APELAÇÃO CÍVEL Nº 5008463-27.2011.4.04.7107/RS
RELATOR | : | JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA |
APELANTE | : | OSCAR LAMAISON OLIVEIRA DE LIMA |
ADVOGADO | : | ELIANE PATRICIA BOFF |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. CONCESSÃO DE APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. TUTELA ESPECÍFICA.
1. Comprovado pelo conjunto probatório que a parte autora é portadora de enfermidade que a incapacita para o trabalho total e definitivamente, considerados o quadro clínico e as condições pessoais, é de ser concedida aposentadoria por invalidez desde a data do requerimento administrativo. 2. Determina-se o cumprimento imediato do acórdão naquilo que se refere à obrigação de implementar o benefício, por se tratar de decisão de eficácia mandamental que deverá ser efetivada mediante as atividades de cumprimento da sentença stricto sensu previstas no art. 497 do CPC/15, sem a necessidade de um processo executivo autônomo (sine intervallo).
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 6a. Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por maioria, dar parcial provimento à apelação e determinar a implantação do benefício, restando prejudicado o agravo retido, vencidas as Desembargadoras Federais Salise Monteiro Sanchotene e Vânia Hack de Almeida, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 09 de novembro de 2016.
Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA
Relator
| Documento eletrônico assinado por Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8357093v7 e, se solicitado, do código CRC 97514724. | |
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 5008463-27.2011.4.04.7107/RS
RELATOR | : | JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA |
APELANTE | : | OSCAR LAMAISON OLIVEIRA DE LIMA |
ADVOGADO | : | ELIANE PATRICIA BOFF |
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RELATÓRIO
Cuida-se de apelação interposta contra a sentença que julgou improcedente o pedido de auxílio-doença e/ou de aposentadoria por invalidez, por não restar comprovada a incapacidade laborativa, condenando a parte autora ao pagamento de custas e honorários advocatícios fixados em R$ 1.500,00 (mil e quinhentos reais), cuja exigibilidade restou suspensa em razão da Assistência Judiciária Gratuita.
Recorre a parte autora, sustentando, preliminarmente, em sede de agravo retido, que é de suma importância a realização de prova social para a comprovação dos aspectos pessoais do Recorrente devendo para tanto, ser anulada a sentença e devolvido os autos para o Juízo de Origem. Quanto ao mérito, alega que o benefício de auxílio-doença e a consequente conversão em aposentadoria por invalidez ao Recorrente é a medida mais assertiva, visto que em razão da moléstia infectocontagiosa que possui a sua recolocação no mercado de trabalho mostra-se improvável, considerando-se as suas condições pessoais e o estigma social da doença, capaz de diminuir consideravelmente as suas chances de obter ou de manter um emprego formal.
Com contrarrazões, subiram os autos a esta Corte.
É o Relatório.
VOTO
Controverte-se, na espécie, sobre o acerto ou não da sentença que julgou improcedente o pedido de auxílio-doença e/ou de aposentadoria por invalidez, por não restar comprovada a incapacidade laborativa, condenando a parte autora ao pagamento de custas e honorários advocatícios fixados em R$ 1.500,00 (mil e quinhentos reais), cuja exigibilidade restou suspensa em razão da Assistência Judiciária Gratuita.
Quanto à aposentadoria por invalidez, reza o art. 42 da Lei nº 8.213/91:
Art. 42. A aposentadoria por invalidez, uma vez cumprida, quando for o caso, a carência exigida, será devida ao segurado que, estando ou não em gozo de auxílio-doença, for considerado incapaz e insusceptível de reabilitação para o exercício de atividade que lhe garanta a subsistência, e ser-lhe-á paga enquanto permanecer nesta condição.
Já no que tange ao auxílio-doença, dispõe o art. 59 do mesmo diploma:
Art. 59. O auxílio-doença será devido ao segurado que, havendo cumprido, quando for o caso, o período de carência exigido nesta Lei, ficar incapacitado para o seu trabalho ou para a sua atividade habitual por mais de 15 dias consecutivos.
Não havendo controvérsia quanto à qualidade de segurado e carência, passo à análise da incapacidade laborativa.
Segundo entendimento dominante na jurisprudência pátria, nas ações em que se objetiva a concessão de aposentadoria por invalidez ou auxílio-doença, ou mesmo nos casos de restauração desses benefícios, o julgador firma seu convencimento com base na prova pericial, não deixando de se ater, entretanto, aos demais elementos de prova, sendo certo que embora possível, teoricamente, o exercício de outra atividade pelo segurado, ainda assim a inativação por invalidez deve ser outorgada se, na prática, for difícil a respectiva reabilitação, seja pela natureza da doença ou das atividades normalmente desenvolvidas, seja pela idade avançada.
Durante a instrução processual, foram realizadas duas perícias judiciais. A primeira por médica infectologista, em 20-03-11 (E29 - LAUDO1, E64 - LAUDPERI1, E78 - LAUDPERI1 e E134 - LAUDPERI1) e a segunda por médica psiquiatra, em 28-02-14 (E122 - LAU1), das quais se extraem as seguintes informações sobre o quadro clínico da parte autora:
a) enfermidade: diz a perita infectologista que o Autor apresenta, segundo laudos médicos em anexo ao processo, Síndrome da Imundeficiência Adquirida (CID B24), Hipertensão arterial (CID I10) e Insuficiência Cardíaca Congestiva (I50); a perita psiquiatra diz que A parte apresenta alguma sintomatologia sugestiva de patologia CID X F 41.2 - Transtorno misto depressivo ansioso;
b) incapacidade laborativa: responde a perita infectologista que Em todos os documentos relacionados aos eventos supracitados, não foi evidenciado nenhum momento de incapacidade laboral, após 11.03.2009, por doença infecciosa. Não há dados nesses documentos sobre internação hospitalar no período; responde a perita psiquiatra que Atualmente, sob o aspecto psiquiátrico não se constata na parte autora sintomatologia, gravidade ou comprometimento incapacitante. Não se caracteriza incapacidade laborativa por motivos psiquiátricos.
Dos autos extraem-se outras informações sobre a parte autora (E1, E27, E53, E75):
a) idade: 53 anos (nascimento em 25-08-62);
b) profissão: servente de obras;
c) histórico de benefícios: requereu auxílio-doença em 05-08-08, 17-02-09 e 25-05-11, indeferidos em razão de não comparecimento à perícia médica e de parecer contrário da perícia médica; requereu amparo social à pessoa portadora de deficiência em 24-11-14, indeferido em razão de não preenchimento do requisito de impedimentos de longo prazo; ajuizou a presente demanda em 30-08-11; está em gozo de amparo social à pessoa portadora de deficiência, concedido administrativamente, deste 24-06-15;
d) ficha do Sistema de Informação de Agravos de Notificação, de 05-05-08, em que consta que o autor esteve acometido por tuberculose, diagnosticada em 28-09-07; exame de quantificação de carga viral de HIV-1 de 14-03-13; exame de sangue de 11-03-13;
e) atestado de 17-03-03, em que consta que o autor esteve acometido por moléstia correspondente ao CID 10 A15, tendo feito o tratamento proposto; atestado de 16-11-10, em que consta que o autor estava acometido por SIDA, hipertensão arterial e insuficiência cardíaca congestiva, correspondentes aos CID 10 B24, I10 e I50.0; atestado de 18-10-10, cujo diagnóstico foi de cardiopatia hipertensiva e insuficiência cardíaca, correspondente ao CID 10 B24; idem o de 13-06-11; atestado de 22-03-11, em que consta que o autor estava acometido pelas moléstias correspondentes aos CID 10 B24, I10 e I50.0; atestado de 09-04-13, em que consta que o autor estava acometido por SIDA, quadro depressivo e dependência química (CID 10 B24, F32 e F10.2).
Diante de tal quadro, a ação foi julgada improcedente, por não ter restado comprovada a incapacidade para o trabalho. Todavia, entendo que a sentença merece reforma.
Em que pese as conclusões das perícias judiciais de que o autor não está incapacitado para o trabalho, o conjunto probatório indica que ele está incapacitado de forma total e permanente, sem condições de integrar qualquer processo de reabilitação profissional. Isso porque, é imprescindível considerar, além do estado de saúde, as condições pessoais do segurado, como a sua idade (53 anos), a presumível pouca instrução, a limitada experiência laborativa (servente de obras) e, por fim, a realidade do mercado de trabalho atual, já exíguo até para pessoas jovens e que estão em perfeitas condições de saúde. Nesse compasso, ordenar que o postulante, com tais limitações, recomponha sua vida profissional, negando-lhe o benefício no momento em que dele necessita, é contrariar o basilar princípio da dignidade da pessoa.
Destaco ainda que o autor esteve acometido por doenças oportunistas características da afecção de que sofre, o que demonstra que o moléstia não estava estabilizada, ao contrário da conclusão da perícia realizada por médica infectologista. Além disso, cabe destacar que, conforme o CNIS, o autor não possui vínculo laborativo desde 2010, o que dificulta ainda mais sua reintegração ao mercado de trabalho.
Ademais, a doença (AIDS) que lhe acomete traz consigo um estigma capaz de diminuir consideravelmente as suas condições de obter ou de manter um emprego formal, ainda mais considerando que tem 53 anos de idade.
Vejamos, por oportuno, as seguintes decisões deste TRF:
PREVIDENCIÁRIO. CONCESSÃO DE BENEFÍCIO. AUXÍLIO-DOENÇA. EMPREGADA DOMÉSTICA. PORTADORA DE HIV.
- Embora a perícia médica judicial tenha atestado a capacidade laborativa do segurado, não se pode afastar a idéia de que a AIDS traz consigo a marca tenebrosa da "doença incurável". E, submeter um doente de AIDS à volta forçada ao trabalho seria cometer contra ele uma violência injustificável. Na hipótese, faz jus a parte autora ao benefício de auxílio-doença."
(AC 2000.71.05.005038-6, Quinta Turma, Relator p/ Acórdão Des. Federal Paulo Afonso Brum Vaz, DJ 18/06/2003)
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. HIV+ ASSINTOMÁTICO. CONSECTÁRIOS.
(...)
2. Ainda que em oposição ao laudo pericial, concede-se o benefício de aposentadoria por invalidez ao portador de HIV, mesmo sem apresentar sintomas, quando sua recolocação no mercado de trabalho mostrar-se improvável, considerando, para tal, a atividade anteriormente exercida e seu grau de escolaridade.
