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PREVIDENCIÁRIO. CONCESSÃO DE PENSÃO POR MORTE À COMPANHEIRA E EX-ESPOSA. COMPROVAÇÃO DA DEPENDÊNCIA ECONÔMICA. RATEIO. CONSECTÁRIOS. TRF4. 5003256-39.2015....

Data da publicação: 07/07/2020, 23:45:25

EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. CONCESSÃO DE PENSÃO POR MORTE À COMPANHEIRA E EX-ESPOSA. COMPROVAÇÃO DA DEPENDÊNCIA ECONÔMICA. RATEIO. CONSECTÁRIOS. 1. Uma vez comprovado a condição de segurado do de cujus e a dependência previdenciária do requerente, a pensão por morte deve ser deferida. 2. A jurisprudência previdenciária desta Corte distingue duas situações nos casos de cônjuges separados que buscam provar a dependência econômica: a) a dependência econômica do cônjuge separado que recebia pensão de alimentos é presumida (art. 76, §2º c/c art. art. 16, §4º) e b) a dependência econômica do cônjuge separado que não recebia pensão de alimentos deve ser comprovada. 3. Consoante o disposto no artigo 77, do Plano de Benefícios, a pensão por morte, havendo mais de um pensionista, será rateada entre todos, em partes iguais. 4. O Supremo Tribunal Federal reconheceu no RE 870947, com repercussão geral, a inconstitucionalidade do uso da TR. 5. O Superior Tribunal de Justiça, no REsp 1495146, em precedente também vinculante, e tendo presente a inconstitucionalidade da TR como fator de atualização monetária, distinguiu os créditos de natureza previdenciária, em relação aos quais, com base na legislação anterior, determinou a aplicação do INPC, daqueles de caráter administrativo, para os quais deverá ser utilizado o IPCA-E. 6. Estando pendentes embargos de declaração no STF para decisão sobre eventual modulação dos efeitos da inconstitucionalidade do uso da TR, impõe-se fixar desde logo os índices substitutivos, resguardando-se, porém, a possibilidade de terem seu termo inicial definido na origem, em fase de cumprimento de sentença. 7. Os juros de mora, a contar da citação, devem incidir à taxa de 1% ao mês, até 29-06-2009. A partir de então, incidem uma única vez, até o efetivo pagamento do débito, segundo o percentual aplicado à caderneta de poupança. (TRF4, AC 5003256-39.2015.4.04.7129, SEXTA TURMA, Relator ARTUR CÉSAR DE SOUZA, juntado aos autos em 24/04/2019)

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5003256-39.2015.4.04.7129/RS

RELATOR: Juiz Federal ARTUR CÉSAR DE SOUZA

APELANTE: LIA BEATRIZ WOLTMANN (AUTOR)

ADVOGADO: MARLISE SEVERO

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)

APELADO: JANICE ABSY (RÉU)

ADVOGADO: HELENA LANZINI LOSSO

RELATÓRIO

Trata-se de apelação da parte autora de sentença (prolatada em 19/10/2018 na vigência do NCPC) que julgou improcedente os pedidos formulados, cujo dispositivo reproduzo a seguir:

Face ao exposto, JULGO IMPROCEDENTE O PEDIDO.

Custas e Honorários Advocatícios: condeno a parte autora ao pagamento das custas do processo e de honorários advocatícios no montante de 10% (dez por cento) do valor atualizado da causa (IPCA-E), observando-se eventual isenção ou suspensão de exigibilidade em face de AJG deferida nos autos.

Recursos: eventuais apelações interpostas pelas partes restarão recebidas na forma do artigo 1.012 do CPC. Interposto(s) o(s) recurso(s), caberá à Secretaria abrir vista à parte contrária para contrarrazões.

Inconformada, recorreu, alegando, em apertada síntese, que ao contrário do pensamento da magistrada, a saúde precária e sem perspectiva de futuro próximo é conclusão da magistrada, sem qualquer amparo probatório; ainda, não obstante o instituidor do benefício ser portador de deficiência renal, no mais, gozava de saúde perfeita, tanto que se submeteu a transplante de rim vindo a falecer bem depois da alta médica, por complicações de aderência indevida do órgão transplantado.

Outrossim, asseverou que restou demonstrado, nos depoimentos das testemunhas e conversas registradas do casal, que o casamento civil também se consumaria após o divórcio de Elias, não fosse a sua morte, pois já estava separado de fato da ex-esposa há anos.

Prosseguiu, sustentando que no que se refere ao tempo fixado pelo juízo como razoável para preenchimento do requisito “duradouro”, não assiste razão, seja porque a lei não definia à época tempo mínimo de convivência, seja porque, se não durou por mais tempo foi em razão do óbito do parceiro, pois durante o lapso em que conviveram (cerca de 2 anos) o animus de constituir família esteva sempre presente como restou demonstrado através das provas carreadas aos autos, seja através do tratamento dispensado entre ambos, seja em razão da assistência mútua prestada entre os cônjuges, que ao demais,sempre se apresentaram e se comportaram como marido e mulher.

Requereu a reforma da sentença, julgando procedente os pedidos.

Apresentada as contrarrazões, vieram os autos para esta Corte para julgamento.

Na Sessão de 27/03/2019, após a sustentação oral, o julgamento foi adiado.

VOTO

Juízo de admissibilidade

Os apelos preenchem os requisitos legais de admissibilidade.

Objeto da ação

Pugna a parte autora pelo reconhecimento do direito ao benefício de pensão por morte, decorrente do óbito de seu companheiro, Elias Absy, ocorrido em 31/12/2014. Para fins de clareza, transcrevo excerto do relatório da sentença (evento 117, SENT1, p.1):

Trata-se de ação ajuizada contra o INSS visando à concessão e/ou o restabelecimento de pensão por morte requerida por suposto(a) companheiro(a) de ex-segurado(a).

Contestado o feito, e produzidas as provas deferidas e/ou requisitadas pelo Juízo, vieram os autos conclusos para sentença.

Pensão por Morte

Para a obtenção do benefício de pensão por morte deve a parte interessada preencher os requisitos estabelecidos na legislação previdenciária vigente à data do óbito, consoante iterativa jurisprudência dos Tribunais Superiores e desta Corte.

