APELAÇÃO CÍVEL Nº 5042433-62.2017.4.04.9999/RS
RELATOR | : | JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELADO | : | MARGARETE ZAGO SCHAPANSKI |
ADVOGADO | : | IRACILDO BINICHESKI |
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. CONCESSÃO DE APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. QUALIDADE DE SEGURADA ESPECIAL E INCAPACIDADE LABORATIVA COMPROVADAS. ANTECIPAÇÃO DE TUTELA. MANUTENÇÃO.
1. Comprovada a qualidade de segurada especial em período superior ao da carência e a incapacidade laborativa total e permanente da parte autora, é de ser mantida a sentença que concedeu a aposentadoria por invalidez desde o indeferimento administrativo. 2. Atendidos os pressupostos legais da probabilidade do direito e do perigo de dano ou risco ao resultado útil do processo (art. 300, CPC/15), é de ser mantida a tutela antecipatória deferida na sentença.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 6ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, negar provimento ao recurso e manter a tutela antecipada deferida, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 07 de março de 2018.
Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA
Relator
| Documento eletrônico assinado por Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 9297628v7 e, se solicitado, do código CRC FF708401. | |
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 5042433-62.2017.4.04.9999/RS
RELATOR | : | JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA |
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ADVOGADO | : | IRACILDO BINICHESKI |
RELATÓRIO
Cuida-se de apelação interposta contra a sentença (de maio/17) que, deferindo a tutela antecipada, julgou procedente o pedido para condenar o INSS a:
a) conceder à parte autora o benefício de auxílio-doença e ao mesmo tempo convertê-lo em aposentadoria por invalidez a contar de 28/03/11;
b) pagar as parcelas atrasadas, com correção monetária pelo IPCA-E e juros de mora de acordo com o art. 5º da Lei 11.960/09;
c) arcar com os honorários advocatícios de 10% sobre o valor das parcelas vencidas até a data da sentença;
d) pagar os honorários periciais;
e) pagar as custas processuais por metade.
Recorre o INSS, arguindo a prescrição quinquenal e requerendo, em suma, a reforma da sentença, sustentando que não restou comprovada a qualidade de segurada especial da parte autora durante o período equivalente à carência e que não restou comprovada a incapacidade laborativa total e permanente. Requer, também, fixação de data da cessação administrativa e a aplicação integral da Lei 11.960/09.
Com contrarrazões, subiram os autos a este Tribunal.
É o relatório.
VOTO
Controverte-se, na espécie, sobre o acerto ou não da sentença que, deferindo a tutela antecipada, julgou procedente o pedido para condenar o INSS a conceder à parte autora o benefício de auxílio-doença e ao mesmo tempo convertê-lo em aposentadoria por invalidez a contar de 28/03/11.
Quanto à aposentadoria por invalidez, reza o art. 42 da Lei nº 8.213/91:
Art. 42. A aposentadoria por invalidez, uma vez cumprida, quando for o caso, a carência exigida, será devida ao segurado que, estando ou não em gozo de auxílio-doença, for considerado incapaz e insusceptível de reabilitação para o exercício de atividade que lhe garanta a subsistência, e ser-lhe-á paga enquanto permanecer nesta condição.
Já no que tange ao auxílio-doença, dispõe o art. 59 do mesmo diploma:
Art. 59. O auxílio-doença será devido ao segurado que, havendo cumprido, quando for o caso, o período de carência exigido nesta Lei, ficar incapacitado para o seu trabalho ou para a sua atividade habitual por mais de 15 dias consecutivos.
Segundo entendimento dominante na jurisprudência pátria, nas ações em que se objetiva a concessão de aposentadoria por invalidez ou auxílio- doença, ou mesmo nos casos de restauração desses benefícios, o julgador firma seu convencimento com base na prova pericial, não deixando de se ater, entretanto, aos demais elementos de prova, sendo certo que embora possível, teoricamente, o exercício de outra atividade pelo segurado, ainda assim a inativação por invalidez deve ser outorgada se, na prática, for difícil a respectiva reabilitação, seja pela natureza da doença ou das atividades normalmente desenvolvidas, seja pela idade avançada.
