| D.E. Publicado em 26/09/2017 |
APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 0006376-67.2016.4.04.9999/SC
RELATOR | : | Des. Federal JORGE ANTONIO MAURIQUE |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
APELADO | : | MARIA LORENCETTI ZMOZINSKI |
ADVOGADO | : | Marcieli Weschenfelder |
REMETENTE | : | JUIZO DE DIREITO DA 1A VARA DA COMARCA DE CUNHA PORÃ/SC |
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. CONCESSÃO DE BENEFÍCIO. INTERESSE DE AGIR. FALTA DE POSTULAÇÃO NA VIA ADMINISTRATIVA. APOSENTADORIA POR IDADE MISTA OU HÍBRIDA. REQUISITOS LEGAIS. COMPROVAÇÃO. LEI Nº 11.718/2008. LEI 8.213/91, ART. 48, § 3º. TEMPO DE SERVIÇO RURAL E URBANO JÁ RECONHECIDOS NA ESFERA ADMINISTRATIVA. CONCESSÃO DE BENEFÍCIO A SEGURADO QUE NÃO ESTÁ DESEMPENHANDO ATIVIDADE RURAL NO MOMENTO DA IMPLEMENTAÇÃO DOS REQUISITOS. POSSIBILIDADE. MANUTENÇÃO DA SEGURANÇA.
1. O STF, no julgamento do RE nº 631.240/MG (Tema STF nº 350), firmou entendimento no sentido de que a exigência de prévio requerimento administrativo não deve prevalecer quando o entendimento da Administração for notória e reiteradamente contrário à postulação do segurado.
2. É devida a aposentadoria por idade mediante conjugação de tempo rural e urbano durante o período aquisitivo do direito, a teor do disposto na Lei nº 11.718, de 2008, que acrescentou o § 3º ao art. 48 da Lei nº 8.213, de 1991, desde que cumprido o requisito etário de 60 anos para mulher e de 65 anos para homem.
3. Ao § 3º do artigo 48 da LB não pode ser emprestada interpretação restritiva. Tratando-se de trabalhador rural que migrou para a área urbana, o fato de não estar desempenhando atividade rural por ocasião do requerimento administrativo não pode servir de obstáculo à concessão do benefício. A se entender assim, o trabalhador seria prejudicado por passar a contribuir, o que seria um contrassenso. A condição de trabalhador rural, ademais, poderia ser readquirida com o desempenho de apenas um mês nesta atividade. Não teria sentido se exigir o retorno do trabalhador às lides rurais por apenas um mês para fazer jus à aposentadoria por idade.
4. O que a modificação legislativa permitiu foi, em rigor, para o caso específico da aposentadoria por idade aos 60 (sessenta) ou 65 (sessenta e cinco) anos (mulher ou homem), o aproveitamento do tempo rural para fins de carência, com a consideração de salários-de-contribuição pelo valor mínimo no que toca ao período rural.
5. O tempo de serviço rural anterior ao advento da Lei nº 8.213/91 pode ser computado para fins da carência necessária à obtenção da aposentadoria por idade híbrida, ainda que não tenha sido efetivado o recolhimento das contribuições.
6. Não há, à luz dos princípios da universalidade e da uniformidade e equivalência dos benefícios e serviços às populações urbanas e rurais, e bem assim do princípio da razoabilidade, como se negar a aplicação do artigo 48, § 3º, da Lei 8.213/91 ao trabalhador que exerceu atividade rural, mas no momento do implemento do requisito etário (sessenta ou sessenta e cinco anos) está desempenhando atividade urbana.
7. A denominada aposentadoria por idade mista ou híbrida, por exigir que o segurado complete 65 (sessenta e cinco) anos de idade, se homem, e 60 (sessenta) anos, se mulher, em rigor, é, em última análise, uma aposentadoria de natureza assemelhada à urbana. Assim, para fins de definição de regime, deve ser equiparada à aposentadoria por idade urbana. Com efeito, a Constituição Federal, em seu artigo 201, § 7º, II, prevê a redução do requisito etário apenas para os trabalhadores rurais. Exigidos 65 (sessenta e cinco) anos de idade, se homem, e 60 (sessenta) anos, se mulher, a aposentadoria mista, pode-se dizer, constitui praticamente subespécie da aposentadoria urbana, ainda que com possibilidade de agregação de tempo rural sem qualquer restrição.
8. Esta constatação (da similaridade da denominada aposentadoria mista ou híbrida com a aposentadoria por idade urbana) prejudica eventual discussão acerca da descontinuidade do tempo (rural e urbano). Como prejudica, igualmente, qualquer questionamento que se pretenda fazer quanto ao fato de não estar o segurado eventualmente desempenhando atividade rural ao implementar o requisito etário.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Colenda Turma Regional Suplementar de Santa Catarina do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação e à remessa oficial, nos termos da fundamentação, determinando-se a implantação do benefício de aposentadoria por idade híbrida, nos termos do relatório, votos e notas taquigráficas que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Florianópolis, 14 de setembro de 2017.
Des. Federal JORGE ANTONIO MAURIQUE
Relator
| Documento eletrônico assinado por Des. Federal JORGE ANTONIO MAURIQUE, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 9106244v5 e, se solicitado, do código CRC 889DCF7E. | |
| Informações adicionais da assinatura: | |
| Signatário (a): | Jorge Antonio Maurique |
| Data e Hora: | 20/09/2017 16:16 |
APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 0006376-67.2016.4.04.9999/SC
RELATOR | : | Des. Federal JORGE ANTONIO MAURIQUE |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
APELADO | : | MARIA LORENCETTI ZMOZINSKI |
ADVOGADO | : | Marcieli Weschenfelder |
REMETENTE | : | JUIZO DE DIREITO DA 1A VARA DA COMARCA DE CUNHA PORÃ/SC |
RELATÓRIO
Cuida-se de apelação interposta pelo INSS em face da sentença, prolatada em 10/03/2016, que julgou procedente o pedido de concessão de aposentadoria por idade, na forma híbrida (NB 41/166.359.355-5), com efeitos financeiros desde a DER (05/02/2014), reconhecendo a atividade da autora como segurada especial, em regime de economia familiar, no período de 31/01/1966 a 30/03/1979, e como balconista no período de 01/04/1979 a 05/01/1981.
