| D.E. Publicado em 14/11/2018 |
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0015950-17.2016.4.04.9999/RS
RELATOR | : | Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA |
APELANTE | : | VANDREIA DOS SANTOS |
ADVOGADO | : | Jeovane Langner de Souza e outro |
: | Evandro Sebastiao Moro | |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. CONCESSÃO DE APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. QUALIDADE DE SEGURADA ESPECIAL COMPROVADA. TUTELA ESPECÍFICA.
1. Comprovado pelo conjunto probatório que a parte autora trabalhou como agricultora em regime de economia familiar até ficar total e definitivamente incapacitado para o trabalho, é de ser reformada a sentença para conceder a aposentadoria por invalidez desde a DER. 2. Determina-se o cumprimento imediato do acórdão naquilo que se refere à obrigação de implementar o benefício, por se tratar de decisão de eficácia mandamental que deverá ser efetivada mediante as atividades de cumprimento da sentença stricto sensu previstas no art. 461 do CPC, sem a necessidade de um processo executivo autônomo (sine intervallo).
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 6ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, dar provimento ao recurso e determinar a implantação do benefício de aposentadoria por invalidez, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 07 de novembro de 2018.
Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA
Relator
| Documento eletrônico assinado por Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 9128454v6 e, se solicitado, do código CRC DD64FE24. | |
| Informações adicionais da assinatura: | |
| Signatário (a): | João Batista Pinto Silveira |
| Data e Hora: | 08/11/2018 11:47 |
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0015950-17.2016.4.04.9999/RS
RELATOR | : | Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA |
APELANTE | : | VANDREIA DOS SANTOS |
ADVOGADO | : | Jeovane Langner de Souza e outro |
: | Evandro Sebastiao Moro | |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
RELATÓRIO
Trata-se de apelação interposta contra sentença que julgou improcedente o pedido de auxílio-doença ou de aposentadoria por invalidez, por não ter sido comprovada a incapacidade laborativa, condenando a parte autora ao pagamento dos honorários advocatícios, fixados em 10% do valor da causa, suspendendo a exigibilidade em razão da AJG.
Apela a parte autora, requerendo, em suma que a Apelante deve ser considerada incapaz de exercer atividade laborativas, sendo que possui grave comprometimento global de suas atividades o que influencia diretamente a sua capacidade laborativa. Requer assim, a concessão do benefício de auxílio-doença e/ou aposentadoria por invalidez, alternativamente que o feito seja baixado em diligência para a realização de nova perícia.
Com contrarrazões, subiram os autos a este Tribunal.
O MPF opinou pelo provimento do recurso.
Na sessão de 04-10-17, a 6ª Turma decidiu solver questão de ordem para converter o julgamento em diligência (fls. 230/237).
Os autos baixaram à vara de origem e, após a reabertura da instrução, retornaram a este TRF.
O MPF opinou pelo provimento do apelo.
É o relatório.
VOTO
Controverte-se, na espécie, sobre o acerto ou não da sentença que julgou improcedente o pedido de auxílio-doença e/ou de aposentadoria por invalidez, por não ter sido comprovada a incapacidade laborativa.
Quanto à aposentadoria por invalidez, reza o art. 42 da Lei nº 8.213/91:
Art. 42. A aposentadoria por invalidez, uma vez cumprida, quando for o caso, a carência exigida, será devida ao segurado que, estando ou não em gozo de auxílio-doença, for considerado incapaz e insusceptível de reabilitação para o exercício de atividade que lhe garanta a subsistência, e ser-lhe-á paga enquanto permanecer nesta condição.
Já no que tange ao auxílio-doença, dispõe o art. 59 do mesmo diploma:
Art. 59. O auxílio-doença será devido ao segurado que, havendo cumprido, quando for o caso, o período de carência exigido nesta Lei, ficar incapacitado para o seu trabalho ou para a sua atividade habitual por mais de 15 dias consecutivos.