In casu, foram realizadas três perícias judiciais, a primeira por ortopedista e traumatologista em 27/05/15, de onde se extraem as seguintes informações (E3-LAUDPERI43):
(...)
4) agricultora
5) sempre na função de agricultora
6) Paciente informa que em 02.02.2011 teria sido vítima de acidente trânsito (atropelamento) sofrendo traumatismo craniano + traumatismo de coluna + traumatismo de ombros. Em tratamento com o neurologista Dr. Paulo Baes. Ressonância magnética crânio datada em 15.04.15 = encefalopatia frontal bilateral predominando à esquerda com focos de glicoses na substância branca cerebral predominado nos lobos frontais. Trouxe atestado de incapacidade laboral emitido em 06.04.15 pelo neurologista Dr. Paulo Baes, afirmando que autora possui atrofia cerebral de origem traumática. Clinicamente refere alterações de equilíbrio e com isto com facilidade de queda. Alterações do olfato com distúrbio do cheiro e do gosto. Possui também distúrbios de concentração Caminhar com a cabeça erguida para cima.
Hipótese diagnostica = Seqüela de traumatismo craneano. CID S 04.9.
Conduta: Autora pós acidente de trânsito com traumatismo de crânio, permanecendo com alterações de olfato, alterações de equilíbrio, com acompanhamento neurológico do Dr. Paulo Baes que também atesta incapacidade laboral. Portanto, deve ser afastada de suas atividades por um período mínimo de 1 ano. Incapacidade do ponto de vista neurológico e não do ponto de vista ortopédico.
7) Sim possui incapacidade funcional neste momento com alterações neurológicas bem evidentes.
8) Pelo exame clínico que é essencial e comprovado pela ressonância cerebral e pelo atestado emitido pelo seu médico neurologista.
9) Início da doença já citado acima.
10) Incapacidade por um prazo estimado de 1 ano
11) Doença traumática. Não se trata caso de acidente de trabalho.
12) Deve seguir tratamento e orientação de seu médico neurologista Dr. Paulo Baes.
13) Autora, agricultora, sem horário específico de trabalho.
14) Neste momento sem condições laborais.
15) Incapacidade parcial, temporária para função de agricultora.
16) Incapacidade temporária por um prazo mínimo de 1 ano como acima descrito. Tratamento neurológico sugerido por seu médico.
17) Paciente fazendo uso de medicação Hidantal + Omeprazol + Depaquene + Sertralina. Trouxe receita médica emitida pelo Dr. Paulo Baes em 22.04.15
18)
19) Não se trata caso de readaptação funcional. Deve realizar tratamento indicado pelo seu médico para ver se há condições de reversibilidade da sua patologia.
20) Sim porque autora possui encefalopatia frontal bilateral com atrofia cerebral (com presença de glicose na substância branca nos lobos frontais). Obs: o enquadramento com seu grau somente pode ser definido por um médico neurologista.
(...).
Da segunda perícia médico-judicial realizada em 06/07/15 por psiquiatra, extraem-se as seguintes informações (E3-LAUDPERI45):
(...)
Paciente inicia seu discurso relatando que sofreu um acidente (atropelamento por uma moto) em 02/02/2011. Relata que ficou, em função disso, internada por um longo período. Relata que apresenta muitas seqüelas neurológicas devido ao trauma sofrido. Quando questionada sobre os sintomas psiquiátricos, a mesma não sabe muito o que responder. Relata alguns sintomas: desânimo; tristeza; irritabilidade; dificuldade de aceitar as limitações impostas pelo trauma. Obs: nega ideação suicida. Nega sintomas de auto heteroagressão.
Diagnóstico psiquiátrico? Sim
Faz acompanhamento onde e com qual médico? Com neurologista pelo SUS.
Há quanto tempo? 4 anos;
Traz alguma comprovação? Sim.
Quando iniciou a doença? 4 anos;
Quando iniciou a incapacidade? 4 ano;
(...)
Doenças psiquiátricas = comorbidade psiquiátrica pós trauma em 2011.
Médicas/clínicas = seqüelas neurológicas; hipertensão arterial sistêmica?
Internações prévias = nega internações psiquiátricas;
(...)