(...)
(AC 2005.70.00.000448-0, 6ª Turma, Relator Juiz Federal Ricardo Teixeira do Valle Pereira, publicado em 05/07/2006)
PREVIDENCIÁRIO. CONCESSÃO DE APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. AIDS. INCAPACIDADE COMPROVADA. TERMO INICIAL. CORREÇÃO MONETÁRIA. CUSTAS PROCESSUAIS. SÚMULA 02-TA/RS.
(...)
2. Ainda que a perícia médica judicial não ateste a incapacidade laborativa total do segurado portador do vírus da AIDS, submetê-lo à volta forçada ao trabalho é cometer, com ele, violência injustificável, ante à extrema dificuldade em virtude do preconceito sofrido.
(...)
(AC 2007.71.99.005742-1/RS, Turma Suplementar, Rel. Des. Federal Luís Alberto d'Azevedo Aurvalle, D.E. 03-04-2007)
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. ARTIGO 20 DA LEI N.º 8.742/93. RENDA MÍNIMA. CONSECTÁRIOS LEGAIS.
(...)
2. A infecção com vírus HIV traz consigo o estigma social, representado pela resistência de grande parte da sociedade em aceitar, com normalidade, o portador da doença.
3. Em respeito ao fundamento da República Federativa do Brasil, representado pela dignidade da pessoa humana (art. 1º, inc. III, CF), é gravame exacerbado exigir que portador do vírus HIV retorne ao trabalho, em face dos transtornos psicológicos trazidos pelo forte estigma social em relação à doença, aliado às suas condições pessoais.
(...)
(AC 2007.71.99.009672-4, Quinta Turma, Rel. Juiz Artur César de Souza, D.E. 23/03/2009)
Assim, entendo que restou demonstrado nos autos que a a parte demandante é portadora de moléstia que a incapacita total e permanentemente para o exercício de suas atividades laborativas, sem recursos pessoais capazes de garantir-lhe êxito em reabilitar-se e reinserir-se no mercado de trabalho, devendo ser reformada a decisão que para determinar a concessão de aposentadoria por invalidez desde o requerimento administrativo (25-05-11), com o pagamento dos valores atrasados, descontados os valores pagos na via administrativa a título de benefício assistencial.
No que tange ao agravo retido no qual a parte autora requer que a sentença seja anulada para a realização de perícia socioeconômica, entendo que, diante da concessão de aposentadoria por invalidez, tal recurso resta prejudicado.
Da Correção Monetária e dos Juros de Mora
A correção monetária, segundo o entendimento consolidado na 3.ª Seção deste TRF4, incidirá a contar do vencimento de cada prestação e será calculada pelos índices oficiais e aceitos na jurisprudência, quais sejam: ORTN (10/64 a 02/86, Lei n.º 4.257/64); OTN (03/86 a 01/89, Decreto-Lei n.º 2.284/86); BTN (02/89 a 02/91, Lei n.º 7.777/89); INPC (03/91 a 12/92, Lei n.º 8.213/91); IRSM (01/93 a 02/94, Lei n.º 8.542/92); URV (03 a 06/94, Lei n.º 8.880/94); IPC-r (07/94 a 06/95, Lei n.º 8.880/94); INPC (07/95 a 04/96, MP n.º 1.053/95); IGP-DI (05/96 a 03/2006, art. 10 da Lei n.º 9.711/98, combinado com o art. 20, §§5.º e 6.º, da Lei n.º 8.880/94); INPC (de 04/2006 a 29/06/2009, conforme o art. 41-A à Lei n.º 8.213/91); TR (a partir de 30/06/2009, conforme art. 1.º-F da Lei 9.494/97 e o mais recente entendimento do STF, exemplificado pelas Rcl 19.050, Rel. Min. Roberto Barroso; Rcl 21.147, Rel. Min. Cármen Lúcia e Rcl 19.095, Rel. Min. Gilmar Mendes).
Este entendimento não obsta que o juízo de execução observe, quando da liquidação e atualização das condenações impostas ao INSS, o que vier a ser decidido pelo STF em regime de repercussão geral, bem como eventual regramento de transição que sobrevenha em sede de modulação de efeitos, no que tange à aplicação do art. 1º-F da Lei 9.494/97, já que ainda controvertido o tema (STF, RE 870.947, Repercussão Geral, Relator Min. Luiz Fux, julgado em 16/04/2015).
Quanto aos juros de mora, até 29/06/2009, a contar da data da citação, devem ser fixados à taxa de 1% ao mês, com base no art. 3.º do Decreto-Lei n.º 2.322/87, aplicável analogicamente aos benefícios pagos com atraso (vide Súmula 75 deste Tribunal). Após a referida data, devem incidir uma única vez, até o efetivo pagamento do débito, segundo o índice oficial de remuneração básica aplicado à caderneta de poupança, nos termos estabelecidos no art. 1.º-F, da Lei 9.494/97 e sem capitalização, já que esta pressupõe expressa autorização legal (assim: STJ, 5.ª Turma, AgRg no AgRg no Ag 1211604/SP, Rel. Min. Laurita Vaz).
Da Verba Honorária
Os honorários advocatícios, ônus exclusivos do INSS no caso, devem ser fixados em 10% sobre o valor da condenação, excluídas as parcelas vincendas, observando-se a Súmula 76 desta Corte: "Os honorários advocatícios, nas ações previdenciárias, devem incidir somente sobre as parcelas vencidas até a data da sentença de procedência ou do acórdão que reforme a sentença de improcedência".
Das Custas Processuais
O INSS é isento do pagamento das custas no Foro Federal (art. 4.º, I, da Lei n.º 9.289/96) e na Justiça Estadual do Rio Grande do Sul, devendo, contudo, pagar eventuais despesas processuais, como as relacionadas a correio, publicação de editais e condução de oficiais de justiça (artigo 11 da Lei Estadual n.º 8.121/85, com a redação da Lei Estadual nº 13.471/2010, já considerada a inconstitucionalidade formal reconhecida na ADI n.º 70038755864 julgada pelo Órgão Especial do TJ/RS), isenções estas que não se aplicam quando demandado na Justiça Estadual do Paraná (Súmula 20 do TRF4), devendo ser ressalvado, ainda, que no Estado de Santa Catarina (art. 33, p. único, da Lei Complementar estadual 156/97), a autarquia responde pela metade do valor.
Tutela Específica
Destaco que o relevante papel da tutela específica na ordem jurídica foi reafirmado com o Novo Código de Processo Civil. Não poderia ser diferente já que o diploma processual passou a considerar, em suas normas fundamentais, que a atividade satisfativa do direito reconhecido também deve ser prestada em prazo razoável (art. 4.º, NCPC). Essa disposição legal, à evidência, encontra base na própria Constituição Federal (art. 5.º, XXXV, CF). Assim: "à luz desse preceito, tem-se que a Jurisdição apresenta-se como atividade do Estado voltada à realização do Direito, não só restaurando a ordem jurídica violada (isto é, após a ocorrência da lesão, ou do dano), mas, também, evitando que tal violação ocorra" (MEDINA, José Miguel Garcia. Novo Código de Processo Civil Comentado. 3. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015, p. 759).
De fato, a técnica que anteriormente proporcionava o imediato cumprimento das decisões de preponderante eficácia mandamental - para prestigiar a célebre classificação de Pontes de Miranda - foi aprimorada. É que as regras anteriores estavam confinadas aos artigos 461 e 461-A do CPC/73. Agora, é feita a distinção entre o pronunciamento judicial que impõe o dever de fazer ou não fazer, ainda na fase cognitiva, e posteriormente, é dado tratamento ao cumprimento da tutela prestada. Nessa linha, confira-se a redação dos artigos 497 e 536, ambos do NCPC:
Art. 497. Na ação que tenha por objeto a prestação de fazer ou de não fazer, o juiz, se procedente o pedido, concederá a tutela específica ou determinará providências que assegurem a obtenção de tutela pelo resultado prático equivalente.
Parágrafo único. Para a concessão da tutela específica destinada a inibir a prática, a reiteração ou a continuação de um ilícito, ou a sua remoção, é irrelevante a demonstração da ocorrência de dano ou da existência de culpa ou dolo.
Art. 536. No cumprimento de sentença que reconheça a exigibilidade de obrigação de fazer ou de não fazer, o juiz poderá, de ofício ou a requerimento, para a efetivação da tutela específica ou a obtenção de tutela pelo resultado prático equivalente, determinar as medidas necessárias à satisfação do exequente.
§1.º Para atender ao disposto no caput, o juiz poderá determinar, entre outras medidas, a imposição de multa, a busca e apreensão, a remoção de pessoas e coisas, o desfazimento de obras e o impedimento de atividade nociva, podendo, caso necessário, requisitar o auxílio de força policial.
§2.º O mandado de busca e apreensão de pessoas e coisas será cumprido por 2 (dois) oficiais de justiça, observando-se o disposto no art. 846, §§ 1.º a 4.º, se houver necessidade de arrombamento.
§3.º O executado incidirá nas penas de litigância de má-fé quando injustificadamente descumprir a ordem judicial, sem prejuízo de sua responsabilização por crime de desobediência.
§4.º No cumprimento de sentença que reconheça a exigibilidade de obrigação de fazer ou de não fazer, aplica-se o art. 525, no que couber.
§5.º O disposto neste artigo aplica-se, no que couber, ao cumprimento de sentença que reconheça deveres de fazer e de não fazer de natureza não obrigacional.
Tenho, pois, que a tutela específica é instrumento que anima a ordem processual a dar material concreção àquele direito reconhecido em juízo. Ela afasta a juridicidade do plano meramente genérico e converte em realidade a conseqüência determinada pelo provimento judicial.
Não me parece, também, que a tutela específica possa ser indistintamente equiparada às tutelas provisórias (antecipatória e cautelar), já que a sua concessão, em determinados casos, dispensa a situação de perigo, como se denota do parágrafo único do art. 497, NCPC. Aliás, expressis verbis, para que seja evitada a prática de uma conduta ilícita, é irrelevante a demonstração de ocorrência de dano.
No mais, cumpre lembrar que os recursos especial e extraordinário não possuem efeito suspensivo e, portanto, a regra geral é a realização prática do direito tão logo haja pronunciamento pelo tribunal local, não havendo qualquer justificativa razoável para que não se implemente o comando judicial de plano.
