Apelação Cível Nº 5057786-16.2020.4.04.7000/PR
PROCESSO ORIGINÁRIO: Nº 5057786-16.2020.4.04.7000/PR
RELATORA: Juíza Federal FLÁVIA DA SILVA XAVIER
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
APELADO: NEUSA RODRIGUES DE OLIVEIRA (AUTOR)
ADVOGADO: FABIO GREIN PEREIRA (OAB PR034741)
RELATÓRIO
Trata-se de ação de procedimento comum em que é postulada a concessão de aposentadoria especial ou por tempo de contribuição (requerida em 09.11.2017), mediante o reconhecimento da atividade especial exercida durante os períodos de 01.09.1993 a 20.04.1995, 01.10.1995 a 27.12.1995, 14.04.1997 a 24.06.2004, 01.03.2004 a 15.02.2007, 01.03.2010 a 15.07.2010, 01.10.2004 a 01.11.2011 e de 01.09.2011 a 09.11.2017, bem como o pagamento das parcelas em atraso.
Processado o feito, sobreveio sentença, cujo dispositivo tem o seguinte teor:
DISPOSITIVO
Julgo procedentes os pedidos, com fulcro no art. 487, I, do NCPC, para condenar o Instituto Nacional do Seguro Social - INSS a:
a) averbar os períodos especiais exercidos nos períodos de 01.09.1993 a 20.04.1995, 01.10.1995 a 27.12.1995, 14.04.1997 a 24.06.2004, 01.03.2004 a 15.02.2007, 01.03.2010 a 15.07.2010, 01.10.2004 a 01.11.2011 e de 01.09.2011 a 09.11.2017;
b) conceder à parte autora o benefício de aposentadoria especial desde a DER (09.11.2017), e a efetuar o pagamento dos respectivos atrasados, com a incidência de juros e correção monetária, na forma da fundamentação.
Do cumprimento do julgado
A Terceira Seção do TRF da 4ª Região, ao julgar a Questão de Ordem na Apelação Cível nº 2002.71.00.050349-7, firmou entendimento no sentido de que, nas causas previdenciárias, a sentença de procedência, independentemente de requerimento expresso por parte do segurado ou beneficiário, deve determinar a imediata implementação do benefício, valendo-se da tutela específica da obrigação de fazer prevista nos arts. 294/ss., bem como nos artigos 497, 536 e parágrafos e 537 do CPC, (QUOAC 2002.71.00.050349-7, Relator p/ Acórdão Celso Kipper, D.E. 01/10/2007). Revendo posicionamento anterior, percebo que tal interpretação foi direcionada mais às decisões do próprio Tribunal, e não às sentenças proferidas em primeira instância, dado o efeito suspensivo das apelações e o tumulto que a implantação imediata de alguns benefícios pode gerar. Nesse sentido:
PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. CONCESSÃO DE BENEFÍCIO. ART. 461 do CPC. TUTELA ESPECÍFICA. OBRIGAÇÃO DE FAZER. EFICÁCIA PREPONDERANTEMENTE MANDAMENTAL DO PROVIMENTO. CUMPRIMENTO IMEDIATO DO ACÓRDÃO. POSSIBILIDADE. REQUERIMENTO DO SEGURADO. DESNECESSIDADE.
(...)
4. A respeito do momento a partir do qual se poderá tornar efetiva a sentença, na parte referente à implantação futura do benefício, a natureza preponderantemente mandamental da decisão não implica automaticamente o seu cumprimento imediato, pois há de se ter por referência o sistema processual do Código, não a Lei do Mandado de Segurança, eis que a apelação de sentença concessiva do benefício previdenciário será recebida em seu efeito devolutivo e suspensivo, nos termos do art. 520, caput, primeira parte, do CPC, motivo pelo qual a ausência de previsão de efeito suspensivo ex lege da apelação, em casos tais, traz por conseqüência a impossibilidade, de regra, do cumprimento imediato da sentença.
5. Situação diversa ocorre, entretanto, em segundo grau, visto que o acórdão que concede o benefício previdenciário, que esteja sujeito apenas a recurso especial e/ou recurso extraordinário, enseja o cumprimento imediato da determinação de implantar o benefício, ante a ausência, via de regra, de efeito suspensivo daqueles recursos, de acordo com o art. 542, § 2º, do CPC. Tal cumprimento não fica sujeito, pois, ao trânsito em julgado do acórdão, requisito imprescindível apenas para a execução da obrigação de pagar (os valores retroativamente devidos) e, consequentemente, para a expedição de precatório e de requisição de pequeno valor, nos termos dos parágrafos 1º, 1º-A e 3º do art. 100 da Constituição Federal.
6. O cumprimento imediato da tutela específica, diversamente do que ocorre no tocante à antecipação de tutela prevista no art. 273 do CPC, independe de requerimento expresso por parte do segurado ou beneficiário, pois aquele é inerente ao pedido de que o réu seja condenado a conceder o benefício previdenciário, e o seu deferimento sustenta-se na eficácia mandamental dos provimentos fundados no art. 461 do CPC. Em suma, a determinação da implantação imediata do benefício contida no acórdão consubstancia, tal como no mandado de segurança, uma ordem (à autarquia previdenciária) e decorre do pedido de tutela específica (ou seja, o de concessão do benefício) contido na petição inicial da ação.
7. Questão de ordem solvida para que, no tocante à obrigação de implantar (para o futuro) o benefício previdenciário, seja determinado o cumprimento imediato do acórdão sujeito apenas a recurso especial e/ou extraordinário, independentemente de trânsito em julgado e de pedido específico da parte autora.
(TRF4, AC 2002.71.00.050349-7, TERCEIRA SEÇÃO, Relator para Acórdão CELSO KIPPER, D.E. 01/10/2007)
Diante do exposto, em que pese demonstrada a presença do direito, mas inexistindo perigo de demora, não se justifica a antecipação de tutela neste momento.