Argúi, preliminarmente, a falta de interesse de agir, porquanto a autora não formulou requerimento administrativo quanto ao reconhecimento do tempo de atividade rural em regime de economia familiar. Requer a extinção do feito sem o julgamento do mérito.
Com as contrarrazões, vieram os autos a esta Corte para julgamento.
É o relatório.
VOTO
Da ausência de requerimento administrativo
Por certo que não se ignora que a questão da ausência de requermimento administrativo prévio foi objeto de apreciação no RE nº 631.240/MG (Tema STF nº 350), admitido como representativo da controvérsia, onde assim manifestou-se o STF:
RECURSO EXTRAORDINÁRIO. REPERCUSSÃO GERAL. PRÉVIO REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO E INTERESSE EM AGIR. 1. A instituição de condições para o regular exercício do direito de ação é compatível com o art. 5º, XXXV, da Constituição. Para se caracterizar a presença de interesse em agir, é preciso haver necessidade de ir a juízo. 2. A concessão de benefícios previdenciários depende de requerimento do interessado, não se caracterizando ameaça ou lesão a direito antes de sua apreciação e indeferimento pelo INSS, ou se excedido o prazo legal para sua análise. É bem de ver, no entanto, que a exigência de prévio requerimento não se confunde com o exaurimento das vias administrativas. 3. A exigência de prévio requerimento administrativo não deve prevalecer quando o entendimento da Administração for notória e reiteradamente contrário à postulação do segurado. 4. Na hipótese de pretensão de revisão, restabelecimento ou manutenção de benefício anteriormente concedido, considerando que o INSS tem o dever legal de conceder a prestação mais vantajosa possível, o pedido poderá ser formulado diretamente em juízo - salvo se depender da análise de matéria de fato ainda não levada ao conhecimento da Administração -, uma vez que, nesses casos, a conduta do INSS já configura o não acolhimento ao menos tácito da pretensão. 5. Tendo em vista a prolongada oscilação jurisprudencial na matéria, inclusive no Supremo Tribunal Federal, deve-se estabelecer uma fórmula de transição para lidar com as ações em curso, nos termos a seguir expostos. 6. Quanto às ações ajuizadas até a conclusão do presente julgamento (03.09.2014), sem que tenha havido prévio requerimento administrativo nas hipóteses em que exigível, será observado o seguinte: (i) caso a ação tenha sido ajuizada no âmbito de Juizado Itinerante, a ausência de anterior pedido administrativo não deverá implicar a extinção do feito; (ii) caso o INSS já tenha apresentado contestação de mérito, está caracterizado o interesse em agir pela resistência à pretensão; (iii) as demais ações que não se enquadrem nos itens (i) e (ii) ficarão sobrestadas, observando-se a sistemática a seguir. 7. Nas ações sobrestadas, o autor será intimado a dar entrada no pedido administrativo em 30 dias, sob pena de extinção do processo. Comprovada a postulação administrativa, o INSS será intimado a se manifestar acerca do pedido em até 90 dias, prazo dentro do qual a Autarquia deverá colher todas as provas eventualmente necessárias e proferir decisão. Se o pedido for acolhido administrativamente ou não puder ter o seu mérito analisado devido a razões imputáveis ao próprio requerente, extingue-se a ação. Do contrário, estará caracterizado o interesse em agir e o feito deverá prosseguir. 8. Em todos os casos acima - itens (i), (ii) e (iii) -, tanto a análise administrativa quanto a judicial deverão levar em conta a data do início da ação como data de entrada do requerimento, para todos os efeitos legais. 9. Recurso extraordinário a que se dá parcial provimento, reformando-se o acórdão recorrido para determinar a baixa dos autos ao juiz de primeiro grau, o qual deverá intimar a autora - que alega ser trabalhadora rural informal - a dar entrada no pedido administrativo em 30 dias, sob pena de extinção. Comprovada a postulação administrativa, o INSS será intimado para que, em 90 dias, colha as provas necessárias e profira decisão administrativa, considerando como data de entrada do requerimento a data do início da ação, para todos os efeitos legais. O resultado será comunicado ao juiz, que apreciará a subsistência ou não do interesse em agir. (RE 631240, Relator(a): Min. ROBERTO BARROSO, Tribunal Pleno, julgado em 03/09/2014, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-220 DIVULG 07-11-2014 PUBLIC 10-11-2014)
No caso dos autos, em que pese tendo sido a presente demanda ajuizada em 07/10/2014, isto é, após a conclusão do julgamento da questão no Pleno do STF e não contestadas no mérito as alegações da inicial pelo INSS (fls. 42/46 e 150/155), não resta caracterizada a falta de interesse de agir.
Como bem fundamentou o magistrado a quo, requerido administrativamente o benefício de aposentadoria por idade urbana, a Autarquia possui o dever, tendo em conta o direito social de que cuida, esclarecer acerca da possibilidade da chamada aposentadoria híbrida ou mista. A não observância desse dever, como foi o caso dos autos, seria por si só suficiente para o afastamento da preliminar de carência de ação por falta de interesse de agir.
Cumpre destacar que na inicial a autora relata que na oportunidade do requerimento administrativo sequer foi oportunizada a juntada de documentos comprobatórios da atividade rurícola, ao argumento de que não seria possível sua soma ao tempo de serviço urbano.