Especificamente em matéria previdenciária, a sentença concessiva de benefício amolda-se aos provimentos mandamentais e executivos em sentido amplo, cujos traços marcantes, considerada a eficácia preponderante, são, respectivamente, o conteúdo mandamental e a dispensa da execução ex intervallo, ou seja, a propositura de nova ação de execução. Nesse ponto, vale registrar que este Tribunal já adota a compreensão, de longa data, no sentido de que é possível a imediata implantação dos benefícios previdenciários com fundamento na tutela específica (TRF4, 3.ª Seção, Questão de Ordem na AC n.º 2002.71.00.050349-7/RS, Rel. para o acórdão Des. Federal Celso Kipper, julgado em 09-08-2007).
Entendo, portanto, que a implantação do benefício previdenciário ora deferido é medida que se impõe imediatamente. Para tanto, deverá o INSS, no prazo de 45 dias, realizar as providências administrativas necessárias.
Considerando-se que o autor está em gozo de benefício assistencial, deverá ele optar pelo benefício que entender mais vantajoso.
Ante o exposto, voto por dar parcial provimento à apelação e determinar a implantação do benefício, restando prejudicado o agravo retido.
Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA
Relator
| Documento eletrônico assinado por Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8357092v3 e, se solicitado, do código CRC 9AF5C3A7. | |
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| Signatário (a): | João Batista Pinto Silveira |
| Data e Hora: | 22/09/2016 12:40 |
APELAÇÃO CÍVEL Nº 5008463-27.2011.4.04.7107/RS
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VOTO DIVERGENTE
Com a devida vênia, apresento divergência ao voto proferido pelo eminente relator.
Entendeu-se por reformar a sentença, dando provimento à apelação da parte autora para que lhe seja concedido o benefício de aposentadoria por invalidez, desde o requerimento administrativo.
Contudo, foram realizados, no caso dos autos, exames periciais com especialistas em infectologia e psiquiatria.
Veja-se que no exame pericial realizado por infectologista, referiu o expert que ao exame físico não há incapacidade por doença infecciosa (resposta ao quesito 6, e. 29, LAUDO/1). Ademais, destaco o seguinte trecho:
Autor apresenta, segundo laudos médicos em anexo ao processo, Síndrome da Imunodeficiência Adquirida (CID B24), Hipertensão arterial (CID I10) e Insuficiência Cardíaca Congestiva (I50). Não é possível avaliar incapacidade quanto a doença infecciosa, pois autor não trouxe exames ou receitas referentes ao seu tratamento. Quanto ao exame físico, não há incapacidade no momento (resposta ao quesito 1 do juízo, e. 29, LAUDO/1).
Restando inconclusiva a perícia, esta foi complementada após a apresentação de exames pelo autor:
Em todos os documentos relacionados aos eventos supracitados, não foi evidenciado nenhum momento de incapacidade laboral, após 11.03.2009, por doença infecciosa. Não há dados nesses documentos sobre internação hospitalar no período (e. 134, LAUDDPERI1).
No mesmo sentido foi a conclusão da perícia realizada por especialista em psiquiatria, a qual diagnosticou transtorno misto depressivo ansioso, porém, sem constatar incapacidade para o exercício das atividades laborativas.
O perito judicial é o profissional de confiança do juízo, cujo compromisso é examinar a parte com imparcialidade. Embora o julgador não fique adstrito às conclusões do perito, a prova em sentido contrário ao laudo judicial, para prevalecer, deve ser suficientemente robusta e convincente.
No caso dos autos, foram juntados atestados médicos datados nos anos de 2003, 2010 e 2011 (e. 1, ATESTMED6, e. 27, ATESTMED4, e. 75, ATESTMED1), os quais apontam as doenças referidas pelas perícias judiciais, sem constatar, entretanto, incapacidade laborativa em virtude de tais patologias no período pretendido pela parte autora. Depreende-se de tais documentos, inclusive, que a parte autora se encontra em acompanhamento médico e realizando o tratamento adequado em virtude das enfermidades das quais sofre.
Percebe-se, dessa forma, que embora ao autor seja portador de síndrome de imunodeficiência adquirida, o seu quadro, no período em questão, é assintomático. O fato de o requerente ser portador do vírus, por si só, não enseja a concessão do benefício por incapacidade ora pleiteado.
Nesse sentido, destaco o seguinte o precedente desta Turma:
PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-DOENÇA. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. PORTADOR DE HIV. AUSÊNCIA DE INCAPACIDADE. DESCABIMENTO. 1. O fato de ser portador de HIV não enseja automaticamente a concessão de benefício por incapacidade, não sendo o estigma social ou a discriminação fatores autorizadores da concessão deste benefício. 2. A evolução da medicina nesta área trouxe muitos avanços para a qualidade de vida das pessoas portadoras de HIV, o que, inclusive, contribuiu para que em grande parte dos casos a pessoa mantenha a plena capacidade laboral. 3. Neste contexto, não basta apenas demonstrar que está acometido pela doença, mas que tal moléstia enseja a incapacidade para o exercício das atividades laborais. 4. Ausente a incapacidade laboral, o autor não faz jus a benefício por incapacidade. (TRF4, AC 5013849-33.2014.404.7107, SEXTA TURMA, Relatora VÂNIA HACK DE ALMEIDA, juntado aos autos em 17/06/2016)
Por conseguinte, não havendo prova documental suficiente acerca da incapacidade laboral do autor, é de se dispensar ao laudo judicial a confiança necessária para concluir que o autor não se encontra incapacitado para o exercício de suas atividades laborativas, não fazendo jus, portanto, aos benefícios pleiteados.
Quanto ao agravo retido interposto, o qual, em virtude de estar relacionado com questões de mérito, ora analiso, nego provimento, haja vista que a prova social resta desnecessária ante a ausência de incapacidade laboral.
Dessa forma, deve a sentença ser mantida, inclusive em relação aos ônus de sucumbência.
Dispositivo
Ante o exposto, voto por negar provimento ao agravo retido e à apelação da parte autora.
Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE
| Documento eletrônico assinado por Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE, , na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8478026v7 e, se solicitado, do código CRC 4750F40. | |
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| Signatário (a): | Salise Monteiro Sanchotene |
| Data e Hora: | 21/09/2016 16:58 |
APELAÇÃO CÍVEL Nº 5008463-27.2011.4.04.7107/RS
RELATOR | : | JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA |
APELANTE | : | OSCAR LAMAISON OLIVEIRA DE LIMA |
ADVOGADO | : | ELIANE PATRICIA BOFF |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
VOTO-VISTA
Pelo Des. Federal Roger Raupp Rios:
Trago a julgamento pedido de vista formulado na sessão da 6ª Turma do dia 28/09/2016, para a qual fui convocado nos termos do art. 942 do NCPC, em razão de anterior julgamento não unânime.
Em síntese, a parte autora ajuizou ação pretendendo o restabelecimento de auxílio-doença ou, alternativamente, a concessão de aposentadoria por invalidez.
A sentença julgou improcedente o pedido, porquanto não demonstrada, pela perícia judicial, incapacidade para o trabalho.
A parte autora apelou, aduzindo ser portador de AIDS (CID B24) desde 2009, bem como hipertensão arterial (CID I10) e insuficiência cardíaca congestiva (I50). Pediu o provimento de agravo retido, para que seja realizada perícia social. Sustentou que a AIDS lhe traz severas limitações, principalmente de ordem social. Referiu que "reside em uma cidade pequena (cerca de 21.000 habitantes) onde os acontecimentos são assimilados e repassados às pessoas de maneira rápida e ampla, razão pela qual a maior parte da sociedade é conhecedora do quadro clínico apresentado pelo beneficiário", sendo que "a falta de conhecimento sobre a doença e, principalmente sobre as formas de contágio, gera discriminação e preconceito em todas as áreas da vida do portador do HIV, principalmente na esfera profissional". Concluiu que, "além da doença infectocontagiosa e dos problemas psiquiátricos de depressão e alcoolismo que possui, não tem condições de se manter sozinho e vive de favor na casa de terceiro".
O relator, Des. Federal João Batista Pinto Silveira, votou pelo parcial provimento da apelação, determinando a implantação do benefício, prejudicado o agravo retido, nos seguintes termos:
"(...)
Em que pese as conclusões das perícias judiciais de que o autor não está incapacitado para o trabalho, o conjunto probatório indica que ele está incapacitado de forma total e permanente, sem condições de integrar qualquer processo de reabilitação profissional. Isso porque, é imprescindível considerar, além do estado de saúde, as condições pessoais do segurado, como a sua idade (53 anos), a presumível pouca instrução, a limitada experiência laborativa (servente de obras) e, por fim, a realidade do mercado de trabalho atual, já exíguo até para pessoas jovens e que estão em perfeitas condições de saúde. Nesse compasso, ordenar que o postulante, com tais limitações, recomponha sua vida profissional, negando-lhe o benefício no momento em que dele necessita, é contrariar o basilar princípio da dignidade da pessoa.
Destaco ainda que o autor esteve acometido por doenças oportunistas características da afecção de que sofre, o que demonstra que o moléstia não estava estabilizada, ao contrário da conclusão da perícia realizada por médica infectologista. Além disso, cabe destacar que, conforme o CNIS, o autor não possui vínculo laborativo desde 2010, o que dificulta ainda mais sua reintegração ao mercado de trabalho.
Ademais, a doença (AIDS) que lhe acomete traz consigo um estigma capaz de diminuir consideravelmente as suas condições de obter ou de manter um emprego formal, ainda mais considerando que tem 53 anos de idade.
Vejamos, por oportuno, as seguintes decisões deste TRF:
PREVIDENCIÁRIO. CONCESSÃO DE BENEFÍCIO. AUXÍLIO-DOENÇA. EMPREGADA DOMÉSTICA. PORTADORA DE HIV.
- Embora a perícia médica judicial tenha atestado a capacidade laborativa do segurado, não se pode afastar a idéia de que a AIDS traz consigo a marca tenebrosa da 'doença incurável'. E, submeter um doente de AIDS à volta forçada ao trabalho seria cometer contra ele uma violência injustificável. Na hipótese, faz jus a parte autora ao benefício de auxílio-doença.'