Condeno o INSS ao pagamento integral dos honorários de sucumbência, fixados no percentual mínimo de cada faixa estipulada pelo artigo 85, §3°, do Novo Código de Processo Civil, dependendo da apuração do montante em eventual cumprimento de sentença, sempre observando o §5° do artigo 85 do CPC. A base de cálculo será o valor da condenação, limitado ao valor das parcelas vencidas até a sentença (Súmula 111, STJ; Súmula 76, TRF4).
Sem custas ao INSS, em face da isenção legal prevista pelo artigo 4º, inciso I, da Lei 9.289/1996.
Defiro à parte autora os benefícios da assistência judiciária, nos termos dos arts. 98 e ss. do NCPC.
Interposta apelação, intime-se a parte contrária para contrarrazões, por 15 dias. Com ou sem elas, remetam-se os autos ao Tribunal Regional Federal da 4º Região, nos termos do art. 1.010, § 3º, do CPC.
Sentença publicada e registrada eletronicamente.
Intimem-se.
Após o trânsito em julgado, proceda-se à implantação do benefício, conforme os seguintes parâmetros:
PARÂMETROS PARA CUMPRIMENTO:
TIPO DE CUMPRIMENTO | implantação ap. especial |
NB - ESPÉCIE | 191.631.595-7 |
DIB | 09.11.2017 |
DIP | 1º dia do mês da intimação para a implantação do benefício |
DCB | Não aplicável |
RMI | a calcular |
Para os benefícios cuja implantação será realizada na vigência da EC 103/2019, a parte autora deverá informar se possui outra aposentadoria ou pensão por morte em regime próprio de previdência, detalhando qual data de início e o valor, conforme anexo I da Portaria nº 450/2020-INSS, disponível em http://www.in.gov.br/en/web/dou/-/portaria-n-450-de-3-de-abril-de-2020-251287830
O INSS apela doreconhecimento da especialidade dos períodos 01.09.1993 a 20.04.1995, 01.10.1995 a 27.12.1995, 14.04.1997 a 24.06.2004, 01.03.2004 a 15.02.2007, 01.03.2010 a 15.07.2010, 01.10.2004 a 01.11.2011 e de 01.09.2011 a 09.11.2017, alegando que não foi demonstrada a exposição habitual, permanente e obrigatória a agentes infectocontagiosos, mediante contato com pacientes infectados ou materiais contaminados, o que deve ser averiguado com base na profissiografia do caso concreto, não bastando o simples exercício do labor em ambiente hospitalar.
Sustenta que estão excluídas da exposição nociva as atividades de cunho burocrático, pois para o reconhecimento da especialidade em razão do risco biológico, tal exposição deve ser indissociável da prestação de serviço.
Pugna também pelo reconhecimento do uso de equipamentos de proteção individual como medida eficaz para neutralizar o risco de contágio.
Com contrarrazões, vieram os autos a este Tribunal.
É o relatório.
VOTO
MÉRITO
DAS ATIVIDADES ESPECIAIS
Com relação ao reconhecimento das atividades exercidas como especiais, cumpre ressaltar que o tempo de serviço é disciplinado pela lei em vigor à época em que efetivamente exercido, passando a integrar, como direito adquirido, o patrimônio jurídico do trabalhador. Desse modo, uma vez prestado o serviço sob a égide de legislação que o ampara, o segurado adquire o direito à contagem como tal, bem como à comprovação das condições de trabalho na forma então exigida, não se aplicando retroativamente uma lei nova que venha a estabelecer restrições à admissão do tempo de serviço especial.
Tal entendimento foi manifestado pelo STJ em julgamento de recurso repetitivo já transitado em julgado - que estabeleceu também a possibilidade de conversão de tempo de serviço especial em comum, mesmo após 1998. É teor da ementa, que transitou em julgado em 10/05/2011:
PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DA CONTROVÉRSIA. RITO DO ART. 543-C, § 1º, DO CPC E RESOLUÇÃO N. 8/2008 - STJ. DIVERGÊNCIA JURISPRUDENCIAL NÃO COMPROVADA. AUSÊNCIA DE IDENTIDADE FÁTICA. DESCABIMENTO. COMPROVAÇÃO DE EXPOSIÇÃO PERMANENTE AOS AGENTES AGRESSIVOS. PRETENSÃO DE REEXAME DE MATÉRIA FÁTICA. ÓBICE DA SÚMULA N. 7/STJ.
[...]
PREVIDENCIÁRIO. RECONHECIMENTO DE ATIVIDADE ESPECIAL APÓS 1998. MP N. 1.663-14, CONVERTIDA NA LEI N. 9.711/1998 SEM REVOGAÇÃO DA REGRA DE CONVERSÃO.
1. Permanece a possibilidade de conversão do tempo de serviço exercido em atividades especiais para comum após 1998, pois a partir da última reedição da MP n. 1.663, parcialmente convertida na Lei 9.711/1998, a norma tornou-se definitiva sem a parte do texto que revogava o referido § 5º do art. 57 da Lei n. 8.213/1991.
2. Precedentes do STF e do STJ.
CONVERSÃO DE TEMPO DE SERVIÇO ESPECIAL EM COMUM. OBSERVÂNCIA DA LEI EM VIGOR POR OCASIÃO DO EXERCÍCIO DA ATIVIDADE. DECRETO N. 3.048/1999, ARTIGO 70, §§ 1º E 2º. FATOR DE CONVERSÃO. EXTENSÃO DA REGRA AO TRABALHO DESEMPENHADO EM QUALQUER ÉPOCA.
1. A teor do § 1º do art. 70 do Decreto n. 3.048/99, a legislação em vigor na ocasião da prestação do serviço regula a caracterização e a comprovação do tempo de atividade sob condições especiais. Ou seja, observa-se o regramento da época do trabalho para a prova da exposição aos agentes agressivos à saúde: se pelo mero enquadramento da atividade nos anexos dos Regulamentos da Previdência, se mediante as anotações de formulários do INSS ou, ainda, pela existência de laudo assinado por médico do trabalho.
2. O Decreto n. 4.827/2003, ao incluir o § 2º no art. 70 do Decreto n. 3.048/99, estendeu ao trabalho desempenhado em qualquer período a mesma regra de conversão. Assim, no tocante aos efeitos da prestação laboral vinculada ao Sistema Previdenciário, a obtenção de benefício fica submetida às regras da legislação em vigor na data do requerimento.
