Experimente agora!
VoltarHome/Jurisprudência Previdenciária

PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO. RECEBIMENTO INDEVIDO. ERRO ADMINISTRATIVO. BOA-FÉ. IRREPETIBILIDADE. TRF4. 5000270-16.2017.4.04.7009...

Data da publicação: 27/08/2021, 11:00:58

EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO. RECEBIMENTO INDEVIDO. ERRO ADMINISTRATIVO. BOA-FÉ. IRREPETIBILIDADE. Não havendo prova de má-fé do segurado no recebimento indevido de benefício na via administrativa, decorrente de má aplicação de norma jurídica, interpretação equivocada ou erro da Administração, não cabe a devolução dos valores, considerando a natureza alimentar e o recebimento de boa-fé. (TRF4, AC 5000270-16.2017.4.04.7009, TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DO PR, Relator MÁRCIO ANTÔNIO ROCHA, juntado aos autos em 19/08/2021)

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5000270-16.2017.4.04.7009/PR

RELATOR: Desembargador Federal MÁRCIO ANTONIO ROCHA

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (AUTOR)

APELADO: GREGORIO SZEREMETA CHIKOSKI (RÉU)

RELATÓRIO

O INSS propôs ação de ressarcimento ao erário em face de GREGORIO SZEREMETA CHIKOSKI, num total de R$ 111.440,34. Sustenta que o "requerente e a instituidora possuíam quantidade superior aos 4 módulos fiscais" e contratavam empregados permanentes para as atividades rurais, consequentemente não ostentando a qualidade de segurado especial.

Processado o feito, foi proferida sentença, publicada em 11/06/2018, cujo dispositivo ficou assim redigido (ev. 44 de origem):

Ante o exposto, julgo improcedente o pedido formulado, com fundamento no artigo 487, inc. I, do Código de Processo Civil.

Condeno o INSS ao pagamento de custas ex lege e de honorários advocatícios em favor da parte ré, os quais arbitro em 10% sobre o valor da condenação, a ser apurado quando da liquidação de sentença, com fulcro no art. 85, §§ 2º e 3º, inc. I, do CPC.

Sentença não sujeita à remessa necessária (art. 496, §§ 3º e 4º, do CPC).

Havendo interposição de recurso de apelação, intime-se a parte recorrida para contra-arrazoar em 15 (quinze) dias, salvo se for entidade de direito público, caso em que terá prazo em dobro, 30 (trinta) dias. Na hipótese de, nas preliminares das contrarrazões, serem suscitadas questões resolvidas na fase de conhecimento que não desafiem a interposição de agravo de instrumento, intime-se a parte recorrente para se manifestar em 15 (quinze) dias, salvo se for entidade de direito público, caso em que terá prazo em dobro, 30 (trinta) dias, para tanto. Cumpridas as diligências ou decorridos os prazos para manifestação, remetam-se os autos ao Tribunal Regional Federal da 4ª Região.

O INSS apelou alegando que o benefício foi revisto, constatando-se, a partir do CNIS, que o autor, marido da instituidora, possuía área de terras superior a 4 módulos rurais, com utilização de empregados. Argumenta que a boa-fé não afasta a obrigatoriedade da devolução de valores percebidos indevidamente (ev. 48).

Com contrarrazões, vieram os autos a esta Corte.

É o relatório.

Peço dia para julgamento.

VOTO

Benefício recebido na via administrativa. Tema 979/STJ

Inicialmente, registro que foi fixada a tese no Tema 979/STJ. Transcrevo a ementa do julgado, publicado em 23/04/2021:

PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. TEMA 979. ARTIGO 1.036 DO CPC/2015. BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. ARTIGOS 884 E 885 DO CÓDIGO CIVIL/2002. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. SÚMULA 211 DO STJ. ART. 115, II, DA LEI N. 8.213/1991. DEVOLUÇÃO DE VALORES RECEBIDOS POR FORÇA DE INTERPRETAÇÃO ERRÔNEA E MÁ APLICAÇÃO DA LEI. NÃO DEVOLUÇÃO. ERRO MATERIAL DA ADMINISTRAÇÃO. POSSIBILIDADE DE DEVOLUÇÃO SOMENTE NA HIPÓTESE DE ERRO EM QUE OS ELEMENTOS DO CASO CONCRETO NÃO PERMITAM CONCLUIR PELA INEQUÍVOCA PRESENÇA DA BOA-FÉ OBJETIVA.
1. Da admissão do recurso especial: Não se conhece do recurso especial quanto à alegada ofensa aos artigos 884 e 885 do Código Civil, pois não foram prequestionados. Aplica-se à hipótese o disposto no enunciado da Súmula 211 do STJ. O apelo especial que trata do dissídio também não comporta conhecimento, pois não indicou as circunstâncias que identifiquem ou assemelhem os precedentes colacionados e também por ausência de cotejo analítico e similitude entre as hipóteses apresentadas. Contudo, merece conhecimento o recurso quanto à suposta ofensa ao art. 115, II, da lei n. 8.213/1991.
2. Da limitação da tese proposta: A afetação do recurso em abstrato diz respeito à seguinte tese: Devolução ou não de valores recebidos de boa-fé, a título de benefício previdenciário, por força de interpretação errônea, má aplicação da lei ou erro da Administração da Previdência Social.
3. Irrepetibilidade de valores pagos pelo INSS em razão da errônea interpretação e/ou má aplicação da lei: O beneficiário não pode ser penalizado pela interpretação errônea ou má aplicação da lei previdenciária ao receber valor além do devido. Diz-se desse modo porque também é dever-poder da Administração bem interpretar a legislação que deve por ela ser aplicada no pagamento dos benefícios. Dentro dessa perspectiva, esta Corte Superior evoluiu a sua jurisprudência passando a adotar o entendimento no sentido de que, para a não devolução dos valores recebidos indevidamente pelo beneficiário da Previdência Social, é imprescindível que, além do caráter alimentar da verba e do princípio da irrepetibilidade do benefício, a presença da boa-fé objetiva daquele que recebe parcelas tidas por indevidas pela administração. Essas situações não refletem qualquer condição para que o cidadão comum compreenda de forma inequívoca que recebeu a maior o que não lhe era devido.
4. Repetição de valores pagos pelo INSS em razão de erro material da Administração previdenciária: No erro material, é necessário que se averigue em cada caso se os elementos objetivos levam à conclusão de que houve boa-fé do segurado no recebimento da verba. Vale dizer que em situações em que o homem médio consegue constatar a existência de erro, necessário se faz a devolução dos valores ao erário.
5. Do limite mensal para desconto a ser efetuado no benefício: O artigo 154, § 3º, do Decreto n. 3.048/1999 autoriza a Administração Previdenciária a proceder o desconto daquilo que pagou indevidamente; todavia, a dedução no benefício só deverá ocorrer quando se estiver diante de erro da administração. Nesse caso, caberá à Administração Previdenciária, ao instaurar o devido processo administrativo, observar as peculiaridades de cada caso concreto, com desconto no beneficio no percentual de até 30% (trinta por cento).
6. Tese a ser submetida ao Colegiado: Com relação aos pagamentos indevidos aos segurados decorrentes de erro administrativo (material ou operacional), não embasado em interpretação errônea ou equivocada da lei pela Administração, são repetíveis os valores, sendo legítimo o seu desconto no percentual de até 30% (trinta por cento) do valor do benefício mensal, ressalvada a hipótese em que o segurado, diante do caso concreto, comprova sua boa-fé objetiva, sobretudo com demonstração de que não lhe era possível constatar o pagamento indevido.
7. Modulação dos efeitos: Tem-se de rigor a modulação dos efeitos definidos neste representativo da controvérsia, em respeito à segurança jurídica e considerando o inafastável interesse social que permeia a questão sub examine, e a repercussão do tema que se amolda a centenas de processos sobrestados no Judiciário. Desse modo somente deve atingir os processos que tenham sido distribuídos, na primeira instância, a partir da publicação deste acórdão.
8. No caso concreto: Há previsão expressa quanto ao momento em que deverá ocorrer a cessação do benefício, não havendo margem para ilações quanto à impossibilidade de se estender o benefício para além da maioridade da beneficiária. Tratou-se, em verdade, de simples erro da administração na continuidade do pagamento da pensão, o que resulta na exigibilidade de tais valores, sob forma de ressarcimento ao erário, com descontos nos benefícios, tendo em vista o princípio da indisponibilidade do patrimônio público e em razão da vedação ao princípio do enriquecimento sem causa.
Entretanto, em razão da modulação dos efeitos aqui definidos, deixa-se de efetuar o descontos dos valores recebidos indevidamente pelo segurado.
9. Dispositivo: Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa extensão, não provido.
Acórdão sujeito ao regime previsto no artigo 1.036 e seguintes do CPC/2015.
(REsp 1381734/RN, Rel. Ministro BENEDITO GONÇALVES, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 10/03/2021, DJe 23/04/2021)

