APELAÇÃO CÍVEL Nº 5048910-72.2015.4.04.9999/PR
RELATOR | : | PAULO AFONSO BRUM VAZ |
APELANTE | : | DELICE CAMARGO |
ADVOGADO | : | FLÁVIO RODRIGUES DOS SANTOS |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. CONCESSÃO DE APOSENTADORIA POR INVALIDEZ OU DE AUXÍLIO-DOENÇA. LAUDO PERICIAL INSUFICIENTE. SENTENÇA ANULADA PARA A PRODUÇÃO DE NOVA PERÍCIA.
1. Quando a perícia judicial não cumpre os pressupostos mínimos de idoneidade da prova técnica, ela é produzida, na verdade, de maneira a furtar do magistrado o poder de decisão.
2. Hipótese em que, embora o perito judicial seja especializado em ortopedia e traumatologia, o laudo pericial produzido no processo é insuficiente para aferir as reais condições de saúde da demandante, devendo ser anulada a sentença para a realização de nova prova pericial por médico especialista.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Colenda 5a. Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, anular, de ofício, a sentença, para que seja reaberta a instrução, com a realização de nova perícia judicial por especialista em ortopedia, prejudicada a apelação da parte autora, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 05 de julho de 2016.
Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ
Relator
| Documento eletrônico assinado por Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8360830v6 e, se solicitado, do código CRC 3D1D0760. | |
| Informações adicionais da assinatura: | |
| Signatário (a): | Paulo Afonso Brum Vaz |
| Data e Hora: | 11/07/2016 14:37 |
APELAÇÃO CÍVEL Nº 5048910-72.2015.4.04.9999/PR
RELATOR | : | PAULO AFONSO BRUM VAZ |
APELANTE | : | DELICE CAMARGO |
ADVOGADO | : | FLÁVIO RODRIGUES DOS SANTOS |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
RELATÓRIO
Cuida-se de apelação interposta pela parte autora em face da sentença que julgou improcedente o pedido de benefício por incapacidade.
Sustenta, em síntese, que preenche os requisitos necessários a sua concessão.
Com as contrarrazões, vieram os autos a esta Corte.
É o relatório.
VOTO
Premissas
Trata-se de demanda previdenciária na qual a parte autora objetiva a concessão de AUXÍLIO-DOENÇA, previsto no art. 59 da Lei 8.213/91, ou APOSENTADORIA POR INVALIDEZ, regulado pelo artigo 42 da Lei 8.213/91.
São quatro os requisitos para a concessão desses benefícios por incapacidade: (a) qualidade de segurado do requerente (artigo 15 da LBPS); (b) cumprimento da carência de 12 contribuições mensais prevista no artigo 25, I, da Lei 8.213/91 e art. 24, parágrafo único, da LBPS; (c) superveniência de moléstia incapacitante para o desenvolvimento de atividade laboral que garanta a subsistência; e (d) caráter permanente da incapacidade (para o caso da aposentadoria por invalidez) ou temporário (para o caso do auxílio-doença).
Cabe salientar que os benefícios de auxílio-doença e aposentadoria por invalidez são fungíveis, sendo facultado ao julgador (e, diga-se, à Administração), conforme a espécie de incapacidade constatada, conceder um deles, ainda que o pedido tenha sido limitado ao outro. Dessa forma, o deferimento do amparo nesses moldes não configura julgamento ultra ou extra petita. Por outro lado, tratando-se de benefício por incapacidade, o Julgador firma a sua convicção, via de regra, por meio da prova pericial.
De qualquer sorte, o caráter da incapacidade, a privar o segurado do exercício de todo e qualquer trabalho, deve ser avaliado conforme as particularidades do caso concreto. Isso porque existem circunstâncias que influenciam na constatação do impedimento laboral (v.g.: faixa etária do requerente, grau de escolaridade, tipo de atividade e o próprio contexto sócio-econômico em que inserido o autor da ação).
Exame do caso concreto
No caso sub examine, a controvérsia recursal cinge-se à verificação da incapacidade da parte autora, uma vez que o INSS não contestou a qualidade de segurada da demandante e o requisito da carência. Além disso, na esfera administrativa, o benefício de auxílio-doença foi indeferido em razão de não ter sido constatada a incapacidade para o trabalho (evento 1, out7).
Diante disso, a partir da perícia médica realizada em 12/12/2014 por perito de confiança do juízo (evento 42), especialista em ortopedia e traumatologia, é possível obter os seguintes dados:
a- enfermidade (CID): osteoartrose de joelho esquerdo;
b- incapacidade: inexistente; a flexão dos joelhos é normal, apresenta dor leve, não incapacitante;
c- grau da incapacidade: -;
d- prognóstico da incapacidade: -;
e- início da doença/incapacidade: início da doença em 2012 (primeiro exame de joelho);
f- idade na data do laudo: 55 anos;
g- profissão: trabalhou na zona rural e, após, como empregada dompestica; está sem trabalhar há 3 anos;
h- escolaridade: ensino fundamental incompleto (2ª série).
