Apelação Cível Nº 5003302-07.2022.4.04.9999/RS
RELATOR: Juiz Federal JULIO GUILHERME BEREZOSKI SCHATTSCHNEIDER
APELANTE: NEUSA PEIXOTO DOS SANTOS
ADVOGADO: JEFFERSON LUIS VICARI (OAB RS028555)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RELATÓRIO
Trata-se de apelação em face de sentença, proferida na vigência do CPC/2015, que julgou improcedente a ação objetivando auxílio-doença/aposentadoria por invalidez e condenou a parte autora ao pagamento das custas processuais e de honorários advocatícios, estes fixados em R$ 800,00 (exigibilidade suspensa em face da gratuidade). Sustenta a autora, em suma, que está incapacitada para o trabalho. Requer a reforma da sentença no sentido de ser reconhecido o direito ao benefício por incapacidade desde a DCB. Não houve resposta.
É o relatório.
VOTO
Para demonstrar a incapacidade foram juntados aos autos, dentre outros, os seguintes documentos (EVENTO 3 - VOL2):
- Atestado médico, emitido em 27-9-2017, pelo Dr. Rafael A. Espanhol, especialista em neurologia, CREMERS 34455, relatando que a autora "foi submetida a avaliação neurológica por quadro de F33 e queixa M54.4; está em uso de vários medicamentos psicotrópicos prescritos pelo psiquiatra e segue poliqueixosa. Necessita de afastamento de suas atividades laborativas por tempo indeterminado para tratamento do quadro citado" (fl. 19);
- Atestado médico, emitido em 4-12-2017, pelo Dr. Matheus Balen, neurocirurgião, CREMERS 41505, referindo que a demandante "é acometida de Doença Cerebrovascular CID: I69, e se encontra em acompanhamento ambulatorial, em investigação etiológica" (fl. 22);
- Atestado médico, emitido em 13-12-17, pelo Dr. Rafael A. Espanhol, neurologista, CREMERS 34455, relatando que a autora "encontra-se em tratamento neurológico por quadro de F33 apresentando queixas R51 e M54.4 fazendo uso medicamentos c/ pouca melhora do quadro. Necessita afastamento de suas atividades laborativas por 120 dias para tratamento e reabilitação do quadro" (fl. 21).
A perícia médica judicial (EVENTO 3 - MANIF_MPF8, fls. 4-6), realizada em 17-7-2019, por especialista em ortopedia e traumatologia, apurou que a autora, faxineira autônoma, nascida em 25-1-1968, é portadora de Outra degeneração especificada de disco intervertebral e Artrose não especificada (CID-10: M51.3 e M19.9), e concluiu que ela está apta ao trabalho, nos seguintes termos:
"Conclusão: sem incapacidade atual
- Justificativa: A Autora apresenta discopatia degenerativa da coluna lombar, compativel com a faixa etária de 50 anos.
Comprovada em RX da coluna lombar de 10/09/2018.
A degeneração da coluna (discopatia degenerativa) não é uma doença, mas sim um acontecimento normal, que faz parte do processo de envelhecimento. Todas as pessoas, mesmo as que nunca tiveram nenhum problema espinhal, apresentam sinais de degeneração. De fato, as alterações degenerativas começam a aparecer bem mais cedo, praticamente no início da idade adulta.
A degeneração é, na verdade, o nome dado ao processo de desgaste das estruturas, principalmente das juntas da coluna, que são o disco intervertebral e as articulações facetarias. O grau de desgaste varia muito, podendo ser desde alterações iniciais, leves, como uma perda de hidratação do disco, até grandes alterações, como uma artrose pronunciada das articulações facetarias.
A maioria das pessoas sente alguma dor ou desconforto relacionado a este desgaste, mas estes sintomas costumam ser pouco importantes e não causar maiores problemas.
Apresenta artrose no médio pé, confirmado em RX do pé esquerdo de 10/09/2018.
Exame físico do pé esquerdo, dentro da normalidade fisiológica:
Flexão: 10°;
Extensão: 30°;
Subtalar: normal.
Referiu dor a palpação do escafoide nos movimentos do médio pé.
Pode fazer tratamento clinico, concomitante com o trabalho.
A Autora está apta ao trabalho. (...)".
