Apelação Cível Nº 5002304-76.2022.4.04.7012/PR
PROCESSO ORIGINÁRIO: Nº 5002304-76.2022.4.04.7012/PR
RELATORA: Juíza Federal FLÁVIA DA SILVA XAVIER
APELANTE: EVA DE FATIMA GONORATTO (AUTOR)
ADVOGADO: OSCAR DANILO MACIEL (OAB PR024699)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
RELATÓRIO
Trata-se de ação de procedimento comum em que se postula concessão de benefício assistencial por incapacidade.
Sobreveio sentença que indeferiu a petição inicial e julgou extinto o feito, sem resolução de mérito, por ausência de interesse processual (art. 485, VI, do CPC). Foi deferida a assistência judiciária gratuita.
A parte autora apela, sustentando que sua pretensão remonta ao indeferimento do benefício de auxílio-doença, protocolado em 28/01/2010, quando procurou o INSS, em decorrência de seu problema de saúde, que a impossibilitava de realizar qualquer atividade laborativa capaz de suprir suas necessidades básicas. Esclarece que o servidor da Autarquia errou ao protocolar seu pedido, pois deveria ter constado benefício de amparo assistencial, considerando que não se enquadrava como segurada. Menciona o princípio da fungibilidade e afirma ser possível a concessão de benefício por incapacidade diverso do requerido. Assevera que busca a percepção de benefício assistencial em período que não recebeu qualquer outro benefício, o qual lhe foi sonegado por incorreção administrativa. Postula a anulação da sentença para determinar a reabertura da instrução processual.
Com contrarrazões, vieram os autos a este Tribunal.
É o relatório.
VOTO
A presente ação foi ajuizada em 13/07/2022 e o juízo de origem reconheceu a ausência de interesse de agir, porque, além de transcorrido longo período desde o requerimento administrativo, o mesmo foi realizado para obtenção de benefício por incapacidade temporária, inexistindo, assim, pedido administrativo para a concessão de amparo assistencial.
Inconformada, a parte autora recorre, postulando que seja reconhecido seu interesse de agir com o retorno dos autos para prosseguimento do feito.
Merece acolhida o pedido da parte autora.
A jurisprudência desta Corte é firme no sentido de que o indeferimento administrativo do benefício por incapacidade configura pretensão resistida, independentemente do transcurso do tempo até o ajuizamento da ação.
Com efeito, não há que se exigir contemporaneidade entre o indeferimento do benefício e ajuizamento do feito, pois o transcurso do tempo não desnatura a pretensão resistida que materializa o interesse processual.
Nessa linha, os seguintes precedentes:
PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL. BENEFÍCIO POR INCAPACIDADE. INTERESSE DE AGIR. REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO RECENTE. DESNECESSIDADE. AUSÊNCIA DE LAUDO PERICIAL. CERCEAMENTO DE DEFESA. SENTENÇA ANULADA. 1. O Supremo Tribunal Federal, ao julgar o Recurso Extraordinário nº 631.240/MG em sede de repercussão geral, assentou entendimento no sentido de ser necessário, como regra geral, o requerimento administrativo antes do ajuizamento de ações de concessão de benefícios previdenciários. 2. A jurisprudência deste Tribunal pacificou-se no sentido de não ser necessária, para fins de caracterizar o interesse de agir da parte autora, a juntada de requerimento administrativo com data mais próxima do ajuizamento da demanda. 3. Hipótese de anulação da sentença com a determinação de retorno dos autos à origem para o regular processamento do feito, possibilitando à parte autora a realização da prova pericial. (TRF4, AC 5020139-45.2019.4.04.9999, TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DE SC, Relator CELSO KIPPER, juntado aos autos em 15/02/2022)
DIREITO PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. NOVO REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO ATUALIZADO OU RECENTE. INTERESSE DE AGIR. DESNECESSIDADE. AUSÊNCIA DE LAUDO PERICIAL. SENTENÇA ANULADA. 1. A jurisprudência deste Tribunal pacificou-se no sentido de não ser necessária, para fins de caracterizar o interesse de agir da parte autora, a juntada de novo requerimento administrativo indeferido pelo INSS com data mais próxima do ajuizamento da demanda. 2. Imprescindível a realização de perícia médica para avaliação dos requisitos necessários à concessão de benefício previdenciário. (TRF4, AC 5013658-66.2019.4.04.9999, TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DE SC, Relator PAULO AFONSO BRUM VAZ, juntado aos autos em 15/02/2022)
Ademais, o fato de o requerimento administrativo ter sido protocolado para fins de obtenção de auxílio-doença e não, especificamente, de benefício assistencial não afasta o interesse de agir da parte autora, diante da aplicação do Princípio da Fungibilidade, segundo o qual é possível a concessão de benefício por incapacidade diverso do requerido, desde que preenchidos os requisitos necessários.
