APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 5004221-47.2014.4.04.7001/PR
RELATOR | : | Des. Federal ROGER RAUPP RIOS |
APELANTE | : | ANDREA APARECIDA ORTENZI GARCIA |
ADVOGADO | : | ANDRE BENEDETTI DE OLIVEIRA |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELADO | : | OS MESMOS |
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIOS POR INCAPACIDADE. REQUISITOS. LIMITAÇÃO PARCIAL E PERMANENTE PARA DETERMINADAS FUNÇÕES. AUXÍLIO-DOENÇA DEVIDO ATÉ A EFETIVA REABILITAÇÃO. AVC - AUXÍLIO-ACIDENTE INDEVIDO. CONSECTÁRIOS LEGAIS. TUTELA ESPECÍFICA. IMPLANTAÇÃO DO BENEFÍCIO.
1. São três os requisitos para a concessão dos benefícios por incapacidade: a) a qualidade de segurado; b) o cumprimento do período de carência de 12 contribuições mensais; c) a incapacidade para o trabalho, de caráter permanente (aposentadoria por invalidez) ou temporária (auxílio-doença).
2. A concessão dos benefícios de auxílio-doença e aposentadoria por invalidez pressupõe a averiguação da incapacidade para o exercício de atividade que garanta a subsistência do segurado, e terá vigência enquanto permanecer ele nessa condição.
3. A prova pericial constitui o meio adequado para se apurar a existência da incapacidade laborativa do requerente, sendo, no caso concreto, desnecessária a oitiva de testemunhas para comprovar a alegação, eis que a perícia foi clara e conclusiva.
4. . No caso dos autos, o laudo pericial indicou que a parte autora está incapacitada para suas atividades habituais; entretanto, considerando que não se trata de pessoa idosa, bem como que possui elevada instrução educacional, é viável, em tese, a reabilitação profissional. Logo, mostra-se adequado o restabelecimento do auxílio-doença desde a cessação administrativa.
5. Termo inicial do benefício na data da cessação administrativa, uma vez evidenciado que a incapacidade estava presente àquela data.
6. Acidente vascular cerebral ou encefálico (AVC ou AVE) é um termo técnico da área da medicina que não constitui fato gerador do benefício de auxílio-acidente, ainda que consolide com redução parcial e permanente da capacidade laborativa.
7. Declarada pelo Supremo Tribunal Federal a inconstitucionalidade do art. 1º-F da Lei nº 9.494/97, com a redação dada pela Lei nº 11.960/2009, os juros moratórios devem ser equivalentes aos índices de juros aplicáveis à caderneta de poupança (STJ, REsp 1.270.439/PR, 1ª Seção, Relator Ministro Castro Meira, 26/06/2013). No que tange à correção monetária, permanece a aplicação da TR, como estabelecido naquela lei e demais índices oficiais consagrados pela jurisprudência.
8. O cumprimento imediato da tutela específica independe de requerimento expresso do segurado ou beneficiário, e o seu deferimento sustenta-se na eficácia mandamental dos provimentos fundados no art. 461 do CPC/1973, bem como nos artigos 497, 536 e parágrafos e 537 do CPC/2015.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, negar provimento ao agravo retido e à apelação da parte autora e dar parcial provimento à remessa oficial e à apelação do INSS, determinando a implantação do benefício, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 28 de junho de 2016.