De notar, também, que restou expressamente consignado no julgamento do RE nº 631.240/MG, no item 3 do acórdão que, a exigência de prévio requerimento administrativo não deve prevalecer quando o entendimento da Administração for notória e reiteradamente contrário à postulação do segurado.
Assim, considerando que a Autarquia tem notório e reiterado entendimento contrário à pretensão da autora, no sentido do cômputo da atividade rural anterior a 1991 como carência para a obtenção de benefício de aposentadoria por idade híbrida para os segurados que passaram a desenvolver atividade urbana, entendo que não há falar em ausência de interesse de agir.
Tanto é correta esta afirmação que a Autarquia sequer alerta os segurados sobre tal possibilidade.
Assim, não merece provimento o apelo do INSS.
Remessa Oficial
Considero interposta a remessa necessária, visto que sua dispensa apenas tem lugar quando a sentença líquida veicular condenação não excedente a 60 (sessenta) salários mínimos (STJ, Súmula 490, EREsp 600.596, Corte Especial, Rel. Min. Teori Albino Zavascki, DJ 23/11/2009).
Saliente-se, por oportuno, que não incide o limite de 1.000 (mil) salários mínimos previsto no art. 496, § 3º, inciso I, do NCPC, porquanto a r. sentença foi proferida antes de 18/03/2016 (data da vigência do NCPC definida pelo Pleno do STJ em 02/04/2016), conforme prevê expressamente o artigo 14 do NCPC [A norma processual não retroagirá e será aplicável imediatamente aos processos em curso, respeitados os atos processuais praticados e as situações jurídicas consolidadas sob a vigência da norma revogada].
Trata-se de demanda previdenciária objetivando a concessão de APOSENTADORIA POR IDADE HÍBRIDA, prevista no artigo 48, § 3º e seguintes, da Lei 8.213/91.
Premissas
Rege-se o benefício de aposentadoria por idade pelo art. 48, caput, da Lei n.º 8.213/91:
Art. 48. A aposentadoria por idade será devida ao segurado que, cumprida a carência exigida nesta Lei, completar 65 (sessenta e cinco) anos de idade, se homem, e 60 (sessenta), se mulher. (Redação dada pela Lei nº 9.032, de 1995)
§ 1o Os limites fixados no caput são reduzidos para sessenta e cinqüenta e cinco anos no caso de trabalhadores rurais, respectivamente homens e mulheres, referidos na alínea a do inciso I, na alínea g do inciso V e nos incisos VI e VII do art. 11. (Redação Dada pela Lei nº 9.876, de 26.11.99)
(...)
Como visto, dois são os requisitos para a obtenção da aposentadoria por idade urbana: a) idade mínima (65 anos para o homem e 60 anos para a mulher) e b) carência. Em se tratando de trabalhador rural, o requisito etário tem redução de cinco anos.
A carência (ou o tempo equivalente à carência para os segurados especiais) foi fixada pela Lei n.º 8.213/91 em 180 meses de contribuição (art. 25, II, da Lei 8.213/91). Na revogada CLPS/84, ela era de 60 contribuições (art. 32, caput, dessa Consolidação). No que tange à carência, todavia, a Lei n.º 8.213/91 estabeleceu norma de transição, haja vista o aumento que se verificou no número de contribuições exigido (de 60 para 180). Neste sentido estabeleceu o artigo 142 do referido diploma:
Art. 142. Para o segurado inscrito na Previdência Social Urbana até 24 de julho de 1991, bem como para o trabalhador e o empregador rural cobertos pela Previdência Social Rural, a carência das aposentadorias por idade, por tempo de serviço e especial obedecerá à seguinte tabela, levando-se em conta o ano em que o segurado implementou todas as condições necessárias à obtenção do benefício:
(Artigo e tabela com a redação dada pela Lei nº 9.032, de 28.4.95)
Não se pode perder de vista, por outro lado, o que estabelece o § 1º do art. 102 da Lei n.º 8.213/91:
Art. 102. A perda da qualidade de segurado importa em caducidade dos direitos inerentes a essa qualidade.
§ 1º A perda da qualidade de segurado não prejudica o direito à aposentadoria para cuja concessão tenham sido preenchidos todos os requisitos, segundo a legislação em vigor à época em que estes requisitos foram atendidos. (sublinhei)
Interpretando os dispositivos acima transcritos à luz dos princípios da ampla proteção e da razoabilidade, e tendo em vista que a condição essencial para a concessão da aposentadoria por idade urbana é o suporte contributivo correspondente, consubstanciado na carência implementada, a jurisprudência nacional caminhou no sentido de entender que é irrelevante a perda da condição de segurado para a concessão do referido benefício. Desta forma, os requisitos necessários à obtenção do benefício (idade e carência) podem ser preenchidos separadamente. Referido entendimento está expresso no seguinte precedente da 3ª Seção do STJ:
PREVIDENCIÁRIO. EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA EM RECURSO ESPECIAL. APOSENTADORIA POR IDADE. TRABALHADOR URBANO. ARTIGOS 25 E 48 DA LEI 8.213/91. PERDA DA QUALIDADE DE SEGURADO. ARTIGO 102 DA LEI 8.213/91. IMPLEMENTAÇÃO SIMULTÂNEA. DESNECESSIDADE. VERIFICAÇÃO DOS REQUISITOS NECESSÁRIOS. IDADE MÍNIMA E RECOLHIMENTO DAS CONTRIBUIÇÕES DEVIDAS - CARÊNCIA. PRECEDENTES. ARTIGO 24, PARÁGRAFO ÚNICO DA LEI 8.213/91. NÃO APLICABILIDADE. EMBARGOS REJEITADOS.