3. A adoção deste ou daquele fator de conversão depende, tão somente, do tempo de contribuição total exigido em lei para a aposentadoria integral, ou seja, deve corresponder ao valor tomado como parâmetro, numa relação de proporcionalidade, o que corresponde a um mero cálculo matemático e não de regra previdenciária.
4. Com a alteração dada pelo Decreto n. 4.827/2003 ao Decreto n. 3.048/1999, a Previdência Social, na via administrativa, passou a converter os períodos de tempo especial desenvolvidos em qualquer época pela regra da tabela definida no artigo 70 (art. 173 da Instrução Normativa n. 20/2007).
5. Descabe à autarquia utilizar da via judicial para impugnar orientação determinada em seu próprio regulamento, ao qual está vinculada. Nesse compasso, a Terceira Seção desta Corte já decidiu no sentido de dar tratamento isonômico às situações análogas, como na espécie (EREsp n. 412.351/RS).
6. Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa extensão, desprovido. (REsp 1151363/MG, STJ, 3ª Seção, Rel. Min. Jorge Mussi, DJe de 05/04/2011)
Isto posto, e tendo em vista a diversidade de diplomas legais que se sucederam na disciplina da matéria, faz-se necessário inicialmente definir qual a legislação aplicável ao caso concreto, ou seja, qual a legislação vigente quando da prestação da atividade pela parte autora.
Tem-se, então, a seguinte evolução legislativa quanto ao tema sub judice:
a) no período de trabalho até 28/04/1995, quando vigente a Lei n° 3.807/60 (Lei Orgânica da Previdência Social) e suas alterações e, posteriormente, a Lei n° 8.213/91 (Lei de Benefícios) em sua redação original (artigos 57 e 58), é possível o reconhecimento da especialidade do trabalho quando houver a comprovação do exercício de atividade enquadrável como especial nos decretos regulamentadores e/ou na legislação especial, ou quando demonstrada a sujeição do segurado a agentes nocivos por qualquer meio de prova (exceto para ruído e calor/frio, casos em que sempre será necessária a mensuração dos níveis por meio de perícia técnica, carreada aos autos ou noticiada em formulário emitido pela empresa, a fim de se verificar a nocividade ou não desses agentes). Para o enquadramento das categorias profissionais, devem ser considerados os Decretos n° 53.831/64 (Quadro Anexo - 2ª parte), n° 72.771/73 (Quadro II do Anexo) e n° 83.080/79 (Anexo II);
b) de 29/04/1995 e até 05/03/1997 foi definitivamente extinto o enquadramento por categoria profissional, de modo que, no interregno compreendido entre esta data e 05/03/1997 (período em que vigentes as alterações introduzidas pela Lei n° 9.032/95 no artigo 57 da Lei de Benefícios), é necessária a demonstração efetiva de exposição, de forma permanente, não ocasional nem intermitente, a agentes prejudiciais à saúde ou à integridade física, por qualquer meio de prova - considerando-se suficiente, para tanto, a apresentação de formulário padrão preenchido pela empresa, sem a exigência de embasamento em laudo técnico (com a ressalva dos agentes nocivos ruído e calor/frio, cuja comprovação depende de perícia, como já referido). Para o enquadramento dos agentes nocivos, devem ser considerados os Decretos n° 53.831/64 (Quadro Anexo - 1ª parte), nº 72.771/73 (Quadro I do Anexo) e n° 83.080/79 (Anexo I);
c) a partir de 06/03/1997, quando vigente o Decreto n° 2.172/97, que regulamentou as disposições introduzidas no artigo 58 da Lei de Benefícios pela Medida Provisória n° 1.523/96 (convertida na Lei n° 9.528/97), passou-se a exigir, para fins de reconhecimento de tempo de serviço especial, a comprovação da efetiva sujeição do segurado a agentes agressivos por meio da apresentação de formulário padrão, embasado em laudo técnico, ou por meio de perícia técnica. Para o enquadramento dos agentes nocivos, devem ser considerado os Decretos n° 2.172/97 (Anexo IV) e n° 3.048/99.
d) a partir de 01/01/2004, o Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP) passou a ser documento indispensável para a análise do período cuja especialidade for postulada (artigo 148 da Instrução Normativa nº 99 do INSS, publicada no DOU de 10/12/2003). Tal documento substituiu os antigos formulários (SB-40, DSS-8030, ou DIRBEN-8030) e, desde que devidamente preenchido, inclusive com a indicação dos profissionais responsáveis pelos registros ambientais e pela monitoração biológica, exime a parte da apresentação do laudo técnico em juízo.
Intermitência
A habitualidade e permanência do tempo de trabalho em condições especiais prejudiciais à saúde ou à integridade física (referidas no artigo 57, § 3º, da Lei n° 8.213/91) não pressupõem a exposição contínua ao agente nocivo durante toda a jornada de trabalho. Tal exposição deve ser ínsita ao desenvolvimento das atividades cometidas ao trabalhador, integrada à sua rotina de trabalho, e não de ocorrência eventual ou ocasional. Exegese diversa levaria à inutilidade da norma protetiva, pois em raras atividades a sujeição direta ao agente nocivo se dá durante toda a jornada de trabalho, e em muitas delas a exposição em tal intensidade seria absolutamente impossível (EINF n.º 0003929-54.2008.404.7003, TRF/4ª Região, 3ª Seção, Rel. Des. Federal Rogério Favreto, D.E. 24/10/2011; EINF n.º 2007.71.00.046688-7, TRF/4ª Região, 3ª Seção, Rel. Des. Federal Celso Kipper, D.E. 07/11/2011).
Ademais, conforme o tipo de atividade, a exposição ao respectivo agente nocivo, ainda que não diuturna, configura atividade apta à concessão de aposentadoria especial, tendo em vista que a intermitência na exposição não reduz os danos ou riscos inerentes à atividade, não sendo razoável que se retire do trabalhador o direito à redução do tempo de serviço para a aposentadoria, deixando-lhe apenas os ônus da atividade perigosa ou insalubre (EINF n° 2005.72.10.000389-1, TRF/4ª Região, 3ª Seção, Rel. Des. Federal João Batista Pinto Silveira, D.E. 18/05/2011; EINF n° 2008.71.99.002246-0, TRF/4ª Região, 3ª Seção, Rel. Des. Federal Luís Alberto D'Azevedo Aurvalle, D.E. 08/01/2010).