Des. Federal ROGER RAUPP RIOS
Relator
| Documento eletrônico assinado por Des. Federal ROGER RAUPP RIOS, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8317248v3 e, se solicitado, do código CRC 43D1AF08. | |
| Informações adicionais da assinatura: | |
| Signatário (a): | Roger Raupp Rios |
| Data e Hora: | 30/06/2016 11:04 |
APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 5004221-47.2014.4.04.7001/PR
RELATOR | : | Des. Federal ROGER RAUPP RIOS |
APELANTE | : | ANDREA APARECIDA ORTENZI GARCIA |
ADVOGADO | : | ANDRE BENEDETTI DE OLIVEIRA |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELADO | : | OS MESMOS |
RELATÓRIO
Trata-se de apelações e reexame necessário contra sentença que julgou parcialmente procedente o pedido para restabelecer à parte autora o benefício de auxílio-doença desde 30/09/2013 (data da cessação administrativa) até a sua efetiva reabilitação. Restou o INSS condenado a pagar as parcelas devidas a partir do vencimento de cada uma, corrigidas pelo INPC e acrescidas de juros de mora calculados pelos índices oficiais aplicados à caderneta de poupança. Isenta de custas, a autarquia ressarcirá os honorários periciais e pagará honorários advocatícios sucumbenciais de 10% sobre o valor das parcelas vencidas até a data da sentença.
Em suas razões recursais, a parte autora requer a análise do agravo retido interposto contra a decisão que indeferiu a produção de prova testemunhal (Evento 79). No mérito, sustenta que jamais exerceu a atividade de comerciária, para a qual o laudo concluiu que estava ela apta, e que suas patologias em conjunto - depressão e sequelas de acidente vascular encefálico - constituem impedimento definitivo para sua atividade de zootecnista, bem como para quaisquer outras que poderiam garantir a subsistência. Argumenta, também, que o laudo comprovou a incapacidade parcial e permanente decorrente de acidente de qualquer natureza (AVE), resultando na impossibilidade de exercer a mesma profissão anterior ao sinistro. Ao final, requer a reforma do julgado para lhe conceder aposentadoria por invalidez ou sucessivamente, o benefício de auxílio-acidente.
O INSS, por sua vez, sustenta a constitucionalidade da Lei 11.960/2009, bem como que as ADIs 4.357 e 4.425, julgadas pelo STF, tiveram seus efeitos modulados no tempo e que não alcançam a presente ação. Ao final, requer a aplicação da Lei 11.960/09 para fins de juros e correção monetária.
Apresentadas as contrarrazões apenas pela autora, subiram os autos a este Tribunal.
É o breve relatório.
VOTO
Do novo CPC (Lei 13.105/2015)
Consoante a norma inserta no art. 14 do CPC/2015, "a norma processual não retroagirá e será aplicável imediatamente aos processos em curso, respeitados os atos processuais praticados e as situações jurídicas consolidadas sob a vigência da norma revogada". Portanto, apesar da nova normatização processual ter aplicação imediata aos processos em curso, os atos processuais já praticados, perfeitos e acabados não podem mais ser atingidos pela mudança ocorrida a posteriori.
Nesse sentido, serão examinados segundo as normas do CPC de 2015 tão somente os recursos e remessas em face de sentenças publicadas a contar do dia 18/03/2016.
Da ordem cronológica dos processos
Dispõe o art. 12 do Novo CPC (Lei nº 13.105/2015, com redação da Lei nº 13.256/2016) que "os juízes e os tribunais atenderão, preferencialmente, à ordem cronológica de conclusão para proferir sentença ou acórdão", estando, contudo, excluídos da regra do caput, entre outros, "as preferências legais e as metas estabelecidas pelo Conselho Nacional de Justiça" (§2º, inciso VII), bem como "a causa que exija urgência no julgamento, assim reconhecida por decisão fundamentada" (§2º, inciso IX).
O caso presente encontra-se dentre aqueles considerados urgentes no julgamento, vez que se refere a benefício por incapacidade, estando a parte autora, hipossuficiente, hipoteticamente impossibilitada de laborar e obter o sustento seu e de familiares.
Agravo retido da autora
Em razões de apelo a parte autora ratifica o agravo retido (Evento 79) interposto contra a decisão que indeferiu o pedido de produção de prova testemunhal para comprovar que a agravante está incapacitada para o trabalho, bem como que não exerce a atividade de comerciária.
In casu, é de ver-se que a oitiva de testemunha é desnecessária, na medida em que a prova pericial constitui o meio adequado para se apurar a existência da inaptidão laborativa do recorrente. Nada obstante, a questão do exercício da atividade de comerciária não é determinante neste momento, eis que a sentença restabeleceu o auxílio-doença até que a segurada seja reabilitada em uma ou outra função, desde que compatível com seu estado de saúde.