I - A aposentadoria por idade, consoante os termos do artigo 48 da Lei 8.213/91, é devida ao segurado que, cumprida a carência exigida nesta lei, completar 65 anos de idade, se homem, e 60, se mulher.
II - O art. 25 da Lei 8.213/91, por sua vez, estipula a carência de 180 (cento e oitenta) meses de contribuição para obtenção da aposentadoria por idade para o trabalhador urbano.
III - A perda da qualidade de segurado, após o atendimento aos requisitos da idade mínima e do recolhimento das contribuições previdenciárias devidas, não impede a concessão da aposentadoria por idade. Precedentes.
IV - Ademais, os requisitos exigidos pela legislação previdenciária não precisam ser preenchidos, simultaneamente, no caso de aposentadoria por idade. Interpretação do artigo 102, § 1º da Lei 8.213/91. Precedentes.
V - Sobre o tema, cumpre relembrar que o caráter social da norma previdenciária requer interpretação finalística, ou seja, em conformidade com os seus objetivos.
VI - O parágrafo único do artigo 24 da Lei 8.213/91 aplica-se aos casos em que o segurado não consegue comprovar, de forma alguma, a totalidade da carência exigida, ao benefício que se pretende, tendo que complementar o período comprovado com mais 1/3 (um terço), pelo menos, de novas contribuições, mesmo que já possua o requisito idade, o que não é o caso dos autos.
VII - Embargos rejeitados, para prevalecer o entendimento no sentindo de não se exigir a implementação simultânea dos requisitos para a aposentadoria por idade, sendo irrelevante o fato de o trabalhador ter perdido a qualidade de segurado.
(EREsp 327803/SP, Embargos de Divergência no Recurso Especial 2002/0022781-3, Rel. Min. Hamilton Carvalhido, Rel. p/Acórdão Min. Gilson Dipp, DJ 11-04-2005, p. 177). Grifado.
Podem ser citados ainda os seguintes precedentes do STJ: a) 5ª Turma: RESP 641190/RS, Rel. Min. Laurita Vaz, DJ 20/06/2005, p. 351, e b) 6ª Turma: RESP 496814/PE, Rel. Min. Hamilton Carvalhido, DJ 01/07/2005, p. 649.
Destarte, deve ser observada a orientação do STJ, segundo a qual o preenchimento de todos os requisitos não necessita ser concomitante.
Se é assim, fica evidente não importar a circunstância de a carência ter sido preenchida anteriormente à perda da qualidade de segurado e do implemento etário no caso da aposentadoria por idade urbana. O fator relevante é o somatório das contribuições, vertidas a qualquer tempo anteriormente à perda da qualidade de segurado, alcançar o mínimo exigido para a obtenção da carência, a qual se encontra atualmente delineada na tabela do art. 142 da Lei n.º 8.213/91 e, no regime da CLPS/84, em seu art. 32. A questão é atuarial. O que se exige é que o benefício esteja lastreado em contribuições suficientes, de modo a ser minimamente suportado pelo Sistema Previdenciário. Implementado esse requisito, resta apenas atingir a idade mínima prevista em lei.
Isso, a propósito, restou consagrado no artigo 3º da Lei n.º 10.666, de 08/05/2003 (resultante da conversão da MP nº 83, de 12/12/2002):
"Art. 3º - A perda da qualidade de segurado não será considerada para a concessão das aposentadorias por tempo de contribuição e especial.
§ 1o Na hipótese de aposentadoria por idade, a perda da qualidade de segurado não será considerada para a concessão desse benefício, desde que o segurado conte com, no mínimo, o tempo de contribuição correspondente ao exigido para efeito de carência na data do requerimento do benefício.
§ 2º A concessão do benefício de aposentadoria por idade, nos termos do §1º, observará, para os fins de cálculo do valor do benefício, o disposto no art. 3º, caput e §2º, da Lei nº 9.876, de 26 de novembro de 1999, ou, não havendo salários de contribuição recolhidos no período a partir da competência julho de 1994, o disposto no art. 35 da Lei nº 8.213, de 24 de julho de 1991."
Por fim, deve ser salientado que não se aplicam obviamente as regras de transição estabelecidas no artigo 142 da Lei n.º 8.213/91 aos segurados inscritos na Previdência após 24 de julho de 1991. Para estes há necessidade de se observar o prazo de carência previsto no artigo 25, inciso II, do mesmo Diploma (180 meses).
No caso em apreço, a parte autora pretende a concessão da denominada aposentadoria por idade mista ou híbrida. Completou a idade mínima para a obtenção da aposentadoria por idade urbana, desempenhou atividade urbana anteriormente à implementação do requisito etário, mas informa que exerceu atividades rurícolas no passado, o que lhe autorizaria a pretensão, a princípio, de agregar o(s) lapso(s) respectivo(s) para obter a aposentadoria por idade.
De fato, em 23/06/2008 passou a vigorar a Lei 11.718, que, dentre outras alterações, modificou o § 2º e instituiu o § 3º do art. 48 da Lei de Benefícios da Previdência Social, nos seguintes termos:
"Art. 48. (omissis)
§ 2º Para os efeitos do disposto no § 1º deste artigo, o trabalhador rural deve comprovar o efetivo exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, por tempo igual ao número de meses de contribuição correspondente à carência do benefício pretendido, computado o período a que se referem os incisos III a VIII do § 9o do art. 11 desta Lei.
§ 3º Os trabalhadores rurais de que trata o § 1º deste artigo que não atendam ao disposto no § 2o deste artigo, mas que satisfaçam essa condição, se forem considerados períodos de contribuição sob outras categorias do segurado, farão jus ao benefício ao completarem 65 (sessenta e cinco) anos de idade, se homem, e 60 (sessenta) anos, se mulher."