- Não sabe informar sobre patologias;
- Nega história de alcoolismo;
- Nega suicídios;
(...)
Aparência adequada, lúcida, orientada em tempo, espaço e pessoa, memória prejudicada, pensamento com fluxo lentificado, forma e conteúdo preservados, humor deprimido, afeto congruente, normovigil, normotenaz, insight e juízo crítico presentes.
(...)
CID 10 = F32.1 - Episódio depressivo moderado;
CID 10 = F43.9 - Reação não especificada a um "stress" grave;
EIXO II: Não Constatado;
EIXO III: Seqüelas neurológicas: HAS.
EIXO IV: Problemas ocupacionais: desemprego;
EIXO V: +- 61 pontos na Escala de Avaliação Global do Funcionamento;
(...)
Não apresenta incapacidade laborativa sob o ponto de vista da avaliação psiquiátrica. Obs: sugiro que a paciente seja avaliada por um médico especialista em neurologia ou neurocirurgia.
(...)
2) Desânimo; tristeza; irritabilidade; dificuldade de aceitar limitações impostas pelo trauma;
(...)
4) Deprimida.
(...)
7) Do ponto de vista psiquiátrico, não há impedimentos.
8) Não apresenta incapacidade laborativa sob o ponto de vista da avaliação psiquiátrica. Obs: sugiro que a paciente seja avaliada por um médico especialista em neurologia ou neurocirurgia.
(...)
6) Sim. Episódio depressivo moderado - codificado pelo CID como F32.1; Reação não especificada a um "stress" grave-codificada pelo CID F32.1 F43.9. As causas são multifatoriais.
(...)
9) 2011;
10) Não apresenta incapacidade laborativa sob o ponto de vista da avaliação psiquiátrica.
(...)
21) Obs: sugiro que a paciente seja avaliada por um médico especialista em neurologia ou neurocirurgia.
(...).
A terceira perícia oficial realizada por neurologista em 02/06/16, refere o seguinte (E3-LAUDPERI62):
(...)
Comparece a periciada, acompanhada de familiar, com história de ter tido acidente automobilístico. Enquanto caminhava na rua foi atropelada por motociclista em 02 de fevereiro de 2011 e com conseqüente traumatismo de crânio. Ficou internada no hospital, em UTI, estando em coma por várias semanas. Exames feitos na ocasião mostram quadro de traumatismo de crânio com comprometimento de lobos frontais, bilaterais. Controle subsequente mostraram área de encefalomalácia de ambos os lobos frontais, mais importante em região frontal à esquerda. A mesma dedicava-se as lidas rurícolas, morando nos limites da região urbana/rural. Desde então apresentou quadro compatível com epilepsia secundária que agora se encontra controlada, mas ficando com seqüelas neurológicas como seja; adinamia, perda de iniciativa, depressão, e transtorno cognitivo e práxico moderado. A memória encontra-se pouco comprometida. A coordenação motora apresenta-se preservada e a força muscular preservada. Eletroencefalogramas feitos mostram lentificação difusa dos ritmos de base. Exames de neuroimagem mostraram áreas de encefalomalácia nos lobos frontais, mais importante à esquerda, caracterizando o quadro compatível como de lobectomizada frontal, do ponto de vista clínico neurológico.
O quadro se mantém estável desde aquela época, e sem ter grandes mudanças no quadro neurológico. O quadro neurológico atual da periciada é: perda da dinâmica nas condutas, astenia, raciocínio lógico e abstrato lentos, coordenação motora preservada, e com quadro gnósico e práxico comprometidos.
(...)
6. R: A periciada, conforme relato acima, apresenta sequelas neurológicas decorrente de traumatismo crânio encefálico com quadros típicos de lobactomia frontal. A mesma tem origem traumática, não relacionado a acidente de trabalho. O CID 10 é T90.5.
(...)
9. Qual a data inicial da doença? R: 2 de fevereiro de 2011.
10. R: O quadro se baseia na seqüela do traumatismo crânio encefálico, com data inicial DID já relatado acima, que é a mesma DII. Tem mais de um ano de evolução e o quadro não melhorou nem piorou, se mantém estabilizado devido às seqüelas neurológicas. Quadro consolidado.