Cumpre, assim, ressaltar o posicionamento deste Regional no sentido da desnecessidade de produção de prova testemunhal para corroborar a incapacidade da parte:
PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-DOENÇA. INDEFERIMENTO DE PROVA TESTEMUNHAL MANTIDO. INCAPACIDADE LABORAL NÃO CARACTERIZADA. I. A incapacidade laborativa é questão a ser comprovada mediante perícia técnica, já produzida nos autos, não se prestando a prova testemunhal para tal finalidade. II. Evidenciada a inexistência de incapacidade laboral da parte autora no período requerido, a partir do conjunto probatório constante dos autos, impõe-se a manutenção da sentença de improcedência do pedido de concessão de benefício por incapacidade. (TRF4, AC 0004845-77.2015.404.9999, Quinta Turma, Relator Rogerio Favreto, D.E. 09/07/2015)
AGRAVO DE INSTRUMENTO. PROCESSO CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-DOENÇA. PROVA TESTEMUNHAL PARA COMPROVAÇÃO DA INCAPACIDADE LABORATIVA. DESNECESSIDADE. ARTIGO 400, II, DO CPC. Tratando-se de ação na qual se objetiva a concessão/restabelecimento de benefício por incapacidade, a prova testemunhal se afigura desnecessária, nos termos do artigo 400, inciso II, do Código de Processo Civil, na medida em que a prova pericial constitui o meio adequado para se apurar a existência da enfermidade e da inaptidão laborativa dela decorrente. (TRF4, AG 0000564-05.2015.404.0000, Sexta Turma, Relatora Vânia Hack de Almeida, D.E. 28/05/2015)
AGRAVO. BENEFÍCIO POR INCAPACIDADE. PROVA TESTEMUNHAL. COMPLEMENTAÇÃO DE QUESITOS. DESNECESSIDADE. A prova testemunhal não se presta para comprovação da incapacidade, a qual depende de prova técnica já realizada nos autos não necessitando de complementação. (TRF4, AG 5027156-35.2014.404.0000, Sexta Turma, Relator p/ Acórdão (auxílio Kipper) Paulo Paim da Silva, juntado aos autos em 04/05/2015)
É sabido, ademais, que a prova é destinada ao Juiz, cabendo, pois, a ele avaliar a necessidade de produção de novas provas para seu próprio convencimento e materialização da verdade. Perfeitamente possível, portanto, o magistrado indeferir a realização da prova se o conjunto probatório acostado aos autos é suficiente ao deslinde da controvérsia.
Ante o exposto, voto no sentido de negar provimento ao agravo.
Dos requisitos para a concessão do benefício
A concessão de benefícios por incapacidade laboral está prevista nos artigos 42 e 59 da Lei 8.213/91, verbis:
Art. 42. A aposentadoria por invalidez, uma vez cumprida, quando for o caso, a carência exigida, será devida ao segurado que, estando ou não em gozo de auxílio-doença, for considerado incapaz e insusceptível de reabilitação para o exercício de atividade que lhe garanta a subsistência, e ser-lhe-á paga enquanto permanecer nesta condição.
Art. 59. O auxílio-doença será devido ao segurado que, havendo cumprido, quando for o caso, o período de carência exigido nesta Lei, ficar incapacitado para o seu trabalho ou para a sua atividade habitual por mais de 15 dias consecutivos.
Extrai-se, da leitura dos dispositivos acima transcritos, que são três os requisitos para a concessão dos benefícios por incapacidade: a) a qualidade de segurado; b) o cumprimento do período de carência de 12 contribuições mensais; c) a incapacidade para o trabalho, de caráter permanente (aposentadoria por invalidez) ou temporária (auxílio-doença).
