atual desse benefício for superior ao daquele.
Faculta-se, outrossim, à parte beneficiária manifestar eventual desinteresse quanto ao cumprimento desta determinação.
Conclusão
Reforma-se a sentença para reconhecer que a parte autora faz jus à concessão de AUXÍLIO POR INCAPACIDADE TEMPORÁRIA, a partir da DER em 04/11/2016 (e. 1 - DEC27).
Dispositivo
Ante o exposto, voto por negar provimento ao recurso do INSS, dar provimento ao apelo da autora, e determinar a imediata implantação do benefício.
Documento eletrônico assinado por PAULO AFONSO BRUM VAZ, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40002646975v23 e do código CRC 56918572.Informações adicionais da assinatura:
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Data e Hora: 26/7/2021, às 16:47:23
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Apelação Cível Nº 5006943-71.2020.4.04.9999/SC
RELATOR: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: LUIZA HELENA GONCALVES DE AQUINO
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO POR INCAPACIDADE. VINCULAÇÃO AO LAUDO. INOCORRÊNCIA. PROVA INDICIÁRIA.
1. O juízo não está adstrito às conclusões do laudo médico pericial, nos termos do artigo 479 do NCPC ( O juiz apreciará a prova pericial de acordo com o disposto no art. 371, indicando na sentença os motivos que o levaram a considerar ou a deixar de considerar as conclusões do laudo, levando em conta o método utilizado pelo perito), podendo discordar, fundamentadamente, das conclusões do perito em razão dos demais elementos probatórios coligido aos autos.
2. Embora o caderno processual não contenha elementos probatórios conclusivos com relação à incapacidade do segurado, caso não se possa chegar a uma prova absolutamente conclusiva, consistente, robusta, é adequado que se busque socorro na prova indiciária e nas evidências.
3. Tendo em conta que, na cessação do auxílio-doença, a recorrente persistia com patologias incapacitantes de forma total e havendo agravamento, resta evidente que esteve incapacitada para atividades laborais por todo o período.
4. Ainda que o laudo pericial realizado tenha concluído pela aptidão laboral anterior a 19/04/2018, a confirmação da existência das moléstias incapacitantes referidas na exordial (CID 10 - G50 Transtornos do nervo trigêmeo; M51.2 Outros deslocamentos discais intervertebrais especificados; M54.4 Lumbago com ciática; M54.5 Dor lombar baixa; R52.1 Dor crônica intratável; S82.6 Fratura do maléolo lateral; Z98.1 Artrodese), corroborada pela documentação clínica apresentada, associada às suas condições pessoais - habilitação profissional (secretária) e idade atual (55 anos) - demonstra a efetiva incapacidade para o exercício da atividade profissional, o que enseja, indubitavelmente, a concessão de auxílio por incapacidade temporária, desde a DER em 04/11/2016.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia Turma Regional Suplementar de Santa Catarina do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, negar provimento ao recurso do INSS, dar provimento ao apelo da autora, e determinar a imediata implantação do benefício, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Florianópolis, 21 de julho de 2021.
Documento eletrônico assinado por PAULO AFONSO BRUM VAZ, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40002646976v4 e do código CRC c332ccf4.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): PAULO AFONSO BRUM VAZ
Data e Hora: 26/7/2021, às 16:47:23
Conferência de autenticidade emitida em 03/08/2021 04:01:11.
EXTRATO DE ATA DA SESSÃO Virtual DE 14/07/2021 A 21/07/2021
Apelação Cível Nº 5006943-71.2020.4.04.9999/SC
RELATOR: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ
PRESIDENTE: Desembargador Federal SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: LUIZA HELENA GONCALVES DE AQUINO
ADVOGADO: PRISCILA PAZ (OAB SC054585)
ADVOGADO: FRANCIELLI THIESEN LOHN (OAB SC036329)
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 14/07/2021, às 00:00, a 21/07/2021, às 16:00, na sequência 358, disponibilizada no DE de 05/07/2021.
Certifico que a Turma Regional suplementar de Santa Catarina, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DE SANTA CATARINA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO DO INSS, DAR PROVIMENTO AO APELO DA AUTORA, E DETERMINAR A IMEDIATA IMPLANTAÇÃO DO BENEFÍCIO.
RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ
Votante: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ
Votante: Desembargador Federal CELSO KIPPER
Votante: Desembargador Federal SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ
ANA CAROLINA GAMBA BERNARDES
Secretária
Conferência de autenticidade emitida em 03/08/2021 04:01:11.