Equipamentos de Proteção Individual - EPI
A Medida Provisória n° 1.729/98 (posteriormente convertida na Lei 9.732/1998) alterou o §2º do artigo 58 da Lei 8.213/1991, determinando que o laudo técnico contenha i) informação sobre a existência de tecnologia de proteção individual que diminua a intensidade do agente agressivo a limites de tolerância, e ii) recomendação sobre a sua adoção pelo estabelecimento respectivo. Por esse motivo, em relação à atividade exercida no período anterior a 03/12/1998 (data da publicação da referida MP) a utilização de equipamentos de proteção individual (EPI) é irrelevante para o reconhecimento das condições especiais, prejudiciais à saúde ou à integridade física do trabalhador. A própria autarquia já adotou esse entendimento na Instrução Normativa n° 45/2010 (art. 238, § 6º).
Em período posterior a 03/12/1998, foi reconhecida pelo e. STF a existência de repercussão geral quanto ao tema (Tema 555). No julgamento do ARE 664.335 (Tribunal Pleno, Rel Min. Luiz Fux, DJe 12/02/2015), a Corte Suprema fixou duas teses: 1) o direito à aposentadoria especial pressupõe a efetiva exposição do trabalhador a agente nocivo à sua saúde, de modo que, se o EPI for realmente capaz de neutralizar a nocividade não haverá respaldo constitucional à aposentadoria especial; e 2) na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos limites legais de tolerância, a declaração do empregador, no âmbito do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), no sentido da eficácia do Equipamento de Proteção Individual - EPI, não descaracteriza o tempo de serviço especial para aposentadoria.
Ou seja: nos casos de exposição habitual e permanente a ruído acima dos limites de tolerância sempre caracteriza a atividade como especial, independentemente da utilização ou não de EPI, ou de menção em laudo pericial à neutralização de seus efeitos nocivos, uma vez que os equipamentos eventualmente utilizados não detêm a progressão das lesões auditivas decorrentes.
Recentemente foi julgado por esta Corte o Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas n° 5054341-77.2016.4.04.0000/SC (IRDR Tema 15), que trata justamente da eficácia do EPI na neutralização dos agentes nocivos. Naquele julgado foi confirmado o entendimento supra referido, sendo relacionados ainda outros agentes em que a utilização de EPI não descaracteriza o labor especial. É teor do voto:
Cumpre ainda observar que existem situações que dispensam a produção da eficácia da prova do EPI, pois mesmo que o PPP indique a adoção de EPI eficaz, essa informação deverá ser desconsiderada e o tempo considerado como especial (independentemente da produção da prova da falta de eficácia) nas seguintes hipóteses:
a) Períodos anteriores a 3 de dezembro de 1998:
Pela ausência de exigência de controle de fornecimento e uso de EPI em período anterior a essa data, conforme se observa da IN INSS 77/2015 -Art. 279, § 6º:
"§ 6º Somente será considerada a adoção de Equipamento de Proteção Individual - EPI em demonstrações ambientais emitidas a partir de 3 de dezembro de 1998, data da publicação da MP nº 1.729, de 2 de dezembro de 1998, convertida na Lei nº 9.732, de 11 de dezembro de 1998, e desde que comprovadamente elimine ou neutralize a nocividade e seja respeitado o disposto na NR-06 do MTE, havendo ainda necessidade de que seja assegurada e devidamente registrada pela empresa, no PPP, a observância: (...)"
b) Pela reconhecida ineficácia do EPI:
b.1) Enquadramento por categoria profissional: devido a presunção da nocividade (ex. TRF/4 5004577-85.2014.4.04.7116/RS, 6ª Turma, Rel. Des. Fed. João Batista Pinto Silveira, em 13/09/2017)
b.2) Ruído: Repercussão Geral 555 (ARE 664335 / SC)
b.3) Agentes Biológicos: Item 3.1.5 do Manual da Aposentadoria Especial editado pelo INSS, 2017.
b.4) Agentes nocivos reconhecidamente cancerígenos: Memorando-Circular Conjunto n° 2/DIRSAT/DIRBEN/INSS/2015:
Exemplos: Asbesto (amianto): Item 1.9.5 do Manual da Aposentadoria Especial editado pelo INSS, 2017; Benzeno: Item 1.9.3 do Manual da Aposentadoria Especial editado pelo INSS, 2017.
b.5) Periculosidade: Tratando-se de periculosidade, tal qual a eletricidade e vigilante, não se cogita de afastamento da especialidade pelo uso de EPI. (ex. APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 5004281-23.2014.4.04.7000/PR, Rel. Ézio Teixeira, 19/04/2017)
Em suma, de acordo com a tese fixada por esta Corte a utilização de EPI não afasta a especialidade do labor: i) em períodos anteriores a 3-12-1998; ii) quando há enquadramento da categoria profissional; iii) em relação aos seguintes agentes nocivos: ruído, agentes biológicos, agentes cancerígenos (asbestos e benzeno) e periculosos.
Em sede de embargos de declaração, nos autos do IRDR em questão, o rol taxativo foi ampliado para acrescentar o calor, as radiações ionizantes, os trabalhos sob condições hiperbáricas, trabalhos sob ar comprimido.
Outrossim, apenas para os casos em que o LTCAT e o PPP informem a eficácia do EPI, o julgado determina a adoção de um 'roteiro resumido', apontando a obrigatoriedade de o juiz oficiar o empregador para fornecimento dos registros sobre o fornecimento do EPI. Caso apresentada a prova do fornecimento do EPI, na sequência, deverá o juiz determinar a realização da prova pericial. Apenas após esgotada a produção de prova sobre a eficácia do EPI, persistindo a divergência ou dúvida, caberá o reconhecimento do direito de averbação do tempo especial.