Da qualidade de segurado e do período de carência
Quanto ao período de carência (número mínimo de contribuições mensais indispensáveis para que o beneficiário faça jus ao benefício), estabelece o art. 25 da Lei de Benefícios da Previdência Social:
Art. 25. A concessão das prestações pecuniárias do Regime Geral de Previdência Social depende dos seguintes períodos de carência:
I - auxílio-doença e aposentadoria por invalidez: 12 contribuições mensais;
Na hipótese de ocorrer a cessação do recolhimento das contribuições, prevê o art. 15 da Lei nº 8.213/91 o denominado "período de graça", que permite a prorrogação da qualidade de segurado durante um determinado lapso temporal:
Art. 15. Mantém a qualidade de segurado, independentemente de contribuições:
I - sem limite de prazo, quem está em gozo de benefício;
II - até 12 (doze) meses após a cessação das contribuições, o segurado que deixar de exercer atividade remunerada abrangida pela Previdência Social ou estiver suspenso ou licenciado sem remuneração;
III - até 12 (doze) meses após cessar a segregação, o segurado acometido de doença de segregação compulsória;
IV - até 12 (doze) meses após o livramento, o segurado retido ou recluso;
V - até 3 (três) meses após o licenciamento, o segurado incorporado às Forças Armadas para prestar serviço militar;
VI - até 6 (seis) meses após a cessação das contribuições, o segurado facultativo.
§ 1º O prazo do inciso II será prorrogado para até 24 (vinte e quatro) meses se o segurado já tiver pago mais de 120 (cento e vinte) contribuições mensais sem interrupção que acarrete a perda da qualidade de segurado.
§ 2º Os prazos do inciso II ou do § 1º serão acrescidos de 12 (doze) meses para o segurado desempregado, desde que comprovada essa situação pelo registro no órgão próprio do Ministério do Trabalho e da Previdência Social.
§ 3º Durante os prazos deste artigo, o segurado conserva todos os seus direitos perante a Previdência Social.
§ 4º A perda da qualidade de segurado ocorrerá no dia seguinte ao do término do prazo fixado no Plano de Custeio da Seguridade Social para recolhimento da contribuição referente ao mês imediatamente posterior ao do final dos prazos fixados neste artigo e seus parágrafos.
Prevê a LBPS que, decorrido o período de graça na forma do § 4º, as contribuições anteriores à perda da qualidade de segurado somente serão computadas para efeitos de carência depois que o segurado contar, a partir da nova filiação à Previdência Social, com, no mínimo, 1/3 (um terço) do número de contribuições exigidas para o cumprimento da carência definida para o benefício a ser requerido.
Da comprovação da incapacidade laboral
A concessão dos benefícios de auxílio-doença e aposentadoria por invalidez pressupõe a averiguação, através de exame médico-pericial, da incapacidade para o exercício de atividade que garanta a subsistência do segurado, e terá vigência enquanto essa condição persistir. Ainda, não obstante a importância da prova técnica, o caráter da limitação deve ser avaliado conforme as circunstâncias do caso concreto. Isso porque não se pode olvidar de que fatores relevantes - como a faixa etária do requerente, seu grau de escolaridade e sua qualificação profissional, assim como outros - são essenciais para a constatação do impedimento laboral e efetivação da proteção previdenciária.
Dispõe, outrossim, a Lei 8.213/91 que a doença ou lesão de que o segurado já era portador ao filiar-se ao Regime Geral de Previdência Social não lhe conferirá direito ao benefício, salvo quando a incapacidade sobrevier por motivo de progressão ou agravamento da doença ou lesão.
Do caso concreto
A presente ação foi distribuída em 27/02/2014 à 1ª Vara Federal de Londrina/PR com pedidos atinentes a benefícios por incapacidade.
A qualidade de segurado e o cumprimento do requisito da carência não foram contestados de forma contundente pelo INSS, não sendo, a priori, pontos controvertidos na presente ação. Assim, a matéria central a ser enfrentada, e motivo da decisão administrativa, diz respeito ao requisito da incapacidade.