(AC 2000.71.05.005038-6, Quinta Turma, Relator p/ Acórdão Des. Federal Paulo Afonso Brum Vaz, DJ 18/06/2003)
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. HIV+ ASSINTOMÁTICO. CONSECTÁRIOS.
(...)
2. Ainda que em oposição ao laudo pericial, concede-se o benefício de aposentadoria por invalidez ao portador de HIV, mesmo sem apresentar sintomas, quando sua recolocação no mercado de trabalho mostrar-se improvável, considerando, para tal, a atividade anteriormente exercida e seu grau de escolaridade.
(...)
(AC 2005.70.00.000448-0, 6ª Turma, Relator Juiz Federal Ricardo Teixeira do Valle Pereira, publicado em 05/07/2006)
PREVIDENCIÁRIO. CONCESSÃO DE APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. AIDS. INCAPACIDADE COMPROVADA. TERMO INICIAL. CORREÇÃO MONETÁRIA. CUSTAS PROCESSUAIS. SÚMULA 02-TA/RS.
(...)
2. Ainda que a perícia médica judicial não ateste a incapacidade laborativa total do segurado portador do vírus da AIDS, submetê-lo à volta forçada ao trabalho é cometer, com ele, violência injustificável, ante à extrema dificuldade em virtude do preconceito sofrido.
(...)
(AC 2007.71.99.005742-1/RS, Turma Suplementar, Rel. Des. Federal Luís Alberto d'Azevedo Aurvalle, D.E. 03-04-2007)
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. ARTIGO 20 DA LEI N.º 8.742/93. RENDA MÍNIMA. CONSECTÁRIOS LEGAIS.
(...)
2. A infecção com vírus HIV traz consigo o estigma social, representado pela resistência de grande parte da sociedade em aceitar, com normalidade, o portador da doença.
3. Em respeito ao fundamento da República Federativa do Brasil, representado pela dignidade da pessoa humana (art. 1º, inc. III, CF), é gravame exacerbado exigir que portador do vírus HIV retorne ao trabalho, em face dos transtornos psicológicos trazidos pelo forte estigma social em relação à doença, aliado às suas condições pessoais.
(...)
(AC 2007.71.99.009672-4, Quinta Turma, Rel. Juiz Artur César de Souza, D.E. 23/03/2009)
Assim, entendo que restou demonstrado nos autos que a a parte demandante é portadora de moléstia que a incapacita total e permanentemente para o exercício de suas atividades laborativas, sem recursos pessoais capazes de garantir-lhe êxito em reabilitar-se e reinserir-se no mercado de trabalho, devendo ser reformada a decisão que para determinar a concessão de aposentadoria por invalidez desde o requerimento administrativo (25-05-11), com o pagamento dos valores atrasados, descontados os valores pagos na via administrativa a título de benefício assistencial.
No que tange ao agravo retido no qual a parte autora requer que a sentença seja anulada para a realização de perícia socioeconômica, entendo que, diante da concessão de aposentadoria por invalidez, tal recurso resta prejudicado."
Divergindo, a Des.ª Federal Salise Monteiro Sanchotene negou provimento ao agravo retido e à apelação, ao argumento de que a perícia referiu que não há incapacidade, no que foi acompanhada pela Des.ª Federal Vânia Hack de Almeira.
Tendo sido convocado a votar, nos termos do art. 942 do NCPC, pedi vista para melhor analisar o caso dos autos.
1) Ponto de partida: modelo integrado biomédico e social da capacidade, incapacidade e deficiência
Como ponto de partida, é necessário firmar que a análise da capacidade/incapacidade e deficiência, desencadeada pela invocação de qualquer moléstia, deve adotar uma perspectiva social, valendo-se do modelo biopsicossocial.
A compreensão da proteção constitucional social diante da incapacidade para o trabalho deve partir de uma interpretação sistemática do ordenamento jurídico. Em primeiro lugar, deve-se ter presente a dignidade humana (CR, art. 1º, III), os direitos fundamentais da liberdade e da igualdade (art. 5º, caput), os direitos fundamentais sociais à saúde, ao trabalho e à previdência social (art. 6º), o fundamento da ordem econômica na valorização do trabalho humano (art. 170), o primado do trabalho e os objetivos do bem-estar e justiça sociais da ordem social (art. 193) e à cobertura dos eventos de doença, invalidez e idade avançada (art. 201, I).
Arrolados os princípios pertinentes ao âmbito de proteção constitucional, o próximo passo é compreender o que é incapacidade enquanto categoria jurídica, para o que é imprescindível visualizá-la como fenômeno socialmente relevante que o direito destaca e juridiciza.
Do mesmo modo que outros elementos da vida social juridicizados, os diversos conceitos veiculados pelo direito referem-se a determinadas realidades, cuja nomeação possibilita não-só sua percepção, como também atua decisivamente em sua dinâmica no mundo das relações sociais juridicizadas. Nessa medida, ao lidar com conceitos o jurista não pode fazê-lo na fria assepsia da abstração alheia ao mundo, ambiente onde carne e ossos habitam, em especial quando se persegue o significado de incapacidade para a proteção constitucional previdenciária.
Com efeito, capacidade e incapacidade, eficiência e deficiência, segurança e risco, são binômios que só ganham sentido a partir dos corpos inseridos no mundo onde habitam. Mundo esse gestado pela relação complexa entre as diversas esferas da vida pessoal, corporal, psíquica, social, política, laboral e cultural, onde uma dimensão constrói a outra e é por ela simultaneamente construída. Não há, de fato, existência humana fora do tempo e do espaço socialmente construídos e vividos. Daí que saúde e doença, capacidade e incapacidade, eficiência e deficiência só possam ser corretamente compreendidos no tempo histórico, que é sempre e necessariamente social.
Postas essas premissas, tanto no quadro dos benefícios de incapacidade (auxílio-doença e aposentadoria por invalidez), quanto no benefício de prestação continuada em virtude de deficiência, não há como afastar-se do modelo integrado.
Benefícios por incapacidade
Com efeito, não há como interpretar os artigos 42 (um corpo humano concreto, historicamente "considerado incapaz e insuscetível de reabilitação para o exercício de atividade que lhe garanta a subsistência" - nas palavras da lei) e 59 da LBPS (um corpo humano concreto e histórico que "ficar incapacitado para o seu trabalho ou para sua atividade habitual" - igualmente na dicção legal) fora das coordenadas normativas constitucionais, fora da historicidade e da concretude.
Nesse quadro, não há conceituação juridicamente correta de incapacidade senão mediante a consideração conjunta da dimensão biomédica (aqui abrangendo também as avaliações psicológicas) e da dimensão social, uma vez que a falta de uma dessas dimensões inviabiliza no mundo concreto e na história onde tomam sentido e existência os conceitos e as realidades da saúde, da doença e da capacidade para o trabalho ou atividade habitual.
Com efeito, o debate sobre benefícios por incapacidade pode ser lido, dentre tantas formas, pelo destaque de alguns momentos: (1) a constatação dos limites estritamente biomédicos, (2) o desafio da fundamentação pela invocação de causas supralegais e (3) a invocação de analogia ou interpretação extensiva com o modelo constitucional da deficiência. Diante dessa evolução, aqui se sustenta, como fundamento jurídico para o reconhecimento do direito a benefícios relativos à incapacidade, um conceito juridicamente correto e adequado de incapacidade (4).
Em um primeiro momento, apercebeu-se a inadequação da compreensão da incapacidade, numa perspectiva estritamente biomédica, como "impossibilidade de desempenho de funções específicas de uma atividade ou ocupação, em consequência de alterações morfopsicofisiológicas, provocadas por doença ou acidente". Essa constatação levou à consideração de circunstâncias como idade e escolaridade do segurado (momento 2), denominadas nesse debate como "causas supralegais" (Rafael Machado de Oliveira, "Incapacidade biopsicossocial no Direito Previdenciário", disponível em http://www.egov.ufsc.br/portal/conteudo/incapacidade-biopsicossocial-no-direito-previdenci%C3%A1rio, 31/08/2016).
Diante disso, num terceiro momento, invocou-se interpretação extensiva, assim como do recurso à analogia, como fundamentos para alcançar circunstâncias sociais que, em acréscimo à avaliação biomédica, levem eventualmente à conclusão pela proteção previdenciária por incapacidade (João Augusto Câmara da Silveira, "O conceito de incapacidade no âmbito do benefício previdenciário da aposentadoria por invalidez", Revista Direito e Liberdade, disponível em http://www.esmarn.tjrn.jus.br/revistas/index.php/revista_direito_e_liberdade/article/viewFile/711/640, 31/08/2016).
Nesse sentido, a propósito, a elaboração doutrinária e jurisprudencial que, passo a passo, consolidam a noção de "invalidade social", atentando para as circunstâncias de cada caso (idade, tipo de incapacidade, escolaridade, profissão, potencial agravamento, possibilidade de tratamento, risco na permanência na atividade, dentre outros) e valendo-se inclusive em analogia à proteção jurídica da deficiência, terreno onde a chamada abordagem biopsicossocial é juridicamente expressa e obrigatória.
A argumentação que fundamenta este voto diferencia-se das posições acimas resumidas. Nelas, o elemento central para a constatação da incapacidade é o diagnóstico médico de doença ou acidente que impossibilita o exercício de atividade profissional. A dimensão social terá relevância e será considerada quando acrescer elementos em situações onde, "a priori", o diagnóstico biomédico, por si só, não gera convencimento pela incapacidade e, daí, a situação exige maior investigação.
Na compreensão do conceito de incapacidade ora proposta afirma-se que não há possibilidade de considerar que um diagnóstico biomédico, por si só, conclua pela incapacidade, sem qualquer consideração social, como se fosse possível imaginar que qualquer diagnóstico médico existisse fora de determinado contexto histórico, onde inclusive a própria noção do que é saúde e do que é doença é forjada. Essa dissociação entre a dimensão biomédica e a social é rejeitada na compreensão ora exposta, inviabilizando um método decisório onde haja duas etapas distintas e complementares. No modelo integrado das dimensões biomédica e social o juízo sobre a incapacidade não pode separar tais dimensões.