Como se vê, tal lei instituiu a possibilidade de outorga do benefício de aposentadoria por idade ao segurado ou à segurada que desempenhou atividades rurais, com o implemento da carência mediante o cômputo do tempo de serviço prestado em outras categorias - como empregado urbano ou contribuinte individual, v.g. - desde que haja o implemento da idade mínima de 60 (sessenta) anos para mulher e 65 (sessenta e cinco) anos para homem.
Tenho que ao § 3º do artigo 48 da LB não pode ser emprestada interpretação restritiva. Tratando-se de trabalhador rural que migrou para a área urbana, o fato de não estar desempenhando atividade rural por ocasião do requerimento administrativo não pode servir de obstáculo à concessão do benefício. A se entender assim, o trabalhador seria prejudicado por passar a contribuir, o que seria um contrassenso. A condição de trabalhador rural, ademais, poderia ser readquirida com o desempenho de apenas um mês nesta atividade. Não teria sentido se exigir o retorno do trabalhador às lides rurais por apenas um mês para fazer jus à aposentadoria por idade.
A conclusão que se pode extrair é de que a modificação legislativa, em rigor, permitiu o aproveitamento do tempo rural para fins de carência, com a consideração de salários-de-contribuição pelo valor mínimo, no caso específico da aposentadoria por idade aos 60 (sessenta) ou 65 (sessenta e cinco) anos (mulher ou homem).
A verdade é que, em uma situação como esta, o segurado não deixou de trabalhar, apenas mudou de regime. Não pode ser prejudicado pelo fato de ter passado a contribuir como trabalhador urbano. Tivesse continuado a trabalhar como agricultor em regime de economia familiar, sem efetuar qualquer recolhimento de contribuições, poderia ter obtido aposentadoria aos 55 (cinquenta e cinco) ou 60 (sessenta) anos de idade sem qualquer problema. Não há razão, assim, para que se negue o direito ao benefício, com requisito etário mais rigoroso, somente porque passou a recolher contribuições.
Assim, sob pena de se relegar ao desamparo quem jamais deixou de exercer atividade laborativa, há de se adotar entendimento no sentido de reconhecer o direito à aplicação da regra do artigo 48, § 3º, da Lei 8.213/91 a todos os trabalhadores que tenham desempenhado de forma intercalada atividades urbanas e rurais.
Calha registrar que sob o regime da Lei Complementar 11, de 25/05/1971 havia norma de sentido assemelhado, que inclusive amparava de forma mais efetiva os trabalhadores rurais que migravam para a área urbana. Com efeito, assim estabelecia o artigo 14 da Lei Complementar 11/71:
"Art. 14. O ingresso do trabalhador rural e dependentes, abrangidos por esta Lei complementar , no regime de qualquer entidade de previdência social não lhes acarretará a perda do direito às prestações do programa de assistência , enquanto não decorrer o período de carência a que se condicionar a concessão dos benefícios pelo novo regime."
O dispositivo acima, como se percebe, amparava o segurado rural que migrava para a área urbana. Não tendo havido a perda da qualidade de segurado, era possível reconhecer o direito à obtenção do benefício segundo as regras previstas para o regime rural, enquanto não preenchidos os requisitos (inclusive carência) exigidos para obtenção de proteção pelo regime urbano.
Não há, à luz dos princípios da universalidade e da uniformidade e equivalência dos benefícios e serviços às populações urbanas e rurais, e bem assim do princípio da razoabilidade, como se negar a aplicação do artigo 48, § 3º, da Lei 8.213/91 ao trabalhador que exerceu atividade rural, mas no momento do implemento do requisito etário (sessenta ou sessenta e cinco anos) está desempenhando atividade urbana.
Esse entendimento, aliás, está em conformidade com a jurisprudência mais recente do STJ, conforme se extrai do seguinte precedente:
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA HÍBRIDA POR IDADE. ART. 48, § 3º, DA LEI N. 8213/91. EXEGESE. MESCLA DOS PERÍODOS DE TRABALHO URBANO E RURAL. EXERCÍCIO DE ATIVIDADE RURAL NO MOMENTO QUE ANTECEDE O REQUERIMENTO. DESNECESSIDADE. CÔMPUTO DO TEMPO DE SERVIÇO RURAL ANTERIOR À VIGÊNCIA DA LEI N. 8.213/91 PARA FINS DE CARÊNCIA. POSSIBILIDADE. 1. A Lei 11.718/2008, ao alterar o art. 48 da Lei 8.213/91, conferiu ao segurado o direito à aposentadoria híbrida por idade, possibilitando que, na apuração do tempo de serviço, seja realizada a soma dos lapsos temporais de trabalho rural com o urbano. 2. Para fins do aludido benefício, em que é considerado no cálculo tanto o tempo de serviço urbano quanto o de serviço rural, é irrelevante a natureza do trabalho exercido no momento anterior ao requerimento da aposentadoria. 3. O tempo de serviço rural anterior ao advento da Lei n. 8.213/91 pode ser computado para fins da carência necessária à obtenção da aposentadoria híbrida por idade, ainda que não tenha sido efetivado o recolhimento das contribuições. 4. O cálculo do benefício ocorrerá na forma do disposto no inciso II do caput do art. 29 da Lei n. 8.213/91, sendo que, nas competências em que foi exercido o labor rurícola sem o recolhimento de contribuições, o valor a integrar o período básico de cálculo - PBC será o limite mínimo de salário-de-contribuição da Previdência Social. 5. A idade mínima para essa modalidade de benefício é a mesma exigida para a aposentadoria do trabalhador urbano, ou seja, 65 anos para o homem e 60 anos para a mulher, portanto, sem a redução de 5 anos a que faria jus o trabalhador exclusivamente rurícola. 6. Recurso especial improvido. (REsp 1476383/PR, Rel. Ministro SÉRGIO KUKINA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 01/10/2015, DJe 08/10/2015) (grifei)
Há de se considerar, ainda, que a denominada aposentadoria mista ou híbrida, por exigir que o segurado complete 65 (sessenta e cinco) anos de idade, se homem, e 60 (sessenta) anos, se mulher, é, em última análise, uma aposentadoria de natureza assemelhada à urbana. Assim, para fins de definição de regime, deve ser equiparada à aposentadoria urbana. Com efeito, a Constituição Federal, em seu artigo 201, § 7º, II, prevê a redução do requisito etário apenas para os trabalhadores rurais. Exigidos 65 (sessenta e cinco) anos de idade, se homem, e 60 (sessenta) anos, se mulher, a aposentadoria mista, pode-se dizer, constitui praticamente subespécie da aposentadoria urbana, ainda que com possibilidade de agregação de tempo rural sem qualquer restrição.
