Experimente agora!
VoltarHome/Jurisprudência Previdenciária

EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO. RECEBIMENTO INDEVIDO. ERRO ADMINISTRATIVO. BOA-FÉ. IRREPETIBILIDADE. TRF4. 5004798-37.2019.4.04.7005...

Data da publicação: 13/10/2022, 19:20:16

EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO. RECEBIMENTO INDEVIDO. ERRO ADMINISTRATIVO. BOA-FÉ. IRREPETIBILIDADE. Não havendo má-fé do segurado no recebimento indevido de benefício na via administrativa, decorrente de má aplicação de norma jurídica, interpretação equivocada ou erro da Administração, não cabe a devolução dos valores, considerando a natureza alimentar e o recebimento de boa-fé. (TRF4, AC 5004798-37.2019.4.04.7005, DÉCIMA TURMA, Relator MÁRCIO ANTÔNIO ROCHA, juntado aos autos em 10/08/2022)

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5004798-37.2019.4.04.7005/PR

RELATOR: Desembargador Federal MÁRCIO ANTONIO ROCHA

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)

APELADO: MISLANE KOVALSKI OLLMANN (AUTOR)

RELATÓRIO

Trata-se de ação ajuizada por Mislane Kovalski Ollmann em face do INSS, objetivando a anulação da decisão administrativa do INSS que determinou a restituição de valores recebidos a título de benefício assistencial à pessoa com deficiência, considerados indevidos nos períodos de 08/2005 a 12/2006 e 80/2007 a 11/2017, conforme processo administrativo (evento 8, RESPOSTA1).

Citado, o INSS contestou (evento 10, CONTES1), alegando que a parte autora recebeu parcelas de amparo assistencial ao deficiente (NB 87/137.436.802-1), posteriormente cessado em virtude da constatação de aumento da renda familiar, acarretando a percepção indevida do LOAS, e o dever de restituição do débito.

Processado o feito, sobreveio sentença, publicada em em 11/11/2019, por meio da qual o Juízo a quo julgou o pedido nos seguintes termos (evento 15, SENT1):

Em assim sendo, declaro prescritas as parcelas anteriores a 10/04/2014, extinguindo o feito com resolução do mérito nos termos do art. 487, II, do Código de Processo Civil e JULGO PROCEDENTE o pedido deduzido na inicial, com resolução do mérito nos termos do artigo 487, inciso I, do Código de Processo Civil, para declarar inegixível em face da parte autora o valor apurado pelo réu no procedimento de revisão do cálculo do benefício (NB 87/137.436.802-1).

Condeno o INSS ao pagamento de honorários de sucumbência incidentes sobre o valor atualizado da causa nos percentuais mínimos de cada faixa prevista no artigo 85, § 3º, do Código de Processo Civil, na forma do § 5º do mesmo dispositivo legal, observado o valor de salário mínimo vigente na data da presente sentença.

Sem custas ao INSS, em face da isenção legal prevista pelo artigo 4º, inciso I, da Lei 9.289/1996.

O INSS apela, sustentando, em síntese que houve a percepção indevida de LOAS pela parte autora, acarretando assim um débito com a fazenda pública e a cessação do benefício, constatado o incremento da renda familiar da beneficiária. Alega a necessidade, legalidade e constitucionalidade da cobrança dos valores indevidamente pagos pelo INSS a título de benefício assistencial, independente de demonstração de má-fé da parte contrária. Requer o prequestionamento dos dispositivos que elenca (evento 21, APELAÇÃO1).

Com contrarrazões, vieram os autos a esta Corte.

Por meio do acórdão, evento 6, ACOR1, a Turma Regional Suplementar do Paraná do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu acolher em parte o pedido da autora para determinar a suspensão do processo administrativo em que o INSS busca o ressarcimento dos valores, até que o Superior Tribunal de Justiça defina o tema, e dar parcial provido à apelação do INSS, para afastar a decisão que concluiu pela irrepetibilidade dos valores, mantendo-se, todavia, a vedação da cobrança, até que a questão seja definida pelo Superior Tribunal de Justiça, verbis:

PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. VALORES RECEBIDOS DE BOA-FÉ. SUSPENSÃO DO PROCESSO. 1. O Superior Tribunal de Justiça afetou o Tema nº 979, "Devolução ou não de valores recebidos de boa-fé a título de benefício previdenciário, por força de interpretação errônea, má aplicação da lei ou erro da Administração da Previdência Social", à sistemática dos recursos repetitivos, com determinação de suspensão de todos os processos pendentes (REsp. 1381734/RN, DJe de 16.08.2017). Se a cobrança dos valores ainda se restringe à via administrativa, cabível a determinação de suspensão do procedimento naquela esfera.

