| D.E. Publicado em 16/06/2017 |
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0006764-67.2016.4.04.9999/RS
RELATORA | : | Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
APELANTE | : | JOÃO VALZUK |
ADVOGADO | : | Eduardo Ferrari |
APELADO | : | (Os mesmos) |
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. COISA JULGADA. PARCIALMENTE RECONHECIDA. AGRAVAMENTO. PRÉVIO REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO. CONTESTAÇÃO DE MÉRITO. AUXÍLIO-DOENÇA E APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. INCAPACIDADE COMPROVADA. CONDIÇÕES PESSOAIS. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS DE SUCUMBÊNCIA. CORREÇÃO MONETÁRIA E JUROS DE MORA. FASE DE CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. DIFERIMENTO.
1. Para o reconhecimento da coisa julgada é necessário que entre uma e outra demanda seja caracterizada a chamada "tríplice identidade" - de partes, de pedido e de causa de pedir -, sendo que a variação de quaisquer desses elementos identificadores afasta a ocorrência de coisa julgada.
2. Em ações objetivando benefício por incapacidade a modificação do suporte fático dá-se pela superveniência de nova moléstia ou pelo agravamento de moléstia preexistente, que justifique a concessão de novo benefício.
3. Ainda que a ação se baseie em requerimento administrativo posterior, o segurado não se desincumbe do dever de demonstrar que houve mudança na situação fática, que se dá pelo agravamento da doença já existente ou pela constatação de patologia incapacitante diversa.
4. A ausência de requerimento administrativo resta suprida pela contestação de mérito apresentada, o que caracteriza resistência à pretensão versada pela parte autora nos termos do julgamento pelo Supremo Tribunal Federal do RE 631.240/MG.
5. Comprovado que o segurado encontrava-se temporariamente incapacitado para suas atividades habituais quando do ajuizamento da ação, é devida a concessão do benefício de auxílio-doença.
6. Converte-se o benefício em aposentadoria por invalidez, desde a data da perícia judicial, porquanto comprovada a incapacidade total e permanente do segurado para o exercício de sua atividade laboral, a qual lhe garante o sustento, considerando suas condições pessoais de idade, escolaridade e qualificação profissional.
7. Os honorários advocatícios de sucumbência devem ser fixados em 10% sobre as parcelas vencidas até a decisão judicial concessória do benefício previdenciário pleiteado.
8. Deliberação sobre índices de correção monetária e taxas de juros diferida para a fase de cumprimento de sentença, a iniciar-se com a observância dos critérios da Lei 11.960/2009, de modo a racionalizar o andamento do processo, permitindo-se a expedição de precatório pelo valor incontroverso, enquanto pendente, no Supremo Tribunal Federal, decisão sobre o tema com caráter geral e vinculante. Precedentes do STJ e do TRF da 4ª Região.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 6ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento ao recurso do INSS e à remessa oficial, esta tida por interposta, a fim de condenar a autarquia à concessão do benefício de auxílio-doença ao autor a partir da data do ajuizamento desta ação, 15/10/2012, convertido em aposentadoria por invalidez a partir da data da realização da perícia médica em juízo, 10/10/2013, e dar provimento ao recurso adesivo do requerente para fixar os honorários advocatícios em 10% sobre as parcelas vendias até a decisão judicial concessória, bem como, de ofício, diferir para a fase de execução a forma de cálculo dos consectários legais, julgando prejudicada a remessa no ponto, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 07 de abril de 2017.
Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA
Relatora
| Documento eletrônico assinado por Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA, Relatora, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8931318v4 e, se solicitado, do código CRC DD34A791. | |
| Informações adicionais da assinatura: | |
| Signatário (a): | Vânia Hack de Almeida |
| Data e Hora: | 01/06/2017 16:05 |
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0006764-67.2016.4.04.9999/RS
RELATORA | : | Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
APELANTE | : | JOÃO VALZUK |
ADVOGADO | : | Eduardo Ferrari |
APELADO | : | (Os mesmos) |
RELATÓRIO
Trata-se de ação ordinária objetivando a concessão do benefício de auxílio-doença, com a conversão em aposentadoria por invalidez, e o pagamento das prestações devidas a partir da data do ajuizamento da ação, ou a concessão do benefício de auxílio-acidente. Requereu a parte autora a antecipação dos efeitos da tutela e, ao final, o pagamento das parcelas atrasadas.