Esta constatação (da similaridade da denominada aposentadoria mista ou híbrida com a aposentadoria por idade urbana) prejudica, registre-se, eventual discussão acerca da descontinuidade do tempo (rural e urbano), haja vista os fundamentos acima expostos. Como prejudica, igualmente, qualquer questionamento que se pretenda fazer quanto ao fato de não estar o segurado eventualmente desempenhando atividade rural ao implementar o requisito etário.
Do caso concreto
No caso em tela, a parte autora completou a idade mínima para a obtenção da aposentadoria por idade urbana (60 anos de idade) em 31/01/2014, devendo, de acordo com a tabela do artigo 142 da Lei n.º 8.213/91, comprovar o recolhimento, de, no mínimo, 180 contribuições anteriores ao preenchimento do requisito etário e/ou ao requerimento administrativo (em 05/02/2014).
Em sede administrativa, foram reconhecidos pela Autarquia, 154 contribuições até a DER.
Ademais, requer o reconhecimento do exercício da atividade rural no período de 31/01/1966 a 30/03/1979 e o reconhecimento do vínculo como balconista, anotado na CTPS, de 01/04/1979 a 05/01/1981 (fl. 17), o qual não foi contabilizado pelo INSS.
Quanto ao reconhecimento do tempo de serviço rural, as premissas são as seguintes:
a) a possibilidade de extensão da prova material para período anterior ao documento mais antigo (Súmula nº 577 do STJ: "É possível reconhecer o tempo de serviço rural anterior ao documento mais antigo apresentado, desde que amparado em convincente prova testemunhal colhida sob o contraditório.");
b) A presunção de continuidade do tempo de serviço rural no período compreendido entre os documentos indicativos do trabalho rural no período abrangido pela carência. Neste sentido, Moacyr Amaral Santos faz referência à teoria de Fitting, segundo a qual presume-se a permanência de um estado preexistente, se não for alegada a sua alteração, ou, se alegada, não tiver sido feita a devida prova desta. Amaral Santos, citando Soares de Faria na síntese dos resultados obtidos por Fitting, pontifica que "só a afirmação de uma mudança de um estado anterior necessita de prova, que não a permanência do mesmo: affirmanti non neganti incumbit probatio" (SANTOS, Moacyr Amaral. Prova Judiciária no Cível e Comercial. 5. ed. São Paulo: Saraiva, 1983. v. 1, p. 102);
c) A ampliação da abrangência do início de prova material pertinente ao período de carência a períodos anteriores ou posteriores à sua datação, desde que complementado por robusta prova testemunhal, uma vez que "não há exigência de que o início de prova material se refira a todo o período de carência, para fins de aposentadoria por idade do trabalhador rural" (AgRg no AREsp 194.962/MT), bem como que "basta o início de prova material ser contemporâneo aos fatos alegados e referir-se, pelo menos, a uma fração daquele período, corroborado com prova testemunhal, a qual amplie sua eficácia probatória" (AgRg no AREsp 286.515/MG), entendimentos esses citados com destaque no voto condutor do acórdão do REsp nº 1349633 - representativo de controvérsia que consagrou a possibilidade da retroação dos efeitos do documento tomado como início de prova material, desde que embasado em prova testemunhal. Vide Súmula nº 577 do STJ (supracitada) e recentes julgados da Terceira Seção: AR 4.507/SP, AR 3.567/SP, EREsp 1171565/SP, AR 3.990/SP e AR 4.094/SP;
d) a inviabilidade de comprovação do labor rural através de prova exclusivamente testemunhal (REsp 1133863/RN, Rel. Ministro CELSO LIMONGI, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 13/12/2010, DJe 15/04/2011);
e) segundo a jurisprudência da 3ª Seção deste Regional, a utilização de maquinário e eventual de diaristas não afasta, por si só, a qualidade de segurado especial porquanto ausente qualquer exigência legal no sentido de que o trabalhador rural exerça a atividade agrícola manualmente. (TRF4, EINF 5023877-32.2010.404.7000, Terceira Seção, Relator p/ Acórdão Rogerio Favreto, juntado aos autos em 18/08/2015);
f) a admissão, como início de prova material e nos termos da Súmula 73 deste Tribunal, de documentos de terceiros, membros do grupo parental;
g) o fato de que o tamanho da propriedade rural não é, sozinho, elemento que possa descaracterizar o regime de economia familiar desde que preenchidos os demais requisitos (REsp 1403506/MG, Rel. Ministra ELIANA CALMON, SEGUNDA TURMA, julgado em 03/12/2013, DJe 16/12/2013);
h) segundo a Lei nº 12.873/2013, que alterou, entre outros, o art. 11 da LB, "o grupo familiar poderá utilizar-se de empregados contratados por prazo determinado ou de trabalhador de que trata a alínea g do inciso V do caput, à razão de no máximo 120 (cento e vinte) pessoas por dia no ano civil, em períodos corridos ou intercalados ou, ainda, por tempo equivalente em horas de trabalho, não sendo computado nesse prazo o período de afastamento em decorrência da percepção de auxílio-doença". Deixou-se de exigir, assim, que a contratação ocorresse apenas em épocas de safra (ROCHA, Daniel Machado da; BALTAZAR JR., José Paulo. Comentários à Lei de Benefícios da Previdência Social. São Paulo: Altas, 2015, p. 63);
i) de acordo com a jurisprudência do STJ, o exercício de atividade urbana pelo rurícola não afasta, por si só, sua condição de segurado especial. No entanto, não se considera segurado especial quando ficar demonstrado que o trabalho urbano constitui a principal atividade laborativa do requerente e/ou sua principal fonte de renda. (REsp 1483172/CE, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 23/10/2014, DJe 27/11/2014);
j) o exercício da atividade rural pode ser descontínuo (AgRg no AREsp 327.119/PB, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 02/06/2015, DJe 18/06/2015);
l) no que tange ao trabalho do boia-fria, o STJ, por meio, entre outros, do REsp 1.321.493, Rel. Min. Herman Benjamin, abrandou as exigências quanto ao início de prova material da atividade rural, desde que complementada através de idônea prova testemunhal;
m) o segurado especial tem de estar trabalhando no campo quando completar a idade mínima para obter a aposentadoria rural por idade, momento em que poderá requerer seu benefício, ressalvada a hipótese do direito adquirido, em que o segurado especial, embora não tenha requerido sua aposentadoria por idade rural, já preencheu de forma concomitante, no passado, ambos os requisitos - carência e idade. (STJ, REsp 1354908, 1ª Seção, Tema 642/recurso repetitivo).
