Apelação Cível Nº 5023439-26.2017.4.04.7108/RS
RELATOR: Juiz Federal ARTUR CÉSAR DE SOUZA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
APELADO: WELINGTON DIEGO GOMES RODRIGUES (AUTOR)
ADVOGADO: EVANDRO JORGE KORBES
RELATÓRIO
Trata-se de apelação em face de sentença proferida, na vigência do CPC/2015, com o seguinte dispositivo:
"Ante o exposto, julgo procedentes os pedidos formulados pela parte autora, resolvendo o mérito da demanda, nos termos do art. 487, inciso I, do CPC/2015, para o fim de:
(a) condenar o INSS a implantar o benefício de auxílio-acidente desde 09/01/2006 (dia subsequente à cessação do NB 31/506.775.754-6), bem como ao pagamento das diferenças vencidas desde 29/04/2011 (prescrição), cujos valores deverão ser atualizados na forma da fundamentação.
Condeno a parte ré ao ressarcimento do valor dos honorários periciais despendidos pela SJRS, bem como ao pagamento de honorários advocatícios, em percentual a ser fixado por ocasião da liquidação da sentença, nos termos do art. 85, § 4º, inc. II do CPC/2015, a ser calculado sobre o valor da condenação, esclarecendo que a base de cálculo da verba honorária compreenderá apenas a soma das prestações vencidas até a data de publicação desta sentença (Súmulas 111/STJ e 76/TRF4) e não abrangerá os valores já pagos ao segurado na via administrativa, mas apenas as diferenças reconhecidas como devidas em Juízo.
Sem condenação em custas, visto que não adiantadas pela autora, sendo isenta a parte ré (art. 4º, I, da Lei n. 9.289/96)
Sentença não sujeita à remessa necessária, diante da improvável possibilidade de o valor da condenação atingir o limite mínimo de mil salários mínimos estabelecido para essa providência no artigo 496, § 3°, I do CPC.
Interposto(s) o(s) recurso(s), caberá à Secretaria intimar a parte contrária para contrarrazões, e, na seqüência, remeter os autos à Corte Regional.
Sentença publicada e registrada eletronicamente. Intimem-se."
Em suas razões recursais, o INSS aduz a decadência do direito à revisão do ato de indeferimento do benefício. Alega, outrossim, que a perícia administrativa constatou não haver elementos que comprovassem a incapacidade laboral ou limitação funcional, não havendo enquadramento em nenhuma das hipóteses previstas no Anexo III do Decreto 3.048/99, motivo pelo qual a parte autora não faz jus à concessão do auxílio-acidente. Na eventualidade, requer a aplicação integral do art. 1º-F da Lei 9.494/97, na redação da Lei 11.960/2009, no que tange aos consectários legais. Por fim, postula o prequestionamento da matéria.
Oportunizadas as contrarrazões, vieram os autos ao Tribunal.
É o relatório.
VOTO
Juízo de admissibilidade
O apelo preenche os requisitos legais de admissibilidade.
Prejudicial de decadência
Não se tratando de revisão de benefício previdenciário já concedido, mas de pedido de concessão de benefício que restou indeferido/cancelado na seara administrativa, ou seja, de direito ao benefício, não incide a regra de decadência do art. 103, caput, da Lei 8.213/91, nos termos do decidido pelo Supremo Tribunal Federal por ocasião do julgamento do Recurso Extraordinário n.º 626.489, em 16/10/2013, na sistemática do art. 543-B, do CPC/73: "O direito à previdência social constitui direito fundamental e, uma vez implementados os pressupostos de sua aquisição, não deve ser afetado pelo decurso do tempo. Como consequência, inexiste prazo decadencial para a concessão inicial do benefício previdenciário".