À época, quando do falecimento de ELIAS ABSY, ocorrido em 31/12/2014, a legislação aplicável à espécie - Lei 8.213, de 24 de julho de 1991 (Plano de Benefícios da Previdência Social) apresentava a seguinte redação:

Art. 74 - A pensão por morte será devida ao conjunto dos dependentes do segurado que falecer, aposentado ou não, a contar da data:

I - do óbito, quando requerida até 30 dias depois deste;

II - do requerimento, quando requerida após o prazo previsto no inciso anterior;

III - da decisão judicial, no caso de morte presumida.

São, portanto, três os requisitos para a concessão do benefício de pensão por morte previdenciária:

a) o óbito (ou morte presumida);

b) a qualidade de segurada da pessoa falecida;

c) a existência de dependentes, na forma prevista no artigo 16, da Lei n. 8.213/1991.

O evento morte está comprovado pela certidão de óbito (evento 2, PROCADM1, p.2).

Não há controvérsia em relação à qualidade de segurado de Elias Absy. Ademais, verifico, através do sistema PLENUS, que é instituidor do benefício de Pensão por Morte NB 171.400.161-7 , titulado por Janice Absy (corré nesta ação), DIB 31/12/2014.

A controvérsia cinge-se a alegada união estável entre a autora e o falecido.

Passo a analisar esta questão, para fins de qualificação da parte autora como dependente do (a) falecido (a).

A Constituição Federal de 1988, para efeito da proteção do Estado, reconheceu a união estável entre o homem e a mulher como entidade familiar, remetendo à lei a tarefa de facilitar sua conversão em casamento (artigo 226, § 3º).

A regulamentação do referido dispositivo constitucional veio com a Lei 9.278, de 10 de maio de 1996, que assim estabeleceu em seu artigo 1º:

Art. 1º É reconhecida como entidade familiar a convivência duradoura, pública e contínua, de um homem e uma mulher, estabelecida como objetivo de constituição da família.

Por seu turno, o artigo 16, §3º, da Lei 8.213, de 24 de julho de 1991, em sua redação original, ao dispor sobre os beneficiários do Regime Geral de Previdência Social, na condição de dependentes, definiu como companheiro ou companheira a pessoa que, sem ser casada, mantém união estável com o segurado ou com a segurada, de acordo com o§ 3º do artigo 226 da Constituição Federal.

Posteriormente, o Regulamento da Previdência Social (Decreto nº 3.048. de 06 de maio de 1999), ao especificar a união estável para fins previdenciários, observou o tratamento conferido ao tema pelo artigo 1.723, do Código Civil de 2002, que reconhece como entidade familiar a união estável entre o homem e a mulher, configurada na convivência pública, contínua e duradoura e estabelecida com o objetivo de constituição de família.

Esta disposição legal deve ser interpretada conforme a Constituição Federal de 1988, de modo a dela se excluir qualquer significado que impeça o reconhecimento da união contínua, pública e duradoura entre pessoas do mesmo sexo como família, consoante decidiu o Supremo Tribunal Federal na Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental nº 132 (Relator: Ministro Ayres Britto, Tribunal Pleno, julgado em 05 de maio de 2011, DJe-198 DIVULG 13-10-2011 PUBLIC 14-10-2011).

De toda maneira, para o reconhecimento da união estável, essencial que haja o propósito atual de constituir família, na linha de recente julgado do Superior Tribunal de Justiça, cujo trecho da ementa assim refere:

[...]

2.1 O propósito de constituir família, alçado pela lei de regência como requisito essencial à constituição da união estável - a distinguir, inclusive, esta entidade familiar do denominado "namoro qualificado" -, não consubstancia mera proclamação, para o futuro, da intenção de constituir uma família. É mais abrangente. Esta deve se afigurar presente durante toda a convivência, a partir do efetivo compartilhamento de vidas, com irrestrito apoio moral e material entre os companheiros. É dizer: a família deve, de fato, restar constituída.

2.2. Tampouco a coabitação, por si, evidencia a constituição de uma união estável (ainda que possa vir a constituir, no mais das vezes, um relevante indício

[...]

(REsp 1454643/RJ, Rel. Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, TERCEIRA TURMA, julgado em 03/03/2015, DJe 10/03/2015).

Dessa forma, comprovada a relação intuitu familiae, ou seja, que apresenta convivência duradoura, pública, contínua e reconhecida como tal pela comunidade em que vivem os companheiros, a dependência econômica é presumida, cabendo ao Instituto Nacional do Seguro Social provar o contrário.

Nesse sentido:

PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE DE COMPANHEIRO E GENITOR. DEPENDÊNCIA ECONÔMICA COMPROVADA E PRESUMIDA. QUALIDADE DE SEGURADO ESPECIAL DEMONSTRADA. TUTELA ESPECÍFICA. 1. Na vigência da Lei nº 8.213/91, dois são os requisitos para a concessão de benefício de pensão por morte, quais sejam: a qualidade de segurado do instituidor e a dependência dos beneficiários que, se preenchidos, ensejam o seu deferimento. 2. Presumida a dependência econômica em relação aos filhos e, também, em relação á companheira, pois demonstrada a existência de união estável entre o casal, correta a sentença que concedeu ao autor o benefício de pensão por morte a contar do óbito em relação aos filhos menores, absolutamente incapazes, e a contar do ajuizamento da ação em relação à companheira. 3. Determina-se o cumprimento imediato do acórdão naquilo que se refere à obrigação de implementar o benefício, por se tratar de decisão de eficácia mandamental que deverá ser efetivada mediante as atividades de cumprimento da sentença stricto sensu previstas no art. 461 do CPC, sem a necessidade de um processo executivo autônomo (sine intervallo). (TRF4, APELREEX 0022784-41.2013.404.9999, Sexta Turma, Relator João Batista Pinto Silveira, D.E. 27/07/2015).

PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. CONCESSÃO. QUALIDADE DE DEPENDENTE. UNIÃO ESTÁVEL. CONSECTÁRIOS. 1. A concessão do benefício de pensão por morte depende da ocorrência do evento morte, da demonstração da qualidade de segurado do de cujus e da condição de dependente de quem objetiva a pensão. 2. Para a obtenção do benefício de pensão por morte deve a parte interessada preencher os requisitos estabelecidos na legislação previdenciária vigente à data do óbito, consoante iterativa jurisprudência dos Tribunais Superiores e desta Corte. 3. É presumida a condição de dependência do companheiro, face às disposições contidas no artigo 16, I e § 4º, da Lei 8.213/91. 4. Necessidade de comprovação da união estável, para fim de caracterizar a dependência econômica da companheira, face às disposições contidas no artigo 16, I e § 4º, da Lei 8.213/91. (TRF4, APELREEX 0007002-23.2015.404.9999, Quinta Turma, Relator Rogério Favreto, D.E. 20/07/2015).

Demais, a união estável pode ser demonstrada por prova testemunhal idônea, uma vez que a Lei nº 8.213/91 apenas exige início de prova material para a comprovação de tempo de serviço. (TRF4, AC 0001256-77.2015.404.9999, Sexta Turma, Relatora Vânia Hack de Almeida, D.E. 29/06/2015).

Realizada audiência de instrução e julgamento em 23/07/2014, oportunidade na qual foi tomado o depoimento pessoal da autora e ouvidas cinco testemunhas por ela arroladas: Sras Júlia Maria Szulseveski, Jurema Oliveira da Silva, Adelina Pressi, Nelci Vasconcelos Belinelli e Luiz César Savi e cinco testemunhas da corré Janice Absy: Sras Irene Martins Baltar, Ana Izabel da Costa Stangler, Ademir Alfredo Vieira, Sueli Maria de Oliveira e Célia Cristina da Silva.

No depoimento pessoal da autora Lia Beatriz Woltmann, constaram as declarações abaixo:

Que era divorciada; tem 72 anos, dois filhos casados; que conheceu o Elias em meados de 2012; que é residente em São Leopoldo; que Elias era de Curitiba; que tem uma afilhada que mora em Curitiba e ela é amiga dele e foi apresentada a ele; que a depoente é aposentada pelo INSS e trabalhava como advogada; que a sobrinha e o Elias frequentavam a mesma academia e eram muito amigos; que foi passar uns dias de férias lá e foi apresentada pela sobrinha a ele; que ele era separado; que ele disse que estava uns dois ou três anos separado e morava sozinho em Curitiba; que primeiro quando ía a Curitiba parava na casa da afilhada, depois passaram a se corresponder pela internet, até 2013, que ele foi informando que tinha problemas renais, que não podia viajar porque esperava o transplante primeiro em Curitiba e depois Joinville; que não chegou a morar com ele; que em 2014 começou a frequentar a casa dele, acertado que como ele não podia viajar, esperando o transplante, a depoente é que iria para lá; que a depoente vivia dentro de avião, ou de carro ou de carona indo para lá com ele; que ele morava sozinho; que houve um período em que o filho e o neto moravam com ele, uns dois meses, acho; que havia três impedimentos que o impediam de viajar, era a hemodiálise, o transplante que poderia ser chamado a qualquer hora, e os cuidados com o neto; que ele tinha 68 anos quando faleceu; que a Dona Janice recebe a pensão hoje; que só soube que o benefício tinha sido deferido para Dona Janice depois que o INSS informou; que em 2014 o Elias passou a ajudá-la com as despesas, ; que ele pagava todas as passagens, depositava dinheiro para pagar outras despesas como IPTU, contradomínio, essas coisas assim; depois que desfez a sociedade com a colega passou um período de necessidade, aí ele disse que como se considerava o marido dela, firmou o compromisso, teria que ajudá-la; que quando se separou do primeiro marido nunca recebeu nada; que se separou com 29 anos de idade, ele ajudava com a escola;...que teve um relacionamento com ele em torno de dois anos;... que ele estava em São Leopoldo no dia de natal quando começaram os problemas; que a depoente o acompanhou, avisando os parentes; que dia 27 de dezembro foram para Curitiba; que iriam passar o ano novo em um hotel fazenda em Paranaguá, depois iriam encontrar a filha dele que mora em São Paulo, no dia 04 e 05 de janeiro, depois iriam para São Leopoldo, passando antes em Joinville, porque tinha que ir lá todo o mês, e daí iria para São Leopoldo, já levando a mudança porque não iria mais morar em Curitiba; que ele começou a passar mal no dia 25 de dezembro, no dia 26 passou o dia na UNIMED de São Leopoldo, dia 27 pela manhã foram para Curitiba e dia 28 ele baixou hospital lá e não saiu mais; que foi apresentada para o filho e o neto de Elias; que a apresentou como companheira; que conheceu o irmão dele e foi apresentada também como companheira; que a relação com os parentes dele era muito boa, pois toda vez que estava lá almoçavam juntos, na casa do irmão ou em um restaurante fora, o filho e neto também. Nada mais.

No depoimento da ré Janice Absy, por sua vez, foram referidas estas informações:

Que se casou com o Eli dia 18 de dezembro de 1971; que teve dois filhos com ele, o filho 43 e a filha 42; que nunca estiveram separados; que moravam em cidades diferentes; que a depoente mora em Florianópolis e ele morava em Curitiba; que morou com o Elias de 77 a 85 em Florianópolis, depois de 2000 a 2010; que depois ele quis ir para Curitiba e a depoente não quis; que ele foi para Curitiba em 2007; que durante 7 anos a depoente e o instituidor do benefício moraram em cidades diferente; que ía seguidamente à Curitiba; que os pais moravam em Curitiba e mudaram há dois anos para a Bahia; que quando do óbito de Elias a depoente foi para ficar com as netas para a filha acompanhar o enterro do pai; que a depoente não foi ao enterro dele; que a depoente não estava vivendo com o Elias; que a depoente não trabalha, vive da pensão do Elias; que antes dele falecer ele sustentava a depoente; que ele sempre pagou as contas da depoente; que nunca chegaram a separar no papel; que trabalhou antes de casar e depois por seis meses; que é dona de casa, tem dois filhos com Elias e três netos; que mesmo depois de separados ele mantinha a família; que nestes sete anos de separação ela só se manteve com o que ele lhe deu; que depois que tomou conhecimento da existência de dona Lia, chegou a conversar com a advogada sobre a possibilidade de separação...Nada mais.