A fim de comprovar o tempo de serviço em regime de economia familiar a autora juntou: a) certidão do INCRA dando conta de uma área de 18 ha em nome do pai da autora, Sr. Pedro Lorensett, no período de 1965 a 1977 (fl. 21) e certidão de nascimento do irmão da autora, Edemar Jorge Lorensett, em 05/09/1963, em que o pai da autora é qualificado como agricultor (fl. 23) e histórico escolar do irmão, onde de 1972 a 1974, onde o pai é qualificado como agricultor (fls. 24/26).
Na audiência do dia 10/12/2015 (fl. 118) foram ouvidas duas testemunhas, Sr. Lenoir Rossin e Sra. Libera Justina Balbinot, que confirmaram o exercício de atividade rural pela autora em regime de economia familiar.
Assim, correta a decisão que reconheceu o exercício do labor rural no período de 31/01/1966 a 30/03/1979.
Inicialmente, cumpre consignar que os registros constantes na CTPS possuem presunção juris tantum, somente podendo ser infirmados por provas robustas em sentido contrário, que não se verifica na espécie.
Nessa esteira, reputando a Carteira de Trabalho e Previdência Social como documento hábil a comprovar os períodos de trabalho nela lançados, os seguintes precedentes do TRF da 4ª Região:
PREVIDENCIÁRIO. CÔMPUTO DE TEMPO DE SERVIÇO URBANO COMUM. COMPROVAÇÃO. AVERBAÇÃO. O registro constante na CTPS goza da presunção de veracidade juris tantum, devendo a prova em contrário ser inequívoca, constituindo, desse modo, prova plena do serviço prestado nos períodos ali anotados, ressaltando-se que a anotação posterior não constitui, por si só, qualquer indício de fraude. (TRF4, APELREEX 5053764-90.2012.404.7000, Quinta Turma, Relator p/ Acórdão Ricardo Teixeira do Valle Pereira, juntado aos autos em 25/03/2015)
PREVIDENCIÁRIO. ATIVIDADE RURAL. INÍCIO DE PROVA MATERIAL CORROBORADO POR TESTEMUNHAS. CONTRIBUIÇÕES PREVIDENCIÁRIAS. ATIVIDADE URBANA COM REGISTRO EM CTPS - PROVA PLENA. VÍNVULO DE PARENTESCO ENTRE EMPREGADO E EMPREGADOR. CNIS. CONCESSÃO DE APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO. DIREITO ADQUIRIDO. TUTELA ESPECÍFICA.
1. (...)
3. O registro constante na CTPS goza da presunção de veracidade juris tantum, devendo a prova em contrário ser inequívoca, constituindo, desse modo, prova plena do serviço prestado nos períodos ali anotados.
4. Não logrando o INSS desincumbir-se do ônus da prova em contrário às anotações da CTPS do autor, o tempo ali registrado deve ser computado para fins de benefício previdenciário.
5. A existência de vínculo de parentesco entre empregado e empregador não faz presumir fraude no contrato de trabalho, incumbindo ao INSS prová-la o que não ser verificou no presente feito.
6. Por mais relevante que seja o fato de não constarem contribuições no CNIS, o segurado não pode ser responsabilizado pelo fato de não terem sido recolhidas contribuições pelo empregador a quem compete efetuar o devido recolhimento (art. 30, inciso I, alínea a, Lei nº 8.212/91). Ademais, a fiscalização e a cobrança de tais calores cabe, justamente, à Autarquia Previdenciária junto ao empregador, não podendo ser penalizado o segurado.7. (...)