Segundo entendimento dominante na jurisprudência pátria, nas ações em que se objetiva a concessão de aposentadoria por invalidez ou auxílio-doença, ou mesmo nos casos de restauração desses benefícios, o julgador firma seu convencimento com base na prova pericial, não deixando de se ater, entretanto, aos demais elementos de prova, sendo certo que embora possível, teoricamente, o exercício de outra atividade pela segurada, ainda assim a inativação por invalidez deve ser outorgada se, na prática, for difícil a respectiva reabilitação, seja pela natureza da doença ou das atividades normalmente desenvolvidas, seja pela idade avançada.
Durante a instrução processual, foi realizada perícia médico-judicial por psiquiatra em 08/05/2015 (fls. 180/181), a qual apurou as seguintes informações sobre o quadro clínico da parte autora:
a) enfermidades: diz o perito que: Retardo mental leve... CID 10 F70;
b) incapacidade: responde o perito que Não há incapacidade... Desde a infância... Não, tem diagnóstico de CID 10 F70, mas não a incapacita para o trabalho;
c) tratamento: afirma o perito que: Patologia para toda a vida... Não há tratamento.
Da segunda perícia judicial, realizada por outro psiquiatra em 28-03-18, extraem-se as seguintes informações (fls. 255/259):
(...)
CONCLUSÃO
A pericianda é portadora de patologias psiquiátricas e neurológica graves, irreversíveis, com ruptura do vínculo com a realidade, sintomas psicóticos, com agitação psicomotora e déficit cognitivo importante.
Necessitará de cuidados especializados (médico e farmacológicos) para o resto de seus dias...
É portadora de retardo mental orgânico, nasceu de parto normal gemelar domiciliar, com hipóxia neonatal que lhe deixou sequelas.
Também é portadora de epilepsia e crises de ausência, bem como de patologia mental psicótica e com prejuízo do juízo crítico.
Não responde pelos atos da vida civil de forma definitiva e comprova sua condição com documentação médica desde 2005.
Já está interditada desde novembro de 2009 e a mãe é a sua curadora.
(...)
6) Sim. F22, F71 e G40. Causas bio-psico-sociais.
(...)
9) Retardo mental congênito e F22 desde a adolescência.
(...)
15) Total, permanente e omniprofissional.
(...).
Do exame dos autos, constatam-se outros elementos sobre a parte autora. Vejamos:
a) idade: 28 anos (nascimento em 04/04/1990 - fls. 10/11);
b) histórico de benefícios: a autora teve indeferidos os pedidos de benefício assistencial de 16-12-05 e de 21-12-06 e o de auxílio-doença de 27/03/2008 em razão de perícia médica contrária (fls. 19/20 e 77/121); ajuizou a presente ação em 19/05/2010; a autora foi interditada por sentença com trânsito em julgado em 09/05/2011 (fls. 161/172);
c) atestado psiquiátrico de 10/07/2007 (fls. 13 e 80) referindo que a parte autora estava em tratamento e possuía sintomas de grande intensidade com severo comprometimento global devendo ser afastada de suas atividades laborativas permanentemente, sendo inválida e alienada mental (CID F22 -Transtornos delirantes persistente, F72 - Retardo mental grave e G40.9 - Epilepsia, não especificada); atestado de psiquiatra de 02/12/2005 (fl. 14) onde constou que estava em tratamento psiquiátrico em função de doença mental e não apresentava condições de estudo e labor por 3 meses; atestado médico de 16/06/2006 (fl. 15) referindo que estava em tratamento da saúde mental desde agosto/2005 pelo CID F79 (Retardo mental não especificado);
d) laudo psiquiátrico do processo de interdição (076/1.10.0000623-0), realizado em 10/02/2010 (fl. 55) onde constou que possuía sintomas de severa intensidade, com grave comprometimento global de suas atividades, sendo incapaz definitivamente, capaz de manter hábitos da vida diária, mas necessita de cuidados de terceiros para gerenciar seus bens CID F71 (Retardo mental moderado);
e) parecer técnico pericial em junta médica (INSS) de 03/06/2008 (fl. 112) constando que não havia incapacidade, fixando a DID em 04/1997 pelo CID Z03 (Observação e avaliação médica por doenças e afecções suspeitas) e que a autora possuía sinais de trabalho braçal recente bolha por contato em mão D;
f) encaminhamento para EEG de 06/08/2007 (fl. 16) para avaliação de histórico inespecífico de epilepsia; receitas de 2007/2008 (fls. 17/18 e 81/86);
g) laudo do INSS de 27/03/2008 (fl. 98), cujo diagnóstico foi de CID Z03 (Observações e avaliação médica por doença e afecções suspeitas); idem o laudo de 03/06/2008 (fls. 115 e 120/121);
h) instrução: 4ª série incompleta (fl. 87).