Definido o Tema 979 pelo Superior Tribunal de Justiça, voltaram os autos para concluir o julgamento do pedido de anulação da decisão administrativa do INSS que determinou a restituição de valores recebidos a título de benefício assistencial à pessoa com deficiência.

É o relatório.

Peço dia para julgamento.

VOTO

Benefício recebido na via administrativa. Tema 979/STJ

Inicialmente, registro que foi fixada a tese no Tema 979/STJ. Transcrevo a ementa do julgado, publicado em 23/04/2021:

PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. TEMA 979. ARTIGO 1.036 DO CPC/2015. BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. ARTIGOS 884 E 885 DO CÓDIGO CIVIL/2002. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. SÚMULA 211 DO STJ. ART. 115, II, DA LEI N. 8.213/1991. DEVOLUÇÃO DE VALORES RECEBIDOS POR FORÇA DE INTERPRETAÇÃO ERRÔNEA E MÁ APLICAÇÃO DA LEI. NÃO DEVOLUÇÃO. ERRO MATERIAL DA ADMINISTRAÇÃO. POSSIBILIDADE DE DEVOLUÇÃO SOMENTE NA HIPÓTESE DE ERRO EM QUE OS ELEMENTOS DO CASO CONCRETO NÃO PERMITAM CONCLUIR PELA INEQUÍVOCA PRESENÇA DA BOA-FÉ OBJETIVA.
1. Da admissão do recurso especial: Não se conhece do recurso especial quanto à alegada ofensa aos artigos 884 e 885 do Código Civil, pois não foram prequestionados. Aplica-se à hipótese o disposto no enunciado da Súmula 211 do STJ. O apelo especial que trata do dissídio também não comporta conhecimento, pois não indicou as circunstâncias que identifiquem ou assemelhem os precedentes colacionados e também por ausência de cotejo analítico e similitude entre as hipóteses apresentadas. Contudo, merece conhecimento o recurso quanto à suposta ofensa ao art. 115, II, da lei n. 8.213/1991.
2. Da limitação da tese proposta: A afetação do recurso em abstrato diz respeito à seguinte tese: Devolução ou não de valores recebidos de boa-fé, a título de benefício previdenciário, por força de interpretação errônea, má aplicação da lei ou erro da Administração da Previdência Social.
3. Irrepetibilidade de valores pagos pelo INSS em razão da errônea interpretação e/ou má aplicação da lei: O beneficiário não pode ser penalizado pela interpretação errônea ou má aplicação da lei previdenciária ao receber valor além do devido. Diz-se desse modo porque também é dever-poder da Administração bem interpretar a legislação que deve por ela ser aplicada no pagamento dos benefícios. Dentro dessa perspectiva, esta Corte Superior evoluiu a sua jurisprudência passando a adotar o entendimento no sentido de que, para a não devolução dos valores recebidos indevidamente pelo beneficiário da Previdência Social, é imprescindível que, além do caráter alimentar da verba e do princípio da irrepetibilidade do benefício, a presença da boa-fé objetiva daquele que recebe parcelas tidas por indevidas pela administração. Essas situações não refletem qualquer condição para que o cidadão comum compreenda de forma inequívoca que recebeu a maior o que não lhe era devido.
4. Repetição de valores pagos pelo INSS em razão de erro material da Administração previdenciária: No erro material, é necessário que se averigue em cada caso se os elementos objetivos levam à conclusão de que houve boa-fé do segurado no recebimento da verba. Vale dizer que em situações em que o homem médio consegue constatar a existência de erro, necessário se faz a devolução dos valores ao erário.
5. Do limite mensal para desconto a ser efetuado no benefício: O artigo 154, § 3º, do Decreto n. 3.048/1999 autoriza a Administração Previdenciária a proceder o desconto daquilo que pagou indevidamente; todavia, a dedução no benefício só deverá ocorrer quando se estiver diante de erro da administração. Nesse caso, caberá à Administração Previdenciária, ao instaurar o devido processo administrativo, observar as peculiaridades de cada caso concreto, com desconto no beneficio no percentual de até 30% (trinta por cento).
6. Tese a ser submetida ao Colegiado: Com relação aos pagamentos indevidos aos segurados decorrentes de erro administrativo (material ou operacional), não embasado em interpretação errônea ou equivocada da lei pela Administração, são repetíveis os valores, sendo legítimo o seu desconto no percentual de até 30% (trinta por cento) do valor do benefício mensal, ressalvada a hipótese em que o segurado, diante do caso concreto, comprova sua boa-fé objetiva, sobretudo com demonstração de que não lhe era possível constatar o pagamento indevido.
7. Modulação dos efeitos: Tem-se de rigor a modulação dos efeitos definidos neste representativo da controvérsia, em respeito à segurança jurídica e considerando o inafastável interesse social que permeia a questão sub examine, e a repercussão do tema que se amolda a centenas de processos sobrestados no Judiciário. Desse modo somente deve atingir os processos que tenham sido distribuídos, na primeira instância, a partir da publicação deste acórdão.
8. No caso concreto: Há previsão expressa quanto ao momento em que deverá ocorrer a cessação do benefício, não havendo margem para ilações quanto à impossibilidade de se estender o benefício para além da maioridade da beneficiária. Tratou-se, em verdade, de simples erro da administração na continuidade do pagamento da pensão, o que resulta na exigibilidade de tais valores, sob forma de ressarcimento ao erário, com descontos nos benefícios, tendo em vista o princípio da indisponibilidade do patrimônio público e em razão da vedação ao princípio do enriquecimento sem causa.
Entretanto, em razão da modulação dos efeitos aqui definidos, deixa-se de efetuar o descontos dos valores recebidos indevidamente pelo segurado.
9. Dispositivo: Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa extensão, não provido.
Acórdão sujeito ao regime previsto no artigo 1.036 e seguintes do CPC/2015.
(REsp 1381734/RN, Rel. Ministro BENEDITO GONÇALVES, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 10/03/2021, DJe 23/04/2021)