Como se vê, foi fixada a seguinte tese:

"Com relação aos pagamentos indevidos aos segurados decorrentes de erro administrativo (material ou operacional), não embasado em interpretação errônea ou equivocada da lei pela Administração, são repetíveis os valores, sendo legítimo o seu desconto no percentual de até 30% (trinta por cento) do valor do benefício mensal, ressalvada a hipótese em que o segurado, diante do caso concreto, comprova sua boa-fé objetiva, sobretudo com demonstração de que não lhe era possível constatar o pagamento indevido."

Houve modulação de efeitos, restringindo sua aplicabilidade aos processos ajuizados após a sua publicação:

"Tem-se de rigor a modulação dos efeitos definidos neste representativo da controvérsia, em respeito à segurança jurídica e considerando o inafastável interesse social que permeia a questão sub examine, e a repercussão do tema que se amolda a centenas de processos sobrestados no Judiciário. Desse modo somente deve atingir os processos que tenham sido distribuídos, na primeira instância, a partir da publicação deste acórdão."

Destarte, a modulação afasta a obrigatoriedade de sua incidência aos processos já em andamento, mas não impede a incidência da sua premissa jurídica referente à necessidade de aferição da boa-fé ou da má-fé, como pressuposto para decidir sobre repetibilidade dos valores recebidos.

Nesse ponto, a tese jurídica não destoa da jurisprudência já firmada neste Tribunal:

PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL DE PRESTAÇÃO CONTINUADA. ARTIGO 20, DA LEI Nº 8.742/93 (LOAS). RISCO SOCIAL. REQUISITO NÃO PREENCHIDO. RESTITUIÇÃO DE VALORES RECEBIDOS. CARÁTER ALIMENTAR. BOA-FÉ. IRREPETIBILIDADE. 1. Indevida a restituição e/ou desconto de valores pagos aos segurados por erro administrativo e cujo recebimento deu-se de boa-fé, em face do princípio da irrepetibilidade ou da não devolução dos alimentos. 2. Relativização do estabelecido nos artigos 115, inciso II, da Lei nº 8.213/91 e 154, § 3º, do Decreto nº 3.048/99. (...) (TRF4 5079799-10.2014.404.7100, SEXTA TURMA, Relatora Des. Federal Salise Monteiro Sanchotene, 4.9.2017)

PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE DE GENITORA. BENEFÍCIO INDEVIDO. EMANCIPAÇÃO. DEVOLUÇÃO DE VALORES. BOA-FÉ. REVOGAÇÃO. ANTECIPAÇÃO DE TUTELA. IMPOSSIBILIDADE. (...) 3. Incontroverso o erro administrativo, levando em conta o caráter alimentar dos benefícios, e ausente comprovação de eventual má-fé do segurado, devem ser relativizadas as normas dos arts. 115, II, da Lei nº 8213/91 e 154, § 3º, do Decreto nº 3048/99. (TRF4, AC 0002425-31.2017.404.9999, SEXTA TURMA, Relator Juiz Federal Artur César de Souza, D.E. 23.8.2017)

PREVIDENCIÁRIO. AÇÃO AJUIZADA PELO INSS. CARÁTER ALIMENTAR DAS PRESTAÇÕES PREVIDENCIÁRIAS. AUSÊNCIA DE MÁ-FÉ. Esta Corte vem se manifestando no sentido da impossibilidade de repetição dos valores recebidos de boa-fé pelo segurado, dado o caráter alimentar das prestações previdenciárias, sendo relativizadas as normas dos arts. 115, II, da Lei nº 8.213/91, e 154, § 3º, do Decreto nº 3.048/99. Hipótese em que, diante do princípio da irrepetibilidade ou da não-devolução dos alimentos, deve ser afastada a cobrança dos valores. (TRF4 5029624-84.2015.404.7000, TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DO PR, Relator Des. Federal Luiz Fernando Wowk Penteado, 9.8.2017)