Ou seja, restou fixada presunção de ineficácia do EPI, sob a qual foi invertido o ônus da prova, ressalvando-se que a prova da existência do agente nocivo persiste necessária, cabendo ao segurado sua demonstração.
Em suma, de acordo com a tese fixada por esta Corte no IRDR:
- quando o LTCAT e o PPP informam não ser eficaz o EPI, há a especialidade do período de atividade;
- quando a empresa informa no PPP a existência de EPI e sua eficácia, deve se possibilitar que tanto a empresa quanto o segurado possam questionar - no movimento probatório processual - a prova técnica da eficácia do EPI;
- a utilização de EPI não afasta a especialidade do labor, pois é presumida a sua ineficácia: i) em períodos anteriores a 3-12-1998; ii) quando há enquadramento da categoria profissional; iii) em relação aos seguintes agentes nocivos: ruído, agentes biológicos, agentes cancerígenos (como asbestos e benzeno) e agentes periculosos (como eletricidade), calor, radiações ionizantes e trabalhos sob condições hiperbáricas, trabalhos sob ar comprimido.
Agentes Biológicos
De acordo com o entendimento fixado pela 3ª Seção deste Tribunal Regional Federal da 4ª Região, é possível o reconhecimento da especialidade do labor exercido sob exposição a agentes biológicos nocivos:
EMBARGOS INFRINGENTES. PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO. ATIVIDADE ESPECIAL. AGENTES BIOLÓGICOS. - Tendo o embargante logrado comprovar o exercício de atividade em contato com agentes biológicos, de 01-03-1979 a 02-03-1987, 03-04- 1987 a 16-01-1989 e 15-02-1989 a 07-05-1997, faz jus ao reconhecimento da especialidade dos períodos, com a devida conversão, o que lhe assegura o direito à concessão do benefício da aposentadoria por tempo de serviço proporcional, desde a data do requerimento administrativo, efetuado em 08-05-1997. (TRF4, EIAC 1999.04.01.021460-0, Terceira Seção, Relator Des. Federal Celso Kipper, DJ 05/10/2005)
No mesmo sentido o entendimento desta Turma Regional Suplementar (TRF4, AC 5005415-63.2011.4.04.7009, Relator Des. Federal Luiz Fernando Wowk Penteado, 20/08/2018).
Ademais, é firme o entendimento de que a utilização de Equipamento de Proteção Individual não afasta o reconhecimento da especialidade do trabalho exposto a tais agentes nocivos:
PREVIDENCIÁRIO. RECONHECIMENTO DE TEMPO DE SERVIÇO ESPECIAL. PROVA DA EFETIVA EXPOSIÇÃO A AGENTES NOCIVOS. HABITUALIDADE E PERMANÊNCIA. UTILIZAÇÃO DE EQUIPAMENTO DE PROTEÇÃO INDIVIDUAL. CONTAGEM DE TEMPO COMUM PARA APOSENTADORIA ESPECIAL. BENEFÍCIO POSTERIOR À LEI Nº 9.032/1995. CONSECTÁRIOS LEGAIS. TUTELA ESPECÍFICA. HONORÁRIOS. PREQUESTIONAMENTO. 1 a 8. (...) 9. Para fins de reconhecimento de atividade especial, em razão da exposição a agentes biológicos, não se exige comprovação do contato permanente a tais agentes nocivos, pressupondo-se o risco de contaminação, ainda que o trabalho tenha sido desempenhado com a utilização de EPI. A habitualidade e permanência do tempo de trabalho em condições especiais prejudiciais à saúde ou à integridade física (referidas no artigo 57, § 3º, da Lei n° 8.213/91) não pressupõem a exposição contínua ao agente nocivo durante toda a jornada de trabalho. 10. a 14. (...) (TRF4 5038030-56.2013.4.04.7100, 5ª T., Rel. Des. Federal Osni Cardoso Filho, 10/08/2018)
PREVIDENCIÁRIO. ATIVIDADE ESPECIAL. AGENTES NOCIVOS. EQUIPAMENTOS DE PROTEÇÃO INDIVIDUAL. CONCESSÃO DE APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO/CONTRIBUIÇÃO. OPÇÃO PELA RMI MAIS VANTAJOSA. TUTELA ESPECÍFICA. 1 a 3 (...). 4. A exposição a agentes biológicos não precisa ocorrer durante toda a jornada de trabalho para caracterização da especialidade do labor, uma vez que basta o contato de forma eventual para que haja risco de contaminação. Ainda que ocorra a utilização de EPIs, eles não são capazes de elidir o risco proveniente do exercício da atividade com exposição a agentes de natureza infecto-contagiosa. 5 a 6. (...) (TRF4, AC 5005224-96.2013.4.04.7122, 6ª T., Rel. Des. Federal João Batista Pinto Silveira, 06/08/2018)
PREVIDENCIÁRIO. REVISÃO DE BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. REMESSA OFICIAL. SENTENÇA ANTERIOR AO CPC DE 2015. CABIMENTO. COISA JULGADA. AFASTADA. PRESCRIÇÃO PARCIAL. APOSENTADORIA ESPECIAL. AVERBAÇÃO DE TEMPO ESPECIAL. RUÍDO. AGENTES QUÍMICOS E BIOLÓGICOS. AFASTAMENTO DE ATIVIDADE ESPECIAL. INCONSTITUCIONALIDADE. CONSECTÁRIOS LEGAIS. PRECEDENTE DO STF NO RE Nº 870.947. IMPLANTAÇÃO IMEDIATA DO BENEFÍCIO. 1 a 10. (...). 11. Os riscos de contágio por agentes biológicos não são afastados pelo uso de EPI. 12 a 14. (...) (TRF4 5082278-82.2014.4.04.7000, Turma Regional Suplementar do PR, Rel. Des. Federal Fernando Quadros da Silva, 23/04/2018).
Outrossim, em se tratando de agentes biológicos, concluiu-se, no bojo de IRDR (Tema nº 15 deste Tribunal Regional Federal), ser dispensável a produção de prova sobre a eficácia do EPI, pois, segundo o item 3.1.5 do Manual da Aposentadoria Especial editado pelo INSS no ano de 2017, aprovado pela Resolução nº 600, de 10/08/2017, "como não há constatação de eficácia de EPI na atenuação desse agente, deve-se reconhecer o período como especial mesmo que conste tal informação."