Como se vê, foi fixada a seguinte tese:

"Com relação aos pagamentos indevidos aos segurados decorrentes de erro administrativo (material ou operacional), não embasado em interpretação errônea ou equivocada da lei pela Administração, são repetíveis os valores, sendo legítimo o seu desconto no percentual de até 30% (trinta por cento) do valor do benefício mensal, ressalvada a hipótese em que o segurado, diante do caso concreto, comprova sua boa-fé objetiva, sobretudo com demonstração de que não lhe era possível constatar o pagamento indevido."

Houve modulação de efeitos, restringindo sua aplicabilidade aos processos ajuizados após a sua publicação:

"Tem-se de rigor a modulação dos efeitos definidos neste representativo da controvérsia, em respeito à segurança jurídica e considerando o inafastável interesse social que permeia a questão sub examine, e a repercussão do tema que se amolda a centenas de processos sobrestados no Judiciário. Desse modo somente deve atingir os processos que tenham sido distribuídos, na primeira instância, a partir da publicação deste acórdão."

Destarte, a modulação afasta a obrigatoriedade de sua incidência aos processos já em andamento, mas não impede a incidência da sua premissa jurídica referente à necessidade de aferição da boa-fé ou da má-fé, como pressuposto para decidir sobre repetibilidade dos valores recebidos.