O pedido antecipatório foi indeferido (fl. 41).
Realizada a perícia judicial em (10/10/2013), foi o laudo acostado às fls. 112-115.
O pedido de antecipação da tutela foi reiterado pela parte autora e, novamente, indeferido pelo juízo a quo (fl. 158), sendo, contudo, concedido em razão do provimento dado ao recurso de agravo de instrumento interposto pelo requerente (fls. 169-174).
A sentença julgou procedente o pedido, condenando o INSS a conceder o benefício de aposentadoria por invalidez desde 31/05/2012, corrigidas as parcelas vencidas e com incidência de juros de mora. Ainda, isentou a autarquia ao pagamento das custas e a condenou ao pagamento dos honorários advocatícios, fixados em R$ 500,00. Por fim, não sujeito a decisão ao reexame necessário.
Apelaram ambas as partes.
O INSS defendeu em suas razões a necessidade de que a remessa necessária seja reconhecida e de não ter sido comprovada pela parte autora sua incapacidade na medida em que as informações contidas no laudo médico apenas fazem referência à limitação funcional.
O autor, por seu turno, apresentou recurso adesivo objetivando a majoração da verba honorária fixada.
Oportunizadas as contrarrazões, subiram os autos.
É o relatório.
VOTO
Do Direito Intertemporal
Considerando que o presente processo está sendo apreciado por esta Turma após o início da vigência da Lei n.º 13.105/15, novo Código de Processo Civil, necessário se faz a fixação, à luz do direito intertemporal, dos critérios de aplicação dos dispositivos processuais concernentes ao caso em apreço, a fim de evitar eventual conflito aparente de normas.
Para tanto, cabe inicialmente ressaltar que o CPC/2015 procurou estabelecer, em seu CAPÍTULO I, art. 1º que 'o processo civil será ordenado, disciplinado e interpretado conforme os valores e as normas fundamentais estabelecidos na Constituição da República Federativa do Brasil, observando-se as disposições deste Código'; em seu CAPÍTULO II, art. 14, que 'a norma processual não retroagirá e será aplicável imediatamente aos processos em curso, respeitados os atos processuais praticados e as situações jurídicas consolidadas sob a vigência da norma revogada'; bem como, em suas DISPOSIÇÕES FINAIS E TRANSITÓRIAS, art. 1.046, caput, que 'ao entrar em vigor este Código, suas disposições se aplicarão desde logo aos processos pendentes, ficando revogada a Lei no 5.869, de 11 de janeiro de 1973' (grifo nosso).
Neste contexto, percebe-se claramente ter o legislador pátrio adotado o princípio da irretroatividade da norma processual, em consonância com o art. 5º, inc. XXXVI da Constituição Federal, o qual estabelece que 'a lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada'.
Desta forma, a fim de dar plena efetividade às referidas disposições normativas, e tendo em vista ser o processo constituído por um conjunto de atos, dirigidos à consecução de uma finalidade, qual seja, a composição do litígio, adoto, como critério de solução de eventual conflito aparente de normas, a Teoria dos Atos Processuais Isolados, segundo a qual cada ato deve ser considerado separadamente dos demais para o fim de se determinar a lei que o rege, a qual será, segundo o princípio tempus regit actum, aquela que estava em vigor no momento em que o ato foi praticado.