A testemunha Adelina Pressi, prestou depoimento, com o seguinte teor:

Que conhece a Dona Lia; que eram colegas; que conheceu o Sr. Elias, e que ele esteve em São Leopoldo/RS depois de realizar o transplante de rins, sendo que antes ele não vinha porque estava aguardando o transplante, e por conta disso era a autora quem viajava para lá; que o viu várias vezes; que o Sr. Elias esteve por duas vezes em São Leopoldo, porém, nestas duas vezes, enquanto permanecia na cidade, esteve várias vezes no escritório, sendo que a primeira vez foi em novembro/2014; que ficou por uns 20 a 30 dias e então voltou à Curitiba, em razão de consultas médicas e logo retornou novamente para São Leopoldo; que o conheceu em novembro de 2014; que ele tinha esse relacionamento bastante sério com a autora; que quando ele ligava para o escritória se referia a Lia como "minha esposa"; e inclusive ambos usavam aliança na mão esquerda; Relatou que a partir do início de 2014 a autora foi muitas vezes para Curitiba, lá permanecendo por períodos longos, tendo acompanhado ele na cirurgia, e todo período de hospitalização; que os familiares da autora (seus clientes) relataram que ela havia conhecido o Sr. Elias por intermédio de uma sobrinha, ocasião em que esteve de férias no Paraná, no início de 2013; que depois disso eles ficaram se relacionando por telefone, por internet; que ele esteve na festa de fim de ano do escritório e também o avistou na inauguração de uma loja acompanhando a autora; que a Lia foi para lá porque ele fora chamado para realizar o transplante e ela foi para acompanhá-lo; que na primeira vez que ele veio a São Leopoldo ficou na casa da Lia umas duas semanas; que quando ele retornasse iriam para um hotel em Capão da Canoa; que a depoente disse que poderia locar o apartamento que tem em Capão da Canoa para eles; que o Sr. Elias teria conversado com ela sobre o seu desejo de divorciar-se da esposa para poder formalizar o seu relacionamento com a Sra. Lia, inclusive já teria contratado uma profissional em Curitiba para fazer esta separação; que inclusive a consultou se não poderia fazer esta separação em São Leopoldo, ao que a depoente o aconselhou que fizesse lá. Nada mais.

A testemunha Jurema Oliveira da Silva, prestou depoimento, com o seguinte teor:

Que era diarista da autora; que conheceu o Sr. Elias pela internet, e que ele teria vindo a São Leopoldo, em novembro, quando o conheceu; que a Sra. Lia viajava frequentemente para Curitiba para ficar com ele; que trabalhava como diarista na casa da Sra Lia desde o início do ano de 2014 e neste período ela viajou para Curitiba muitas vezes; que quando o Sr. Elias veio para São Leopoldo, a Sra. Lia arrumou uma parte do guarda roupa para ele utilizar; que ainda tem roupa dele lá; que o Sr. Elias e a autora usavam alianças; que ele fazia compras para casa, como rancho; que o Sr. Elias chegou a pagar pelo serviço dela; que ele adorava ela; que era possível ver pelo o olhar dele; que os filhos da Lia conheceram ele; Referiu que o Sr. Elias teria deixado roupas na casa da autora, e objetos de uso pessoal, como o tablet, o notebook e o aparelho celular. Nada mais.

A testemunha Júlia Maria Szulseveski, prestou depoimento, com o seguinte teor:

Que conheceu a autora por meio de amigos em comum; que trabalha para Dona Lia; que teria dado carona a ela até Itapema, em Florianópolis/SC, e que nesta oportunidade a autora foi ao encontro do Sr. Elias; que eles ficaram no mesmo hotel; que ele foi apresentado pela autora como seu companheiro, e que, neste momento, ele mesmo teria corrigido, referindo ser o marido dela, sempre a chamando de minha mulher; que logo depois eles colocaram aliança; que ela voltou para Curitiba com ele; que, posteriormente, reencontrou com o Sr Elias, ele já tinha feito o transplante; que quando ele veio a São Leopoldo, fizeram uma reuniãozinho de amigos em comum; que ele se referia sempre a ela como minha mulher; que o conheceu em março de 2014; que a Lia lhe pediu carona até Itapema porque o Elias iria encontrá-la lá. Nada mais.

As testemunhas Nelci Vasconcelos Belinelli e Luiz César Savi relataram:

que conheciam a Sra. Lia e o Sr. Elias, sendo que o Luís era amigo do Sr. Elias e a Nelci conheceu o casal no apartamento “deles”, onde trabalhava passando roupa, uma vez por semana, desde o início do ano de 2014; que viu a dona Lia lá umas três vezes na casa do Sr. Elias; que era o Sr. Elias que lhe pagava; que o Sr. Luís, por sua vez, veio a conhecer a autora por intermédio do Sr. Elias, sendo que a avistou na companhia do Sr. Elias por umas 4 ou 5 vezes; que se encontrava com o Sr. Elias apenas uma vez por semana, quando almoçavam em um restaurante, sendo que em uma destas oportunidades foi apresentado à autora, mas que ele sabia do relacionamento desde o começo de 2013; que o Elias se referia à Sra. Lia como sendo sua companheira, mulher, e minha linda; a depoente Nelci asseverou que havia roupas da autora no apartamento do Sr. Elias em Curitiba; que o Sr. Elias chamava dona Lia de "minha linda"; que cada vez que a autora ia para Curitiba permanecia por aproximadamente uma semana; que o casal costumava viajar junto, e que os reconhecia como casal; que o filho e o neto do Sr. Elias moraram por quase um ano na casa do Sr. Elias e que ele trabalhava em uma plataforma, onde ficava embarcado por em média um mês, período em que o Sr. Elias cuidava do neto; que foi no velório do Sr. Elias e que Sra. Lia estava presente recebendo as condolências, sendo que também se faziam presentes a filha, irmãos e a cunhada; o Sr. Luís confirmou que a Sra. Lia estava presente recebendo as condolências no dia do velório, junto com outras pessoas da família; que quem o informou do velório foi a Dona Lia, e que a Sra. Janice não estava presente; que o Sr. Elias levava bastante a sério esse relacionamento; que depois que ele a conheceu, eles praticamente se encontravam todo o final de semana, ele mesmo agendava e pagava as passagens para ela encontrá-lo em Curitiba/PR; que o Sr. Elias não morava com a autora pelo fato de ser paciente renal crônico, fazia hemodiálise 03 vezes por semana o que dificultava seu deslocamento, motivo pelo qual ela que se deslocava para Curitiba...que o Elias disse que ele pagava as passagens. Nada mais.