Nesse passo, durante a instrução processual, foi realizada perícia judicial em 30/10/2014, a qual foi conduzida pelo Dr. Alcindo Cerci Neto, especialista em medicina legal, perícias médicas e medicina interna, de cujo laudo (Eventos 38 e 67, LAU1) se extraem os seguintes dados:
- quadro mórbido: sequela de AVE isquêmico (perda parcial de visão) e episódio depressivo moderado;
- incapacidade: parcial e permanente para algumas atividades;
- início da incapacidade estimado (DII): novembro de 2012; por ocasião da alta administrativa já estava consolidado o quadro parcialmente incapacitante para função de zootecnista;
- origem e prognóstico: sequelas de lesão cerebelar provocada por um edema sanguíneo durante um procedimento de exame; possibilidade de reabilitação de outras atividades;
As conclusões periciais, conforme explicitado, devem ser analisadas sob o prisma das condições socioeconômicas da parte autora. Nesse norte, do exame dos autos, constatam-se os seguintes elementos:
- idade no momento da perícia: 41 anos (nascimento em 14/05/73);
- atividades laborais: zootecnista, comerciária
- escolaridade: ensino superior completo (pós-graduação);
- requerimentos: auxílio-doença deferido de 19/11/12 a 30/09/13;
Com efeito, no laudo e na complementação, o experto nomeado referiu que as sequelas resultantes do acidente vascular encefálico (AVE) causam incapacidade permanente para a atividade de zootecnista, eis que a função exige acuidade visual apurada; por outro lado, seu quadro de saúde é compatível com o exercício de outras atividades, notadamente as da área comercial - as quais a autora inferiu ao médico perito que já vinha exercendo junto com seu marido (Evento 38, LAU1, pgs. 7/8).
Embora nas razões de apelação a autora refute veementemente a afirmação de que ela prestava auxílio ao marido na condição de comerciária, sendo encontrada na empresa apenas algumas vezes por semana, tal circunstância não é determinante para o deslinde do feito, eis que não elide a conclusão pericial de que a autora pode ser reabilitada para outras atividades profissionais compatíveis com suas limitações neurológicas e oculares.
Ademais, consulta ao sítio da Secretaria da Receita Federal do Brasil, revela que a autora Andrea Aparecida Ortenzi Garcia é sócia-administradora de A.A. Ortenzi Garcia & Cia Ltda, CNPJ 16.637.481/0001-80, sociedade empresária cuja atividade é o comércio atacadista dos mais variados gêneros, como produtos de limpeza, roupas, alimentos, embalagens, material para escritório, suprimentos e equipamentos de informática. Em que pese a administração da empresa não gere uma presunção absoluta contra a requerente, enfraquece sua tese de que nunca teve ligação com a atividade comercial, mormente quando se verifica que a empresa foi constituída em agosto de 2012 e a rescisão do emprego de zootecnista se deu apenas um mês antes.
Ressalto nesse diapasão que a autora não é pessoa idosa (nascida em 1973), possui elevada instrução educacional (pós-graduação), reside em cidade com economia desenvolvida (Londrina/PR) e que está inserida em grupo familiar titular de comércio formal. Logo, sendo viável do ponto de vista médico e social a reabilitação para outras atividades hábeis a garantir a subsistência da requerente, a sentença proferida pelo Juízo a quo é apropriada no ponto em que reconhece o direito ao benefício de auxílio-doença desde a data da indevida cessação até a reabilitação.
Em relação ao pedido de auxílio-acidente, muito embora tenha se verificado uma incapacidade parcial e permanente na autora, restou comprovado que sua origem é um AVE - acidente vascular encefálico ou cerebral -, termo técnico da medicina que define um episódio de isquemia, isto é, falta de irrigação sanguínea das células cerebrais, que não caracteriza acidente de qualquer natureza enquanto fato gerador do benefício insculpido no art. 86 da Lei 8.213/1991.