Por consequência, para deslinde da antinomia aparente supracitada, deve ser aplicada no julgamento a lei vigente:
(a) Na data do ajuizamento da ação, para a verificação dos pressupostos processuais e das condições da ação;
(b) Na data da citação (em razão do surgimento do ônus de defesa), para a determinação do procedimento adequado à resposta do réu, inclusive quanto a seus efeitos;
(c) Na data do despacho que admitir ou determinar a produção probatória, para o procedimento a ser adotado, inclusive no que diz respeito à existência de cerceamento de defesa;
(d) Na data da publicação da sentença (entendida esta como o momento em que é entregue em cartório ou em que é tornado público o resultado do julgamento), para fins de verificação dos requisitos de admissibilidade dos recursos, de seus efeitos, da sujeição da decisão à remessa necessária, da aplicabilidade das disposições relativas aos honorários advocatícios, bem como de sua majoração em grau recursal.
Remessa Oficial
Conforme já referido, tratando-se de sentença publicada na vigência do CPC/73, inaplicável o disposto no art. 496 do CPC/2015 quanto à remessa necessária.
Consoante decisão da Corte Especial do STJ (EREsp nº 934642/PR), em matéria previdenciária, as sentenças proferidas contra o Instituto Nacional do Seguro Social só não estarão sujeitas ao duplo grau obrigatório se a condenação for de valor certo (líquido) inferior a sessenta salários mínimos.
Não sendo esse o caso, tenho como interposta a remessa oficial.
Da coisa julgada
Para o reconhecimento da coisa julgada é necessário que entre uma e outra demanda seja caracterizada a chamada "tríplice identidade", ou seja, que haja identidade de partes, de pedido e de causa de pedir. A variação de quaisquer desses elementos identificadores afasta a ocorrência de coisa julgada.
Nesse sentido, apenas para exemplificar, o precedente a seguir transcrito:
PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. CONCESSÃO DE BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. COISA JULGADA. ALEGAÇÃO DE MODIFICAÇÃO DA SITUAÇÃO SOCIOECONÔMICA. NECESSIDADE DE REALIZAÇÃO DE PERÍCIA SOCIOECONÔMICA. CERCEAMENTO DE DEFESA. ANULAÇÃO DA SENTENÇA.
1. Para a admissão da existência de coisa julgada é necessário, nos termos do § 2º do artigo 301 do CPC, que entre uma e outra demanda seja caracterizada a chamada "tríplice identidade", ou seja, que haja identidade de partes, de pedido e de causa de pedir. A variação de quaisquer desses elementos identificadores afasta a ocorrência de coisa julgada.
2. É possível o ajuizamento de nova ação pelo segurado contra o INSS (com o mesmo pedido) sempre que houver modificação da situação fática, o que não infringirá a coisa julgada, pois a causa de pedir será diferente. Precedentes da Corte.
(...)
(AC nº 0019677-86.2013.404.9999, Rel. Juiz Federal Roger Raupp Rios, 6ª T., dec. un. em 26/03/2014, D.E. de 03/04/2014)
Em relação à causa de pedir, sabe-se que ela é composta pelos fundamentos jurídicos e pelo suporte fático. Em ações referentes ao reconhecimento da incapacidade do segurado, a modificação do suporte fático dá-se pela superveniência de nova moléstia ou pelo agravamento de moléstia preexistente, que justifique a concessão de novo benefício.
Assim, é possível o ajuizamento de nova ação pelo segurado contra o INSS (com o mesmo pedido) sempre que houver modificação da situação fática, o que não acarretará violação à coisa julgada, pois a causa de pedir será diferente.
E ainda que a ação se baseie em requerimento administrativo posterior, o segurado não se desincumbe do dever de demonstrar que houve mudança na situação fática, que se dá pelo agravamento da doença já existente ou pela constatação de patologia incapacitante diversa.