No modelo integrado da compreensão da incapacidade essa conclusão é resultante de uma avaliação onde as duas dimensões estão presentes, indissoluvelmente relacionadas. Isso porque o que seja "impossibilidade de desempenho" e até mesmo o que seja "doentio" não são definições médicas separadas do mundo social. É na vida em sociedade que se define o que é e quando há "impossibilidade de desempenho com conseqüente incapacidade de ganho" e o que é "doentio" ou "saudável".
Dois exemplos deixam isso bem claro: a biografia conhecida de Stephen Hawking e a história da homossexualidade.
Hawking é uma celebridade científica e até midiática mundial. Não somente graças à sua persistência, mas em especial pelo acesso a tratamento e equipamentos adequados, esse físico lecionou por anos e hoje é diretor de pesquisa em Departamento de Matemática Aplicada e Física Teórica da prestigiada Universidade de Cambridge, ostentando capacidade para a vida acadêmica profissional, com vasta produção contemporânea. Sua história é exemplo vivo de como a "impossibilidade de desempenho", mesmo diante de doença tão severa (esclerose lateral amiotrófica) não pode ser, por si só, dissociada do contexto social, conclusiva pela incapacidade. A dimensão social, portanto, é decisiva para avaliar a "impossibilidade para desempenho", elemento nuclear do conceito de incapacidade.
A homossexualidade, enquanto orientação sexual, até pouco tempo atrás, provocou diagnósticos onde a terapia era a internação compulsória (isso para não falar da insistência de alguns ainda hoje querem considerá-la doentia, ao ponto de defenderem recursos públicos para terapias de saúde "de conversão"). A mesma pessoa, com a mesma corporalidade e psiquismo, alguns anos atrás diagnosticada com grave distúrbio, estigmatizada até como ameaça à sociedadel hoje é considerada distante de qualquer patologia. A dimensão social, portanto, é decisiva não-somente para avaliar "a impossibilidade de desempenho", mas também para interpretar o outro elemento nuclear do conceito de incapacidade, qual seja, "impossibilidade de desempenho provocada por doença".
Assentar um modelo integrado de compreensão da incapacidade não significa colocar em questão todo e qualquer diagnóstico médico conclusivo e, tantas vezes na prática, indisputável quanto à incapacidade de alguém. Trata-se de explicitar que a evidência da incapacidade medicamente atestada de alguém totalmente imobilizado (por esclerose, por exemplo) produz-se porque está (corretamente) implícito que, em tais circunstâncias presumidas ou demonstradas, efetivamente tão elevado grau de imobilidade gera a situação, para aquele indivíduo, social e historicamente situado, de incapacidade como impossibilidade de desempenho para atividades que garantam a subsistência.
Expostos esses fundamentos, conclui-se que a correta interpretação das normas constitucionais e legais exige a concretização do conceito jurídico de incapacidade laboral como impossibilidade de desempenho de funções específicas de uma atividade ou ocupação, em consequência da interação entre doenças ou acidentes e barreiras presentes no contexto social, que resultam em impedimentos de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, comprometendo o sustento.
Acrescento mais alguns exemplos.
Hipótese nítida de aplicação do modelo integrado da incapacidade é a de mulher de idade avançada, com baixa escolaridade, impossibilitada fisicamente para serviços domésticos remunerados, em contexto social onde eventual tentativa de reabilitação ver-se-ia frustrada por crise no mercado de trabalho, associada ou não à carência de serviços públicos de educação. Como é fácil de ver, alegar que do ponto de vista médico tal segurada poderia desempenhar atividade escriturária seria desconhecer a abordagem biopsicossocial com prejuízo concreto e grave à segurada e frustração do dever constitucional de proteção social.
O mesmo se concluiria diante de alegação de capacidade para labor rural por segurada portadora de algumas limitações, à consideração de que as atividades rurais desempenhadas por mulheres são mais leves. O modelo social, ao revelar precisamente o contrário (a carga de trabalho rural feminino é mais pesada que a masculina), fornece conclusão oposta, vale dizer, pela presença de incapacidade.
O modelo integrado, ademais, abre espaço para concluir pela incapacidade em hipótese onde, apesar de parecer biomédico atestar taxativamente pela capacidade atual de segurado, as condições sociais concretas e disponíveis em que desempenha sua função acarretem, de modo previsível e plausível, dano efetivo à saúde, considerando o seu estado atual e as barreiras que enfrenta.
Por outro lado, o modelo social abre espaço para concluir pela capacidade para o trabalho sempre que, não obstante alguma limitação, o indivíduo tiver à sua disposição meios socialmente acessíveis, que lhe permitam desempenhar adequadamente e sem prejuízo à saúde as funções atinentes à sua ocupação.
Benefício de prestação continuada a pessoas com deficiência
Na mesma linha, a compreensão jurídica vigente da deficiência, tanto na Lei Orgânica da Assistência Social (Lei n. 8.472/1993, com a redação da Lei nº 12.435/2011), como na Lei nº 13.146/2015 (Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência - Estatuto da Pessoa com Deficiência), quanto na Lei Complementar nº 142/2013 (sobre a aposentadoria da pessoa com deficiência segurada no RGPS), adotam essa abordagem biopsicossocial, cujo fundamento maior se encontra na Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, incorporada ao direito brasileiro com estatura constitucional.
Tanto num quadro (benefícios por incapacidade), quanto no outro (benefício de prestação continuada), isso implica adotar a compreensão desenvolvida na Classificação Internacional de Funcionalidade, Incapacidade e Saúde (CIF), cujos termos incorporam os diversos elementos considerados pelo modelo integrado biopsicossocial, que abrange considerações biomédicas e sociais.
No quadro da CIF, reconhecida mundialmente como instrumento adequado para o desenvolvimento da legislação internacional e nacional em matéria de direitos sociais (ORGANIZAÇÃO PANAMERICANA DE SAÚDE E ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DA SAÚDE, "CIF: CLASSIFICAÇÃO INTERNACIONAL DE FUNCIONALIDADE, INCAPACIDADE E SÁUDE", São Paulo: Editora USP, 2008, p. 17), englobam-se os componentes relevantes para a saúde relacionados ao bem-etar em termos de domínios de saúde e de domínios relacionados à saúde, sendo esta efetivamente aplicável a todas as pessoas. Ela fornece uma descrição de situações relacionadas às funções do ser humano e suas restrições, de maneira integrada e acessível (p. 18).
Para o caso em apreço, onde se discutem restrições relacionadas à sorologia positiva para HIV, importa mencionar que são relevantes, no contexto da saúde, as funções dos corpos (funções fisiológicas dos sistemas orgânicos) e as estruturas dos corpos (partes anatômicas do corpo como órgãos, membros e componentes). Neste quadro definitório, deficiências são problemas nas funções ou nas estruturas do corpo como um desvio significativo ou uma perda (p. 21), desvio significativo este em face dos padrões populacionais geralmente aceitos no estado biomédico do corpo e de suas funções (p. 23).
Em situações envolvendo tal sorologia positiva, há sim, portanto, que se perquirir acerca da presença de deficiência em virtude de problemas nas funções corporais (em especial, nas funções do sistema imunológico), que podem inflingir ao indivíduo, nos termos da CIF, tanto limitações de atividade, quanto restrições de participação. Limitações de atividade são, nos termos da CIF, "dificuldades que um indivíduo pode encontrar na execução de atividades" e restrições de participação, por sua vez, são "problemas que um indivíduo pode enfrentar ao se envolver em situações de vida" (p. 21).
2) Benefício por incapacidade e benefício de prestação continuada a pessoa vivendo com HIV/AIDS: a assintomatologia, por si só, não define o reconhecimento ou não do direito
No modelo biopsicossocial, a avaliação biomédica que registra assintomatologia em segurado vivendo com HIV/AIDS, não tem como ignorar o preconceito e a discriminação presentes na vida em sociedade. Na mesma linha, não se pode apagar outras circunstâncias eventalmente presentes. A questão é verificar, no caso concreto, quais as possibilidades e os impedimentos que o indivíduo experimenta na vida em sociedade, que podem resultar em redução total ou parcial de capacidade para exercício de atividade laboral remunerada, como também impliquem restrição de participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições.
Logo, há direito a benefício por incapacidade para pessoa vivendo com HIV, assintomática para AIDS, se o preconceito e a discriminação, associados a outros fatores, impedirem ou reduzirem o exercício de atividade laboral remunerada, como também ao benefício de prestação continuada, se este conjunto de fatores obstruir a participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de oportunidades.
Desse modo, não se trata de estabelecer uma relação direta entre sorologia positiva para HIV, ainda que sem sintomas, incapacidade laboral decorrente de estigma ou impedimento de longo prazo que, em interação com barreiras, obstrui participação igualitária na vida social. No mesmo diapasão, estar-se-ia incorrendo em equívoco simplesmente afirmando que, em si mesma, a ausência de sintomas relacionados ao HIV seja garantia de capacidade laboral ou de participação igualitária às pessoas vivendo com HIV/AIDS.
3) A epidemia de HIV/AIDS e modelo biopsicossocial no contexto brasileiro
Há vários elementos a serem considerados, portanto, na aplicação do modelo biopsicossocial para a avaliação da incapacidade laboral em matéria de benefícios previdenciários. No caso da epidemia de HIV/AIDS no Brasil, a enumeração de cada um deles e sua ponderação requer cuidado e humildade, dada a complexidade histórica de cada um e a multicausalidade fatorial inafastável para um juízo positivo ou negativo de capacidade laboral.
Nesse esforço, do exame da literatura científica e da atenção às experiências de indivíduos e grupos vivendo com HIV/AIDS, destaco o histórico das respostas brasileiras diante da epidemia e os processos de estigmatização.
Com efeito, é decisivo ter um panorama das respostas brasileiras diante da epidemia do HIV/AIDS. Isso porque é nesse contexto em que pessoas assintomáticas se inserem nos dias de hoje, momento cuja atualidade e compreensão não se produzem no vazio histórico.