Além disso, "a exposição de forma intermitente aos agentes biológicos não descaracteriza o risco de contágio, uma vez que o perigo existe tanto para aquele que está exposto de forma contínua como para aquele que, durante a jornada, ainda que não de forma permanente, tem contato com tais agentes (TRF4, APELREEX 5002443-07.2012.404.7100/RS, 6ª T., Rel. Des. Federal João Batista Pinto Silveira, 26/07/2013). "3. Os requisitos da habitualidade e da permanência devem ser entendidos como não-eventualidade e efetividade da função insalutífera, continuidade e não-interrupção da exposição ao agente nocivo. A intermitência refere-se ao exercício da atividade em local insalubre de modo descontínuo, ou seja, somente em determinadas ocasiões. 4. Se o trabalhador desempenha diuturnamente suas funções em locais insalubres, mesmo que apenas em metade de sua jornada de trabalho, tem direito ao cômputo do tempo de serviço especial, porque estava exposto ao agente agressivo de modo constante, efetivo, habitual e permanente" (TRF4, AC nº 2000.04.01.073799-6/PR, 6ª T., Rel. Des. Federal Luiz Carlos de Castro Lugon, DJU 09/05/2001).
No que concerne especificamente às atividades desenvolvidas no âmbito hospitalar, expostas a agentes biológicos nocivos, encontram enquadramento nos códigos 1.3.2 do Quadro Anexo ao Decreto n.º 53.831/64; 1.3.4 do Anexo I ao Decreto n.º 83.080/79; 3.0.1 do Anexo IV ao Decreto n.º 2.172/97; e 3.0.1 do Anexo IV ao Decreto n.º 3.048/99.
A Turma Nacional de Uniformização, ainda sobre o tema debatido, já sinalizou que, "no caso de agentes biológicos, o conceito de habitualidade e permanência é diverso daquele utilizado para outros agentes nocivos, pois o que se protege não é o tempo de exposição (causador do eventual dano), mas o risco de exposição a agentes biológicos." (PEDILEF nº 0000026-98.2013.490.0000, Rel. Juiz Federal Paulo Ernane Moreira Barros, DOU 25.04.2014).
Conforme dispõe a NR-15 do Ministério do Trabalho e Emprego, ao tratar da exposição a agentes biológicos em seu Anexo XIV, são insalubres as atividades desempenhadas em hospitais, serviços de emergência, enfermarias, ambulatórios, postos de vacinação e outros estabelecimentos destinados aos cuidados da saúde humana, quando houver contato direto com pacientes ou objetos por estes utilizados.
Ademais, a respeito do reconhecimento da especialidade para a atividade relacionada à enfermagem, é o posicionamento desta Turma Regional Suplementar do Paraná:
PREVIDENCIÁRIO. APELAÇÃO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. AVERBAÇÃO DE TEMPO ESPECIAL. ATIVIDADE DE AUXILIAR DE ENFERMAGEM. EXPOSIÇÃO A AGENTES BIOLÓGICOS. AVERBAÇÃO DO TEMPO DE SERVIÇO PRESTADO NO EXTERIOR PARA FINS DE APOSENTADORIA NO BRASIL. URUGUAI. ACORDO MULTILATERAL DE SEGURIDADE SOCIAL. RECONHECIMENTO. (...) 5. Esta Corte assentou o entendimento de que profissões desenvolvidas em ambientes hospitalares (relacionadas à medicina e enfermagem) se caracterizam como labor especial, tendo em conta o fato de que se trata de ambiente sabidamente contaminado por diversidade de bactérias e vírus. Nessas condições, os equipamentos de proteção utilizados (ainda que necessários) não neutralizam por completo a exposição aos referidos agentes - considerado ainda o risco de acidentes. 6. Caso em que o autor não preenche o tempo mínimo para aposentar-se, sendo cabível a averbação do labor urbano e especial ora reconhecidos. (TRF4, AC 5021836-19.2015.4.04.7000, TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DO PR, Relator MARCOS JOSEGREI DA SILVA, juntado aos autos em 23/05/2019)
CASO CONCRETO
No caso dos autos, discute-se sobre a especialidade do labor exercido pela parte autora com exposição a agentes biológicos nos períodos de 01.09.1993 a 20.04.1995, 01.10.1995 a 27.12.1995, 14.04.1997 a 24.06.2004, 01.03.2004 a 15.02.2007, 01.03.2010 a 15.07.2010, 01.10.2004 a 01.11.2011 e de 01.09.2011 a 09.11.2017.
A sentença examinou as provas e decidiu a questão com exatidão, mediante fundamentos com os quais concordo e utilizo como razões de decidir, nos seguintes termos:
Passo a analisar o caso concreto.
1) 01.09.1993 a 30.04.1995 e de 01.10.1995 a 27.12.1995
A autora trabalhou no referido período como atendente de enfermagem para a Fundação Médica Assistencial do Trabalhador Rural de Fênix.
Segundo o PPP (ev. 1; ppp7), a autora ficou exposta a agentes biológicos de 01.09.1993 a 30.04.1995 e a acidentes (cortes com perfurocortantes, respingos nos olhos...) de 01.10.1995 a 27.12.1995. A função da autora permaneceu a mesma em ambos os períodos. Constou na descrição de atividades que a autora tinha contato direito com os pacientes.
No LTCAT que embasou o preenchimento do PPP constou que a autora teve contato com agentes biológicos durante todo o período em que laborou para a referida Fundação Médica (ev. 1; ppp7; p. 3/14).
Os agentes biológicos são considerados nocivos pela legislação previdenciária, a qual exige, para que a nocividade se revele, que a exposição seja permanente. Vejamos a Lei n° 8.213/91:
Art. 57. A aposentadoria especial será devida, uma vez cumprida a carência exigida nesta Lei, ao segurado que tiver trabalhado sujeito a condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, durante 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, conforme dispuser a lei.