No caso dos autos, verifico que em 15/02/2011 a parte autora ajuizou a ação nº 5003094-22.2011.404.7117 perante a Vara Federal de Erechim/RS, postulando a concessão do benefício auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez desde a data do requerimento administrativo do NB 31/543.250.086-4 (fls. 51-58), alegando incapacidade laboral por problemas ortopédicos (discopatia degenerativa cervical e lombar). A perícia judicial foi realizada no dia 07/06/2011 e concluiu pela aptidão laboral (fls. 59-63), sendo proferida sentença de improcedência em 21/09/2011 (fls. 64-66), ocorrendo o trânsito em julgado em 29/03/2012 após ter sido negado provimento ao recurso interposto pelo autor (fls. 69-70).
Ocorre que em 15/10/2012, posteriormente ao trânsito em julgado da ação anterior, a parte autora ajuizou a presente perante a Justiça Estadual, Comarca de Gaurama/RS, com mesmo pedido, porém, com causa de pedir ligeiramente diferente: auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez em razão de incapacidade laboral decorrente de agravamento dos problemas ortopédicos.
Não obstante pretenda a concessão desde o ajuizamento da ação ou de data mais pretérita, fazendo referência ao benefício anteriormente requerido, referindo ainda a existência da ação precedente supracitada, tenho que há fato relevante a ser considerado nestes autos.
Isto porque alega à inicial a existência de agravamento de seu estado de saúde, o que demonstra a partir dos atestados e exames acostados aos autos, indicando a ocorrência efetiva do alegado agravamento, o que é majorado pelo fato de ser o autor trabalhador rural.
Tal agravamento autoriza o ajuizamento de nova ação, respeitando, contudo, a coisa julgada em relação ao período precedente ao agravamento.
Assim, merece provimento parcial a remessa oficial para reconhecer a existência de coisa julgada em relação ao pedido de benefício por incapacidade até a data do trânsito em julgado da ação anterior (29/03/2012).
Por consequência, passo a adentrar na análise do mérito do pedido.
Interesse de Agir e Prévio Requerimento Administrativo
O Supremo Tribunal Federal, em sede de repercussão geral, assentou entendimento sobre a matéria, nos autos do RE 631240/MG, no sentido da indispensabilidade do prévio requerimento administrativo de benefício previdenciário como pressuposto para que se possa acionar legitimamente o Poder Judiciário.
Entretanto, fixou fórmula de transição para os casos ajuizados até a data o julgamento da repercussão geral (03/09/2014), definindo que para aquelas ações em que o INSS apresentou contestação de mérito no curso do processo judicial, ficará mantido seu trâmite. Isso ocorre porque a contestação caracteriza o interesse de agir da parte autora, uma vez que há resistência ao pedido.
No caso dos autos, considerando que o INSS apresentou contestação de mérito, tenho por configurado o interesse de agir a justificar o ajuizamento da presente ação.
Fundamentação
Passo, inicialmente, ao exame acerca da incapacidade laborativa da parte autora, postergando a análise a respeito dos requisitos da qualidade de segurado e da carência mínima para o momento seguinte.
No que diz respeito à incapacidade, destaco que o diagnóstico indicando a existência de determinada doença, por si só, não significa que está o paciente incapacitado para o trabalho. E o mesmo se dá com relação a patologias de natureza irreversível ou incurável, pois várias são as doenças sem cura ou sem reversão do quadro que nenhum comprometimento trazem à plena capacidade laboral do portador.
Segundo entendimento dominante na jurisprudência pátria, nas ações em que se objetiva a concessão de aposentadoria por invalidez ou auxílio-doença, ou mesmo nos casos de restauração desses benefícios, o julgador firma seu convencimento com base na prova pericial, não deixando de se ater, entretanto, aos demais elementos de prova.
Verifica-se do laudo pericial judicial que a parte autora é portadora de "Discopatia degenerativa da coluna cervical e lombar - CID10 M51 e Radiculopatia à esquerda por estenose foraminal - CID10 M54.1", o que, segundo o expert, torna-a incapaz definitivamente para o exercício de sua atividade laboral, o que concluiu a partir da soma das patologias associada ao exercício de atividade laboral de grande esforço.