Conforme indica a literatura especializada, podem ser arroladas 4 fases nessa trajetória. A primeira fase (1982-1983), desencadeada a partir dos primeiros casos, registrou o surgimento dos primeiros programas (no Estado de São Paulo) e organizações não-governamentais (GAPA - Grupo de Apoio e Prevenção à AIDS e ABIA - Associação Brasileira Interdisciplinar de AIDS); ela foi marcada por ampla negação estatal e onde de pânico moral, medo, estigma e discriminação, em especial por líderes religiosos. A segunda fase (1986-1990) tem seu início marcado pelo Programa Nacional de AIDS, com abordagem mais pragmática e técnica, com o surgimento de ONGs (GAPAs) pelo país. Com elas, cresceu a pressão por respostas mais solidárias e comunitárias (destacou-se a liderança de Herbert Daniel), baseadas em compromissos éticos e políticos, não restritas à abordagem tecnocrática. De 1990 a 1992, a terceira fase foi bastante turbulenta, surgindo um distanciamento entre a atividade estatal e a sociedade, caracterizando praticamente um antagonismo (administração Collor de Mello). A quarta fase (1992 a 1996), retomou o rumo de respostas colaborativas entre sociedade e Estado, contando inclusive com financiamento internacional. Todos esses momentos revelam, não por acaso, correspondência entre os desenvolvimentos da história política nacional e as respostas à epidemia (Richard Parker, "Construindo os alicerces para a resposta ao HIV/AIDS no Brasil: o desenvolvimento de políticas sobre o HIV/AIDS, 1982-1996", In: "Divulgação em Saúde para Debate", Rio de Janeiro: CEBES/ABIA/Mailman School of Public Health - Columbia University, n. 27, ago. 2003, p. 8-49).
Em 1996, é promulgada a Lei Federal nº 9.313, marco histórico para o acesso a antirretrovirais, estabelecendo acesso universal, inaugurando experiência mundialmente reconhecida de modo positivo. Esse avanço, todavia, começa a ser desafiado a partir dos anos 2000, em decorrência de pressões vindas de detentores internacionais de patentes farmacêuticas, cujo direito de propriedade comercial passa a ser tensionado por perspectivas de direitos humanos e do direito à saúde, resultando na Declaração de Doha sobre TRIPS e Saúde Pública, onde se admitiu o licenciamento compulsório para produção de medicamentos diante da epidemia.
No entanto, internamente, as respostas brasileiras verificaram fragilização desde 2006, em especial quanto à atenção primária em HIV/AIDS e ao apoio a iniciativas da sociedade civil, como registra Sonia Corrêa ("A resposta brasileira ao HIV e à AIDS em tempos tormentosos e incertos", In: "Mito vs Realidade: sobre a resposta brasileira à epidemia de HIV E AIDS em 2016", Rio de Janeiro: ABIA, 2016, p. 7-16).
Como registram Fernando Seffner e Richard Parker ("A neoliberalização da prevenção do HIV e a resposta brasileira à AIDS", In: "Mito vs Realidade: sobre a resposta brasileira à epidemia de HIV E AIDS em 2016", Rio de Janeiro: ABIA, 2016, p. 22-30), de 2003 a 2010, as respostas produziram-se no intrincado contexto em que lideranças da sociedade civil se integraram na máquina administrativa, com perda progessiva de autonomia da ONGs, que passaram a ser vistas mais como executoras de ações determinadas pelas políticas públicas, em apoio ao Estado.
Disputas comerciais, inclusive junto à OMC, colocaram então o desafio sanitário nacional da incorporação de medicamentos, marcando a trajetória das respostas à epidemia durante toda a década de 2010. Nesse período, o que predominou foram a opacidade, o conservadorismo e o tecnicismo em face da epidemia, fragilizando-se abordagens mais amplos, que envolveriam a promoção de direitos humanos, tanto na área da saúde, quanto em geral (Veriano Terto Jr., Felipe Carvalho, Pedro Villardi e Marcela Vieira, "A luta continua: avanços e retrocessos no acesso aos antirretrovirais no Brasil", In: "Mito vs Realidade: sobre a resposta brasileira à epidemia de HIV E AIDS em 2016", Rio de Janeiro: ABIA, 2016, p. 37 e seguintes).
Por fim, nesse rapidíssimo escorço histórico, os tempos atuais nas respostas à epidemia revelam o recrudescimento de forças conservadoras e disseminadoras de antigos estereótipos altamente negativos, bloqueando não somente medidas de prevenção e informação, como também a incorporação de novas alternativas sanitárias. O resultado disso é a tendência, verificada nos últimos anos, de reversão de redução e de crescimento da epidemia. Como alerta Alexandre Granjeiro, há indícios de que a epidemia está reemergindo e tende a atingir patamares mais elevados do que os observados nos últimos 30 anos ("Da estabilização à reemergência: os desafios para o enfrentamento da epidemia de HIV/AIDS no Brasil", In: "Mito vs Realidade: sobre a resposta brasileira à epidemia de HIV E AIDS em 2016", Rio de Janeiro: ABIA, 2016, p. 16-22).
A reemergência da epidemia, acompanhada da fragilização da participação da sociedade civil e das dificuldades enfrentadas pelo SUS, acrescida do recrudescimento de forças conservadoras e dissonantes do paradigma dos direitos humanos de soropositivos, alimentam significativamente os processos sociais de estigmatização de pessoas vivendo com HIV/AIDS, sejam assintomáticas ou não.
Essas as constatações da literatura especializada (Francisco Inácio Bastos, "Da persistência das metáforas: estigma e discriminação e HIV/AIDS", In: "Estigma e Saúde", org. Simone Monteiro e Wilza Villela, Rio de Janeiro: Fiocruz, 2013, p. 91-104), que registra especialmente como os processos de discriminação e estigma resultam de interações e dinâmicas sociais que articulam marcadores sociais de desigualdades, como classe, gênero, cor/raça/etnia, entre outros, além das características individuais dos sujeitos (Simone Monteiro, Wilza Villela, Carla Pereira e Priscilla Soares, "A produção acadêmica recente sobre estigma, discriminação, saúde e AIDS no Brasil", In: "Estigma e Saúde", org. Simone Monteiro e Wilza Villela, Rio de Janeiro: Fiocruz, 2013 p. 62).
De fato, como ensina Veriano Terto Jr. ("La seropositividad AL VIH como identidad social y política en el Brasil", In: "Ciudadanía Sexual en América Latina: abriendo el debate", org. Carlos Cáceres e outros. Lima: Universidad Peruana Cayetano Heredia, 2004, p. 305-310), a epidemia reconceitualizou uma série de identidades sociais, dentre as quais a da pessoa soropositiva, passando a ser visto não somente como enfermo ou paciente, mas como sujeito que atua individual e coletivamente em face de vários contextos sociais e políticos.
Esses contextos são decisivos para as experiências e as respostas, que num ambiente de preconceito e discriminação foram inclusive percebidos como situações de morte civil (Herbert Daniel, "Vida antes da morte", RJ: Tipografia Jabuti, 1989). Tanto que, conforme apontam os estudos culturais, o soropositivo é assimilado mesmo à figura do monstro perigoso (e homossexual), como alerta Jeffrey Jerome Cohen ("A cultura dos monstros: sete teses", in: "Pedagogia dos monstros - os prazeres e os perigos da confusão de fronteiras / Jeffrey Jerome Cohen ; tradução de Tomaz Tadeu da Silva --- Belo Horizonte: Autêntica, 2000, p. 29):
"Tese: o monstro sempre escapa (soropositivo como perigoso) Bram Stoker's Dracula, de Francis Coppola, o subtexto homossexual presente desde a aparição da lésbica Lamia, de Sheridan Le Fanu (Carmilla, 1872), tal como os corpúsculos vermelhos que servem como o leitmotif do filme, sobe à superfície, primariamente como consciência da AIDS, transformando a doença do vampirismo em uma forma sádica (e muito medieval) de redenção por meio dos tormentos do corpo que sofre. Nenhuma coincidência, pois, que Coppola estivesse produzindo um documentário sobre a AIDS ao mesmo tempo em que ele estava trabalhando no Drácula."
4) A proteção previdenciária e o "dilema antidiscriminatório"
Um dado importante a ser considerado na decisão quanto à incapacidade laboral de pessoas assintomáticas vivendo com HIV/AIDS diz respeito às consequências da concessão de eventual benefício.
De fato, reconhecer o direito ao benefício pode ser uma necessidade diante de um risco social concreto e efetivo, eliminando ou ao menos reduzindo violações à vida digna do beneficiário. Ao mesmo tempo, pode alimentar processos sociais de estigmatização do indivíduo, seja pela identificação do beneficiário a um grupo discriminado, seja até mesmo por apartá-lo de certos ambientes sociais laborais, com potencial de integração e de colaboração sociais. Isso sem falar na violência simbólica e da injúria que podem resultar da combinação de estereótipos negativos contra beneficiários de direitos sociais ("vagabundos"; "pesos mortos para a sociedade") e preconceitos contra pessoas vivendo com HIV/AIDS ("seres perigosos" e degenerados por sua perversão e luxúria).
Em termos de políticas públicas e formulações jurídicas, estas possibilidades alertam para o chamado "dilema da diferença" (MINOW, Martha. Making All the Difference: Inclusion, Exclusion, and American Law Ithaca: Cornell University Press, 1990), que pode ser expresso em três versões e traduzido para a hipótese considerada em três versões:
a) primeira versão: a diferença pode ser recriada ao ser registrada ou ao ser ignorada (deferimento do benefício funcionando como marcador social de diferença sorológica ensejadora de discriminação);
b) segunda versão: a ambigüidade da neutralidade (indeferimento do benefício como desconsideração complacente com a discriminação vivida por sorologia);
c) terceira versão: a tomada de decisões baseadas em critérios formais, rígidos e universais (todo portador de HIV tem sempre direito ao benefício, independente de sintomatologia OU o portador assintomático, a princípio, não tem direito ao benefício) ou a abertura para decisões individualizadas, com maior grau de concretização.
Trata-se de três versões do mesmo fenômeno. Ao destacar-se a diferença para proteger contra discriminação, pode-se engendrar mais preconceito e discriminação (primeira versão; sobre esse ponto, ver HALLEY, Janet. The Politics of the Closet: legal articulation of sexual orientation identity. In: ENGLE, Karen (org.); DANIELSEN, Dan. After Identity. New York: Routledge, 1995). Permanecer inerte diante de uma realidade de discriminação, sob a ambiguidade da neutralidade, pode conduzir à cumplicidade discriminatória (segunda versão). A terceira versão do dilema acumula os riscos insítos às duas primeiras formulações: confiar em regras universais, formais e rígidas, tentando evitar mais diferenciação e preconceito, quedando-se neutro, ou permitir margens cada vez maiores de liberdade de decisão diante de cada caso, tentando afastar o perigo da cumplicidade com a discriminação, com o risco de alimentar o dilema em sua primeira versão.