11. R: Não há relação com o trabalho da periciada. O traumatismo aconteceu decorrente de acidente de trânsito, estando a periciada caminhando na rua, não relacionado ao seu trabalho.
12. R: Conforme já relatado acima a periciada apresenta quadros típicos de lobectomia frontal bilateral, com adinamia, défict cognitivo, agnosia e praxia comprometidas, e perda de iniciativa, quadro clínico este que se mantém estável desde aquela época. Não há perspectiva de cura ou melhora. Incapacita totalmente para competir no mercado de trabalho.
13. R: A periciada trabalhou nas lidas de casa e lidas rurícolas no passado.
14. R: A periciada é incapaz total para qualquer tipo de atividade laborativa que garanta seu sustento econômico e/ou de competir no mercado de tarbalho. Inclusive para realizar tarefas simples precisa de estímulo constante de pessoa responsável.
(...)
16.1 R: Total.
16.2 R: Definitiva
16.3 R: Multiprofissional
17. R: A incapacidade não é temporária e sim definitiva. O quadro clínico neurológico da periciada encontra-se consolidada e estabilizada.
18. R: O quadro clínico neurológico já foi compensado e estabilizado, não há perspectiva de cura ou melhora, e a periciada apresenta seqüelas definitivas de lobectomia frontal. O tratamento atualmente em uso visa unicamente controle poliativo dos sintomas principais.
19. R: Não há perspectiva de cura e não há condições para ser reabilitada ou readaptada.
20. R: Não há condições de reabilitação/readaptação.
(...).
Do exame dos autos, colhem-se ainda as seguintes informações sobre a parte autora (E3-ANEXOSPET4, CONTEST/IMPUG7, LAUDPERI45, PET41, PET42, PET64, PET69):
a) idade: 51 anos (nascimento em 11/05/66);
b) histórico de benefícios: a autora requereu auxílio-doença em 01/03/11, indeferido em razão do não comparecimento para concluir exame médico pericial; ajuizou a ação em 03/08/11; gozou de auxílio-doença de 10/03/12 a 07/10/14, de 06/04/15 a 06/06/15 e de 14/07/15 a 02/09/16;
c) atestado de neurologista (23/03/11), referindo que ela sofreu T.C.E grave por atropelamento apresentando como seqüela; anosmia (não sente cheiro), déficit cognitivo moderado ... distúrbio de humor ... CID S06 (traumatismo intracraniano); atestado de neurologista (06/04/15), refere que a parte autora não tem condições de trabalho por apresentar quadro ... (déficit cognitivo, memória, depressão, etc.) .... e epilepsia de difícil controle devido a ter tido trauma crânio encefálico grave que lhe acometeu .... lacuna frontal bilateral (atrofia cerebral); atestados de neurologistas (14/06/16, 18/01/16, 31/08/16), referem que ela não tem condições de trabalhar;
d) receita (26/02/15); agioressonância do crânio (15/04/15); ficha de internação hospitalar (02/02/11);
e) laudo do INSS (28/03/11), relato de ferimento em face em 2/2/2011 e baixa hospitalar - acidente de atropelamento por motocicleta. Atestado CRM 22078 - 23/1/2011 - cid s 06 - sem período sugerido. H. Vida e saúde - não recorda data da alta.
Assim, não há dúvida de que a autora está inválida desde a época do acidente de trânsito em 02/02/11.
Recorre o INSS, sustentando que não restou comprovada a qualidade de segurada especial da parte autora durante o período equivalente à carência e que não restou comprovada a incapacidade laborativa total e permanente. Requer, também, fixação de data da cessação administrativa e a aplicação integral da Lei 11.960/09.
A autora alega que era agricultora em regime de economia familiar na época do acidente em 2011.
Tratando-se de rurícola, cumpre ao julgador valorar os fatos e circunstâncias evidenciados com ênfase no artigo 5º da Lei de Introdução ao Código Civil, devendo-se levar em conta a realidade social em que inserido o trabalhador rural, onde na demonstração dos fatos predomina a informalidade, não se mostrando razoável exigir que os documentos carreados ao processo sigam sempre a forma prescrita em lei, devendo ser considerados válidos quando de outra forma atingir a finalidade precípua de comprovar o exercício da atividade rural, consoante disposto no art. 244 do CPC.