PREVIDENCIÁRIO. REVISÃO DE BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. REMESSA EX OFFICIO. INEXISTÊNCIA. AUDITORIA. AUXÍLIO-DOENÇA. FRAUDE NÃO DEMONSTRADA. RETOMADA DA CAPACIDADE LABORAL E RETORNO À ATIVIDADE LABORAL. NÃO COMPROVADAS. VALORES DEVIDOS E PERCEBIDOS DE BOA-FÉ. RESSARCIMENTO AO ERÁRIO. IMPOSSIBILIDADE. CONSECTÁRIOS DA SUCUMBÊNCIA. MAJORAÇÃO. 1. Hipótese em que a sentença não está sujeita à remessa ex officio, a teor do disposto no artigo 496, § 3º, I, do Código de Processo Civil. 2. A Administração possui o poder-dever de anular seus próprios atos, quando eivados de ilegalidade, assegurado o contraditório e ampla defesa. 3. A jurisprudência do STJ e também deste regional são uniformes no sentido de, em face do princípio da irrepetibilidade e da natureza alimentar das parcelas, não ser possível a restituição de valores pagos indevidamente a título de benefício previdenciário, por força de interpretação equivocada, má aplicação da lei ou erro administrativo, e cujo recebimento deu-se de boa-fé pelo segurado. 4. Admitida a relativização do art. 115, II, da Lei nº 8.213/1991 e art. 154, §3º, do Decreto nº 3.048/1999, considerando o caráter alimentar da verba e o recebimento de boa-fé pelo segurado, o que se traduz em mera interpretação conforme a Constituição Federal. (...) (TRF4, AC 5010235-23.2014.4.04.7009, TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DO PR, Relator Des. Federal Fernando Quadros da Silva, 26/04/2021)

No caso, o INSS não diligenciou no sentido de comprovar a má-fé da parte segurada, tratando-se de mera pretensão de revaloração das provas.

Neste ponto, peço vênia para transcrever a fundamentação da sentença, da lavra do MM. Juiz Federal, Dr. Leandro Cadenas Prado, que fez precisa análise dos fatos:

2.1. Da condição de segurada especial à época e, consequentemente, da regularidade da pensão por morte decorrente do falecimento de sua esposa: (a) área rural inferior a 4 módulos fiscais; (b) labor de segurado especial sem empregados permanentes

2.1.1. O INSS sustenta que o "requerente e a instituidora possuíam quantidade superior aos 4 módulos fiscais" e contratavam empregados permanentes para as atividades rurais. Fatos que não comprovariam a condição de segurada especial da instituidora (falecida esposa do réu) e, consequentemente, não justificaria a concessão da pensão por morte para ele. Em razão disso, a autarquia suspendeu o pagamento do benefício previdenciário e pleiteia a restituição dos valores já pagos - de maio de 2002 a julho de 2012 (evento 1, INIC1 e PROCADM3).

2.1.2. A questão cinge-se em verificar se a esposa do réu (instituidora do benefício) ostentava - à época - os requisitos de segurada especial: (a) se a área em que eles exerciam a atividade rural tinha até 4 módulos fiscais; (b) se utilização ou não de labor permanente.

Sabe-se que "o benefício previdenciário rege-se pela lei do tempo quem que reunidas as condições para sua concessão" (STF, no RE 602012 AgR, 1ª Turma, Rel. Min. CÁRMEN LÚCIA, Primeira Turma, j. em 24/08/2010). Logo, deve-se verificar se os requisitos legais foram cumpridos à época da concessão do benefício (DER de 05/06/2002).

2.1.3. Conforme os documentos juntados aos autos (evento 27), observa-se que o réu tinha menos de 4 módulos fiscais (imóvel de matrícula nº 3.903) à época da concessão do benefício previdenciário.