Diante deste quadro, como desenvolver e aplicar a legislação previdenciária, em se tratando de condição assintomática de pessoa vivendo com HIV/AIDS?
Um caminho para evitar esse impasse envolve três passos, na esteira da referida Martha Minow ('Justice Engendered' Harvard Law Review - The Supreme Court, 1986 Term, nov. 1987): (a) considerar os pontos de vista que produzem a diferença; (b) avaliar as circunstâncias suspeitas de discriminação e (c) levar a sério as diferentes perspectivas.
Nessa trilha, o primeiro passo exige atentar que: (1) a diferença não é algo intrínseco, mas sempre relacional, socialmente construída (por mais que a sorologia positiva para HIV seja um diagnóstico biomédico e que a assintomatologia também, distinguir e discriminar indivíduos por tal condição é uma construção social relacional); (2) sempre existe um paradigma pressuposto quando se qualifica algo ou alguém como 'diferente', sendo necessário, portanto, explicitá-lo e discuti-lo (o indivíduo soronegativo, obviamente sem qualquer sintoma, torna-se o paradigma de comparação produtor do diferente); (3) na produção da diferença, tal paradigma representa somente um dos pontos de vista possíveis, devendo-se considerar outros pontos de vista (há que se considerar o ponto de vista, a experiência do soropositivo assintomático quanto à inserção laboral); (4) via de regra, toma-se o status quo como algo natural, espontâneo e legítimo, donde a corriqueira confusão entre inação e neutralidade e medidas corretivas e favorecimento ou privilégio.
O segundo passo requer levar a sério as circunstâncias suspeitas de discriminação (no caso, a presença de discriminação no mercado de trabalho contra pessoas vivendo com HIV) levando em consideração o maior número possível de perspectivas e relativizando os paradigmas assentes, fazendo com que um maior número de alternativas se apresente. Deste procedimento, por si só, não brotam soluções acabadas; todavia, ele permite que algumas discriminações antes desapercebidas se tornem visíveis e alerta contra preconceitos antes inquestionados, desapercebidos ou menosprezados contra "os diferentes".
O terceiro e derradeiro passo amplia alternativas e respostas em face da abertura apresentada por essas perspectivas. Tudo, é claro, sem resvalar da aceitação da diversidade para uma atitude de "mútua indiferença", dominada pela passividade, que se manifesta pela omissão, pelo refúgio em modelos e categorias cristalizadas ou pela simples negação da realidade discriminatória. Este procedimento, considerado como um todo, torna a dinâmica do direito da antidiscriminação e do direito previdenciário mais apta a responder às intrincadas questões sobre igualdade e discriminação, evitando, na medida do possível, efeitos negativos do "dilema da diferença".
Na hipótese sob julgamento, tomar os cuidados que esse percurso propicia implica superar a naturalização do paradigma de comparação (soronegativo obviamente sem sintomas para HIV/AIDS) em face do "diferente" (soropositivo assintomático (primeiro passo); atentar para possíveis circunstâncias diversas daquelas vividas pelo paradigma de comparação (presença de discriminação no mercado de trabalho contra pessoas vivendo com HIV, independente de sintomatologia); por fim, ampliar o leque de respostas possíveis, uma vez informada a percepção pela perspectiva do "diferente" (eventual direito ao benefício, ainda que assintomático, dependendo do contexto).
Vale dizer, a mera invocação da assintomatologia de pessoas vivendo com HIV/AIDS é inadequada e insuficiente para fazer concluir necessariamente pelo indeferimento do benefício, assim como da pura menção quanto à existência de processos sociais de estigmatização não decorre imediatamente o direito ao benefício.
Assim se conclui não-somente em atenção ao modelo biopsicossocial da incapacidade e da deficiência, como também pela consciência do "dilema antidiscriminatório" que se apresenta caso a caso.
5. Análise do caso concreto
Retomando o acima aduzido, conclui-se que a correta interpretação das normas constitucionais e legais exige a concretização do conceito jurídico de incapacidade laboral como impossibilidade de desempenho de funções específicas de uma atividade ou ocupação, em consequência da interação entre doenças ou acidentes e barreiras presentes no contexto social, que resultam em impedimentos de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, comprometendo o sustento.
Desse modo, não se trata de estabelecer uma relação direta entre sorologia positiva para HIV, ainda que sem sintomas, incapacidade laboral decorrente de estigma ou impedimento de longo prazo que, em interação com barreiras, obstrui participação igualitária na vida social. No mesmo diapasão, estar-se-ia incorrendo em equívoco simplesmente afirmando que, em si mesma, a ausência de sintomas relacionados ao HIV seja garantia de capacidade laboral ou de participação igualitária às pessoas vivendo com HIV/AIDS.
No caso concreto, o relator bem ponderou:
"Em que pesem as conclusões das perícias judiciais de que o autor não está incapacitado para o trabalho, o conjunto probatório indica que ele está incapacitado de forma total e permanente, sem condições de integrar qualquer processo de reabilitação profissional. Isso porque, é imprescindível considerar, além do estado de saúde, as condições pessoais do segurado, como a sua idade (53 anos), a presumível pouca instrução, a limitada experiência laborativa (servente de obras) e, por fim, a realidade do mercado de trabalho atual, já exíguo até para pessoas jovens e que estão em perfeitas condições de saúde. Nesse compasso, ordenar que o postulante, com tais limitações, recomponha sua vida profissional, negando-lhe o benefício no momento em que dele necessita, é contrariar o basilar princípio da dignidade da pessoa.
Destaco ainda que o autor esteve acometido por doenças oportunistas características da afecção de que sofre, o que demonstra que o moléstia não estava estabilizada, ao contrário da conclusão da perícia realizada por médica infectologista. Além disso, cabe destacar que, conforme o CNIS, o autor não possui vínculo laborativo desde 2010, o que dificulta ainda mais sua reintegração ao mercado de trabalho.
Ademais, a doença (AIDS) que lhe acomete traz consigo um estigma capaz de diminuir consideravelmente as suas condições de obter ou de manter um emprego formal, ainda mais considerando que tem 53 anos de idade.
Diante deste quadro, está presente o contexto em que a situação de vida do autor experimenta incapacidade laboral, compreendida na riqueza do modelo biopsicossocial, pelo que peço vênia à divergência e acompanho o voto relator.
Ante o exposto, voto por dar provimento parcial à apelação e determinar a implantação do benefício, restando prejudicado o agravo retido.
Des. Federal ROGER RAUPP RIOS
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 5008463-27.2011.4.04.7107/RS
RELATOR | : | JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA |
APELANTE | : | OSCAR LAMAISON OLIVEIRA DE LIMA |
ADVOGADO | : | ELIANE PATRICIA BOFF |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
VOTO-VISTA
Pedi vista dos autos para melhor apreciar a questão e, após analisar o feito, resolvo acompanhar o eminente Relator, com a vênia da divergência.
Ante o exposto, voto por dar parcial provimento à apelação e determinar a implantação do benefício, restando prejudicado o agravo retido.
Juíza Federal Convocada ANA PAULA DE BORTOLI
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 20/07/2016
APELAÇÃO CÍVEL Nº 5008463-27.2011.4.04.7107/RS
ORIGEM: RS 50084632720114047107
RELATOR | : | Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA |
PRESIDENTE | : | Desembargadora Federal Vânia Hack de Almeida |
APELANTE | : | OSCAR LAMAISON OLIVEIRA DE LIMA |
ADVOGADO | : | ELIANE PATRICIA BOFF |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 20/07/2016, na seqüência 754, disponibilizada no DE de 05/07/2016, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 6ª TURMA, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
ADIADO O JULGAMENTO.
Elisabeth Thomaz
Diretora Substituta de Secretaria
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 27/07/2016
APELAÇÃO CÍVEL Nº 5008463-27.2011.4.04.7107/RS
ORIGEM: RS 50084632720114047107
RELATOR | : | Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA |
PRESIDENTE | : | Desembargadora Federal Vânia Hack de Almeida |
PROCURADOR | : | Procurador Regional da República Cláudio Dutra Fontela |
APELANTE | : | OSCAR LAMAISON OLIVEIRA DE LIMA |
ADVOGADO | : | ELIANE PATRICIA BOFF |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
Certifico que o(a) 6ª TURMA, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
RETIRAR DE PAUTA.
Gilberto Flores do Nascimento
Diretor de Secretaria
MANIFESTAÇÕES DOS MAGISTRADOS VOTANTES
Processo Apresentado em Mesa
Certidão de Julgamento
Data da Sessão de Julgamento: 20/07/2016 (ST6)
Relator: Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA
ADIADO O JULGAMENTO.