A testemunha Irene Martins Baltar referiu:

Que conhece a Janice desde 1982, eram vizinhas; que conhece o casal desde 1982; que a depoente mudou de casa 8 vezes; que a Janice mais; que nem a depoente e nem o marido foram informados que havia uma separação entre o Elias e a Janice; que nunca escutou do casal que um morava em Florianópolis e outro em Curitiba; que não sabia de um relacionamento fora do casamento... Nada mais.

A testemunha Ana Izabel da Costa Stangler relatou o que segue:

Que o casal é amigo do casal do falecido Elias quase quarenta anos; que o falecido não queria que Janice trabalhasse, ele "melava" o trabalho dela, que o que ela ganhava em Curitiba era para pagar os moletons das crianças; que eles estavam em Florianópolis e depois da separação ele foi para Curitiba; que sabe que ele estava separado de Janice e que ele namorava; que soube que ele tinha uma namorada no nordeste e que ele ajudava; que mandava dinheiro para o filho, tinha comprado uma aliança e tinha uma no sul; que depois de separados, eles fizeram um acordo, ele dava para ela a metade; que ela sobrevivia da pensão dele...Nada mais.

As testemunhas Ademir Alfredo Vieira, Sueli Maria de Oliveira e Célia Cristina da Silva relataram:

Que conheciam o seu Elias; quem indicou os depoentes para serem testemunha foi o filho do seu Elias, o João; que os depoentes são testemunhas que moravam próximo de seu Elias; o depoente Ademir continua sendo porteiro do prédio onde residia o seu Elias; que conheceu a Nelci, era diarista e ía trabalhar na casa do seu Elias uma vez por semana; que não conhecia nenhuma namorada do senhor Elias; que não conhecia a dona Lia; que a viu uma vez logo que ele fez o transplante, e na véspera do falecimento dele; que a outra depoente morava no andar de cima e a outra tem um restaurante no qual ele comia todos os dias sozinho; que viu dona Lia uma vez só quando ele a levou para comer no restaurante e ele não a apresentou; que a testemunha Celia afirmou que conhecia o seu Elias lá do prédio; que quando ele caiu e quebrou o braço foi ela que o acudiu; que almoçavam no mesmo restaurante no mesmo horário; que viu dona Lia uma vez no restaurante com ele e não foi apresentada; que depois é que soube que ela era namorada dele; o depoente Ademir, porteiro do prédio, afirmou que o falecido Elias tinha apresentado Lia como sua namorada; que as testemunhas não foram ao velório. Nada mais.

Esses testemunhos já seriam suficientes à comprovação da união estável. Porém, há outros elementos nos autos que confirmam idêntico propósito, a saber:

a) Envelopes de correspondência destinadas à Lia Beatriz Woltmann, expedida por Elias Absy em 20/06/2014, em 04/07/2014 (evento 1, OUT7 e OUT8, pp. 1/2);

b) Ficha de internação de Elias Absy no hospital UNIMED, na qual a autora figura como cônjuge (evento 2, PROCADM1, p.10);

c) Receituário de controle especial em nome de Elias Absy, datado de 26/12/2014 em São Leopoldo/RS (evento 2, PROCADM1, pp 13/14);

d) Comprovantes de consultas e exames realizados em 26/12/2014, por Elias, em São Leopoldo-RS, figurando a autora como acompanhante (evento 2, PROCADM1, pp.15/17);

e) Extrato de conta corrente do Banco do Brasil em nome da autora, acusando transferência em 22/09/2014 de R$ 2.000,00 (dois mil reais) efetuada por Elias Absy (evento 2, PROCADM1, p.20);

f) Extrato de conta corrente do Banco do Brasil em nome da autora, acusando transferência em 25/11/2014 de R$ 300,00 (trezentos reais) efetuada por Elias Absy (evento 2, PROCADM1, p.22);

g) Extrato de conta corrente do Banco do Brasil em nome da autora, acusando depósito em 11/08/2014 de R$ 1.500,00 (um mil e quinhentos reais) efetuada por Paulo Roberto, irmão de Elias Absy (evento 2, PROCADM1, p.24);

h) Cópia de e-mail trocado entre Lia e Elias em 26/06/2014 (evento 2, PROCADM1, p.27);

i) Bilhete de passagem aérea em nome da autora realizada de 06/08/2014 de Porto Alegre/RS a Joinville/SC (evento 2, PROCADM1, p.40);

j) Bilhete de passagem aérea em nome da autora realizada de 16/05/2014 de Porto Alegre/RS a Curitiba/PR (evento 2, PROCADM1, p.44);

k) Recibo de pagamento de Hotel Ibis em Joinville, diaria em 06/08/2014, no qual a autora está cadastrada no endereço de Elias (evento 2, PROCADM1, p. 68);

l) Bilhetes afetivos escritos por Elias Absy à Lia (evento 2, PROCADM1, p.78);

m) Ata notarial na qual são transcritos mensagens de aplicativos de internet entre o falecido e a autora (evento 2, PROCADM1, p.79);

n) Fotos de Elias no hospital em seu tratamento (evento 2, PROCADM1, p.137);

o) Fotos de Elias e da autora em família, em aniversários, viagens, e no Natal de 2014 e alianças, com nora, neto e irmão (evento 2, PROCADM1,pp.131/149;

p) Foto de Elias após realizado o transplante em Joinville - SC (evento 2, PROCADM1, p.131);

q) Foto de Elias e a autora na noite de natal/2014 em São Leopoldo RS (evento 2, PROCADM1, p.145);

r) Declaração de Maria Lúcia Absy, irmã do falecido, expedida em 06/02/2015, na qual declara que seu irmão estava separado de fato de Janice Absy há mais de 05 anos e que manteve união estável com a autora (evento 2, PROCADM1, p.150).