Nesse ponto, a tese jurídica não destoa da jurisprudência já firmada neste Tribunal:

PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL DE PRESTAÇÃO CONTINUADA. ARTIGO 20, DA LEI Nº 8.742/93 (LOAS). RISCO SOCIAL. REQUISITO NÃO PREENCHIDO. RESTITUIÇÃO DE VALORES RECEBIDOS. CARÁTER ALIMENTAR. BOA-FÉ. IRREPETIBILIDADE. 1. Indevida a restituição e/ou desconto de valores pagos aos segurados por erro administrativo e cujo recebimento deu-se de boa-fé, em face do princípio da irrepetibilidade ou da não devolução dos alimentos. 2. Relativização do estabelecido nos artigos 115, inciso II, da Lei nº 8.213/91 e 154, § 3º, do Decreto nº 3.048/99. (...) (TRF4 5079799-10.2014.404.7100, SEXTA TURMA, Relatora Des. Federal Salise Monteiro Sanchotene, 4.9.2017)

PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE DE GENITORA. BENEFÍCIO INDEVIDO. EMANCIPAÇÃO. DEVOLUÇÃO DE VALORES. BOA-FÉ. REVOGAÇÃO. ANTECIPAÇÃO DE TUTELA. IMPOSSIBILIDADE. (...) 3. Incontroverso o erro administrativo, levando em conta o caráter alimentar dos benefícios, e ausente comprovação de eventual má-fé do segurado, devem ser relativizadas as normas dos arts. 115, II, da Lei nº 8213/91 e 154, § 3º, do Decreto nº 3048/99. (TRF4, AC 0002425-31.2017.404.9999, SEXTA TURMA, Relator Juiz Federal Artur César de Souza, D.E. 23.8.2017)

PREVIDENCIÁRIO. AÇÃO AJUIZADA PELO INSS. CARÁTER ALIMENTAR DAS PRESTAÇÕES PREVIDENCIÁRIAS. AUSÊNCIA DE MÁ-FÉ. Esta Corte vem se manifestando no sentido da impossibilidade de repetição dos valores recebidos de boa-fé pelo segurado, dado o caráter alimentar das prestações previdenciárias, sendo relativizadas as normas dos arts. 115, II, da Lei nº 8.213/91, e 154, § 3º, do Decreto nº 3.048/99. Hipótese em que, diante do princípio da irrepetibilidade ou da não-devolução dos alimentos, deve ser afastada a cobrança dos valores. (TRF4 5029624-84.2015.404.7000, TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DO PR, Relator Des. Federal Luiz Fernando Wowk Penteado, 9.8.2017)

PREVIDENCIÁRIO. REVISÃO DE BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. REMESSA EX OFFICIO. INEXISTÊNCIA. AUDITORIA. AUXÍLIO-DOENÇA. FRAUDE NÃO DEMONSTRADA. RETOMADA DA CAPACIDADE LABORAL E RETORNO À ATIVIDADE LABORAL. NÃO COMPROVADAS. VALORES DEVIDOS E PERCEBIDOS DE BOA-FÉ. RESSARCIMENTO AO ERÁRIO. IMPOSSIBILIDADE. CONSECTÁRIOS DA SUCUMBÊNCIA. MAJORAÇÃO. 1. Hipótese em que a sentença não está sujeita à remessa ex officio, a teor do disposto no artigo 496, § 3º, I, do Código de Processo Civil. 2. A Administração possui o poder-dever de anular seus próprios atos, quando eivados de ilegalidade, assegurado o contraditório e ampla defesa. 3. A jurisprudência do STJ e também deste regional são uniformes no sentido de, em face do princípio da irrepetibilidade e da natureza alimentar das parcelas, não ser possível a restituição de valores pagos indevidamente a título de benefício previdenciário, por força de interpretação equivocada, má aplicação da lei ou erro administrativo, e cujo recebimento deu-se de boa-fé pelo segurado. 4. Admitida a relativização do art. 115, II, da Lei nº 8.213/1991 e art. 154, §3º, do Decreto nº 3.048/1999, considerando o caráter alimentar da verba e o recebimento de boa-fé pelo segurado, o que se traduz em mera interpretação conforme a Constituição Federal. (...) (TRF4, AC 5010235-23.2014.4.04.7009, TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DO PR, Relator Des. Federal Fernando Quadros da Silva, 26/04/2021)

No caso, peço vênia para transcrever a fundamentação da sentença, da lavra do MM. Juiz Federal,Wesley Schneider Collyer, que fez sucinta e precisa análise dos fatos e valoração da prova:

(...)