No mesmo sentido, mais recentemente, a jurisprudência desta Corte:
PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-ACIDENTE. DECADÊNCIA. HONORÁRIOS DE ADVOGADO. IMPLANTAÇÃO DO BENEFÍCIO.1. Não há prazo decadencial relativamente à concessão inicial de benefícios previdenciários. Precedentes deste Tribunal.2. Comprovada a diminuição da capacidade laboral decorrente de lesões consolidadas ocasionadas por acidente de qualquer natureza, é devido o auxílio-acidente.3. Honorários de advogado fixados em dez por cento do valor das parcelas da condenação vencidas até a data do acórdão.4. Ordem para implantação do benefício.Precedente. (APELREEX 0004141-35.2013.404.9999, Sexta Turma, Relator MARCELO DE NARDI, D.E. 07/02/2017)
Ressalto, uma vez mais, que é irrelevante o longo decurso do lapso temporal entre o fato gerador do benefício e a formulação do pedido perante a Autarquia Previdenciária. Trata-se de manifestação do direito fundamental à seguridade social.
Evidentemente, os efeitos financeiros do benefício não solicitado no momento adequado ficam limitados à prescrição de cinco anos (art. 103, parágrafo único, LBPS). Essa restrição, verifica-se, foi corretamente apontada na sentença (Evento 54 do originário).
Assim, não merece provimento o recurso do INSS quanto ao ponto.
Mérito
Por estar em consonância com o entendimento desta Relatoria quanto às questões deduzidas, a sentença recorrida merece ser mantida pelos seus próprios fundamentos, os quais adoto como razões de decidir, in verbis:
"(...)
Do auxílio-acidente
A parte autora pretende a concessão do benefício de auxílio-acidente a partir da data de cessação do benefício de auxílio-doença (NB nº 31/516.922.031-2, cessado em 30/12/2006) em razão de sequelas decorrentes de acidente ocorrido em 19/02/2005 (fratura do acetábulo a esquerda e lesão do nervo ciático).
Dispõe o art. 86 da LBPS:
Art. 86. O auxílio-acidente será concedido, como indenização, ao segurado quando, após consolidação das lesões decorrentes de acidente de qualquer natureza, resultarem sequelas que impliquem redução da capacidade para o trabalho que habitualmente exercia.
Assim, "(...) Quatro são os requisitos para a concessão do benefício em tela: (a) qualidade de segurado; (b) a superveniência de acidente de qualquer natureza; (c) a redução parcial e definitiva da capacidade para o trabalho habitual, e (d) o nexo causal entre o acidente a redução da capacidade. (...) (TRF4, AC 0010494-91.2013.404.9999, Quinta Turma, Relator Ricardo Teixeira do Valle Pereira, D.E. 26/07/2013).
Segundo a doutrina de Carlos Alberto Pereira de Castro e João Batista Lazzari, "o auxílio-acidente é um benefício previdenciário pago mensalmente ao segurado acidentado como forma de indenização, sem caráter substitutivo do salário, pois é recebido cumulativamente com o mesmo, quando, após a consolidação das lesões decorrentes de acidente de qualquer natureza - e não somente de acidentes de trabalho -, resultarem sequelas que impliquem redução da capacidade para o trabalho que habitualmente exercia - Lei n. 8.213/91, art. 86, caput." (grifei) (Manual de Direito Previdenciário - 9. ed. - reimpressão - Florianópolis : Conceito Editorial, 2007 - pág. 534).
Ainda, conforme tais autores, "de um acidente ocorrido com o segurado podem resultar danos irreparáveis, insuscetíveis de cura, para a integridade física do segurado. Tais danos, por sua vez, podem assumir diversos graus de gravidade; para a Previdência Social, o dano que enseja direito ao auxílio-acidente é o que acarreta perda ou redução na capacidade de trabalho (qualitativa ou quantitativa), sem caracterizar a invalidez permanente para todo e qualquer trabalho." (Manual de Direito Previdenciário - 9. ed. - reimpressão - Florianópolis : Conceito Editorial, 2007 - pág. 535).