Outrossim, entendeu o Juízo de origem pela improcedência do pedido, sob fundamento de que a saúde do instituidor do benefício era precária e que a relação durara tão somente 2 anos e que a autora já o conheceu enfermo, com sérias limitações físicas e sem muitas perspectivas de voltar a uma vida normal.

Destarte, no que se refere à união estável, os requisitos estabelecidos na legislação previdenciária vigente à data do óbito não fixam tempo mínimo de união entre o casal, para o reconhecimento de união estável.

Ainda, a Constituição Federal reconheceu a união estável entre homem e mulher, independentemente do lapso temporal dos conviventes, artigo 226, §3º. Assim, irrelevante que a relação da autora com o instituidor do benefício tenha durado 2 anos, à análise de um relacionamento "duradouro".

Com efeito, a própria irmã de Elias Absy, Maria Lúcia Absy vem aos autos reconhecendo o relacionamento, a união estável havida entre o seu irmão e a autora (evento 19, PROCADM1, p.146)

No que se refere à prova oral, as testemunhas arroladas pela corré Janice, Ademir Alfredo Vieira, Sueli Maria de Oliveira e Célia Cristina da Silva vizinhos e porteiro do prédio no qual Elias morava restaram fragilizados diante de afirmações inconsistentes e contraditórias. Ademir, o porteiro, afirmou de maneira enfática no início de seu depoimento: que não conhecia nenhuma namorada do senhor Elias; no entanto, ao final de seu depoimento, disse: que o falecido Elias tinha apresentado Lia como sua namorada; as demais relatam que o viram no restaurante com a autora, mas que ele não a apresentara, dando a idéia tratar-se de pessoas íntimas do falecido que justificasse a apresentação daquela pessoa a elas; entretanto, nenhuma das três testemunhas se fez presente ao velório de Elias.

Da mesma forma chama a atenção o depoimento da testemunha arrolada pela corré, Sra Ana Izabel quando afirmou: que ele namorava; que soube que ele tinha uma namorada no nordeste e que ele ajudava; que mandava dinheiro para o filho, tinha comprado uma aliança e tinha uma no sul, fato não levantado nos autos, sequer mencionado pela corré Janice, mitigando as relações afetivas do falecido.

Igualmente fragilizado o depoimento da testemunha Irene que informou ser ela e o marido amigos íntimos do casal Elias e Janice Absy, e que nunca souberam de separação do casal, tampouco a existência de um relacionamento fora do casamento por parte de Elias. Ora, a própria corré Janice reconheceu a separação de fato e a existência de Lia.

De resto, as demais testemunhas foram unânimes em relatar a afetividade, a convivência pública do casal. Hipótese que está estribada no vasto acerbo de documentos acostados aos autos, como passagens aéreas da autora para Curitiba, reserva de hotéis, fotos de Elias com a autora e amigos e familiares.

A testemunha Adelina relatou: que quando ele ligava para o escritória se referia a Lia como "minha esposa"; e inclusive ambos usavam aliança na mão esquerda; Relatou que a partir do início de 2014 a autora foi muitas vezes para Curitiba. Já a depoente Jurema, diarista da autora disse: que quando o Sr. Elias veio para São Leopoldo, a Sra. Lia arrumou uma parte do guarda roupa para ele utilizar; ...que ele adorava ela; que era possível ver pelo o olhar dele; que os filhos da Lia conheceram ele; referiu que o Sr. Elias teria deixado roupas na casa da autora, e objetos de uso pessoal, como o tablet, o notebook e o aparelho celular; ainda, a testemunha Júlia Maria enfatiza: que quando ele veio a São Leopoldo, fizeram uma reuniãozinho de amigos em comum; que ele se referia sempre a ela como minha mulher; por fim, as testemunhas Nelci e Luiz relataram: que o Elias se referia à Sra. Lia como sendo sua companheira, mulher, e minha linda; a depoente Nelci asseverou que havia roupas da autora no apartamento do Sr. Elias em Curitiba; que o Sr. Elias chamava dona Lia de "minha linda".

Sopesando a prova oral, tenho que, em sua maioria corroborou a documentação acostada pela autora, na medida em que confirmaram o vínculo existente entre o casal.

Nesse diapasão, entendo que é possível formar um juízo de certeza acerca da união estável havida entre a requerente e o falecido, pois que os elementos instrutórios do feito dão conta que, além de manterem uma relação de confiança recíproca, conviviam publicamente, com laços afetivos contínuos e duradouros e estabelecidos com o objetivo de constituição familiar, em condições que configuram o reconhecimento da união estável, nos termos do art. 1.723 do CC.

Vale repisar, que a coabitação trata-se de requisito cuja prescindibilidade tem sido reconhecida, inclusive, nos casos de união estável, consoante demonstra o julgado do STJ abaixo ementado:

DIREITOS PROCESSUAL CIVIL E CIVIL. UNIÃO ESTÁVEL. REQUISITOS. CONVIVÊNCIA SOB O MESMO TETO. DISPENSA. CASO CONCRETO. LEI N. 9.728/96. ENUNCIADO N. 382 DA SÚMULA/STF. ACERVO FÁTICO-PROBATÓRIO. REEXAME. IMPOSSIBILIDADE. ENUNCIADO N. 7 DA SÚMULA/STJ. DOUTRINA. PRECEDENTES. RECONVENÇÃO. CAPÍTULO DA SENTENÇA. TANTUM DEVOLUTUM QUANTUM APELLATUM. HONORÁRIOS. INCIDÊNCIA SOBRE A CONDENAÇÃO. ART. 20, § 3º, CPC. RECURSO PROVIDO PARCIALMENTE.

I - Não exige a lei específica (Lei n. 9.728/96) a coabitação como requisito essencial para caracterizar a união estável. Na realidade, a convivência sob o mesmo teto pode ser um dos fundamentos a demonstrar a relação comum, mas a sua ausência não afasta, de imediato, a existência da união estável.

II - Diante da alteração dos costumes, além das profundas mudanças pelas quais tem passado a sociedade, não é raro encontrar cônjuges ou companheiros residindo em locais diferentes.