(AC n. 2002.70.05.009267-3, Rel. Des. Federal João Batista Pinto Silveira, Sexta Turma, DE de 07-12-2007)- grifei
PREVIDENCIÁRIO. CONCESSÃO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO. ATIVIDADE URBANA. INÍCIO DE PROVA MATERIAL CORROBORADO POR PROVA TESTEMUNHAL. CTPS. PRESUNÇÃO JURIS TANTUM. ÔNUS DA PROVA. AUSÊNCIA DE RECOLHIMENTO DE CONTRIBUIÇÕES PREVIDENCIÁRIAS. ANTECIPAÇÃO DOS EFEITOS DA TUTELA. DEFERIDA. 1. A atividade urbana é comprovada mediante início de prova material, contanto que seja corroborado por prova testemunhal idônea. 2. A anotação na Carteira de Trabalho e Previdência Social goza de presunção juris tantum de veracidade, nos termos da Súmula 12 do Tribunal Superior do Trabalho, constituindo prova plena do trabalho prestado ainda que esta seja feita posteriormente à prestação laboral, admitindo, contudo, prova em contrário. 3. A Autarquia em nenhum momento ilidiu por meio de provas a anotação do contrato de trabalho da CTPS do segurado, resumindo-se a reproduzir em suas razões as supostas irregularidades levantadas na via administrativa, sendo que lhe competia o ônus da prova, a teor do art. 333, inciso II, do CPC. 4. O Segurado não pode ser penalizado pela ausência de recolhimento de contribuições devidas à Previdência Social, porquanto o encargo de responsabilidade do empregador (previsão do art. 30 e incisos da Lei nº 8.212/91). 5. (...)
(AC n. 2001.71.00.027772-9, Rel. Juiz Federal (convocado) Luiz Antônio Bonat, Quinta Turma, DE de 16-03-2007) - grifei
Destaco que a autora era segurada empregada, não sendo o responsável pelo pontual recolhimento das contribuições previdenciárias. O dever do recolhimento das contribuições previdenciárias, todavia, compete ao empregador, não podendo o trabalhador sofrer subtração dos seus direitos previdenciários pela desídia ou, talvez, má-fé de seu patrão, que é o verdadeiro responsável tributário. Não é outro o regramento trazido pela Lei nº 8.212/91, que trata do custeio do Regime Geral de Previdência Social:
Art. 30. A arrecadação e o recolhimento das contribuições ou de outras importâncias devidas à Seguridade Social obedecem às seguintes normas:
I - a empresa é obrigada a:
a) arrecadar as contribuições do segurados empregados e trabalhadores avulsos a seu serviço, descontando-as da respectiva remuneração.
Considerando que os vínculos constam da CTPS e do CNIS e que cabe ao empregador efetuar o desconto e o recolhimento das contribuições previdenciárias do empregado, deverá o INSS computar os períodos requeridos.
Nessas condições, reconhecidos o período de 01/04/1979 a 05/01/1981, na condição de balconista na empresa Schwambach & Cia. Ltda., e o tempo de atividade rural em regime de economia familiar, de 31/01/1966 a 30/03/1979, a autora perfaz o total de 27 anos, 6 meses e 24 dias.
Portanto, na data em que apresentou o requerimento administrativo (05/02/2014), além de já ter completado a idade exigida (60 anos), havia alcançado período de labor rural, na condição de segurada especial, e de contribuições decorrentes de trabalho urbano, superior à carência mínima do art. 142 da LBPS, o que lhe garante a concessão da aposentadoria por idade mista ou híbrida.
Conclusão sobre o direito da parte autora à aposentadoria por idade híbrida
Dessarte, a parte autora faz jus à aposentadoria por idade híbrida desde 05/02/2014 (data do requerimento administrativo).
Implantação do benefício
Reconhecido o direito da parte, impõe-se a determinação para a imediata implantação do benefício, nos termos do art. 497 do NCPC [Art. 497. Na ação que tenha por objeto a prestação de fazer ou de não fazer, o juiz, se procedente o pedido, concederá a tutela específica ou determinará providências que assegurem a obtenção de tutela pelo resultado prático equivalente.] e da jurisprudência consolidada da Colenda Terceira Seção desta Corte (QO-AC nº 2002.71.00.050349-7, Rel. p/ acórdão Des. Federal Celso Kipper). Dessa forma, deve o INSS implantar o benefício em até 45 dias, a partir da publicação do presente acórdão, conforme os parâmetros acima definidos, incumbindo ao representante judicial da autarquia que for intimado dar ciência à autoridade administrativa competente e tomar as demais providências necessárias ao cumprimento da tutela específica.
Dispositivo
Ante o exposto, voto por negar provimento à apelação e à remessa oficial, nos termos da fundamentação, determinando-se a implantação do benefício de aposentadoria por idade híbrida.
Des. Federal JORGE ANTONIO MAURIQUE
Relator
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 14/09/2017
APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 0006376-67.2016.4.04.9999/SC
ORIGEM: SC 03004766820148240021
RELATOR | : | Des. Federal JORGE ANTONIO MAURIQUE |
PRESIDENTE | : | Paulo Afonso Brum Vaz |
PROCURADOR | : | Fábio Nesi Venzon |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
APELADO | : | MARIA LORENCETTI ZMOZINSKI |
ADVOGADO | : | Marcieli Weschenfelder |
REMETENTE | : | JUIZO DE DIREITO DA 1A VARA DA COMARCA DE CUNHA PORÃ/SC |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 14/09/2017, na seqüência 968, disponibilizada no DE de 28/08/2017, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) Turma Regional suplementar de Santa Catarina, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO E À REMESSA OFICIAL, NOS TERMOS DA FUNDAMENTAÇÃO, DETERMINANDO-SE A IMPLANTAÇÃO DO BENEFÍCIO DE APOSENTADORIA POR IDADE HÍBRIDA.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Des. Federal JORGE ANTONIO MAURIQUE |
VOTANTE(S) | : | Des. Federal JORGE ANTONIO MAURIQUE |
: | Des. Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ | |
: | Des. Federal CELSO KIPPER |
Ana Carolina Gamba Bernardes
Secretária
| Documento eletrônico assinado por Ana Carolina Gamba Bernardes, Secretária, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 9179149v1 e, se solicitado, do código CRC 75554D91. | |
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