Ao fazer a avaliação clínica da autora, o perito judicial referiu suas queixas de "dor no ombro esquerdo e joelho esquerdo" e considerou exames apresentados de ultrassonografia do ombros (27/02/2013), com diagnóstico de "leve tendinite", e de ressonância nuclear magnética do joelho esquerdo, com diagnóstico de "leve osteoartrose no joelho".
Ao exame físico, o perito entendeu inexistente incapacidade para elevação dos braços e para flexão dos joelhos. Disse, também, que a doença apresentada pela autora é de cunho degenerativo e, por isso, não há possibilidade de cura. Porém, frisou que não há incapacidade laboral, que os sintomas são leves e que não há restrição ao movimento, podendo a demandante exercer sua atividade habitual de empregada doméstica. Afirmou, ainda, que o tratamento para a dor pode melhorar o quadro da autora e até deixá-la assintomática.
Ocorre que, na petição inicial (evento 1, inic1), a autora alegou sentir "fortíssimas dores na coluna e nas pernas" e juntou atestado médico de 07/12/2012 apontando os seguintes diagnósticos: CID M47 (Síndromes de compressão da artéria espinhal anterior ou vertebral anterior), M48 (Estenose da coluna vertebral), M51.9 (Transtorno não especificado de disco intervertebral) e M54.5 (Dor lombar baixa), com recomendação de afastamento das atividades braçais por um período de 120 dias. Referiu que "tais enfermidades causam fortes e insuportáveis dores na coluna, e sente muito cansaço e fadiga na hora do trabalho, possui diversos problemas sérios, conforme atestados e laudos médicos inclusos, que vem piorando ao decorrer do tempo". Além disso, trouxe aos autos: cópia de exame de tomografia computadorizada da coluna lombo-sacra, realizado em 28/09/2012, no qual foram constatados, resumidamente, abaulamentos difusos dos discos L3/L4, L4/L5 e L5/S1, com possibilidade de contato com raízes nervosas, e redução da amplitude do canal vertebral ósseo em L3/L4 e L4/L5; guia de encaminhamento do SUS, com data de 31/08/2012, solicitando a realização de 20 sessões de fisioterapia, constando como hipóteses diagnósticas bursite ou tendinite dos ombros; atestados com prescrição de medicamentos; atestado de 28/11/2012, constando os diagnósticos CID M48, M54.5, M51.9 e M47, com recomendação de repouso por 90 dias.
Também, ao impugnar o laudo pericial (evento 47), a autora trouxe aos autos atestado médico de 09/08/2014 declarando que se encontra com déficit de movimentos e dificuldade de deambular, devido às patologias CID M16 (coxartrose primária bilateral) e M19 (artrose primária de outras articulações), e atestado médico de 19/04/2013 declarando que necessita de 90 dias de repouso em função das patologias M51 (Transtornos de discos lombares e de outros discos intervertebrais com mielopatia) e M65 (Abscesso da bainha tendínea), com prescrição de medicação.
Ora, analisando o conjunto da prova produzida nos autos, verifico que, na perícia judicial, o perito judicial não levou em consideração as principais queixas da autora ao longo do processo relativamente aos problemas da coluna, os quais, comprovadamente, possui. Ademais, o expert sequer fez menção aos documentos anexados à inicial, em especial ao exame de tomografia da coluna presentado pela demandante, no qual aparecem diversas alterações.
Em virtude disso, muito embora o perito judicial seja especializado em ortopedia e traumatologia, considero que o laudo pericial produzido no presente processo é insuficiente para aferir as reais condições de saúde da demandante.
Com efeito, o laudo técnico pericial, reconhecidamente a mais relevante prova nas ações previdenciárias por incapacidade, deve conter, pelo menos: as queixas do periciando; a história ocupacional do trabalhador; a história clínica e exame clínico (registrando dados observados nos diversos aparelhos, órgãos e segmentos examinados, sinais, sintomas e resultados de testes realizados); os principais resultados e provas diagnósticas (registrar exames realizados com as respectivas datas e resultados); o provável diagnóstico (com referência à natureza e localização da lesão); o significado dos exames complementares em que apoiou suas convicções; as consequências do desempenho de atividade profissional à saúde do periciando.