O juiz monocrático julgou improcedente a ação, por não ter sido comprovada a incapacidade laborativa.
Diante de todo o conjunto probatório, entendo que restou comprovada a incapacidade laborativa total e definitiva da parte autora. Todavia, é de ser analisada a sua qualidade de segurada, já que na segunda perícia judicial constou que ela padece de Retardo mental congênito e F22 desde a adolescência.
A parte autora alega que era agricultora.
Tratando-se de rurícola, cumpre ao julgador valorar os fatos e circunstâncias evidenciados com ênfase no artigo 5º da Lei de Introdução ao Código Civil, devendo-se levar em conta a realidade social em que inserido o trabalhador rural, onde na demonstração dos fatos predomina a informalidade, não se mostrando razoável exigir que os documentos carreados ao processo sigam sempre a forma prescrita em lei, devendo ser considerados válidos quando de outra forma atingir a finalidade precípua de comprovar o exercício da atividade rural, consoante disposto no art. 244 do CPC.
Visando à comprovação do efetivo exercício nas atividades agrícolas, a parte autora poderá apresentar, alternativamente, os documentos relacionados nos incisos do artigo 106 da Lei de Benefício (rol não exaustivo), não sendo admitida prova exclusivamente testemunhal, salvo na ocorrência de motivo de força maior ou caso fortuito, conforme disposto no parágrafo 3º do art. 55 da Lei nº 8213/91 e Súmula 149 do Egrégio Superior Tribunal de Justiça.
Registre-se que o início de prova material, consoante interpretação sistemática da lei, configurar-se-á mediante documentos que comprovem o exercício da atividade nos períodos postulados, devendo ser contemporâneos à época dos fatos que se pretende comprovar, ainda que parcialmente.
Outrossim, não há impedimento a que sejam considerados os documentos emitidos em período próximo ao controverso, desde que indiquem a continuidade da atividade rural.
Os documentos apresentados em nome de terceiros, sobretudo quando dos pais ou cônjuge, consubstanciam início de prova material do labor rural, de acordo com a Súmula n° 73, desta Corte, haja vista que o trabalho com base em uma única unidade produtiva tem como regra a documentação emitida em nome de uma única pessoa.
Tal orientação, agora sumulada, decorre da própria interpretação possibilitada pelo art. 11 da Lei de Benefícios, que define o regime de economia familiar como aquele em que os membros da família exercem "em condições de mútua dependência e colaboração", sendo certo, repita-se, que os atos negociais da entidade respectiva, via de regra, serão formalizados não de forma individual, mas em nome do pater familiae, que é quem representa o grupo familiar perante terceiros, função esta exercida, normalmente, pelo genitor ou cônjuge masculino (STJ, Resp 506.959/RS, Rel. Min. Laurita Vaz, j. 07-10-03; Resp 603.202, Rel. Min. Jorge Scartezzini, j. 06-05-04 e Resp. 538.232/RS, Rel. Min. Laurita Vaz, j. 15-03-04).
A fim de demonstrar a condição de segurada especial da autora, foram juntados aos autos os seguintes documentos:
a) certidão de casamento dos pais da autora de 1973, em que o pai foi qualificado como agricultor (fl. 82);
b) termo de concessão de uso de propriedade em Assentamento de 05-06-02 em nome dos pais da autora (fl. 83);
c) notas fiscais de entrada/produtor em nome dos pais da autora emitidas entre 2006/07 (fls. 84/85);
d) entrevista rural do INSS de 2008, em que a conclusão foi de que a mesma é segurada especial trabalhando em regime de economia familiar (fls. 91/93), tendo sido homologado o período de 05-04-06 a 27-03-08 (fl. 93).