Do caso concreto
Do exposto, infere-se que a análise da redução da capacidade laboral decorrente das sequelas oriundas do acidente deve ser feita tomando em conta a atividade laboral que o segurado exercia no momento do acidente.
Vejamos as conclusões apresentadas pelo médico perito (ev. 42):
(...)
B. História da doença atual
O autor relata que esteve em benefício de auxílio-doença no período de 05/02/2005 a 08/01/2006, por fratura do fêmur do lado esquerdo, atualmente vindo requerer benefício de auxílio-acidente alegando redução da força no referido membro para permanecer em pé por longos períodos.
Mediante documentação apresentada, sofreu acidente com queda da bicicleta em 05/02/2005, com contusão e fratura do fêmur esquerdo. Na ocasião, foi atendido no Hospital Geral da cidade de Novo Hamburgo, sendo realizada cirurgia corretiva para a referida fratura (com colocação de placas e parafusos).
Na data de 26/05/2005 foi submetido a novo procedimento para troca do material devido à fratura da placa cirúrgica. Consultou com ortopedista durante um ano para acompanhamento do quadro, não tendo realizado tratamento fisioterápico reabilitacional. Atualmente faz uso de Paracetamol ou Ibuprofeno para dor, quando necessário.
Na época da fratura o autor laborava como operador de prensa na posição ortostática continuada, retornando do benefício de auxílio-doença para a mesma função.
(...)
E. quesitos do juízo:
a) Qual é o estado de saúde atual do autor? Há lesão decorrente de acidente?
Bom. Sim
b) O quadro apresentado é resultado de sequelas de acidente? Que tipo de acidente?
Sim. Mediante documentação apresentada, o autor sofreu acidente de trânsito com queda da bicicleta em 05/02/2005, com contusão e fratura do fêmur esquerdo.
c) Houve consolidação da lesão a ponto de permitir ao autor o seu retorno ao mercado de trabalho?
Sim.
d) Apó o acidente, remanesceu redução da capacidade da autora para o trabalho habitual? Desde que época existe a redução da capacidade laboral?
Sim. Janeiro de 2006.
e) O autor exerceu outros trabalhos em sua vida profissional afora o que exercia à época do acidente?
Não, o autor laborou na mesma atividade como operador de prensa de indústria de borrachas, durante 21 anos (conforme o seu relato).
f) Em virtude do acidente ocorrido, há redução da capacidade para outros trabalhos já exercidos ou atuais em exercício pela autora?
As lesões decorridas do acidente deixaram sequelas no membro inferior esquerdo, que implicam redução de 40% da capacidade para o trabalho habitualmente exercido pelo autor, na época em questão.
g) Há nexo causal entre o acidente ocorrido e a eventual redução da capacidade laboral?
Sim.
Reputo presentes os requisitos para concessão do benefício.
Com efeito, o laudo pericial comprova a existência de lesões consolidadas que implicam redução parcial e definitiva da capacidade laborativa da parte autora para sua atividade habitual. Acresento que a sequela que autoriza o deferimento do benefício de auxílio-acidente é aquela da qual resulta redução, ainda que mínima, da capacidade laboral. Nesse sentido:
PREVIDENCIÁRIO. LAUDO PERICIAL. AUXÍLIO ACIDENTE. EXISTÊNCIA DE REDUÇÃO DA CAPACIDADE LABORATIVA EM CARÁTER DEFINITIVO. Para a concessão do auxílio-acidente faz-se necessário o preenchimento dos seguintes requisitos: (a) a consolidação das lesões decorrentes de acidente de qualquer natureza, (b) a redução da capacidade para o trabalho que habitualmente exercia o segurado e (c) o nexo causal entre a consolidação das lesões e a redução definitiva, ainda que mínima, da capacidade laborativa. A sequela que autoriza o deferimento do benefício de auxílio-acidente é aquela da qual resulta redução, ainda que mínima, da capacidade laboral. (TRF4, AC 0016455-42.2015.404.9999, QUINTA TURMA, Relatora TAÍS SCHILLING FERRAZ, D.E. 09/02/2017)
Por outro lado, a qualidade de segurado da parte autora na data do infortúnio é inconteste, devendo ser registrado que recebeu benefício de auxílio-doença no período de 25/02/2005 (DER) à 08/01/2006 (DCB).