Este Tribunal já julgou situações análogas em que foi se assentado que o AVC não se enquadra entre as situações geradoras de auxílio-acidente:
PREVIDENCIÁRIO. CONVERSÃO DE AUXÍLIO-DOENÇA EM APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. AUXÍLIO-ACIDENTE INDEVIDO. (...) 2. Não se enquadrando o AVC - acidente vascular cerebral nos estritos termos do art. 86 da Lei nº 8.213/91 e não havendo redução da capacidade laborativa, mas sim incapacidade, não há falar em auxílio-acidente. (TRF4, AC 5000680-39.2010.404.7003, 6ª TURMA, Relator p/ Acórdão JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA, juntado aos autos em 29/11/2012)
PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-DOENÇA. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. REQUISITOS LEGAIS. AUXÍLIO-ACIDENTE. REFORMATIO IN PEJUS. (...) No caso em tela foi concedido o auxílio-acidente, no entanto, a provável causa, conforme descrito pelo perito, da incapacidade foi um acidente vascular-cerebral, o que, todavia, não se enquadra nos estritos termos do art. 86 da Lei nº 8.213/91. Com efeito, a expressão AVC (acidente vascular-cerebral) é um termo técnico do campo da Medicina. Todavia não estão presentes os requisitos para a conversão do benefício em aposentadoria por invalidez. (...) (TRF4, APELREEX 0003722-49.2012.404.9999, 6ª TURMA, Relatora VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA, D.E. 20/07/2012)
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. SENTENÇA EXTRA PETITA. INOCORRÊNCIA. AUXÍLIO-DOENÇA. INCAPACIDADE LABORAL NÃO COMPROVADA. DESNECESSIDADE DE REABILITAÇÃO. AUXÍLIO-ACIDENTE. DESCABIMENTO(...) 3. Considerando as conclusões do perito judicial neurologista, é possível depreender que a autora está incapacitada para suas atividades de enfermagem, em decorrência de sequelas oriundas de um acidente vascular cerebral. Correta, entretanto, a cessação do auxílio-doença, pois desnecessária a reabilitação profissional, já que a autora já trabalhava e continuou laborando como professora após o acidente. 4. Diminuição de capacidade laborativa decorrente de acidente vascular cerebral não gera direito a auxílio-acidente. (TRF4, AC 0003201-89.2008.404.7107, 6ª TURMA, Rel. Eliana Paggiarin Marinho, D.E. 23/08/11)
Assim, também nesse ponto fica desprovido o apelo autoral.
Dos consectários legais
Considerando o mais recente entendimento do Supremo Tribunal Federal acerca do tema, no que tem sido acompanhado por este Colegiado, dou parcial provimento ao reexame necessário e à apelação do INSS para que os juros e a correção monetária incidam na forma abaixo pontuada.
Correção monetária
A correção monetária, segundo o entendimento consolidado na 3ª Seção deste TRF4, incidirá a contar do vencimento de cada prestação e será calculada pelos índices oficiais e aceitos na jurisprudência, quais sejam:
- IGP-DI (05/96 a 03/2006, art. 10 da Lei n.º 9.711/98, combinado com o art. 20, §§5º e 6.º, da Lei n.º 8.880/94);
- INPC (de 04/2006 a 29/06/2009, conforme o art. 31 da Lei n.º 10.741/03, combinado com a Lei n.º 11.430/06, precedida da MP n.º 316, de 11/08/2006, que acrescentou o art. 41-A à Lei n.º 8.213/91).
- TR (a partir de 30/06/2009, conforme art. 1º-F da Lei 9.494/97, com a redação dada pelo art. 5º da Lei 11.960/2009)
O Supremo Tribunal Federal, quando do julgamento das ADIs 4.357 e 4.425, declarou a inconstitucionalidade por arrastamento do art. 1º-F da Lei 9.494/97, com a redação dada pelo art. 5º da Lei 11.960/2009, afastando a utilização da TR como fator de correção monetária dos débitos judiciais da Fazenda Pública, relativamente ao período entre a respectiva inscrição em precatório e o efetivo pagamento.