Sobre o ponto, destaco recentes julgados deste Tribunal:
PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL AO DEFICIENTE. LEI Nº 8.742/93. LOAS. FALECIMENTO DO TITULAR DO BENEFÍCIO NO CURSO DA AÇÃO. HABILITAÇÃO DOS HERDEIROS PARA O RECEBIMENTO DOS VALORES NÃO PAGOS EM VIDA. POSSIBILIDADE. FALTA DE INTERESSE DE AGIR. REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO DE AUXÍLIO-DOENÇA. EXTINÇÃO DO PROCESSO SEM JULGAMENTO DO MÉRITO. DESCABIMENTO. APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA FUNGIBILIDADE. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. [...] 2. As alegações referentes à falta de interesse de agir e à extinção do processo sem julgamento do mérito, aventadas pelo INSS no apelo, não prosperam, uma vez que, embora não requerido na esfera administrativa o benefício assistencial, a parte autora requereu, no âmbito administrativo, o benefício de auxílio-doença, existindo, portanto, o direito do autor de receber benefício por incapacidade diverso, diante da aplicação do Princípio da Fungibilidade. 3. É pacífico o entendimento jurisprudencial pela incidência do Princípio da Fungibilidade, segundo o qual é possível a concessão de benefício por incapacidade diverso do requerido, desde que preenchidos os requisitos necessários. Desse modo, não há falar em falta de interesse de agir. 4. Esta Corte tem entendido que, em face da natureza pro misero do Direito Previdenciário e calcada nos princípios da proteção social e da fungibilidade dos benefícios de auxílio-doença, aposentadoria por invalidez e amparo assistencial, os quais têm como requisito comum a redução ou inexistência de aptidão para o labor, é de ser concedido o benefício que melhor corresponda à situação demonstrada nos autos, desde que satisfeitos os pressupostos legais. 5. Preenchidos no caso os requisitos exigidos pela Lei Orgânica da Assistência Social - LOAS, resta mantida a concessão do amparo assistencial por deficiência, à sucessão do de cujus, em período pretérito (entre a DER e o óbito). [...] (TRF4, AC 5016636-45.2021.4.04.9999, DÉCIMA TURMA, Relatora CLÁUDIA CRISTINA CRISTOFANI, juntado aos autos em 04/08/2022, grifei)
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. REMESSA NECESSÁRIA. CAUSAS DE NATUREZA PREVIDENCIÁRIA. VALORES QUE, EM REGRA, SÃO INFERIORES AO LIMITE ESTABELECIDO PELO ART. 496, § 3.º, I, DO CPC/15. PRINCÍPIO DA FUNGIBILIDADE ENTRE OS BENEFÍCIOS POR INCAPACIDADE. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL AO PORTADOR DE DEFICIÊNCIA. CONCESSÃO. DEFICIÊNCIA E HIPOSSUFICIÊNCIA FAMILIAR DEMONSTRADAS. CONSECTÁRIOS LEGAIS. TUTELA ESPECÍFICA. [...] 2. A fungibilidade entre o benefício assistencial e os benefícios previdenciários por incapacidade implica que o interesse de agir resta suprido pela prévia submissão de requerimento administrativo referente a qualquer deles. 3. O direito ao benefício assistencial pressupõe o preenchimento dos seguintes requisitos: condição de deficiente (incapacidade para o trabalho e para a vida independente, consoante a redação original do art. 20, da LOAS, ou impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir a participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas, consoante a redação atual do referido dispositivo) ou idoso (assim considerado aquele com 65 anos ou mais, a partir de 1º de janeiro de 2004, data da entrada em vigor da Lei nº 10.741/2003 - Estatuto do Idoso) e situação de risco social (ausência de meios para a parte autora, dignamente, prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família). 4. Demonstrada a deficiência e a hipossuficiência do núcleo familiar, correta a sentença que concedeu o benefício assistencial ao portador de deficiência a contar da DER. [...]. (TRF4, AC 5001746-67.2022.4.04.9999, SEXTA TURMA, Relator JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA, juntado aos autos em 28/07/2022, grifei)
Portanto, comprovado o interesse processual, não há que falar em extinção do feito sem resolução de mérito.