(...)
§ 4º O segurado deverá comprovar, além do tempo de trabalho, exposição aos agentes nocivos químicos, físicos, biológicos ou associação de agentes prejudiciais à saúde ou à integridade física, pelo período equivalente ao exigido para a concessão do benefício.
Os Decretos nº 53.831/64 e 83.080/79 já os relacionavam como nocivos (código 1.3.2), assim como os Decretos nº 2.172/97 e 3.048/99 repetem disposição no mesmo sentido, considerando nocivas atividades com exposição a micro-organismos e parasitas infecciosos vivos e suas toxinas (Código 3.0.1, em ambos os quadros).
Nada obstante, é necessário averiguar a espécie de atividade desenvolvida pelo segurado: em atividades em que não haja contato frequente e direto com doenças infecto-contagiosas, esse contato pode ser caracterizado como eventual, prejudicando o preenchimento do requisito da permanência na exposição aos agentes biológicos.
A TNU em representativo de controvérsia (Tema 211) fixou o entendimento de que "para aplicação do artigo 57, § 3º, da Lei nº 8.213/91, a agentes biológicos, exige-se a probabilidade da exposição ocupacional, avaliando-se, de acordo com a profissiografia, o seu caráter indissociável da produção do bem ou da prestação do serviço, independente de tempo mínimo de exposição durante a jornada."
Finalmente, o Manual de Aposentadoria Especial do INSS (Resolução INSS 600/2017, item 3.1.5), estabelece que, como não há constatação de eficácia de EPI na atenuação desse agente, deve-se reconhecer o período como especial mesmo que conste tal informação, se cumpridas as demais exigências. Portanto, o uso de EPI eficaz não descaracteriza a especialidade quando se trata de agentes biológicos, uma vez que não há neutralização dos riscos de maneira absoluta.
No caso concreto ficou comprovado o contato com agentes biológicos de modo permanente nos períodos de 01.09.1993 a 30.04.1995 e de 01.10.1995 a 27.12.1995, devendo a atividade ser reconhecida como especial, podendo ser convertida em tempo comum.
2) 14.04.1997 a 24.06.2004
A autora trabalhou no referido período como técnica de enfermagem para a Clínica de Fraturas Vila Hauer.
Segundo o PPP (ev. 1; ppp8), a autora ficou exposta a agentes biológicos no período em discussão.
Assim, tendo sido comprovado o contato com agentes biológicos de modo permanente, deverá a atividade ser reconhecida como especial, podendo ser convertida em tempo comum.
3) 01.03.2004 a 15.02.2007 e de 01.03.2010 a 15.07.2010
A autora trabalhou nos referidos períodos como técnica de enfermagem para a Clínica Menino Deus Ltda.
Segundo os PPPs (ev. 1; ppp9; p. 4/9), a autora ficou exposta a agentes biológicos em ambos os períodos.
Assim, tendo sido comprovado o contato com agentes biológicos de modo permanente, deverá a atividade ser reconhecida como especial, podendo ser convertida em tempo comum.
4) 01.10.2004 a 01.11.2011
A autora trabalhou nos referidos períodos como técnica de enfermagem para o Hospital Nossa Senhora das Graças.
Segundo o LTCAT de 2017 (ev. 1; laudo10), a função de técnico de enfermagem ficava exposta a agentes biológicos de modo habitual e permanente. A mesma informação constou no PPP juntado no ev. 1; laudo10; p. 4.
Assim, tendo sido comprovado o contato com agentes biológicos de modo permanente, deverá a atividade ser reconhecida como especial, podendo ser convertida em tempo comum.
5) 01.09.2011 a 09.11.2017
A autora trabalhou no referido período como enfermeira para o Hospital e Maternidade Pinhais Ltda.
Segundo o PPP (ev. 1; ppp11), a autora ficou exposta a agentes biológicos durante o período em discussão. A mesma informação constou no LTCAT juntado no ev. 1; ppp11; p. 4.
Assim, tendo sido comprovado o contato com agentes biológicos de modo permanente, deverá a atividade ser reconhecida como especial, podendo ser convertida em tempo comum.
Verifica-se que o reconhecimento da especialidade de todos os períodos analisados se deu com base em perfil profissiográfico e laudo pericial correspondente, documentos aptos para atestar a exposição habitual e permanenten aos agentes biológicos.
O contato direto com pacientes integra a rotina laboral de auxiliares e técnicos de enfermagem, de modo que a exposição a agentes biológicos é indissociável da prestação do serviço. Assim, não se faz necessária, no caso, uma análise mais minuciosa da profissiografia.
Ademais, a alegação de que o trabalho em questão teria cunho burocrático não guarda qualquer correspondência com a realidade laboral da apelada.
Logo, a manutenção do reconhecimento da especialidade do labor é medida que se impõe, diante das provas constantes nos autos, as quais são suficientes para permitir a conclusão de que a autora estava exposto a agentes biológicos na sua rotina de trabalho.
Análise da Sucumbência Recursal
A partir da jurisprudência do STJ (em especial do AgInt nos EREsp 1539725/DF, Rel. Min. Antonio Carlos Ferreira, Segunda Seção, julgado em 09/08/2017, DJe 19/10/2017), para que haja a majoração dos honorários em decorrência da sucumbência recursal, é preciso o preenchimento dos seguintes requisitos simultaneamente: (a) sentença publicada a partir de 18/03/2016 (após a vigência do CPC/2015); (b) recurso não conhecido integralmente ou improvido; (c) existência de condenação da parte recorrente no primeiro grau; e (d) não ter ocorrido a prévia fixação dos honorários advocatícios nos limites máximos previstos nos §§2º e 3º do artigo 85 do CPC (impossibilidade de extrapolação). Acrescente-se a isso que a majoração independe da apresentação de contrarrazões.
Na espécie, diante do não acolhimento do apelo, impõe-se a majoração dos honorários advocatícios, fixados na sentença nos percentuais mínimos previstos nos incisos do §3º do artigo 85 do CPC sobre o valor da condenação, limitado ao valor das parcelas vencidas até a sentença, em 50% sobre o valor apurado em cada faixa, de modo que, sobre a primeira faixa, são majorados de 10% para 15%, e assim proporcionalmente se a liquidação apurar valores sobre as faixas mais elevadas, considerando o artigo 85, § 2º, incisos I a IV, e §11, do CPC.