Visando à comprovação do efetivo exercício nas atividades agrícolas, a parte autora poderá apresentar, alternativamente, os documentos relacionados nos incisos do artigo 106 da Lei de Benefício (rol não exaustivo), não sendo admitida prova exclusivamente testemunhal, salvo na ocorrência de motivo de força maior ou caso fortuito, conforme disposto no parágrafo 3º do art. 55 da Lei nº 8213/91 e Súmula 149 do Egrégio Superior Tribunal de Justiça.
Registre-se que o início de prova material, consoante interpretação sistemática da lei, configurar-se-á mediante documentos que comprovem o exercício da atividade nos períodos postulados, devendo ser contemporâneos à época dos fatos que se pretende comprovar, ainda que parcialmente.
Outrossim, não há impedimento a que sejam considerados os documentos emitidos em período próximo ao controverso, desde que indiquem a continuidade da atividade rural.
Sabe-se ainda que os documentos expedidos em nome de integrantes do grupo familiar e a qualificação em certidões têm sido aceitos pela jurisprudência como início de prova material, haja vista que o trabalho com base em uma única unidade produtiva tem como regra a documentação emitida em nome de uma única pessoa. Esse entendimento, aliás, reproduz a orientação consolidada no âmbito das Turmas integrantes da 3ª Seção do Superior Tribunal de Justiça (AGREsp 603.663/RS, Rel. Min. Gilson Dipp, DJU de 19-04-2004; REsp 461.302/RS, Rel. Min. Hamilton Carvalhido, DJU de 12-05-2003).
Em sendo assim, o importante é a apresentação de documentos que caracterizem o efetivo exercício da atividade rural, os quais, como já referido, não precisam estar em nome da parte autora para serem tidos como início de prova do trabalho rural, pois não há essa exigência na lei e, via de regra, nesse tipo de entidade familiar os atos negociais são efetivados em nome do chefe do grupo familiar, geralmente o chefe da unidade familiar, o qual, normalmente é o genitor. Nesse sentido: EDREsp 297.823/SP, STJ, 5ª T, Rel. Min. Jorge Scartezzini, DJ 26.08.2002; AMS 2001.72.06.001187-6/SC, TRF 4ªR, 5ªT, Rel. Des. Federal Paulo Afonso Brum, DJ 05-06-2002).
De outro modo, a qualificação de lavrador ou agricultor em atos do registro civil tem sido considerada, também, como início de prova material, se contemporânea aos fatos, podendo estender-se ao cônjuge, se caracterizado o regime de economia familiar (STJ - AgRg no REsp 318511/SP, 6ª T, Rel. Min. Paulo Gallotti, DJ 01.03.2004 e AgRg nos EDcl no Ag 561483/SP, 5ª T, Rel. Min. Gilson Dipp, DJ 24-05-2004). Ademais, não se exige prova material plena da atividade rural em todo o período requerido, mas início de prova material, o que vai ao encontro da realidade social no sentido de não inviabilizar a concessão desse tipo de benefício.
A fim de demonstrar o exercício de atividade rural, foram juntados aos autos os seguintes documentos (E3-ANEXOSPET4, CONTES/IMPUG7):
a) certidão de casamento (16/05/87), onde consta que seu marido era agricultor;
b) contrato particular de arrendamento (09/11/04), tendo como arrendatária a parte autora;
c) notas fiscais de microprodutor em nome da parte autora de 2008/09;
d) declaração de propriedade rural (28/03/11).
Não há como se negar o valor probatório dos referidos documentos para efeito de início de prova documental. Na esteira da jurisprudência dominante, entendo que os documentos constituem (em seu conjunto) um início de prova material da atividade rurícola da autora, sendo suficientes para lastrear a prova oral que confirmou, em linhas gerais, as alegações da autora (E3-AUDIÊNCI79).
Além disso, o próprio INSS reconheceu a condição de segurada especial da autora ao lhe conceder, no curso dessa ação, auxílios-doença por três vezes entre 2012 e 2016.