III - O que se mostra indispensável é que a união se revista de estabilidade, ou seja, que haja aparência de casamento, como no caso entendeu o acórdão impugnado. (...)

(STJ, Quarta Turma, REsp 474962, Processo: 200200952476/SP, DJ 01-03-2004, Relator Min. SÁLVIO DE FIGUEIREDO TEIXEIRA)

Nesse sentido, recente julgado na Sexta do Turma do TRF4:

PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. QUALIDADE DE DEPENDENTE. PACTO ANTENUPCIAL. COABITAÇÃO. DESNECESSIDADE. UNIÃO ESTÁVEL COMPROVADA. BENEFÍCIO DEVIDO. SENTENÇA REFORMADA. 1. Para a obtenção do benefício de pensão por morte, deve a parte interessada preencher os requisitos estabelecidos na legislação previdenciária vigente à data do óbito, consoante iterativa jurisprudência dos Tribunais Superiores e desta Corte. 2. É presumida a dependência econômica da companheira que vivia em união estável com o de cujus. 3. A união estável pode ser demonstrada por testemunhos idôneos e coerentes, informando a existência da relação more uxório. A Lei nº 8.213/91 apenas exige início de prova material para a comprovação de tempo de serviço. 4. A divergência nos endereços constantes de documentos não é suficiente para afastar a existência da união estável, uma vez que a coabitação sequer é requisito essencial para o seu reconhecimento. Precedente. 5. Comprovadas a união estável e, por conseguinte, a dependência econômica da autora em relação ao de cujus, além dos demais requisitos, deve ser mantida a sentença que determinou ao INSS que conceda a pensão por morte à requerente. (TRF4, APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 0003480-85.2015.404.9999, 6ª TURMA, Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA, POR UNANIMIDADE, D.E. 29/06/2015, PUBLICAÇÃO EM 30/06/2015)

Assim, diante do contexto probatório carreado aos autos não há como negar o direito da autora em receber a quota parte da pensão em razão da morte de Elias Absy, pois comprovada a qualidade de segurado do falecido, e a condição de companheira do ex-segurado, o que lhe confere o enquadramento na qualidade de dependente nos moldes do art. 16, inc. I, da Lei nº 8.213/91; preenchidos, então, os requisitos legais à concessão do benefício postulado pela parte autora, há que se reformar a sentença para conceder à Lia Beatriz Woltmann o benefício de pensão por morte.

Termo Inicial

A situação fática estava sob a regência normativa do artigo 74, II da Lei 8.213/941, de 24 de julho de 1991 (Plano de Benefícios da Previdência Social), do requerimento administrativo, quando requerida após o prazo de 30 dias. Nessa senda, o óbito ocorreu em 31/12/2014 e o requerimento administrativo se deu em 25/03/2015 (evento 2, PROCADM1, p. 177), deve a quota parte do benefício ser concedida desde a data do requerimento administrativo em 25/03/2015.

Entretanto, consoante o disposto no artigo 77, do Plano de Benefícios, a pensão por morte, havendo mais de um pensionista, será rateada entre todos, em partes iguais. Como foi demonstrado que o de cujus mantinha união estável com Lia Beatriz Woltmann, e que Janice Absy era dependente do falecido e que já era titular do benefício de pensão por morte por ele instituída, o benefício será rateado entre ambas na proporção de 50% para cada parte.

Como a parte autora logrou êxito dos pedidos, invertem-se os ônus da sucumbência, nos termos do art. 86, parágrafo único, do novo Código de Processo Civil (CPC), para condenar as requeridas ao pagamento de custas e honorários advocatícios, como segue.

Correção monetária

A correção monetária, segundo o entendimento consolidado na 3ª Seção deste TRF4, incidirá a contar do vencimento de cada prestação e será calculada pelos seguintes índices oficiais:

- IGP-DI de 05/96 a 03/2006, art. 10 da Lei n.º 9.711/98, combinado com o art. 20, §§5º e 6º, da Lei n.º 8.880/94;

- INPC a partir de 04/2006, de acordo com a Lei n.º11.430/06, precedida da MP n.º 316, de 11/08/2006, que acrescentou o art. 41-A à Lei n.º 8.213/91, sendo que o art. 31 da Lei n.º 10.741/03, determina a aplicabilidade do índice de reajustamento dos benefícios do RGPS às parcelas pagas em atraso.

A incidência da TR como índice de correção monetária dos débitos judiciais da Fazenda Pública foi afastada pelo Supremo Tribunal Federal, no julgamento do RE 870947, com repercussão geral, tendo-se determinado, no recurso paradigma a utilização do IPCA-E, como já havia sido determinado para o período subsequente à inscrição em precatório, por meio das ADIs 4.357 e 4.425.

Interpretando a decisão do STF, e tendo presente que o recurso paradigma que originou o precedente tratava de condenação da Fazenda Pública ao pagamento de débito de natureza não previdenciária (benefício assistencial), o Superior Tribunal de Justiça, em precedente também vinculante (REsp 1495146), distinguiu, para fins de determinação do índice de atualização aplicável, os créditos de natureza previdenciária, para estabelecer que, tendo sido reconhecida a inconstitucionalidade da TR como fator de atualização,deveria voltar a incidir, em relação a tal natureza de obrigação, o índice que reajustava os créditos previdenciários anteriormente à Lei 11.960/09, ou seja,o INPC.

Importante ter presente, para a adequada compreensão do eventual impacto sobre os créditos dos segurados, que os índices em referência - INPC e IPCA-E tiveram variação praticamente idêntica no período transcorrido desde julho de 2009 até setembro de 2017, quando julgado o RE 870947, pelo STF (IPCA-E: 64,23%; INPC 63,63%), de forma que a adoção de um ou outro índice nas decisões judiciais já proferidas não produzirá diferenças significativas sobre o valor da condenação.

A conjugação dos precedentes acima resulta na aplicação do INPC aos benefícios previdenciários, a partir de abril 2006, reservando-se a aplicação do IPCA-E aos benefícios de natureza assistencial.