No caso concreto, por meio de revisão de benefício, o réu identificou irregularidade na manutenção do beneficio assistencial, entendendo ter havido incremento na renda mensal familiar, entendendo indevido o pagamento do benefício assistencial nos períodos de 08/2005 a 12/2006 e 80/2007 a 11/2017, consoante se extrai dos autos do processo administrativo (E8, RESPOSTA1).

A parte autora alega que recebeu os valores a maior de boa-fé, razão pela qual não seria devida a restituição.

Assiste razão à parte autora. Primeiramente, verifico que não há nenhum elemento nos autos apto para questionar sua boa-fé. Ela não apresentou informações falsas no processo, não omitiu informação, não induziu a erro o órgão administrativo. Desse modo, é fato incontroverso a sua boa-fé.

De outro lado, vale lembrar a natureza alimentar do benefício previdenciário. O pagamento dessas parcelas por longo período gera para o segurado o sentimento de que sempre poderá contar com ele, principalmente em se tratando de um benefício de prestação continuada. Nesse contexto, não seria justo exigir restituição de valores que muito provavelmente foram consumidos em prol da sua subsistência.

Enfim, em razão da evidente boa-fé da parte autora, aliado ao caráter alimentar do benefício recebido, consideram-se irrepetíveis os valores pagos em excesso.

A jurisprudência é farta nesse sentido:

PREVIDENCIÁRIO. ADMINISTRATIVO. DECADÊNCIA PARA O INSS REVISAR O ATO DE CONCESSÃO. APOSENTADORIA. REVISÃO. ILEGALIDADE CONSTATADA. MANTIDO O CANCELAMENTO DO BENEFÍCIO. IRREPETIBILIDADE DOS VALORES PERCEBIDOS DE BOA-FÉ.

1. A Lei 6.309/75 previa em seu artigo 7º que os processos de interesse de beneficiários não poderiam ser revistos após 5 (cinco) anos, contados de sua decisão final, ficando dispensada a conservação da documentação respectiva além desse prazo. Para benefícios concedidos até 14-05-1992, quando revogada a Lei citada, decorrido esse prazo, inviável a revisão da situação, ressalvadas as hipóteses de fraude, pois esta não se consolida com o tempo. Para os benefícios deferidos antes do advento da Lei 9.784/99 o prazo de decadência deve ser contado a partir da data de início de vigência do referido Diploma, ou seja, 01-02-1999. O prazo decadencial de dez anos do art. 103-A da Lei de Benefícios, acrescentado pela Lei n.º 10.839/2004, alcança os benefícios concedidos em data anterior à sua publicação (REsp n.º 1.114.938, Terceira Seção, unânime, j. 14-04-2010), respeitados os princípios da legalidade e da segurança jurídica.

2. A Administração, em atenção ao princípio da legalidade, tem o poder-dever de anular seus próprios atos quando eivados de vícios que os tornem ilegais (Súmulas 346 e 473 do STF).

3. Não restou caracterizada a má-fé da parte autora, pois tanto no processo administrativo quanto no decorrer do trâmite processual, em momento algum falseou as informações prestadas ou os documentos apresentados, nem se utilizou de ardis para induzir a erro os órgãos julgadores.

4. Irrepetibilidade dos valores auferidos, considerando a boa-fé da autora e o caráter alimentar do benefício.

(Apelação/Reexame Necessário Nº 5001083-63.2010.404.7114/RS, Relator Ézio Teixeira, Sexta Turma. D.E. 19/12/2013.

PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO CONCEDIDO ADMINISTRATIVAMENTE. DEVOLUÇÃO DE VALORES RECEBIDOS INDEVIDAMENTE. IMPOSSIBILIDADE. BOA-FÉ. CONSECTÁRIOS.

1. O pagamento originado de decisão administrativa devidamente motivada à luz das razões de fato e de direito apresentadas quanto do requerimento, tem presunção de legitimidade.

2. Evidenciada a boa-fé, o beneficiário não pode ficar jungido à contingência de devolver valores que já foram consumidos, dada a finalidade de prover os meios de subsistência a que se destina o benefício previdenciário.