Em audiência realizada em 11-06-18, foram inquiridas duas testemunhas que afirmaram o seguinte (fls. 272/274 e 283/284):
DEPOIMENTO DE MARIA TEREZINHA CHAVES
JUIZ: A senhora conhece a dona Vandreia dos Santos?
MARIA TEREZINHA: Conheço.
JUIZ: Desde quando?
MARIA TEREZINHA: Desde que... quase quando nasceram, nasceram as duas, né. Nós era vizinho.
JUIZ: Aonde que vocês eram vizinhos?
MARIA TEREZINHA: No assentamento.
JUIZ:Nome do assentamento?
MARIA TEREZINHA: São Domingos, eu acho. Nós morava lá pertinho, vizinho.
JUIZ: E quem é que morava lá na casa da Vandreia? A Vandreia e quem mais?
MARIA TEREZINHA: A Vandreia, o outro irmão dela e as outras moravam perto, né, tudo eram colono, né.
JUIZ:Sim.
MARIA TEREZINHA: Na casa, a dona Maria, o esposo dela, e elas que eram...
JUIZ:E a Vandreia, ela trabalhava?
MARIA TEREZINHA: Trabalhava. Desde que começou, né.
JUIZ:Desde que data ela trabalhava?
MARIA TEREZINHA: De oito a nove ano, porque vinha do colégio, todo mundo ajudava na colônia, né.
JUIZ: E ela fazia o que lá na colônia, como é que era?
MARIA TEREZINHA: Plantavam verdura, mandioca, batata, milho, para criar galinha, cria porco, para sobreviver. Igual eu, né.
JUIZ: Claro, trocavam...
MARIA TEREZINHA: Trocava, né, a gente trabalhava perto, então, igual...
JUIZ: Que tamanho era a propriedade, mais ou menos...
MARIA TEREZINHA:Vinte e poucos hectare. Eu não sei dizer bem, né, o certo da... mas era vinte e poucos hectares.
JUIZ: E tinha maquinário, empregados lá ou não?
MARIA TEREZINHA: Não, tudo a boi.
JUIZ:E aí o que que aconteceu assim com a Vandreia que ela foi parando de trabalha, o que que foi?
MARIA TEREZINHA: Porque ficou doente, e aí a dona Maria trazia para a cidade, daí, né... os médicos foram, né, dizendo que ela tinha poblema e daí foi parando e parou de trabalha.
JUIZ: Mais ou menos que idade a Vandreia tinha assim quando ela parou de trabalhar na lavoura?
MARIA TEREZINHA: Tinha, acho, uns dezesseis ano já, para mim não menti, não tinha bem acesso a idade, mas era isso aí.
JUIZ:Era moça grande.
MARIA TEREZINHA: Moça grande, é. Porque são duas, são gêmeas.
JUIZ: E daí ela começou a adoecer, e ela começou a (inaudível). E acabaram vir morar na cidade ou não?
MARIA TEREZINHA: Acabaram vindo. Eu vim um pouco antes, uns dois ano antes que a dona Maria, e daí depois dona Maria veio.
JUIZ:Veio por causa da...
MARIA TEREZINHA: Por causa da... né, porque a Vandreia tava doente, para ficar mais... Era difícil e é até agora, não é muito fácil ônibus de lá para cá.
JUIZ:E a Vandreia teve um filho. A senhora sabe ou não?
MARIA TEREZINHA: Sei, desde pequenininho. Acho que não tinha nem quinze dias, e daí fiquemo meio perto, né, e eu tive acesso com a criança.
JUIZ:E a senhora ficou sabendo se eles tinham benefício do INSS quando ela teve o filho, a senhora sabe ou não?