Da mesma forma, restou comprovado nexo causal entre o acidente e as lesões, assim como a ocorrência do acidente de trânsito - queda com bicicleta. Quanto ao último ponto, cumpre referir que, a partir do advento da L 9.129/95, tornou-se possível o deferimento de auxílio-acidente em decorrência de acidentes de qualquer natureza, não somente àqueles ocorridos no ambiente de trabalho.
Em suma: demonstrado pela prova pericial que o demandante apresenta redução da capacidade laborativa para a atividade exercida à época do acidente (ocorrido em 05/02/2005), em decorrência de sequela definitiva de lesão provocada pelo evento, faz jus ao recebimento do benefício de auxílio-acidente. (...)"
Cabe reforçar que o direito ao benefício de auxílio-acidente não está condicionado ao grau de incapacidade para o trabalho habitual, bastando que exista a diminuição da aptidão laborativa oriunda de sequela de acidente de qualquer natureza, conforme disposto no art. 86 da Lei nº 8.213/91.
Dessa forma, para concessão de auxílio-acidente, basta a redução da capacidade laboral, como tem entendido esta Corte:
PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS INFRINGENTES.AUXÍLIO-ACIDENTE. GRAU, INDICE OU PERCENTUAL DE REDUÇÃO DA CAPACIDADE LABORAL EM ATIVIDADE HABITUAL. 1. O benefício de auxílio-acidente é devido se e quando comprovado pelo conjunto probatório que o segurado é portador de sequela decorrente de acidente de qualquer natureza determinadora de redução da capacidade para o trabalho habitual, não exigindo, a legislação em vigor, grau, índice ou percentual mínimo de incapacidade, aos fins. Precedentes. (TRF4, EINF 5003477-27.2011.404.7108, Terceira Seção, Relator p/ Acórdão João Batista Pinto Silveira, D.E. 07/06/2013)
Saliente-se que este entendimento está em conformidade também com a jurisprudência do Egrégio STJ, que assim se manifestou por ocasião do julgamento do Tema 416:
PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DA CONTROVÉRSIA. AUXÍLIO-ACIDENTE. LESÃO MÍNIMA. DIREITO AO BENEFÍCIO. 1. Conforme o disposto no art. 86, caput, da Lei 8.213/91, exige-se, para concessão do auxílio-acidente, a existência de lesão, decorrente de acidente do trabalho, que implique redução da capacidade para o labor habitualmente exercido. 2. O nível do dano e, em consequência, o grau do maior esforço, não interferem na concessão do benefício, o qual será devido ainda que mínima a lesão. 3. Recurso especial provido. (REsp 1109591/SC, Rel. Ministro CELSO LIMONGI (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ/SP), TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 25/08/2010, DJe 08/09/2010).