3.Declarada pelo Supremo Tribunal Federal a inconstitucionalidade do art. 1º-F da Lei nº 9.494/97, com a redação dada pela Lei nº 11.960/2009, os consectários legais comportam a incidência de juros moratórios equivalentes aos índices oficiais de remuneração básica e juros aplicáveis à caderneta de poupança (STJ, REsp 1.270.439/PR, 1ª Seção, Relator Ministro Castro Meira, 26/06/2013) e correção monetária pelo INPC e demais índices oficiais consagrados pela jurisprudência.

4. Havendo o feito tramitado perante a Justiça Federal, o INSS está isento do pagamento das custas judiciais, a teor do que preceitua o art. 4º da Lei 9.289/96.

(APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 5010043-58.2012.404.7204/SC, Relator Luiz Carlos de Castro Lugon, D.E. 27/06/2014)

Portanto, reputo procedente o pedido.

Entendo que se aplica ao caso o entendimento jurisprudencial já firmado em casos símeis, conforme precedentes antes transcritos, no sentido da irrepetibilidade dos valores recebidos a título de benefício previdenciário, na ausência de prova de má-fé do segurado, considerando-se que a má-fé deve ser provada, enquanto a boa-fé pode ser presumida, sendo, que no caso, concluiu-se pela sua boa-fé.

Nesse sentido:

PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. AUXÍLIO-DOENÇA. REQUISITOS. LAUDO TÉCNICO. INCAPACIDADE. DOENÇA PREEXISTENTE. NÃO CONFIGURAÇÃO. MÁ-FÉ NÃO COMPROVADA. (...) 4. Ao contrário da boa-fé, a má-fé não se presume. 5. (...) (TRF4, AC 5014793-16.2019.4.04.9999, QUINTA TURMA, Relator ALTAIR ANTONIO GREGÓRIO, 30/09/2020)

PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. COMPETÊNCIA DELEGADA DA JUSTIÇA ESTADUAL. ART. 109, § 3º, DA CF. FORO DE DOMICÍLIO DA PARTE AUTORA. MÁ-FÉ. NÃO PRESUMIDA. PRESUNÇÃO IURIS TANTUM DE BOA FÉ. (...) 2. Em nosso ordenamento jurídico, a má-fé, inclusive a processual, não se presume, devendo sempre ser cabalmente provada, não bastando ilações com base em meros indícios para afastar a boa-fé das informações prestadas pelas partes, essa sim objeto de presunção iuris tantum. (TRF4 5016289-70.2020.4.04.0000, TERCEIRA SEÇÃO, Relator PAULO AFONSO BRUM VAZ, 26/06/2020)

Merece destaque a circunstância do benefício ter sido concedido sem irregularidade/falsidade nos documentos e/ou declarações apresentadas pela parte beneficiária e que não há nenhum elemento nos autos apto para questionar sua boa-fé. Ela não apresentou informações falsas no processo, não omitiu informação, não induziu a erro o órgão administrativo. Desse modo, é fato incontroverso a sua boa-fé, como bem destacou a sentença, o que constitui evidente indício de sua boa-fé, circunstância que impede a obrigatoriedade da devolução pretendida.

Portanto, é inexigível o valor apurado pelo INSS no procedimento de revisão do cálculo do benefício (NB 87/137.436.802-1).

Frisa-se que a modulação de efeitos do Tem 979/STJ afasta a obrigatoriedade de sua incidência aos processos já em andamento, remanescendo a aplicabilidade da jurisprudência então predominante, no sentido da irrepetibilidade na ausência de prova da má-fé.

Logo, o apelo não merece provimento.

Honorários Advocatícios

Em grau recursal, consoante entendimento firmado pelo Superior Tribunal de Justiça, a majoração é cabível quando se trata de "recurso não conhecido integralmente ou desprovido, monocraticamente ou pelo órgão colegiado competente" (STJ, AgInt nos EREsp 1539725/DF, Rel. Min. Antonio Carlos Ferreira, 2ª S., DJe 19.10.2017).