O exame físico realizado ratificou as alegações do autor ao confirmar o diagnóstico relatado à inicial:
Mãos sem sinais de labor recente. Limitação funcional dos movimentos da coluna cervical e lombar, referindo dor. Hipotrofia da musculatura paravertebral da coluna lombar. Teste de Spurling negativo. Teste de Lasegue positivo à esquerda. Referiu hipoestesia no pé esquerdo. Diminuição de força no membro inferior esquerdo.
Assim, concluiu que a referida incapacidade já se encontrava presente quando do ajuizamento da ação, consoante os documentos médicos pelo requerente apresentados. Também, asseverou que o quadro clínico do autor, apesar de degenerativo, é agravado pelo esforço físico empregado no exercício de sua atividade laboral habitual.
Por fim, é importante destacar as condições pessoais do requerente, nascido 06/04/1965, com formação de primeiro grau incompleta e qualificação profissional voltada ao exercício da atividade rural, as quais, aliadas à natureza da enfermidade que o incapacita impossibilitam seu retorno ao mercado de trabalho para o exercício de atividades de cunho leve.
Quanto à qualidade de segurado, esclareço que o trabalho rural como segurado especial dá-se em regime individual (produtor usufrutuário, possuidor, assentado, parceiro ou meeiro outorgados, comodatário ou arrendatário rurais) ou de economia familiar, este quando o trabalho dos membros da família é indispensável à própria subsistência e ao desenvolvimento socioeconômico do núcleo familiar e é exercido em condições de mútua dependência e colaboração, sem a utilização de empregados permanentes (art. 11, VII e § 1º da Lei nº 8.213/91).
A atividade rural de segurado especial deve ser comprovada mediante início de prova material, complementada por prova testemunhal idônea, não sendo esta admitida exclusivamente, a teor do art. 55, § 3º, da Lei 8.213/91, e súmula 149 do STJ.
Desde logo ressalto que somente excluirá a condição de segurado especial a presença ordinária de assalariados - insuficiente a tanto o mero registro em ITR ou a qualificação como empregador rural (II b) - art. 1º, II, "b", do Decreto-Lei 1166, de 15.04.71. Já o trabalho urbano do cônjuge ou familiar, relevante e duradouro, não afasta a condição de regime de economia familiar quando excluído do grupo de trabalho rural. Finalmente, a constitucional idade mínima de dezesseis nos para o trabalho, como norma protetiva, deve ser interpretada em favor do protegido, não lhe impedindo o reconhecimento de direitos trabalhistas ou previdenciários quando tenham efetivamente desenvolvido a atividade laboral.
Quanto ao início de prova material, necessário a todo reconhecimento de tempo de serviço (§ 3º do art. 56 da Lei nº 8.213/91 e Súmula 149/STJ), por ser apenas inicial, tem sua exigência suprida pela indicação contemporânea em documentos do trabalho exercido, embora não necessariamente ano a ano, mesmo fora do exemplificativo rol legal (art. 106 da Lei nº 8.213/91), ou em nome de integrantes do grupo familiar (Admite-se como início de prova material do efetivo exercício de atividade rural, em regime de economia familiar, documentos de terceiros, membros do grupo parental -Súmula 73 do TRF 4ª Região).
Nos casos de trabalhadores informais, especialmente em labor rural de bóia-fria, a dificuldade de obtenção de documentos permite maior abrangência na admissão do requisito legal de início de prova material, valendo como tal documentos não contemporâneos ou mesmo em nome terceiros (patrões, donos de terras arrendadas, integrantes do grupo familiar ou de trabalho rural). Se também ao bóia-fria é exigida prova documental do labor rural, o que com isto se admite é mais amplo do que seria exigível de um trabalhador urbano, que rotineiramente registra suas relações de emprego.