Quando a perícia judicial não cumpre os pressupostos mínimos de idoneidade da prova técnica, ela é produzida, na verdade, de maneira a furtar do magistrado o poder de decisão, porque respostas periciais categóricas, porém sem qualquer fundamentação, revestem um elemento autoritário que contribui para o que se chama decisionismo processual. Em face da ausência de referências fáticas determinadas, a solução judicial se traduziria em uma subjetividade desvinculada aos fatos, resultando mais de valorações e suspeitas subjetivas do que de circunstâncias de fato (FERRAJOLI, Luigi. Direito e Razão: teoria do garantismo penal. São Paulo: RT, 2002. p. 36).
Nessa linha de intelecção, manifesta-se a jurisprudência desta Corte:
PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-DOENÇA OU APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. PERÍCIA INCOMPLETA. PROVA PERICIAL POR ESPECIALISTA. SENTENÇA ANULADA. REABERTURA DA INSTRUÇÃO. Havendo dúvida quanto à incapacidade laborativa da parte autora, diante do conjunto probatório, e tendo a sentença baseado-se em laudo judicial incompleto e que não foi realizado por especialista, é de ser dado provimento ao recurso, a fim de ser anulada a sentença, em razão de cerceamento de defesa, para que seja reaberta a instrução com a realização de perícias judiciais por oncologista e por ortopedista. (AC nº 0022704-43.2014.404.9999, 6ª TURMA, Rel. Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA, unânime, D.E. 12/03/2015).
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ/AUXÍLIO-DOENÇA. REABERTURA DA INSTRUÇÃO. PERÍCIA JUDICIAL COMPLEMENTAR. NECESSIDADE DE REALIZAÇÃO. Sentença anulada e determinada a reabertura da instrução processual para realização de laudo pericial judicial complementar, a fim de suprir a falta de análise da doença mental. (AC nº 0009665-13.2013.404.9999, 6ª TURMA, Relatora Desa. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA, unânime, D.E. 13/06/2014).
PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO RETIDO. AUXÍLIO-DOENÇA E APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. LAUDO PERICIAL. DÚVIDA. NECESSIDADE DE ESPECIALIZAÇÃO. ANULAÇÃO DA SENTENÇA. REABERTURA DA INSTRUÇÃO PROCESSUAL. 1. Constando dos autos elementos indicativos de ser a autora portadora de doença psiquiátrica, e pairando dúvidas sobre a especialização do perito e sobre a qualidade do laudo, tenho que se impõe realização de nova perícia por médico especialista, que possa melhor analisar as reais condições de saúde da demandante. 2. Anulada a sentença a fim de ser reaberta a instrução, para que seja realizada nova perícia, por psiquiatra. (AC nº 5004678-35.2012.404.7006, 5ª TURMA, Rel. Des. Federal LUIZ CARLOS DE CASTRO LUGON, unânime, JUNTADO AOS AUTOS EM 28/11/2013).
Conclusão
Dessarte, deve ser anulada a sentença, para que seja reaberta a instrução processual, com a realização de nova perícia judicial por especialista em ortopedia.
Dispositivo
Ante o exposto, voto por anular, de ofício, a sentença, para que seja reaberta a instrução, com a realização de nova perícia judicial por especialista em ortopedia, prejudicada a apelação da parte autora.
Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ
Relator
| Documento eletrônico assinado por Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8360829v30 e, se solicitado, do código CRC BC305515. | |
| Informações adicionais da assinatura: | |
| Signatário (a): | Paulo Afonso Brum Vaz |
| Data e Hora: | 11/07/2016 14:37 |
EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 05/07/2016
APELAÇÃO CÍVEL Nº 5048910-72.2015.4.04.9999/PR
ORIGEM: PR 00001638120138160105
RELATOR | : | Des. Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ |
PRESIDENTE | : | Paulo Afonso Brum Vaz |
PROCURADOR | : | Dr. Carlos Eduardo Copetti Leite |
APELANTE | : | DELICE CAMARGO |
ADVOGADO | : | FLÁVIO RODRIGUES DOS SANTOS |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 05/07/2016, na seqüência 281, disponibilizada no DE de 14/06/2016, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 5ª TURMA, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU ANULAR, DE OFÍCIO, A SENTENÇA, PARA QUE SEJA REABERTA A INSTRUÇÃO, COM A REALIZAÇÃO DE NOVA PERÍCIA JUDICIAL POR ESPECIALISTA EM ORTOPEDIA, PREJUDICADA A APELAÇÃO DA PARTE AUTORA.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Des. Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ |
VOTANTE(S) | : | Des. Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ |
: | Des. Federal ROGERIO FAVRETO | |
: | Des. Federal ROGER RAUPP RIOS |
Lídice Peña Thomaz
Secretária de Turma
| Documento eletrônico assinado por Lídice Peña Thomaz, Secretária de Turma, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8434205v1 e, se solicitado, do código CRC 49508A6F. | |
| Informações adicionais da assinatura: | |
| Signatário (a): | Lídice Peña Thomaz |
| Data e Hora: | 05/07/2016 18:17 |