Improvido o apelo do INSS, majoro a verba honorária, elevando-a em 50% sobre o valor fixado na sentença, considerando as variáveis do art. 85, § 2º, I a IV, § 3º e § 11, do Código de Processo Civil, respeitados os limites máximos de cada faixa, e considerando o entendimento desta Turma em casos símeis:

PREVIDENCIÁRIO. (...) CONSECTÁRIOS DA SUCUMBÊNCIA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. MAJORAÇÃO. (...) 6. Nas ações previdenciárias os honorários advocatícios são devidos pelo INSS no percentual de 10% sobre o valor das parcelas vencidas até a data da sentença de procedência ou do acórdão que reforma a sentença de improcedência, nos termos das Súmulas 111 do STJ e 76 do TRF/4ª Região. Confirmada a sentença, majora-se a verba honorária, elevando-a para 15% sobre o montante das parcelas vencidas, consideradas as variáveis dos incisos I a IV do § 2º e o § 11, ambos do artigo 85 do CPC. (...) (TRF4, AC 5004859-05.2017.4.04.9999, TRS/PR, Rel. Des. Federal Fernando Quadros da Silva, j. 27.02.2019)

Prequestionamento

Objetivando possibilitar o acesso das partes às Instâncias Superiores, considero prequestionadas as matérias constitucionais e/ou legais suscitadas nos autos, conquanto não referidos expressamente os respectivos artigos na fundamentação do voto, nos termos do art. 1.025 do Código de Processo Civil.

Conclusão

- apelação do INSS improvida;

Dispositivo

Ante o exposto, voto por negar provimento à apelação do INSS.



Documento eletrônico assinado por MÁRCIO ANTÔNIO ROCHA, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40003368726v25 e do código CRC 2b214104.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): MÁRCIO ANTÔNIO ROCHA
Data e Hora: 10/8/2022, às 15:17:16


5004798-37.2019.4.04.7005
40003368726.V25


Conferência de autenticidade emitida em 13/10/2022 16:20:15.

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5004798-37.2019.4.04.7005/PR

RELATOR: Desembargador Federal MÁRCIO ANTONIO ROCHA

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)

APELADO: MISLANE KOVALSKI OLLMANN (AUTOR)

EMENTA

PREVIDENCIÁRIO. benefício. recebimento indevido. erro administrativo. Boa-fé. irrepetibilidade.

Não havendo má-fé do segurado no recebimento indevido de benefício na via administrativa, decorrente de má aplicação de norma jurídica, interpretação equivocada ou erro da Administração, não cabe a devolução dos valores, considerando a natureza alimentar e o recebimento de boa-fé.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia Turma Regional Suplementar do Paraná do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, negar provimento à apelação do INSS, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Curitiba, 02 de agosto de 2022.



Documento eletrônico assinado por MÁRCIO ANTÔNIO ROCHA, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40003368727v3 e do código CRC a37a5d24.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): MÁRCIO ANTÔNIO ROCHA
Data e Hora: 10/8/2022, às 15:17:16

5004798-37.2019.4.04.7005
40003368727 .V3


Conferência de autenticidade emitida em 13/10/2022 16:20:15.

Poder Judiciário
Tribunal Regional Federal da 4ª Região

EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 26/07/2022 A 02/08/2022

Apelação Cível Nº 5004798-37.2019.4.04.7005/PR

RELATOR: Desembargador Federal MÁRCIO ANTONIO ROCHA

PRESIDENTE: Desembargadora Federal CLAUDIA CRISTINA CRISTOFANI

PROCURADOR(A): MAURICIO GOTARDO GERUM

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)

APELADO: MISLANE KOVALSKI OLLMANN (AUTOR)

ADVOGADO: ADRIANA PICKLER CATTANI (OAB PR054254)

Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 26/07/2022, às 00:00, a 02/08/2022, às 16:00, na sequência 1038, disponibilizada no DE de 15/07/2022.

Certifico que a Turma Regional suplementar do Paraná, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:

A TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DO PARANÁ DECIDIU, POR UNANIMIDADE, NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO DO INSS.

RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal MÁRCIO ANTONIO ROCHA

Votante: Desembargador Federal MÁRCIO ANTONIO ROCHA

Votante: Desembargador Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO

Votante: Desembargadora Federal CLAUDIA CRISTINA CRISTOFANI

SUZANA ROESSING

Secretária



Conferência de autenticidade emitida em 13/10/2022 16:20:15.

O Prev já ajudou mais de 140 mil advogados em todo o Brasil.Faça cálculos ilimitados e utilize quantas petições quiser!

Experimente agora