Como início de prova material do labor rural juntou a parte autora os seguintes documentos, dentre outros:
a) notas fiscais de comercialização de produção rural (leite cru refrigerado) emitidas em nome do autor entre 09/11/2010 (fl. 17) e 01/06/2012 (fl. 32);
b) matrícula 4.284 do imóvel consistente no lote rural 148-A, com área de 12,3 hectares, localizada em Viadutos/RS, adquirida pelo autor e por sua cônjuge, ambos qualificados como agricultores, em 18/11/2008 (fls. 131-134);
c) certificado de cadastro de imóvel rural 2006/2009 emitido em nome do autor relativamente aos lotes rurais 148 e 148-A com área total de 24,6 hectares, correspondentes a 1,23 módulos fiscais (fl. 138);
d) certidão de casamento do autor com Ludovica Maria Kubiak, ocorrido em 18/05/2002, em que ambos são qualificados como agricultores (fl. 143);
e) certidão de nascimento do filho do casal, em 28/08/1996, em que ambos foram qualificados como agricultores (fl. 142);
Os documentos acima elencados correspondem ao início de prova material exigido para o reconhecimento da condição de segurada especial.
Em audiência de instrução, foram ouvidas duas testemunhas as quais confirmaram conhecer o demandante porque vizinhos do mesmo e, por esta razão, sabem que ele exerce a atividade de agricultor, criando vacas-de-leite, sem o auxílio de empregados, tampouco possuindo maquinário agrícola para o cultivo das lavouras de milho e de soja que possui.
Observo, portanto, que a prova material juntada aos autos foi devidamente corroborada pela prova testemunhal. Assim, presente início de prova material, complementada por direta prova oral, no período controverso, devida é a admissão da condição da parte autora como segurada especial no período pretendido.
Conclusão
Demonstrado que a parte autora está incapacitada para o exercício de seu trabalho habitual, e comprovada a sua qualidade de segurada especial, é de ser reconhecido seu direito à concessão do benefício de auxílio-doença a partir da data do ajuizamento da ação, 15/10/2012, devendo ser convertido em aposentadoria por invalidez a partir da data em que realizada a perícia médica nos autos, 10/10/2013, motivo pelo qual dou parcial provimento à remessa no ponto.
Destaco, apenas, que eventuais valores recebidos a título de benefício previdenciário no mesmo período da condenação, por força da tutela antecipada ou na via administrativa, devem ser descontados no pagamento dos atrasados, evitando-se o pagamento em duplicidade.
Consectários
Juros Moratórios e Correção Monetária.
De início, esclareço que a correção monetária e os juros de mora, sendo consectários da condenação principal, possuem natureza de ordem pública e podem ser analisados até mesmo de ofício. Assim, sua alteração não implica falar em reformatio in pejus.
A questão da atualização monetária das quantias a que é condenada a Fazenda Pública, dado o caráter acessório de que se reveste, não deve ser impeditiva da regular marcha do processo no caminho da conclusão da fase de conhecimento.
Firmado em sentença, em apelação ou remessa oficial o cabimento dos juros e da correção monetária por eventual condenação imposta ao ente público e seus termos iniciais, a forma como serão apurados os percentuais correspondentes, sempre que se revelar fator impeditivo ao eventual trânsito em julgado da decisão condenatória, pode ser diferida para a fase de cumprimento, observando-se a norma legal e sua interpretação então em vigor. Isso porque é na fase de cumprimento do título judicial que deverá ser apresentado, e eventualmente questionado, o real valor a ser pago a título de condenação, em total observância à legislação de regência.
O recente art. 491 do NCPC, ao prever, como regra geral, que os consectários já sejam definidos na fase de conhecimento, deve ter sua interpretação adequada às diversas situações concretas que reclamarão sua aplicação. Não por outra razão seu inciso I traz exceção à regra do caput, afastando a necessidade de predefinição quando não for possível determinar, de modo definitivo, o montante devido. A norma vem com o objetivo de favorecer a celeridade e a economia processuais, nunca para frear o processo.
E no caso, o enfrentamento da questão pertinente ao índice de correção monetária, a partir da vigência da Lei 11.960/09, nos débitos da Fazenda Pública, embora de caráter acessório, tem criado graves óbices à razoável duração do processo, especialmente se considerado que pende de julgamento no STF a definição, em regime de repercussão geral, quanto à constitucionalidade da utilização do índice da poupança na fase que antecede a expedição do precatório (RE 870.947, Tema 810).