Já a perícia médica judicial (EVENTO 3 - MANIF_MPF8, fls. 10-12), realizada em 3-7-2019, por especialista em psiquiatria, apurou que a demandante é portadora de Transtornos do humor [afetivos] orgânicos e Outra degeneração especificada de disco intervertebral (CID-10: F06.3 e M51.3), e concluiu que ela não está incapacitada para o trabalho.
O perito psiquiatra afirmou que "a autora apresenta transtorno do humor de origem orgânica, episódio atual leve, atualmente, é sua patologia principal (do ponto de vista psiquiátrico) e não ocasiona incapacidade laboral. Não há nenhuma alteração no exame do estado mental incapacitante. Realiza as atividades domésticas e apresenta trofismo muscular preservado".
Cumpre registrar que o INSS reconheceu a incapacidade quando lhe concedeu o benefício de auxílio-doença no período de 12-4-2017 a 29-8-2017, em razão de "Dor lombar baixa". A segurada foi examinada em 6-11-2017 e em 8-1-2018, e, embora não tenha sido reconhecida a incapacidade laboral, constatou-se a existência de "Episódios depressivos" e "Transtorno depressivo recorrente" (CID-10: F32 e F33), respectivamente.
Diante de tal quadro, entendo que o recurso da segurada merece parcial provimento.
Em que pese os peritos tenham concluído pela aptidão da autora para o trabalho na atualidade, entendo que o restante do conjunto probatório demonstra que a requerente era portadora das mesmas patologias diagnosticadas atualmente e indica a continuidade da incapacidade laboral após a cessação do auxílio-doença, em 29-8-2017.
Desse modo, tenho por reformar a sentença para determinar o restabelecimento do auxílio-doença desde a cessação administrativa (29-8-2017) até a data da perícia judicial (17-7-2019) que atestou a recuperação da capacidade laboral da autora.
Após o julgamento do RE n. 870.947 pelo Supremo Tribunal Federal (inclusive dos embargos de declaração), a Turma tem decidido da seguinte forma.
A correção monetária incide a contar do vencimento de cada prestação e é calculada pelos seguintes índices oficiais: [a] IGP-DI de 5-1996 a 3-2006, de acordo com o artigo 10 da Lei n. 9.711/1998 combinado com os §§ 5º e 6º do artigo 20 da Lei n. 8.880/1994; e, [b] INPC a partir de 4-2006, de acordo com a Lei n. 11.430/2006, que foi precedida pela MP n. 316/2006, que acrescentou o artigo 41-A à Lei n. 8.213/1991 (o artigo 31 da Lei n. 10.741/2003 determina a aplicação do índice de reajustamento do RGPS às parcelas pagas em atraso).
A incidência da TR como índice de correção monetária dos débitos judiciais da Fazenda Pública foi afastada pelo Supremo naquele julgamento. No recurso paradigma foi determinada a utilização do IPCA-E, como já o havia sido para o período subsequente à inscrição do precatório (ADI n. 4.357 e ADI n. 4.425).
O Superior Tribunal de Justiça (REsp 149146) - a partir da decisão do STF e levando em conta que o recurso paradigma que originou o precedente tratava de condenação da Fazenda Pública ao pagamento de débito de natureza não previdenciária (benefício assistencial) - distinguiu os créditos de natureza previdenciária para estabelecer que, tendo sido reconhecida a inconstitucionalidade da TR como fator de atualização, deveria voltar a incidir, em relação a eles, o INPC, que era o índice que os reajustava à edição da Lei n. 11.960/2009.
É importante registrar que os índices em questão (INPC e IPCA-E) tiveram variação praticamente idêntica no período transcorrido desde 7-2009 até 9-2017 (mês do julgamento do RE n. 870.947): 64,23% contra 63,63%. Assim, a adoção de um ou outro índice nas decisões judiciais já proferidas não produzirá diferenças significativas sobre o valor da condenação.
A conjugação dos precedentes acima resulta na aplicação, a partir de 4-2006, do INPC aos benefícios previdenciários e o IPCA-E aos de natureza assistencial.
Os juros de mora devem incidir a partir da citação. Até 29-6-2009 à taxa de 1% ao mês (artigo 3º do Decreto-Lei n. 2.322/1987), aplicável analogicamente aos benefícios pagos com atraso, tendo em vista o seu caráter eminentemente alimentar (Súmula n. 75 do Tribunal).