MARIA TEREZINHA: Isso aí eu não sei, não perguntei, não sei se...
JUIZ:Está. Ok.
DEPOIMENTO DE ANDRÉIA
JUIZ:Quando é que tu conheceste a Vandreia dos Santos?
ANDRÉIA: Olha, faz dois anos. Eu tenho um brechó do lado da casa da mãe dela, casa delas no caso, e eu conheço bem a família a partir desses dois anos para cá, porque elas estão sempre ali comigo, tão sempre tomando mate comigo ali de tarde. Até mesmo... sem querer ela contou a vida dela, assim, a vida delas como era tudo.
JUIZ: E o que elas contaram: onde nasceram, de onde vieram... O que elas contaram (inaudível)
ANDRÉIA: Elas moravam para fora, né, elas moravam para fora em um assentamento, e o que elas contam é que realmente era bem difícil, era bem complicada a vida delas lá fora, difícil, e elas trabalhavam bastante, ela trabalhava bastante com a mãe dela e a outra irmã dela junto, trabalhavam na lavoura em busca de alimento mesmo, tinham bastante dificuldade para isso, e ela ajudava bastante a mãe dela e a outra irmã dela, tinha bastante dificuldade, mas, mesmo assim, ainda ela fazia o que podia. Depois vieram embora para cá, e a gente vê que a dificuldade ainda continua, porque não tem condições pra nada lá, trabalhar muito menos.
JUIZ: Tu podes afirmar que elas vieram para a cidade por causa da doença da doença da Vandreia?
ANDRÉIA: Ah sim, com certeza. É bem complicado mesmo porque a gente vê, eu to sempre... no dia a dia ali comigo, ela tá sempre falando comigo.
JUIZ: E a Vandreia, tu observas que ela tem uma piora na condição dela assim, ela vai piorando?
ANDRÉIA:Tem, tem mesmo. Cada dia, que eu observo, ela ta bem diferente. E agente que, em vez de melhora, ela tá sempre cada vez pior. A gente vê que é bem complicado mesmo.
JUIZ: Não sabe, mais ou menos, em que época da vida da Vandreia, com que idade eles vieram para a cidade, isso tu não sabe afirmar, mais ou menos?
ANDRÉIA: Olha, eu acho que, pelo que elas me contam assim, ela já tava bem grande, vinte e poucos por aí, acredito que sim. A maioria do tempo foi lá fora, ela teve lá fora, digamos assim a infância delas, que pelo que ela me contou, depois de uma certa idade aí sim ela teve que vir para a cidade já devido a doença mesmo.
JUIZ:Sim, infância e adolescência, por exemplo.
ANDRÉIA:Isto, isto, isto.
Assim sendo, através do conjunto probatório constante dos autos, restou devidamente comprovado o trabalho agrícola desenvolvido pela autora até ficar incapacitada para o trabalho, em razão do que faz jus à concessão de aposentadoria por invalidez desde a DER (27-03-08).
Desse modo, a sentença merece reforma, a fim de que seja outorgado à parte autora o benefício na forma da fundamentação precedente, com o pagamento dos valores atrasados.
Dos consectários
Correção monetária
A correção monetária, segundo o entendimento consolidado na 3ª Seção deste TRF4, incidirá a contar do vencimento de cada prestação e será calculada pelos seguintes índices oficiais:
- IGP-DI de 05/96 a 03/2006, art. 10 da Lei n.º 9.711/98, combinado com o art. 20, §§5º e 6º, da Lei n.º 8.880/94;
- INPC a partir de 04/2006, de acordo com a Lei n.º 11.430/06, precedida da MP n.º 316, de 11/08/2006, que acrescentou o art. 41-A à Lei n.º 8.213/91, sendo que o art. 31 da Lei n.º 10.741/03, determina a aplicabilidade do índice de reajustamento dos benefícios do RGPS às parcelas pagas em atraso.