Verifica-se pela certidão em relatório do Serviço de Registro de Imóveis de Reserva (evento 27, OUT6) a ocorrência de três matrículas:

1ª) matrícula nº 3.903, num total de 22,79 alqueires (551.518 m²), de propriedade de Gregório Chikoski;

2ª) matrícula nº 7.108 , num total de 6,33 alqueires (153.186 m²), de atual propriedade de Roberto Cezar Dukievicz;

3ª) matrícula nº 7.110, num total de 7 alqueires (169.400 m²), de atual propriedade de Roberto Cezar Dukievicz;

Embora constem 3 matrículas de imóveis, o autor não teve acréscimo de área rural que tivesse ultrapassado os 4 módulos fiscais (à época da concessão do benefício). É o que se vê nas certidões do Serviço de Registro de Imóveis de Reserva:

- "não consta no período de 2000 a 2003 registros bens imóveis em que figure proprietário Sr. GREGÓRIO. Certifico, mais, que há bens imóveis em nome do requerente acima qualificado, contudo, registrado em 04 de julho de 1986" (evento 27, OUT5);

- "não constam quaisquer outros bens imóveis rurais registrados em nome de GREGÓRIO, que tenha sido alienado a terceiros, no período de 1976 até a presente data" (evento 27, OUT6 - em 24/08/2012);

Constata-se, assim, que na época da concessão do benefício previdenciário, o réu (e sua esposa) tinham área de 22,79 alqueires (menor que 4 módulos fiscais para a região - de 80 hectares).

Não desconheço que - posteriormente - houve alguma transação imobiliária, mas a circunstância futura não pode ser levado em consideração no momento da concessão do benefício previdenciário.

Cumpre-se, assim, o requisito do art. 11, inc. VII, item 1, da Lei 8.123 (exercer atividade rural em área de até 4 módulos fiscais).

2.1.4. Outra questão é a existência ou não da contratação de empregados permanentes para as atividades rurais do réu (e sua esposa).

Ficou comprovando durante a instrução processual que o réu e sua esposa não contavam com empregados permanentes para sua atividade (art. 11, § 1º, da Lei 8.123).

É o que se vê no depoimento pessoal do réu (evento 58):

Em seu depoimento pessoal a parte ré disse que a esposa faleceu por volta de 2000 e ela era lavradora nesta época. Que o sítio era deles e trabalhava só a família. Que a terra media 22 alqueires, mas plantavam só em 10 alqueires (milho e feijão). Que não tinham empregados. Vendiam o excedente da produção. Não arrendavam nenhuma parte do sítio. Sobre a herança de duas terras que o INSS alega na contestação, disse que foi doado pela esposa para o irmão dela (Cesar). Que a herança veio do sogro para ele depois que a esposa faleceu, com o fim do inventário. Que a doação foi prometida pela esposa ao irmão Cesar quando o sogro era ainda vivo. Que ele e a esposa foram no Cartório e fizeram a desistência dessas terras. Que possui apenas 22 alqueires. Que hoje trabalha ele e o filho e plantam milho e feijão. Não tem tratorista, mas na época da safra contrata ajudante por diária. Fatura em torno de 30 mil anuais.

As testemunhas, também, confirmam os fatos afirmados pelo réu:

A testemunha SAUL DE JESUS MORAIS disse que conhece o autor há aproximadamente 20 anos e eram vizinhos de sítio. A esposa do réu era dona Tereza e ela faleceu. O sitio que a testemunha morou era do irmão do réu e media 22 alqueires e o sítio do réu deve medir o mesmo. Disse que plantam soja nestas terras e não possuem empregados; que não plantam em toda a terra. A testemunha trabalhava nas terras do irmão do réu que fica na localidade de Cadeado, vizinho do sítio do réu. Confirmou que o reu não tem empregados. No Cadeado o réu plantava feijão/milho e trabalhava com ele a família, sem funcionários. Que a falecida também trabalhava na roça junto com o esposo e os filhos.

A testemunha CLAUDIO JOSÉ DREY disse que conhece o reu desde 1976/1977. Conheceu os pais do réu e da falecida esposa (Tereza). Disse que produzia milho feijão, criava porcos, numa terras de aproximadamente 20 alqueires. Disse que reu ficou no sítio do Cadeado por uns 4 anos depois do falecimento da esposa e neste sitio não tinha funcionários e plantavam arroz, feijão e milho. O réu tem 3 filhos, Anderson, Daiane e Deni. Disse que neste sitio do Cadeado o reu plantava no espaço que era possível. Disse que a esposa do reu trabalhou na lavoura até próximo de falecer.