Com efeito, sem razão o INSS em seu apelo, pois houve início razoável de prova documental, corroborado pela prova testemunhal acerca do exercício de trabalho rural em período superior ao da carência.
Assim, comprovada a qualidade de segurada e a incapacidade laborativa total e permanente da autora, é de ser mantida a sentença que concedeu o benefício de aposentadoria por invalidez desde o indeferimento administrativo (28/03/11).
Deve ser mantida a sentença, também, na parte em que deferiu a tutela antecipatória urgente, atualmente prevista no art. 300 do CPC/15:
Art. 300. A tutela de urgência será concedida quando houver elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo.
§ 1.º Para a concessão da tutela de urgência, o juiz pode, conforme o caso, exigir caução real ou fidejussória idônea para ressarcir os danos que a outra parte possa vir a sofrer, podendo a caução ser dispensada se a parte economicamente hipossuficiente não puder oferecê-la.
§ 2.º A tutela de urgência pode ser concedida liminarmente ou após justificação prévia.
§ 3.º A tutela de urgência de natureza antecipada não será concedida quando houver perigo de irreversibilidade dos efeitos da decisão.
Consoante se depreende da leitura do regramento acima, revela-se indispensável à entrega de provimento antecipatório não só a probabilidade do direito, mas também a presença de perigo de dano ou risco ao resultado útil do processo, aos quais se deverá buscar, na medida do possível, maior aproximação do juízo de segurança consignado na norma, sob pena de subversão da finalidade do instituto da tutela antecipatória.
Acresça-se a tais fundamentos, a lição do Ministro do Supremo Tribunal Federal Teori Albino Zavascki, segundo o qual o risco de dano que enseja antecipação é o risco concreto, e não o hipotético ou eventual; atual, ou seja, o que se apresenta iminente no curso do processo; e grave, vale dizer, o potencialmente apto a fazer perecer ou a prejudicar o direito afirmado pela parte (Antecipação da tutela. 7ª ed. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 80). Entendo que o Novo Código de Processo Civil, neste aspecto, não alterou as condições para deferimento de tutela antecipatória fundada em urgência (anterior art. 273, I, do CPC/73).
Dessa forma, diante da sentença de procedência, confirmada neste julgamento, resta caracterizada a probabilidade do direito alegado.
O perigo de dano ou risco ao resultado útil do processo é evidenciado pelo fato de a parte autora padecer de moléstia que a incapacita para o trabalho, impedindo-a, assim, de prover sua subsistência.
Quanto à irreversibilidade dos efeitos do provimento (art. 300, §3.º, CPC/15), deve ser destacada a lição de Luiz Guilherme Marinoni:
Admitir que o juiz não pode antecipar a tutela, quando a antecipação é imprescindível para evitar um prejuízo irreversível ao direito do autor, é o mesmo que afirmar que o legislador obrigou o juiz a correr o risco de provocar dano irreversível ao direito que justamente lhe parece mais provável a tutela sumária funda-se no princípio da probabilidade. Não só lógica mas também o direito à adequada tutela jurisdicional exigem a possibilidade de sacrifício, ainda que de forma irreversível, de um direito que pareça improvável em benefício de outro que pareça provável. Caso contrário, o direito que tem maior probabilidade de ser definitivamente reconhecido poderá ser irreversivelmente lesado. (A antecipação da tutela na reforma do código de processo civil. 2ª. Ed. S. Paulo: malheiros editores, p. 79-80).
Ainda a respeito do tema, oportuno, mais uma vez, o ensinamento de Teori Zavascki, no sentido de que a vedação à tutela antecipatória irreversível não enseja uma regra absoluta (op. cit., p. 93):
Sempre que houver um confronto entre o risco de dano irreparável ao direito do autor e o risco de irreversibilidade da medida antecipatória, deverá o juiz formular a devida ponderação entre os bens jurídicos em confronto, para o que levará em especial consideração a relevância dos fundamentos que a cada um deles dá suporte, fazendo prevalecer a posição com maior chance de vir a ser, ao final do processo a vencedora. Assim, nos casos em que o direito afirmado pelo autor seja de manifesta verossimilhança e que seja igualmente claro o risco de seu dano iminente, não teria sentido algum sacrificá-lo em nome de uma possível, mas improvável situação de irreversibilidade.