Divergência em 26/07/2016 10:45:27 (Gab. Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE)
Voto em 27/07/2016 12:27:02 (Gab. Des. Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ)
O Relator, Des. Federal João Batista Pinto Silveira, dá parcial provimento à apelação da parte autora (requerimento de auxílio doença/aposentadoria por invalidez) nos seguintes termos: "Durante a instrução processual, foram realizadas duas perícias judiciais. A primeira por médica infectologista, em 20-03-11 (E29 - LAUDO1, E64 - LAUDPERI1, E78 - LAUDPERI1 e E134 - LAUDPERI1) e a segunda por médica psiquiatra, em 28-02-14 (E122 - LAU1), das quais se extraem as seguintes informações sobre o quadro clínico da parte autora:a) enfermidade: diz a perita infectologista que o Autor apresenta, segundo laudos médicos em anexo ao processo, Síndrome da Imundeficiência Adquirida (CID B24), Hipertensão arterial (CID I10) e Insuficiência Cardíaca Congestiva (I50); a perita psiquiatra diz que A parte apresenta alguma sintomatologia sugestiva de patologia CID X F 41.2 - Transtorno misto depressivo ansioso;b) incapacidade laborativa: responde a perita infectologista que Em todos os documentos relacionados aos eventos supracitados, não foi evidenciado nenhum momento de incapacidade laboral, após 11.03.2009, por doença infecciosa. Não há dados nesses documentos sobre internação hospitalar no período; responde a perita psiquiatra que Atualmente, sob o aspecto psiquiátrico não se constata na parte autora sintomatologia, gravidade ou comprometimento incapacitante. Não se caracteriza incapacidade laborativa por motivos psiquiátricos.Dos autos extraem-se outras informações sobre a parte autora (E1, E27, E53, E75):a) idade: 53 anos (nascimento em 25-08-62);b) profissão: servente de obras;c) histórico de benefícios: requereu auxílio-doença em 05-08-08, 17-02-09 e 25-05-11, indeferidos em razão de não comparecimento à perícia médica e de parecer contrário da perícia médica; requereu amparo social à pessoa portadora de deficiência em 24-11-14, indeferido em razão de não preenchimento do requisito de impedimentos de longo prazo; ajuizou a presente demanda em 30-08-11; está em gozo de amparo social à pessoa portadora de deficiência, concedido administrativamente, deste 24-06-15;d) ficha do Sistema de Informação de Agravos de Notificação, de 05-05-08, em que consta que o autor esteve acometido por tuberculose, diagnosticada em 28-09-07; exame de quantificação de carga viral de HIV-1 de 14-03-13; exame de sangue de 11-03-13;e) atestado de 17-03-03, em que consta que o autor esteve acometido por moléstia correspondente ao CID 10 A15, tendo feito o tratamento proposto; atestado de 16-11-10, em que consta que o autor estava acometido por SIDA, hipertensão arterial e insuficiência cardíaca congestiva, correspondentes aos CID 10 B24, I10 e I50.0; atestado de 18-10-10, cujo diagnóstico foi de cardiopatia hipertensiva e insuficiência cardíaca, correspondente ao CID 10 B24; idem o de 13-06-11; atestado de 22-03-11, em que consta que o autor estava acometido pelas moléstias correspondentes aos CID 10 B24, I10 e I50.0; atestado de 09-04-13, em que consta que o autor estava acometido por SIDA, quadro depressivo e dependência química (CID 10 B24, F32 e F10.2).Diante de tal quadro, a ação foi julgada improcedente, por não ter restado comprovada a incapacidade para o trabalho. Todavia, entendo que a sentença merece reforma.Em que pese as conclusões das perícias judiciais de que o autor não está incapacitado para o trabalho, o conjunto probatório indica que ele está incapacitado de forma total e permanente, sem condições de integrar qualquer processo de reabilitação profissional. Isso porque, é imprescindível considerar, além do estado de saúde, as condições pessoais do segurado, como a sua idade (53 anos), a presumível pouca instrução, a limitada experiência laborativa (servente de obras) e, por fim, a realidade do mercado de trabalho atual, já exíguo até para pessoas jovens e que estão em perfeitas condições de saúde. Nesse compasso, ordenar que o postulante, com tais limitações, recomponha sua vida profissional, negando-lhe o benefício no momento em que dele necessita, é contrariar o basilar princípio da dignidade da pessoa.Destaco ainda que o autor esteve acometido por doenças oportunistas características da afecção de que sofre, o que demonstra que o moléstia não estava estabilizada, ao contrário da conclusão da perícia realizada por médica infectologista. Além disso, cabe destacar que, conforme o CNIS, o autor não possui vínculo laborativo desde 2010, o que dificulta ainda mais sua reintegração ao mercado de trabalho.Ademais, a doença (AIDS) que lhe acomete traz consigo um estigma capaz de diminuir consideravelmente as suas condições de obter ou de manter um emprego formal, ainda mais considerando que tem 53 anos de idade."Há divergência da Dra. Salise, verbis: "No caso dos autos, foram juntados atestados médicos datados nos anos de 2003, 2010 e 2011 (e. 1, ATESTMED6, e. 27, ATESTMED4, e. 75, ATESTMED1), os quais apontam as doenças referidas pelas perícias judiciais, sem constatar, entretanto, incapacidade laborativa em virtude de tais patologias no período pretendido pela parte autora. Depreende-se de tais documentos, inclusive, que a parte autora se encontra em acompanhamento médico e realizando o tratamento adequado em virtude das enfermidades das quais sofre.Percebe-se, dessa forma, que embora ao autor seja portador de síndrome de imunodeficiência adquirida, o seu quadro, no período em questão, é assintomático. O fato de o requerente ser portador do vírus, por si só, não enseja a concessão do benefício por incapacidade ora pleiteado."com a venia da divergência, acompanho o relator.
Voto em 27/07/2016 13:26:16 (Gab. Des. Federal ROGER RAUPP RIOS)
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 21/09/2016
APELAÇÃO CÍVEL Nº 5008463-27.2011.4.04.7107/RS
ORIGEM: RS 50084632720114047107
RELATOR | : | Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA |
PRESIDENTE | : | Desembargadora Federal Vânia Hack de Almeida |
PROCURADOR | : | Procurador Regional da República Alexandre Amaral Gavronski |
APELANTE | : | OSCAR LAMAISON OLIVEIRA DE LIMA |
ADVOGADO | : | ELIANE PATRICIA BOFF |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 21/09/2016, na seqüência 542, disponibilizada no DE de 02/09/2016, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 6ª TURMA, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
APÓS O VOTO DO RELATOR, PARA DAR PARCIAL PROVIMENTO À APELAÇÃO E DETERMINAR A IMPLANTAÇÃO DO BENEFÍCIO, RESTANDO PREJUDICADO O AGRAVO RETIDO, DO VOTO DIVERGENTE APRESENTADO PELA DESEMBARGADORA FEDERAL SALISE MONTEIRO SANCHOTENE, NEGANDO PROVIMENTO AO AGRAVO RETIDO E À APELAÇÃO DA PARTE AUTORA, E DO VOTO DA DESEMBARGADORA FEDERAL VÂNIA HACK DE ALMEIDA, ACOMPANHANDO A DIVERGÊNCIA, O JULGAMENTO FOI SOBRESTADO NOS TERMOS DO ART. 942 DO CPC/2015, FICANDO AS PARTES DESDE JÁ INTIMADAS, INCLUSIVE PARA O FIM DE EVENTUAL PEDIDO DE SUSTENTAÇÃO ORAL, DO PROSSEGUIMENTO DO JULGAMENTO, QUE SE DARÁ NA SESSÃO DESTA 6ª TURMA DO DIA 28/09/16.
VOTANTE(S) | : | Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA |
: | Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA | |
: | Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE |
Gilberto Flores do Nascimento
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 28/09/2016
APELAÇÃO CÍVEL Nº 5008463-27.2011.4.04.7107/RS
ORIGEM: RS 50084632720114047107
RELATOR | : | Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA |
PRESIDENTE | : | Desembargadora Federal Vânia Hack de Almeida |
PROCURADOR | : | Procurador Regional da República Marcus Vinícius de Aguiar Macedo |
APELANTE | : | OSCAR LAMAISON OLIVEIRA DE LIMA |
ADVOGADO | : | ELIANE PATRICIA BOFF |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
Certifico que o(a) 6ª TURMA, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
PROSSEGUINDO NO JULGAMENTO, APÓS O VOTO APRESENTADO PELA JUÍZA FEDERAL ANA PAULA DE BORTOLI , ACOMPANHANDO A DIVERGÊNCIA, PEDIU VISTA O DESEMBARGADOR FEDERAL ROGER RAUPP RIOS.
PEDIDO DE VISTA | : | Des. Federal ROGER RAUPP RIOS |
VOTANTE(S) | : | Juíza Federal ANA PAULA DE BORTOLI |
Gilberto Flores do Nascimento
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 26/10/2016
APELAÇÃO CÍVEL Nº 5008463-27.2011.4.04.7107/RS
ORIGEM: RS 50084632720114047107
RELATOR | : | Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA |
PRESIDENTE | : | Desembargadora Federal Vânia Hack de Almeida |
PROCURADOR | : | Procuradora Regional da República Adriana Zawada Melo |
APELANTE | : | OSCAR LAMAISON OLIVEIRA DE LIMA |
ADVOGADO | : | ELIANE PATRICIA BOFF |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 26/10/2016, na seqüência 565, disponibilizada no DE de 10/10/2016, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 6ª TURMA, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
PROSSEGUINDO NO JULGAMENTO, APÓS O VOTO-VISTA APRESENTADO PELO DESEMBARGADOR FEDERAL ROGER RAUPP RIOS, ACOMPANHANDO O RELATOR, PEDIU VISTA A JUIZA FEDERAL ANA PAULA DE BORTOLI. JULGAMENTO REALIZADO NA FORMA DO ART. 942 DO CPC/15.
VOTO VISTA | : | Des. Federal ROGER RAUPP RIOS |
PEDIDO DE VISTA | : | Juíza Federal ANA PAULA DE BORTOLI |
Gilberto Flores do Nascimento
Diretor de Secretaria
| Documento eletrônico assinado por Gilberto Flores do Nascimento, Diretor de Secretaria, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8680597v1 e, se solicitado, do código CRC 6BAD6B38. | |
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 09/11/2016
APELAÇÃO CÍVEL Nº 5008463-27.2011.4.04.7107/RS
ORIGEM: RS 50084632720114047107
RELATOR | : | Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA |
PRESIDENTE | : | Desembargadora Federal Vânia Hack de Almeida |
PROCURADOR | : | Procurador Regional da República Paulo Gilberto Cogo Leivas |
APELANTE | : | OSCAR LAMAISON OLIVEIRA DE LIMA |
ADVOGADO | : | ELIANE PATRICIA BOFF |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
Certifico que o(a) 6ª TURMA, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
PROSSEGUINDO NO JULGAMENTO, APÓS O VOTO-VISTA APRESENTADO PELA JUÍZA FEDERAL ANA PAULA DE BORTOLI, ACOMPANHANDO O RELATOR, A TURMA, POR MAIORIA, DECIDIU DAR PARCIAL PROVIMENTO À APELAÇÃO E DETERMINAR A IMPLANTAÇÃO DO BENEFÍCIO, RESTANDO PREJUDICADO O AGRAVO RETIDO. VENCIDAS A DESEMBARGADORA FEDERAL SALISE MONTEIRO SANCHOTENE E A DESEMBARGADORA FEDERAL VÂNIA HACK DE ALMEIDA. JULGAMENTO REALIZADO NA FORMA DO ART. 942 DO CPC/2015.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA |
VOTO VISTA | : | Juíza Federal ANA PAULA DE BORTOLI |
Gilberto Flores do Nascimento
Diretor de Secretaria
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| Signatário (a): | Gilberto Flores do Nascimento |
| Data e Hora: | 10/11/2016 00:11 |