Por fim, tendo em vista que o feito não se encontra em condições de imediato julgamento, nos termos do § 3º do art. 1.013 do CPC, é de ser anulada a sentença e determinado o retorno dos autos à Origem para regular processamento.
PREQUESTIONAMENTO
Objetivando possibilitar o acesso das partes às instâncias superiores, considero prequestionadas as matérias constitucionais e/ou legais suscitadas, conquanto não referidos expressamente os respectivos artigos na fundamentação do voto.
CONCLUSÃO
Apelo da parte autora: provido para anular a sentença e determinar o retorno dos autos à Origem.
DISPOSITIVO
Ante o exposto, voto por dar provimento à apelação, nos termos da fundamentação.
Documento eletrônico assinado por FLAVIA DA SILVA XAVIER, Juíza Federal Convocada, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40003552827v9 e do código CRC fdecc2ed.Informações adicionais da assinatura:
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Apelação Cível Nº 5002304-76.2022.4.04.7012/PR
PROCESSO ORIGINÁRIO: Nº 5002304-76.2022.4.04.7012/PR
RELATORA: Juíza Federal FLÁVIA DA SILVA XAVIER
APELANTE: EVA DE FATIMA GONORATTO (AUTOR)
ADVOGADO: OSCAR DANILO MACIEL (OAB PR024699)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. concessão de benefício ASSISTENCIAL. interesse PROCESSUAL configurado. SENTENÇA ANULADA.
1. Não há que se exigir contemporaneidade entre o indeferimento do benefício e ajuizamento do feito, pois o transcurso do tempo não desnatura a pretensão resistida que materializa o interesse processual.
2. O fato de o requerimento administrativo ter sido protocolado para fins de obtenção de auxílio-doença e não, especificamente, de benefício assistencial não afasta o interesse de agir da parte autora, diante da aplicação do Princípio da Fungibilidade.
3. Anulada a sentença e determinado o retorno dos autos à Origem para regular prosseguimento do feito.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 10ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, dar provimento à apelação, nos termos da fundamentação, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Curitiba, 08 de novembro de 2022.
Documento eletrônico assinado por FLAVIA DA SILVA XAVIER, Juíza Federal Convocada, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40003552828v3 e do código CRC e85783e2.Informações adicionais da assinatura:
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 27/10/2022 A 08/11/2022
Apelação Cível Nº 5002304-76.2022.4.04.7012/PR
RELATORA: Juíza Federal FLÁVIA DA SILVA XAVIER
PRESIDENTE: Juíza Federal FLÁVIA DA SILVA XAVIER
APELANTE: EVA DE FATIMA GONORATTO (AUTOR)
ADVOGADO: OSCAR DANILO MACIEL (OAB PR024699)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 27/10/2022, às 00:00, a 08/11/2022, às 16:00, na sequência 390, disponibilizada no DE de 18/10/2022.
Certifico que a 10ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A 10ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, DAR PROVIMENTO À APELAÇÃO, NOS TERMOS DA FUNDAMENTAÇÃO.
RELATORA DO ACÓRDÃO: Juíza Federal FLÁVIA DA SILVA XAVIER
Votante: Juíza Federal FLÁVIA DA SILVA XAVIER
Votante: Desembargador Federal MÁRCIO ANTONIO ROCHA
Votante: Desembargador Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO
SUZANA ROESSING
Secretária
Conferência de autenticidade emitida em 15/11/2022 04:00:59.