A incidência da TR como índice de correção monetária dos débitos judiciais da Fazenda Pública foi afastada pelo Supremo Tribunal Federal, no julgamento do RE 870947, com repercussão geral, tendo-se determinado, no recurso paradigma a utilização do IPCA-E, como já havia sido determinado para o período subsequente à inscrição em precatório, por meio das ADIs 4.357 e 4.425.
Interpretando a decisão do STF, e tendo presente que o recurso paradigma que originou o precedente tratava de condenação da Fazenda Pública ao pagamento de débito de natureza não previdenciária (benefício assistencial), o Superior Tribunal de Justiça, em precedente também vinculante (REsp 1495146), distinguiu, para fins de determinação do índice de atualização aplicável, os créditos de natureza previdenciária, para estabelecer que, tendo sido reconhecida a inconstitucionalidade da TR como fator de atualização, deveria voltar a incidir, em relação a tal natureza de obrigação, o índice que reajustava os créditos previdenciários anteriormente à Lei 11.960/09, ou seja, o INPC.
Importante ter presente, para a adequada compreensão do eventual impacto sobre os créditos dos segurados, que os índices em referência - INPC e IPCA-E tiveram variação praticamente idêntica no período transcorrido desde julho de 2009 até setembro de 2017, quando julgado o RE 870947, pelo STF (IPCA-E: 64,23%; INPC 63,63%), de forma que a adoção de um ou outro índice nas decisões judiciais já proferidas não produzirá diferenças significativas sobre o valor da condenação.
A conjugação dos precedentes acima resulta na aplicação do INPC aos benefícios previdenciários, a partir de abril 2006, reservando-se a aplicação do IPCA-E aos benefícios de natureza assistencial.
Em data de 24 de setembro de 2018, o Ministro Luiz Fux, relator do RE 870947 (tema 810), deferiu efeito suspensivo aos embargos de declaração opostos pela Fazenda Pública, por considerar que a imediata aplicação da decisão daquela Corte, frente à pendência de pedido de modulação de efeitos, poderia causar prejuízo "às já combalidas finanças públicas".
Em face do efeito suspensivo deferido pelo STF sobre o próprio acórdão, e considerando que a correção monetária é questão acessória no presente feito, bem como que o debate remanescente naquela Corte Suprema restringe-se à modulação dos efeitos da decisão de inconstitucionalidade, impõe-se desde logo, inclusive em respeito à decisão também vinculante do STJ, no tema 905, o estabelecimento do índice aplicável - INPC para os benefícios previdenciários e IPCA-E para os assistenciais -, cabendo, porém, ao juízo de origem observar, na fase de cumprimento do presente julgado, o que vier a ser deliberado nos referidos embargos declaratórios.
Juros de mora
Os juros de mora devem incidir a partir da citação.
Até 29/06/2009, os juros de mora devem incidir à taxa de 1% ao mês, com base no art. 3º do Decreto-Lei n. 2.322/87, aplicável analogicamente aos benefícios pagos com atraso, tendo em vista o seu caráter eminentemente alimentar, consoante firme entendimento consagrado na jurisprudência do STJ e na Súmula 75 desta Corte.
A partir de então, deve haver incidência dos juros, uma única vez, até o efetivo pagamento do débito, segundo percentual aplicado à caderneta de poupança, nos termos estabelecidos no art. 1º-F, da Lei 9.494/97, na redação da Lei 11.960/2009, considerado hígido pelo STF no RE 870947, com repercussão geral reconhecida. Os juros devem ser calculados sem capitalização, tendo em vista que o dispositivo determina que os índices devem ser aplicados "uma única vez" e porque a capitalização, no direito brasileiro, pressupõe expressa autorização legal (STJ, 5ª Turma, AgRgno AgRg no Ag 1211604/SP, Rel. Min. Laurita Vaz).
Por fim, cumpre referir que é desnecessário o trânsito em julgado dos RE 579.431 e RE 870.947 para que o juízo da execução determine a adoção do INPC como índice de correção monetária.
Nesse sentido, inclusive, vêm decidindo as duas Turmas do STF (RE 1035126 AgR-ED e RE 935448 AgR).