Em consequência dessa decisão, e tendo presente a sua ratio, a 3ª Seção desta Corte vinha adotando, para fins de atualização dos débitos judiciais da Fazenda Pública, a sistemática anterior à Lei nº 11.960/2009, o que significava, nos termos da legislação então vigente, apurar-se a correção monetária segundo a variação do INPC, salvo no período subsequente à inscrição em precatório, quando se determinava a utilização do IPCA-E.
Entretanto, a questão da constitucionalidade do uso da TR como índice de atualização das condenações judiciais da Fazenda Pública, antes da inscrição do débito em precatório, teve sua repercussão geral reconhecida no RE 870.947, e aguarda pronunciamento de mérito do STF. A relevância e a transcendência da matéria foram reconhecidas especialmente em razão das interpretações que vinham ocorrendo nas demais instâncias quanto à abrangência do julgamento nas ADIs 4.357 e 4.425.
Recentemente, em sucessivas Reclamações, a Suprema Corte vem afirmando que, no julgamento das ADIs em referência, a questão constitucional decidida restringiu-se à inaplicabilidade da TR ao período de tramitação dos precatórios, de forma que a decisão de inconstitucionalidade por arrastamento foi limitada à pertinência lógica entre o art. 100, § 12, da CRFB e o artigo 1º-F da Lei 9.494/97, na redação dada pelo art. 5º da Lei 11.960/2009. Em consequência, as Reclamações vêm sendo acolhidas, assegurando-se que, ao menos até que sobrevenha decisão específica do STF, seja aplicada a legislação em referência na atualização das condenações impostas à Fazenda Pública, salvo após inscrição em precatório. Os pronunciamentos sinalizam, inclusive, para eventual modulação de efeitos, acaso sobrevenha decisão mais ampla quanto à inconstitucionalidade do uso da TR para correção dos débitos judiciais da Fazenda Pública (Rcl 19.050, Rel. Min. Roberto Barroso; Rcl 21.147, Rel. Min. Cármen Lúcia; Rcl 19.095, Rel. Min. Gilmar Mendes).
Em tais condições, com o objetivo de guardar coerência com os mais recentes posicionamentos do STF sobre o tema, e para prevenir a necessidade de futuro sobrestamento dos feitos apenas em razão dos consectários, a melhor solução a ser adotada, por ora, é orientar para aplicação do critério de atualização estabelecido no art. 1º-F da Lei 9.494/97, na redação da Lei 11.960/2009.
Este entendimento não obsta a que o juízo de execução observe, quando da liquidação e atualização das condenações impostas ao INSS, o que vier a ser decidido pelo STF em regime de repercussão geral, bem como eventual regramento de transição que sobrevenha em sede de modulação de efeitos.
Juros de mora
Até 29-06-2009 os juros de mora, apurados a contar da data da citação, devem ser fixados à taxa de 1% ao mês, com base no art. 3º do Decreto-Lei n. 2.322/87, aplicável analogicamente aos benefícios pagos com atraso, tendo em vista o seu caráter eminentemente alimentar, consoante firme entendimento consagrado na jurisprudência do STJ e na Súmula 75 desta Corte.
A partir de então, deve haver incidência dos juros, uma única vez, até o efetivo pagamento do débito, segundo o índice oficial de remuneração básica aplicado à caderneta de poupança, nos termos estabelecidos no art. 1º-F, da Lei 9.494/97, na redação da Lei 11.960/2009. Os juros devem ser calculados sem capitalização, tendo em vista que o dispositivo determina que os índices devem ser aplicados "uma única vez" e porque a capitalização, no direito brasileiro, pressupõe expressa autorização legal (STJ, 5ª Turma, AgRg no AgRg no Ag 1211604/SP, Rel. Min. Laurita Vaz).
Quanto ao ponto, esta Corte já vinha entendendo que no julgamento das ADIs 4.357 e 4.425 não houvera pronunciamento de inconstitucionalidade sobre o critério de incidência dos juros de mora previsto na legislação em referência.