Consigno, ainda, que a relação das situações constantes do Anexo III do Decreto n.º 3.048/99 não é exaustiva, conforme os precedentes que seguem:
"PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-ACIDENTE. REDUÇÃO DA CAPACIDADE LABORAL. 1. Tratando-se de auxílio-doença, aposentadoria por invalidez ou auxílio-acidente, o Julgador firma sua convicção, via de regra, por meio da prova pericial. 2. A relação das situações que dão direito ao auxílio-acidente, constante do Anexo III do decreto 3.048/99, não é exaustiva, devendo ser consideradas outras em que comprovada, por perícia técnica, a redução da capacidade para o trabalho que o segurado habitualmente exercia. Levando-se em conta, no caso concreto, a redução da capacidade laboral do autor constatada pelo perito judicial, entende-se que o segurado faz jus ao benefício de auxílio-acidente" (AC nº 0002314-68.2009.404.7108/RS, Relator Des. Federal Celso Kipper, DJ de 05/04/2010)
PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-DOENÇA E APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. INCAPACIDADE INEXISTENTE. REDUÇÃO DA CAPACIDADE LABORAL. AUXÍLIO-ACIDENTE. 1. Considerando as conclusões do perito judicial de que a parte autora não está incapacitada para o trabalho, esta não faz jus ao auxílio-doença ou à aposentadoria por invalidez. 2. Tendo o laudo pericial apontado a redução da capacidade laborativa habitual, em face de lesão consolidada decorrente de acidente, é devido o benefício de auxílio-acidente, desde a suspensão do benefício de auxílio-doença. 3. A relação das situações que dão direito ao auxílio-acidente, constante do Anexo III do decreto 3.048/99, não é exaustiva, devendo ser consideradas outras em que comprovada, por perícia técnica, a redução da capacidade para o trabalho que o segurado habitualmente exercia. (AC nº 0009574-88.2011.404.9999; Relator Juiz Federal Loraci Flores de Lima; DE de 09/12/2011).
Ressalte-se, por fim, que o auxílio-acidente é verba de caráter indenizatório, que não pretende substituir o salário do trabalhador. Entende-se, portanto, que é pressuposto para seu recebimento que esteja preservada a capacidade laborativa, porém reduzida.
Dessarte, comprovada a redução permanente da capacidade laborativa que exija maior esforço ou necessidade de adaptação para exercer a mesma atividade, após consolidação de lesões decorrentes de acidente de qualquer natureza, estão preenchidos os requisitos para a concessão do auxílio-acidente.
Assim, deve ser mantida a sentença que condenou o INSS a conceder à parte autora o benefício de auxílio-acidente desde a cessação do auxílio-doença (09/01/2006), observada a prescrição quinquenal.
Correção monetária
A correção monetária, segundo o entendimento consolidado na 3ª Seção deste TRF4, incidirá a contar do vencimento de cada prestação e será calculada pelos seguintes índices oficiais:
- IGP-DI de 05/96 a 03/2006, art. 10 da Lei n.º 9.711/98, combinado com o art. 20, §§5º e 6º, da Lei n.º 8.880/94;
- INPC a partir de 04/2006, de acordo com a Lei n.º 11.430/06, precedida da MP n.º 316, de 11/08/2006, que acrescentou o art. 41-A à Lei n.º 8.213/91, sendo que o art. 31 da Lei n.º 10.741/03, determina a aplicabilidade do índice de reajustamento dos benefícios do RGPS às parcelas pagas em atraso.
A incidência da TR como índice de correção monetária dos débitos judiciais da Fazenda Pública foi afastada pelo Supremo Tribunal Federal, no julgamento do RE 870947, com repercussão geral, tendo-se determinado, no recurso paradigma a utilização do IPCA-E, como já havia sido determinado para o período subsequente à inscrição em precatório, por meio das ADIs 4.357 e 4.425.
Interpretando a decisão do STF, e tendo presente que o recurso paradigma que originou o precedente tratava de condenação da Fazenda Pública ao pagamento de débito de natureza não previdenciária (benefício assistencial), o Superior Tribunal de Justiça, em precedente também vinculante (REsp 1495146), distinguiu, para fins de determinação do índice de atualização aplicável, os créditos de natureza previdenciária, para estabelecer que, tendo sido reconhecida a inconstitucionalidade da TR como fator de atualização, deveria voltar a incidir, em relação a tal natureza de obrigação, o índice que reajustava os créditos previdenciários anteriormente à Lei 11.960/09, ou seja, o INPC.
Importante ter presente, para a adequada compreensão do eventual impacto sobre os créditos dos segurados, que os índices em referência - INPC e IPCA-E tiveram variação praticamente idêntica no período transcorrido desde julho de 2009 até setembro de 2017, quando julgado o RE 870947, pelo STF (IPCA-E: 64,23%; INPC 63,63%), de forma que a adoção de um ou outro índice nas decisões judiciais já proferidas não produzirá diferenças significativas sobre o valor da condenação.