Saliento que, mesmo após o réu apresentar tais documentos, o INSS não postulou a realização de audiência ou produção de novas provas. Afirmou que "não tem mais quaisquer provas a produzir, o que permite o julgamento antecipado da lide" (evento 33, PET1).

Comprova-se, em Juízo, que o réu e sua esposa exerciam atividade rural sem utilização de empregados permanentes (art. 11, § 1º da Lei 8.123).

2.1.5. Pelos documentos juntados aos autos, depoimento pessoal da autora e de suas testemunhas, conclui-se que a instituidora do benefício ostentava (à época) os requisitos de segurada especial: (a) exercício de atividade rural em até 4 módulos fiscais; (b) não utilização de labor permanente.

Entendo que se aplica ao caso o entendimento jurisprudencial já firmado em casos símeis, conforme precedentes antes transcritos, no sentido da irrepetibilidade dos valores recebidos a título de benefício previdenciário, na ausência de prova de má-fé do segurado, considerando-se que a má-fé deve ser provada, enquanto a boa-fé pode ser presumida.

Nesse sentido:

PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. AUXÍLIO-DOENÇA. REQUISITOS. LAUDO TÉCNICO. INCAPACIDADE. DOENÇA PREEXISTENTE. NÃO CONFIGURAÇÃO. MÁ-FÉ NÃO COMPROVADA. (...) 4. Ao contrário da boa-fé, a má-fé não se presume. 5. (...) (TRF4, AC 5014793-16.2019.4.04.9999, QUINTA TURMA, Relator ALTAIR ANTONIO GREGÓRIO, 30/09/2020)

PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. COMPETÊNCIA DELEGADA DA JUSTIÇA ESTADUAL. ART. 109, § 3º, DA CF. FORO DE DOMICÍLIO DA PARTE AUTORA. MÁ-FÉ. NÃO PRESUMIDA. PRESUNÇÃO IURIS TANTUM DE BOA FÉ. (...) 2. Em nosso ordenamento jurídico, a má-fé, inclusive a processual, não se presume, devendo sempre ser cabalmente provada, não bastando ilações com base em meros indícios para afastar a boa-fé das informações prestadas pelas partes, essa sim objeto de presunção iuris tantum. (TRF4 5016289-70.2020.4.04.0000, TERCEIRA SEÇÃO, Relator PAULO AFONSO BRUM VAZ, 26/06/2020)

Assim, tendo a parte segurada recebido os valores de boa-fé, fica afastada a obrigação de restituir os valores, sendo improvido o apelo do INSS.

Honorários Advocatícios

Os honorários advocatícios são devidos, em regra, no patamar de 10%, observados os percentuais mínimos previstos em cada faixa do § 3º do art. 85 do Código de Processo Civil para as condenações proferidas a partir de 18.03.2016, considerando as parcelas vencidas até a data da sentença de procedência ou do acórdão que reforma a sentença de improcedência, nos termos das Súmulas nº 111 do Superior Tribunal de Justiça e nº 76 deste Tribunal Regional Federal da 4ª Região, respectivamente:

Os honorários advocatícios, nas ações previdenciárias, não incidem sobre as prestações vencidas após a sentença.

Os honorários advocatícios, nas ações previdenciárias, devem incidir somente sobre as parcelas vencidas até a data da sentença de procedência ou do acórdão que reforme a sentença de improcedência.

Em grau recursal, consoante entendimento firmado pelo Superior Tribunal de Justiça, a majoração é cabível quando se trata de "recurso não conhecido integralmente ou desprovido, monocraticamente ou pelo órgão colegiado competente" (STJ, AgInt nos EREsp 1539725/DF, Rel. Min. Antonio Carlos Ferreira, 2ª S., DJe 19.10.2017).