Tratando-se de débito, cujos consectários são totalmente definidos por lei, inclusive quanto ao termo inicial de incidência, nada obsta a que seja diferida a solução definitiva para a fase de cumprimento do julgado, em que, a propósito, poderão as partes, se assim desejarem, mais facilmente conciliar acerca do montante devido, de modo a finalizar definitivamente o processo.
Sobre esta possibilidade, já existe julgado da Terceira Seção do STJ, em que assentado que "diante a declaração de inconstitucionalidade parcial do artigo 5º da Lei n. 11.960/09 (ADI 4357/DF), cuja modulação dos efeitos ainda não foi concluída pelo Supremo Tribunal Federal, e por transbordar o objeto do mandado de segurança a fixação de parâmetros para o pagamento do valor constante da portaria de anistia, por não se tratar de ação de cobrança, as teses referentes aos juros de mora e à correção monetária devem ser diferidas para a fase de execução. 4. Embargos de declaração rejeitados". (EDcl no MS 14.741/DF, Rel. Ministro JORGE MUSSI, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 08/10/2014, DJe 15/10/2014).
Na mesma linha vêm decidindo as duas turmas de Direito Administrativo desta Corte (2ª Seção), à unanimidade, (Ad exemplum: os processos 5005406-14.2014.404.7101, 3ª Turma, julgado em 01-06-2016 e 5052050-61.2013.404.7000, 4ª Turma, julgado em 25/05/2016)
Portanto, em face da incerteza quanto ao índice de atualização monetária, e considerando que a discussão envolve apenas questão acessória no contexto da lide, à luz do que preconizam os art. 4º, 6º e 8º do novo Código de Processo Civil, mostra-se adequado e racional diferir-se para a fase de execução a solução em definitivo acerca dos critérios de correção, ocasião em que, provavelmente, a questão já terá sido dirimida pelo tribunal superior, o que conduzirá à observância, pelos julgadores, ao fim e ao cabo, da solução uniformizadora.
A fim de evitar novos recursos, inclusive na fase de cumprimento de sentença, e anteriormente à solução definitiva pelo STF sobre o tema, a alternativa é que o cumprimento do julgado se inicie, adotando-se os índices da Lei 11.960/2009, inclusive para fins de expedição de precatório ou RPV pelo valor incontroverso, diferindo-se para momento posterior ao julgamento pelo STF a decisão do juízo sobre a existência de diferenças remanescentes, a serem requisitadas, acaso outro índice venha a ter sua aplicação legitimada.
Os juros de mora, incidentes desde a citação, como acessórios que são, também deverão ter sua incidência garantida na fase de cumprimento de sentença, observadas as disposições legais vigentes conforme os períodos pelos quais perdurar a mora da Fazenda Pública.
Evita-se, assim, que o presente feito fique paralisado, submetido a infindáveis recursos, sobrestamentos, juízos de retratação, e até ações rescisórias, com comprometimento da efetividade da prestação jurisdicional, apenas para solução de questão acessória.
Diante disso, difere-se para a fase de cumprimento de sentença a forma de cálculo dos consectários legais, adotando-se inicialmente o índice da Lei 11.960/2009, restando prejudicada a remessa necessária no ponto.
Honorários Advocatícios
Considerando que a sentença recorrida foi publicada antes de 18/03/2016, data da entrada em vigor do NCPC, e tendo em conta as explanações tecidas quando da análise do direito intertemporal, esclareço que as novas disposições acerca da verba honorária são inaplicáveis ao caso em tela, de forma que não se determinará a graduação conforme o valor da condenação (art. 85, §3º, I ao V, do CPC/2015), tampouco se estabelecerá a majoração em razão da interposição de recurso (art. 85, §11º, do CPC/2015).