Dos consectários
A correção monetária e os juros de mora devem ser adequados aos parâmetros a seguir fixados:
Correção monetária
A correção monetária, segundo o entendimento consolidado na 3ª Seção deste TRF4, incidirá a contar do vencimento de cada prestação e será calculada pelos seguintes índices oficiais:
- IGP-DI de 05/96 a 03/2006, art. 10 da Lei n.º 9.711/98, combinado com o art. 20, §§5º e 6º, da Lei n.º 8.880/94;
- INPC de 04/2006 a 29/06/2009, conforme o art. 31 da Lei n.º 10.741/03, combinado com a Lei n.º 11.430/06, precedida da MP n.º 316, de 11/08/2006, que acrescentou o art. 41-A à Lei n.º 8.213/91.
- IPCA-E a partir de 30/06/2009.
A incidência da TR como índice de correção monetária dos débitos judiciais da Fazenda Pública foi afastada pelo STF, no julgamento do RE 870947, com repercussão geral, tendo-se determinado a utilização do IPCA-E, como já havia sido determinado para o período subsequente à inscrição em precatório, por meio das ADIs 4.357 e 4.425.
Juros de mora
Os juros de mora devem incidir a partir da citação.
Até 29-06-2009, os juros de mora devem incidir à taxa de 1% ao mês, com base no art. 3º do Decreto-Lei n. 2.322/87, aplicável analogicamente aos benefícios pagos com atraso, tendo em vista o seu caráter eminentemente alimentar, consoante firme entendimento consagrado na jurisprudência do STJ e na Súmula 75 desta Corte.
A partir de então, deve haver incidência dos juros, uma única vez, até o efetivo pagamento do débito, segundo o índice oficial de remuneração básica aplicado à caderneta de poupança, nos termos estabelecidos no art. 1º-F, da Lei 9.494/97, na redação da Lei 11.960/2009, considerado hígido pelo STF no RE 870947, com repercussão geral reconhecida. Os juros devem ser calculados sem capitalização, tendo em vista que o dispositivo determina que os índices devem ser aplicados "uma única vez" e porque a capitalização, no direito brasileiro, pressupõe expressa autorização legal (STJ, 5ª Turma, AgRgno AgRg no Ag 1211604/SP, Rel. Min. Laurita Vaz).
Assim, nego provimento ao recurso nesse aspecto.
Considerando o trabalho adicional em grau recursal realizado, a importância e a complexidade da causa, nos termos do art. 85, §2º e §11º do CPC/15, os honorários advocatícios devem ser majorados para que a faixa inicial seja fixada em 15% da condenação ou do proveito econômico obtido (art. 85, §3º, I, CPC/15). Caso a condenação ou o proveito econômico, por ocasião da liquidação, supere a primeira faixa, o acréscimo deverá incidir na mesma proporção nas faixas mínimas e máximas subseqüentes, na forma do art. 85, §5º, do CPC/15.
Ante o exposto, voto por negar provimento ao recurso e manter a antecipação da tutela deferida.
Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA
Relator
| Documento eletrônico assinado por Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 9297627v6 e, se solicitado, do código CRC 972C1EB1. | |
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 07/03/2018
APELAÇÃO CÍVEL Nº 5042433-62.2017.4.04.9999/RS
ORIGEM: RS 00023693320138210104
RELATOR | : | Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA |
PRESIDENTE | : | Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA |
PROCURADOR | : | Dra. Andrea Falcão de Moraes |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELADO | : | MARGARETE ZAGO SCHAPANSKI |
ADVOGADO | : | IRACILDO BINICHESKI |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 07/03/2018, na seqüência 273, disponibilizada no DE de 20/02/2018, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 6ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO E MANTER A ANTECIPAÇÃO DA TUTELA DEFERIDA.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA |
VOTANTE(S) | : | Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA |
: | Juíza Federal TAÍS SCHILLING FERRAZ | |
: | Juiz Federal ARTUR CÉSAR DE SOUZA |
Paulo Roberto do Amaral Nunes
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