Improvido o apelo do INSS, majoro a verba honorária, elevando-a em 50% sobre o valor fixado na sentença, considerando as variáveis do art. 85, § 2º, I a IV, § 3º e § 11, do Código de Processo Civil, respeitados os limites máximos de cada faixa, e considerando o entendimento desta Turma em casos símeis:

PREVIDENCIÁRIO. (...) CONSECTÁRIOS DA SUCUMBÊNCIA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. MAJORAÇÃO. (...) 6. Nas ações previdenciárias os honorários advocatícios são devidos pelo INSS no percentual de 10% sobre o valor das parcelas vencidas até a data da sentença de procedência ou do acórdão que reforma a sentença de improcedência, nos termos das Súmulas 111 do STJ e 76 do TRF/4ª Região. Confirmada a sentença, majora-se a verba honorária, elevando-a para 15% sobre o montante das parcelas vencidas, consideradas as variáveis dos incisos I a IV do § 2º e o § 11, ambos do artigo 85 do CPC. (...) (TRF4, AC 5004859-05.2017.4.04.9999, TRS/PR, Rel. Des. Federal Fernando Quadros da Silva, j. 27.02.2019)

Prequestionamento

Objetivando possibilitar o acesso das partes às Instâncias Superiores, considero prequestionadas as matérias constitucionais e/ou legais suscitadas nos autos, conquanto não referidos expressamente os respectivos artigos na fundamentação do voto, nos termos do art. 1.025 do Código de Processo Civil.

Conclusão

- apelação improvida;

Dispositivo

Ante o exposto, voto por negar provimento à apelação.



Documento eletrônico assinado por MÁRCIO ANTÔNIO ROCHA, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40002723705v2 e do código CRC 12006b2b.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): MÁRCIO ANTÔNIO ROCHA
Data e Hora: 19/8/2021, às 8:2:15


5000270-16.2017.4.04.7009
40002723705.V2


Conferência de autenticidade emitida em 27/08/2021 08:00:58.

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5000270-16.2017.4.04.7009/PR

RELATOR: Desembargador Federal MÁRCIO ANTONIO ROCHA

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (AUTOR)

APELADO: GREGORIO SZEREMETA CHIKOSKI (RÉU)

EMENTA

PREVIDENCIÁRIO. benefício. recebimento indevido. erro administrativo. Boa-fé. irrepetibilidade.

Não havendo prova de má-fé do segurado no recebimento indevido de benefício na via administrativa, decorrente de má aplicação de norma jurídica, interpretação equivocada ou erro da Administração, não cabe a devolução dos valores, considerando a natureza alimentar e o recebimento de boa-fé.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia Turma Regional Suplementar do Paraná do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, negar provimento à apelação, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Curitiba, 17 de agosto de 2021.



Documento eletrônico assinado por MÁRCIO ANTÔNIO ROCHA, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40002723706v3 e do código CRC 924b03cc.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): MÁRCIO ANTÔNIO ROCHA
Data e Hora: 19/8/2021, às 8:2:15


5000270-16.2017.4.04.7009
40002723706 .V3


Conferência de autenticidade emitida em 27/08/2021 08:00:58.

Poder Judiciário
Tribunal Regional Federal da 4ª Região

EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 09/08/2021 A 17/08/2021

Apelação Cível Nº 5000270-16.2017.4.04.7009/PR

RELATOR: Desembargador Federal MÁRCIO ANTONIO ROCHA

PRESIDENTE: Desembargadora Federal CLAUDIA CRISTINA CRISTOFANI

PROCURADOR(A): SERGIO CRUZ ARENHART

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (AUTOR)

APELADO: GREGORIO SZEREMETA CHIKOSKI (RÉU)

ADVOGADO: VIVIANE BUENO ALIONÇO (OAB PR047677)

Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 09/08/2021, às 00:00, a 17/08/2021, às 16:00, na sequência 449, disponibilizada no DE de 29/07/2021.

Certifico que a Turma Regional suplementar do Paraná, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:

A TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DO PARANÁ DECIDIU, POR UNANIMIDADE, NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO.

RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal MÁRCIO ANTONIO ROCHA

Votante: Desembargador Federal MÁRCIO ANTONIO ROCHA

Votante: Desembargador Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO

Votante: Desembargadora Federal CLAUDIA CRISTINA CRISTOFANI

SUZANA ROESSING

Secretária



Conferência de autenticidade emitida em 27/08/2021 08:00:58.

O Prev já ajudou mais de 140 mil advogados em todo o Brasil.Faça cálculos ilimitados e utilize quantas petições quiser!

Experimente agora