A partir de então, deve haver incidência dos juros até o efetivo pagamento do débito, segundo o índice oficial de remuneração básica aplicado à caderneta de poupança, de acordo com o artigo 1º-F, da Lei n. 9.494/1997, com a redação que lhe foi conferida pela Lei n. 11.960/2009. Eles devem ser calculados sem capitalização, tendo em vista que o dispositivo determina que os índices devem ser aplicados "uma única vez".
Por fim, a partir de 8-12-2021, incidirá o artigo 3º da Emenda n. 113:
Nas discussões e nas condenações que envolvam a Fazenda Pública, independentemente de sua natureza e para fins de atualização monetária, de remuneração do capital e de compensação da mora, inclusive do precatório, haverá a incidência, uma única vez, até o efetivo pagamento, do índice da taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia (Selic), acumulado mensalmente.
O INSS é isento do pagamento das custas processuais quando demandado no Estado do Rio Grande do Sul, mas deve pagar eventuais despesas processuais, como as relacionadas a correio, publicação de editais e condução de oficiais de justiça (artigo 11 da Lei Estadual n. 8.121/1985, com a redação que lhe foi conferida pela Lei n. 13.471/2010, já considerada a inconstitucionalidade formal reconhecida na ADI n. 70038755864 julgada pelo Tribunal de Justiça). Ele também é isento do pagamento da taxa única de serviços judiciais, na forma do estabelecido na Lei Estadual n. 14.634/2014 (artigo 5º). Não há isenção, todavia, do reembolso dos valores adiantados a título de honorários periciais.
Sobre as parcelas vencidas desde a DCB (obrigação de pagar quantia certa) serão acrescidos correção monetária (a partir do vencimento de cada prestação), juros (a partir da citação) e honorários advocatícios arbitrados nos valores mínimos previstos no § 3º do artigo 85 do CPC.
De acordo com os precedentes da Turma, fundamentados em decisão do Superior Tribunal de Justiça (EREsp n. 1.539.725), o § 11 do artigo 85 do CPC pressupõe a existência de condenação da parte recorrente ao pagamento de honorários desde a origem no feito em que interposto o recurso. Todavia, a parte recorrente é a própria segurada.
Ante o exposto, voto por dar parcial provimento ao recurso.
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RELATOR: Juiz Federal JULIO GUILHERME BEREZOSKI SCHATTSCHNEIDER
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ADVOGADO: JEFFERSON LUIS VICARI (OAB RS028555)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. CONCESSÃO DE AUXÍLIO-DOENÇA. INCAPACIDADE LABORAL TEMPORÁRIA PRETÉRITA COMPROVADA DESDE A DCB, SEGUNDO OS ELEMENTOS DOS AUTOS. JUROS E CORREÇÃO MONETÁRIA DE ACORDO COM O TEMA 810 (STF). PROVIMENTO PARCIAL DO RECURSO.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 6ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, dar parcial provimento ao recurso, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 27 de julho de 2022.
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 20/07/2022 A 27/07/2022
Apelação Cível Nº 5003302-07.2022.4.04.9999/RS
RELATOR: Juiz Federal JULIO GUILHERME BEREZOSKI SCHATTSCHNEIDER
PRESIDENTE: Desembargadora Federal TAIS SCHILLING FERRAZ
PROCURADOR(A): PAULO GILBERTO COGO LEIVAS
APELANTE: NEUSA PEIXOTO DOS SANTOS
ADVOGADO: JEFFERSON LUIS VICARI (OAB RS028555)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 20/07/2022, às 00:00, a 27/07/2022, às 14:00, na sequência 1249, disponibilizada no DE de 11/07/2022.
Certifico que a 6ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A 6ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, DAR PARCIAL PROVIMENTO AO RECURSO.
RELATOR DO ACÓRDÃO: Juiz Federal JULIO GUILHERME BEREZOSKI SCHATTSCHNEIDER
Votante: Juiz Federal JULIO GUILHERME BEREZOSKI SCHATTSCHNEIDER
Votante: Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA
Votante: Desembargadora Federal TAIS SCHILLING FERRAZ
LIDICE PEÑA THOMAZ
Secretária
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