TUTELA ESPECÍFICA
Com base no artigo 497 do CPC e na jurisprudência consolidada da Terceira Seção desta Corte (QO-AC 2002.71.00.050349-7, Rel. p/ acórdão Des. Federal Celso Kipper), determino o cumprimento imediato deste julgado.
Na hipótese de a parte autora já estar em gozo de benefício previdenciário, o INSS deverá implantar o benefício concedido ou revisado judicialmente apenas se o valor de sua renda mensal atual for superior ao daquele.
Faculta-se, outrossim, à parte beneficiária manifestar eventual desinteresse quanto ao cumprimento desta determinação.
Requisite a Secretaria da 10ª Turma, à CEAB-DJ, o cumprimento da decisão e a comprovação nos presentes autos, no prazo de 20 (vinte) dias.
DADOS PARA CUMPRIMENTO: (X) CONCESSÃO ( ) RESTABELECIMENTO ( ) REVISÃO | |
NB: 191.631.595-7 | |
ESPÉCIE: Aposentadoria Especial | |
DIB: 09.11.2017 | |
DIP: no prazo de 20 dias | |
DCB: | |
RMI: a apurar | |
Informações adicionais: |
PREQUESTIONAMENTO
Objetivando possibilitar o acesso das partes às instâncias superiores, considero prequestionadas as matérias constitucionais e/ou legais suscitadas, conquanto não referidos expressamente os respectivos artigos na fundamentação do voto.
CONCLUSÃO
Apelo do INSS: improvido.
De ofício: determinar a implantação do benefício concedido, nos termos da fundamentação.
DISPOSITIVO
Ante o exposto, voto por negar provimento à apelação e determinar, de ofício, a implantação do benefício concedido via CEAB, nos termos da fundamentação.
Documento eletrônico assinado por FLAVIA DA SILVA XAVIER, Juíza Federal Convocada, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40003535834v8 e do código CRC 3bb87204.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): FLAVIA DA SILVA XAVIER
Data e Hora: 8/11/2022, às 18:48:32
Conferência de autenticidade emitida em 15/11/2022 04:01:10.
Apelação Cível Nº 5057786-16.2020.4.04.7000/PR
PROCESSO ORIGINÁRIO: Nº 5057786-16.2020.4.04.7000/PR
RELATORA: Juíza Federal FLÁVIA DA SILVA XAVIER
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
APELADO: NEUSA RODRIGUES DE OLIVEIRA (AUTOR)
ADVOGADO: FABIO GREIN PEREIRA (OAB PR034741)
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. concessão de APOSENTADORIA especial. agentes biológicos. auxiliar de enfermagem. exposição permanente. epi. sentença mantida. honorários majorados. tutela específica.
1. O reconhecimento da especialidade da atividade exercida sob condições nocivas é disciplinado pela lei em vigor à época em que efetivamente exercido, passando a integrar, como direito adquirido, o patrimônio jurídico do trabalhador (STJ, Recurso Especial Repetitivo nº 1.310.034).
2. É cabível o reconhecimento da especialidade do trabalho exercido sob exposição a agentes biológicos. A exposição a agentes biológicos não precisa ser permanente para caracterizar a insalubridade do labor, sendo possível o cômputo do tempo de serviço especial diante do risco de contágio constantemente presente. Entendimento da Terceira Seção deste Tribunal.
3. Conforme dispõe a NR-15 do Ministério do Trabalho e Emprego, ao tratar da exposição a agentes biológicos em seu Anexo XIV, são insalubres as atividades desempenhadas em hospitais, serviços de emergência, enfermarias, ambulatórios, postos de vacinação e outros estabelecimentos destinados aos cuidados da saúde humana, quando houver contato direto com pacientes ou objetos por estes utilizados.
4. A utilização de EPI não afasta a especialidade do labor, pois é presumida a sua ineficácia em relação aos agentes nocivos biológicos. Tema 15 IRDR deste Tribunal.
5. Honorários majorados, consoante previsão do artigo 85, §1º do CPC.
6. Determinado o cumprimento imediato do acórdão no tocante à implantação do benefício concedido ou revisado.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 10ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, negar provimento à apelação e determinar, de ofício, a implantação do benefício concedido via CEAB, nos termos da fundamentação, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Curitiba, 08 de novembro de 2022.
Documento eletrônico assinado por FLAVIA DA SILVA XAVIER, Juíza Federal Convocada, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40003535835v5 e do código CRC 9f486454.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): FLAVIA DA SILVA XAVIER
Data e Hora: 8/11/2022, às 18:48:32
Conferência de autenticidade emitida em 15/11/2022 04:01:10.
EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 27/10/2022 A 08/11/2022
Apelação Cível Nº 5057786-16.2020.4.04.7000/PR
RELATORA: Juíza Federal FLÁVIA DA SILVA XAVIER
PRESIDENTE: Juíza Federal FLÁVIA DA SILVA XAVIER
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
APELADO: NEUSA RODRIGUES DE OLIVEIRA (AUTOR)
ADVOGADO: FABIO GREIN PEREIRA (OAB PR034741)
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 27/10/2022, às 00:00, a 08/11/2022, às 16:00, na sequência 276, disponibilizada no DE de 18/10/2022.
Certifico que a 10ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A 10ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO E DETERMINAR, DE OFÍCIO, A IMPLANTAÇÃO DO BENEFÍCIO CONCEDIDO VIA CEAB, NOS TERMOS DA FUNDAMENTAÇÃO.
RELATORA DO ACÓRDÃO: Juíza Federal FLÁVIA DA SILVA XAVIER
Votante: Juíza Federal FLÁVIA DA SILVA XAVIER
Votante: Desembargador Federal MÁRCIO ANTONIO ROCHA
Votante: Desembargador Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO
SUZANA ROESSING
Secretária
Conferência de autenticidade emitida em 15/11/2022 04:01:10.