A conjugação dos precedentes acima resulta na aplicação do INPC aos benefícios previdenciários, a partir de abril 2006, reservando-se a aplicação do IPCA-E aos benefícios de natureza assistencial.
Em data de 24 de setembro de 2018, o Ministro Luiz Fux, relator do RE 870947 (tema 810), deferiu efeito suspensivo aos embargos de declaração opostos pela Fazenda Pública, por considerar que a imediata aplicação da decisão daquela Corte, frente à pendência de pedido de modulação de efeitos, poderia causar prejuízo "às já combalidas finanças públicas".
Em face do efeito suspensivo deferido pelo STF sobre o próprio acórdão, e considerando que a correção monetária é questão acessória no presente feito, bem como que o debate remanescente naquela Corte Suprema restringe-se à modulação dos efeitos da decisão de inconstitucionalidade, impõe-se desde logo, inclusive em respeito à decisão também vinculante do STJ, no tema 905, o estabelecimento do índice aplicável – INPC para os benefícios previdenciários e IPCA-E para os assistenciais -, cabendo, porém, ao juízo de origem observar, na fase de cumprimento do presente julgado, o que vier a ser deliberado nos referidos embargos declaratórios.
Nego provimento ao apelo do INSS, no ponto.
Juros de mora
Os juros de mora devem incidir a partir da citação.
Até 29/06/2009, os juros de mora devem incidir à taxa de 1% ao mês, com base no art. 3º do Decreto-Lei n. 2.322/87, aplicável analogicamente aos benefícios pagos com atraso, tendo em vista o seu caráter eminentemente alimentar, consoante firme entendimento consagrado na jurisprudência do STJ e na Súmula 75 desta Corte.
A partir de então, deve haver incidência dos juros, uma única vez, até o efetivo pagamento do débito, segundo o índice oficial de remuneração básica aplicado à caderneta de poupança, nos termos estabelecidos no art. 1º-F, da Lei 9.494/97, na redação da Lei 11.960/2009, considerado hígido pelo STF no RE 870947, com repercussão geral reconhecida. Os juros devem ser calculados sem capitalização, tendo em vista que o dispositivo determina que os índices devem ser aplicados "uma única vez" e porque a capitalização, no direito brasileiro, pressupõe expressa autorização legal (STJ, 5ª Turma, AgRgnoAgRg no Ag 1211604/SP, Rel. Min. Laurita Vaz).
Honorários advocatícios
Tendo em vista que a sentença foi publicada sob a égide do novo CPC, este regramento é aplicável quanto à sucumbência.
Considerando que o magistrado postergou para a liquidação a definição do valor da verba honorária, fixo em 12% sobre o valor da condenação, nos termos do art. 85, §§ 2º e 3º, do CPC/2015, compreendidas as parcelas vencidas até a sentença, conforme Súmula 111 do STJ e 76 desta Corte.
Prequestionamento
O prequestionamento da matéria segue a sistemática prevista no art. 1.025 do CPC/2015.
Cumprimento imediato do julgado (tutela específica)
Considerando a eficácia mandamental dos provimentos fundados no art. 497 do novo CPC, que repete dispositivo constante do art. 461 do antigo CPC, e tendo em vista que a presente decisão não está sujeita, em princípio, a recurso com efeito suspensivo (TRF4, 3ª Seção, Questão de Ordem na AC n. 2002.71.00.050349-7/RS, Rel. para o acórdão Des. Federal Celso Kipper, julgado em 09/08/2007), determino o cumprimento imediato do acórdão, a ser efetivado em 45 dias, mormente pelo seu caráter alimentar e necessidade de efetivação imediata dos direitos sociais fundamentais.
Conclusão
- Apelação desprovida;
- Consectários adequados à orientação do STF em sede de repercussão geral;
- Determinado o cumprimento imediato do julgado.