Assim, dada a sucumbência mínima do requerente, ao seu recurso adesivo deve ser dado provimento a fim de que os honorários advocatícios sejam fixados em 10% sobre as parcelas vencidas até a decisão judicial concessória do benefício previdenciário pleiteado (Súmula nº 76 do TRF4 e nº 111 do STJ), devendo ser suportados pelo INSS.
Custas Processuais
O INSS é isento do pagamento das custas no Foro Federal (art. 4, I, da Lei nº 9.289/96) e na Justiça Estadual do Rio Grande do Sul, devendo, contudo, pagar eventuais despesas processuais, como as relacionadas a correio, publicação de editais e condução de oficiais de justiça (artigo 11 da Lei Estadual nº 8.121/85, com a redação da Lei Estadual nº 13.471/2010, já considerada a inconstitucionalidade formal reconhecida na ADI nº 70038755864 julgada pelo Órgão Especial do TJ/RS), isenções estas que não se aplicam quando demandado na Justiça Estadual do Paraná (Súmula 20 do TRF4), devendo ser ressalvado, ainda, que no Estado de Santa Catarina (art. 33, p.único, da Lei Complementar Estadual nº156/97), a autarquia responde pela metade do valor.
Tutela Antecipada
No tocante à antecipação dos efeitos da tutela, entendo que deve ser mantida a sentença no ponto, uma vez que presentes os pressupostos legais para o seu deferimento.
Dispositivo
Em face do exposto, voto por dar parcial provimento ao recurso do INSS e à remessa oficial, esta tida por interposta, a fim de condenar a autarquia à concessão do benefício de auxílio-doença ao autor a partir da data do ajuizamento desta ação, 15/10/2012, convertido em aposentadoria por invalidez a partir da data da realização da perícia médica em juízo, 10/10/2013, e dar provimento ao recurso adesivo do requerente para fixar os honorários advocatícios em 10% sobre as parcelas vendias até a decisão judicial concessória, bem como, de ofício, diferir para a fase de execução a forma de cálculo dos consectários legais, julgando prejudicada a remessa no ponto.
Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA
Relatora
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 31/05/2017
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0006764-67.2016.4.04.9999/RS
ORIGEM: RS 00021350620128210098
RELATOR | : | Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA |
PRESIDENTE | : | Desembargadora Federal Vânia Hack de Almeida |
PROCURADOR | : | Procurador Regional da República Maurício Pessutto |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
APELANTE | : | JOÃO VALZUK |
ADVOGADO | : | Eduardo Ferrari |
APELADO | : | (Os mesmos) |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 31/05/2017, na seqüência 16, disponibilizada no DE de 15/05/2017, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 6ª TURMA, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU DAR PARCIAL PROVIMENTO AO RECURSO DO INSS E À REMESSA OFICIAL, ESTA TIDA POR INTERPOSTA, A FIM DE CONDENAR A AUTARQUIA À CONCESSÃO DO BENEFÍCIO DE AUXÍLIO-DOENÇA AO AUTOR A PARTIR DA DATA DO AJUIZAMENTO DESTA AÇÃO, 15/10/2012, CONVERTIDO EM APOSENTADORIA POR INVALIDEZ A PARTIR DA DATA DA REALIZAÇÃO DA PERÍCIA MÉDICA EM JUÍZO, 10/10/2013, E DAR PROVIMENTO AO RECURSO ADESIVO DO REQUERENTE PARA FIXAR OS HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS EM 10% SOBRE AS PARCELAS VENDIAS ATÉ A DECISÃO JUDICIAL CONCESSÓRIA, BEM COMO, DE OFÍCIO, DIFERIR PARA A FASE DE EXECUÇÃO A FORMA DE CÁLCULO DOS CONSECTÁRIOS LEGAIS, JULGANDO PREJUDICADA A REMESSA NO PONTO.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA |
VOTANTE(S) | : | Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA |
: | Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE | |
: | Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA |
Gilberto Flores do Nascimento
Diretor de Secretaria
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