Esta interpretação foi, agora, chancelada, pois, no exame do Recurso Extraordinário 870.947, o STF reconheceu repercussão geral não apenas à questão constitucional pertinente ao regime de atualização monetária das condenações judiciais da Fazenda Pública, mas também à controvérsia pertinente aos juros de mora incidentes.
Em tendo havido a citação já sob a vigência das novas normas, inaplicáveis as disposições do Decreto-lei 2.322/87, incidindo apenas os juros da caderneta de poupança, sem capitalização.
Honorários advocatícios e periciais
Os honorários advocatícios são devidos pelo INSS no percentual de 10% sobre o valor das parcelas vencidas até a data da sentença de procedência ou do acórdão que reforma a sentença de improcedência, nos termos da Súmula 111 do STJ e Súmula 76 deste TRF.
Honorários periciais a cargo da parte vencida.
Custas e despesas processuais - Justiça Federal
Havendo o feito tramitado perante a Justiça Federal, o INSS está isento do pagamento das custas judiciais, a teor do que preceitua o art. 4º da Lei n. 9.289/96.
Nada obstante, por sucumbente, deverá ressarcir os honorários pericias.
Implantação do benefício
A Terceira Seção desta Corte, ao julgar a Questão de Ordem na Apelação Cível nº 2002.71.00.050349-7, firmou entendimento no sentido de que, nas causas previdenciárias, deve-se determinar a imediata implementação do benefício, valendo-se da tutela específica da obrigação de fazer prevista no art. 461 do CPC/1973, bem como nos artigos 497, 536 e parágrafos e 537 do CPC/2015, independentemente de requerimento expresso por parte do segurado ou beneficiário (QUOAC 2002.71.00.050349-7, Relator p/ Acórdão Celso Kipper, D.E. 01/10/2007).
Em razão disso, sendo procedente o pedido, o INSS deverá implantar o benefício concedido no prazo de 45 dias, consoante os parâmetros acima definidos, sob pena de multa.
Conclusão
O apelo e o agravo retido interpostos pela parte autora foram conhecidos e desprovidos. Mantido o restabelecimento de auxílio-doença desde 30/09/2013 (data da cessação administrativa) até a reabilitação da segurada.
A remessa oficial e apelação do INSS foram parcialmente providas para adaptar os consectários legais ao mais recente entendimento do STF acerca de juros e correção monetária, na forma da fundamentação supra.
Determinada a implantação do benefício no prazo de 45 dias.
Dispositivo
Ante o exposto, voto no sentido de negar provimento ao agravo retido e à apelação da parte autora e dar parcial provimento à remessa oficial e à apelação do INSS, determinando a implantação do benefício.
É o voto.
Des. Federal ROGER RAUPP RIOS
Relator
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 28/06/2016
APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 5004221-47.2014.4.04.7001/PR
ORIGEM: PR 50042214720144047001
RELATOR | : | Des. Federal ROGER RAUPP RIOS |
PRESIDENTE | : | Paulo Afonso Brum Vaz |
PROCURADOR | : | Dr.Domingos Sávio Dresch da Silveira |
APELANTE | : | ANDREA APARECIDA ORTENZI GARCIA |
ADVOGADO | : | ANDRE BENEDETTI DE OLIVEIRA |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELADO | : | OS MESMOS |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 28/06/2016, na seqüência 340, disponibilizada no DE de 07/06/2016, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, a DEFENSORIA PÚBLICA e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 5ª TURMA, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU NEGAR PROVIMENTO AO AGRAVO RETIDO E À APELAÇÃO DA PARTE AUTORA E DAR PARCIAL PROVIMENTO À REMESSA OFICIAL E À APELAÇÃO DO INSS, DETERMINANDO A IMPLANTAÇÃO DO BENEFÍCIO.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Des. Federal ROGER RAUPP RIOS |
VOTANTE(S) | : | Des. Federal ROGER RAUPP RIOS |
: | Des. Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ | |
: | Des. Federal ROGERIO FAVRETO |
Lídice Peña Thomaz
Secretária de Turma
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