Da Verba Honorária
Os honorários advocatícios, ônus exclusivos do INSS no caso, devem ser fixados em 10% sobre o valor da condenação, excluídas as parcelas vincendas, observando-se a Súmula 76 desta Corte: "Os honorários advocatícios, nas ações previdenciárias, devem incidir somente sobre as parcelas vencidas até a data da sentença de procedência ou do acórdão que reforme a sentença de improcedência".
Das Custas Processuais
O INSS é isento do pagamento das custas no Foro Federal (art. 4.º, I, da Lei 9.289/96) e na Justiça Estadual do Rio Grande do Sul, de acordo com disposto no art. 5.º, I, da Lei Estadual 14.634/14, que institui a Taxa Única de Serviços Judiciais desse Estado, ressalvando-se que tal isenção não o exime da obrigação de reembolsar eventuais despesas judiciais feitas pela parte vencedora (parágrafo único, do art. 5.º). Salienta-se, ainda, que nessa taxa única não estão incluídas as despesas processuais mencionadas no parágrafo único, do art. 2.º, da referida Lei, tais como remuneração de peritos e assistentes técnicos, despesas de condução de oficiais de justiça, entre outras.
Tal isenção não se aplica quando o INSS é demandado na Justiça Estadual do Paraná (Súmula n.º 20 deste regional), devendo ser salientado, ainda, que no Estado de Santa Catarina (art. 33, parágrafo único, da Lei Complementar estadual 156/97), a autarquia responde pela metade do valor.
Da tutela específica
Considerando os termos do art. 497 do CPC/2015, que repete dispositivo constante do art. 461 do Código de Processo Civil/1973, e o fato de que, em princípio, a presente decisão não está sujeita a recurso com efeito suspensivo (Questão de Ordem na AC 2002.71.00.050349-7/RS - Rel. p/ acórdão Desemb. Federal Celso Kipper, julgado em 09.08.2007 - 3.ª Seção), o presente julgado deverá ser cumprido de imediato quanto à implantação do benefício concedido em favor da parte autora, no prazo de 45 dias.
Na hipótese de a parte autora já se encontrar em gozo de benefício previdenciário, deve o INSS implantar o benefício deferido judicialmente apenas se o valor da renda mensal atual desse benefício for superior ao daquele.
Faculta-se à parte beneficiária manifestar eventual desinteresse quanto ao cumprimento desta determinação.
Ante o exposto, voto por dar provimento ao recurso e determinar a implantação do benefício de aposentadoria por invalidez.
Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA
Relator
| Documento eletrônico assinado por Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 9128453v11 e, se solicitado, do código CRC 2CF7402. | |
| Informações adicionais da assinatura: | |
| Signatário (a): | João Batista Pinto Silveira |
| Data e Hora: | 08/11/2018 11:47 |
EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 07/11/2018
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0015950-17.2016.4.04.9999/RS
ORIGEM: RS 00062310420108210076
RELATOR | : | Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA |
PRESIDENTE | : | Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA |
PROCURADOR | : | Dr. Ricardo Lenz |
APELANTE | : | VANDREIA DOS SANTOS |
ADVOGADO | : | Jeovane Langner de Souza e outro |
: | Evandro Sebastiao Moro | |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 07/11/2018, na seqüência 4, disponibilizada no DE de 22/10/2018, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 6ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU DAR PROVIMENTO AO RECURSO E DETERMINAR A IMPLANTAÇÃO DO BENEFÍCIO DE APOSENTADORIA POR INVALIDEZ.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA |
VOTANTE(S) | : | Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA |
: | Juiz Federal ALTAIR ANTONIO GREGORIO | |
: | Juiz Federal ARTUR CÉSAR DE SOUZA |
Lídice Peña Thomaz
Secretária de Turma
| Documento eletrônico assinado por Lídice Peña Thomaz, Secretária de Turma, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 9477446v1 e, se solicitado, do código CRC 29071A6C. | |
| Informações adicionais da assinatura: | |
| Signatário (a): | Lídice Peña Thomaz |
| Data e Hora: | 07/11/2018 10:47 |