Dispositivo
Ante o exposto, voto por negar provimento à apelação e determinar o cumprimento imediato do julgado.
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Apelação Cível Nº 5023439-26.2017.4.04.7108/RS
RELATOR: Juiz Federal ARTUR CÉSAR DE SOUZA
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ADVOGADO: EVANDRO JORGE KORBES
EMENTA
previdenciário. CONCESSAO DE AUXÍLIO-ACIDENTE. DECADÊNCIA. REDUÇÃO DA CAPACIDADE LABORAL. direito ao benefício. JUROS E CORREÇÃO MONETÁRIA. TEMA 810 STF.
1. Não se tratando de revisão de benefício previdenciário já concedido, mas de pedido de concessão de benefício que restou indeferido/cancelado na seara administrativa, ou seja, de direito ao benefício, não incide a regra de decadência do art. 103, caput, da Lei 8.213/91, nos termos do decidido pelo Supremo Tribunal Federal.
2. "O direito à previdência social constitui direito fundamental e, uma vez implementados os pressupostos de sua aquisição, não deve ser afetado pelo decurso do tempo. Como consequência, inexiste prazo decadencial para a concessão inicial do benefício previdenciário" (RE 626.489, STF).
3. É devido o auxílio-acidente, desde a cessação do auxílio-doença, quando a perícia judicial conclui pela redução permanente da capacidade para o trabalho que o segurado habitualmente exercia, devido à sequela de lesões oriundas de acidente de qualquer natureza.
4. O direito ao benefício de auxílio-acidente não está condicionado ao grau de incapacidade para o trabalho habitual, bastando que exista a diminuição, ainda que mínima, da aptidão laborativa, oriunda de sequela de acidente de qualquer natureza. Entendimento em conformidade com o Tema nº 416 do STJ.
5. O Supremo Tribunal Federal reconheceu no RE 870947, com repercussão geral, a inconstitucionalidade do uso da TR.
6. O Superior Tribunal de Justiça, no REsp 1495146, em precedente também vinculante, e tendo presente a inconstitucionalidade da TR como fator de atualização monetária, distinguiu os créditos de natureza previdenciária, em relação aos quais, com base na legislação anterior, determinou a aplicação do INPC, daqueles de caráter administrativo, para os quais deverá ser utilizado o IPCA-E.
7. Estando pendentes embargos de declaração no STF para decisão sobre eventual modulação dos efeitos da inconstitucionalidade do uso da TR, impõe-se fixar desde logo os índices substitutivos, resguardando-se, porém, a possibilidade de terem seu termo inicial definido na origem, em fase de cumprimento de sentença.
8. Os juros de mora, a contar da citação, devem incidir à taxa de 1% ao mês, até 29/06/2009. A partir de então, incidem uma única vez, até o efetivo pagamento do débito, segundo o percentual aplicado à caderneta de poupança.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 6ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, negar provimento à apelação e determinar o cumprimento imediato do julgado, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 27 de março de 2019.
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 27/03/2019
Apelação Cível Nº 5023439-26.2017.4.04.7108/RS
RELATOR: Juiz Federal ARTUR CÉSAR DE SOUZA
PRESIDENTE: Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
APELADO: WELINGTON DIEGO GOMES RODRIGUES (AUTOR)
ADVOGADO: EVANDRO JORGE KORBES
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 27/03/2019, na sequência 630, disponibilizada no DE de 12/03/2019.
Certifico que a 6ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A 6ª TURMA, DECIDIU, POR UNANIMIDADE, NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO E DETERMINAR O CUMPRIMENTO IMEDIATO DO JULGADO.
RELATOR DO ACÓRDÃO: Juiz Federal ARTUR CÉSAR DE SOUZA
Votante: Juiz Federal ARTUR CÉSAR DE SOUZA
Votante: Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA
Votante: Juíza Federal TAIS SCHILLING FERRAZ
Conferência de autenticidade emitida em 07/07/2020 11:34:50.