Em data de 24 de setembro de 2018, o Ministro Luiz Fux, relator do RE 870947 (tema 810), deferiu efeito suspensivo aos embargos de declaração opostos pela Fazenda Pública, por considerar que a imediata aplicação da decisão daquela Corte, frente à pendência de pedido de modulação de efeitos, poderia causar prejuízo "às já combalidas finanças públicas".

Em face do efeito suspensivo deferido pelo STF sobre o próprio acórdão, e considerando que a correção monetária é questão acessória no presente feito, bem como que o debate remanescente naquela Corte Suprema restringe-se à modulação dos efeitos da decisão de inconstitucionalidade, impõe-se desde logo, inclusive em respeito à decisão também vinculante do STJ, no tema 905, o estabelecimento do índice aplicável - INPC para os benefícios previdenciários e IPCA-E para os assistenciais -, cabendo, porém, ao juízo de origem observar, na fase de cumprimento do presente julgado, o que vier a ser deliberado nos referidos embargos declaratórios.

Juros de mora

Os juros de mora devem incidir a partir da citação.

Até 29-06-2009, os juros de mora devem incidir à taxa de 1% ao mês, com base no art. 3º do Decreto-Lei n. 2.322/87, aplicável analogicamente aos benefícios pagos com atraso, tendo em vista o seu caráter eminentemente alimentar, consoante firme entendimento consagrado na jurisprudência do STJ e na Súmula 75 desta Corte.

A partir de então, deve haver incidência dos juros, uma única vez, até o efetivo pagamento do débito, segundo o índice oficial de remuneração básica aplicado à caderneta de poupança, nos termos estabelecidos no art. 1º-F, da Lei 9.494/97, na redação da Lei 11.960/2009, considerado hígido pelo STF no RE 870947, com repercussão geral reconhecida. Os juros devem ser calculados sem capitalização, tendo em vista que o dispositivo determina que os índices devem ser aplicados "uma única vez" e porque a capitalização, no direito brasileiro, pressupõe expressa autorização legal (STJ, 5ª Turma, AgRgnoAgRg no Ag 1211604/SP, Rel. Min. Laurita Vaz).

Honorários advocatícios

Incide, no caso, a sistemática de fixação de honorários advocatícios prevista no art. 85 do NCPC, porquanto a sentença foi proferida após 18/03/2016 (data da vigência do NCPC definida pelo Pleno do STJ em 02/04/2016).

Invertidos os ônus sucumbenciais, estabeleço a verba honorária em 10% (dez por cento) sobre as parcelas vencidas até a data do presente julgado, considerando as variáveis dos incisos I a IV do § 2º do artigo 85 do NCPC.

Custas e despesas processuais

O INSS é isento do pagamento das custas processuais quando demandado na Justiça Estadual do Rio Grande do Sul, devendo, contudo, pagar eventuais despesas processuais, como as relacionadas a correio, publicação de editais e condução de oficiais de justiça (artigo 11 da Lei Estadual nº 8.121/85, com a redação da Lei Estadual nº 13.471/2010, já considerada a inconstitucionalidade formal reconhecida na ADI nº 70038755864 julgada pelo Órgão Especial do TJ/RS).

Cumprimento imediato do julgado (tutela específica)

Considerando a eficácia mandamental dos provimentos fundados no art. 497 do novo CPC, que repete dispositivo constante do art. 461 do antigo CPC, e tendo em vista que a presente decisão não está sujeita, em princípio, a recurso com efeito suspensivo (TRF4, 3ª Seção, Questão de Ordem na AC n. 2002.71.00.050349-7/RS, Rel. para o acórdão Des. Federal Celso Kipper, julgado em 09/08/2007), determino o cumprimento imediato do acórdão, a ser efetivado em 45 dias, mormente pelo seu caráter alimentar e necessidade de efetivação imediata dos direitos sociais fundamentais.

Prequestionamento

O prequestionamento da matéria segue a sistemática prevista no art. 1.025 do CPC/2015.

Conclusão

Dado parcial provimento à apelação da parte autora, eis que o benefício será rateado entre ambas na proporção de 50% para cada parte. Invertidos os ônus sucumbenciais, estabeleço a verba honorária em 10% (dez por cento) sobre as parcelas vencidas até a data do presente julgado, considerando as variáveis dos incisos I a IV do § 2º do artigo 85 do NCPC, adequando consectários à orientação do STF no RE 870947, determinando o cumprimento imediato do acórdão.

Dispositivo

Ante o exposto, voto por dar parcial provimento à apelação da parte autora, determinando o cumprimento imediato do acórdão.



Documento eletrônico assinado por ARTUR CÉSAR DE SOUZA, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40000949425v74 e do código CRC 3f019145.Informações adicionais da assinatura:
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5003256-39.2015.4.04.7129
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Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5003256-39.2015.4.04.7129/RS

RELATOR: Juiz Federal ARTUR CÉSAR DE SOUZA

APELANTE: LIA BEATRIZ WOLTMANN (AUTOR)

ADVOGADO: MARLISE SEVERO

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)

APELADO: JANICE ABSY (RÉU)

ADVOGADO: HELENA LANZINI LOSSO

EMENTA

PREVIDENCIÁRIO. CONCESSÃO DE PENSÃO POR MORTE À companheira e EX-ESPOSA. COMPROVAÇÃO DA DEPENDÊNCIA ECONÔMICA. RATEIO. consectários.

1. Uma vez comprovado a condição de segurado do de cujus e a dependência previdenciária do requerente, a pensão por morte deve ser deferida.

2. A jurisprudência previdenciária desta Corte distingue duas situações nos casos de cônjuges separados que buscam provar a dependência econômica: a) a dependência econômica do cônjuge separado que recebia pensão de alimentos é presumida (art. 76, §2º c/c art. art. 16, §4º) e b) a dependência econômica do cônjuge separado que não recebia pensão de alimentos deve ser comprovada.

3. Consoante o disposto no artigo 77, do Plano de Benefícios, a pensão por morte, havendo mais de um pensionista, será rateada entre todos, em partes iguais.

4. O Supremo Tribunal Federal reconheceu no RE 870947, com repercussão geral, a inconstitucionalidade do uso da TR.

5. O Superior Tribunal de Justiça, no REsp 1495146, em precedente também vinculante, e tendo presente a inconstitucionalidade da TR como fator de atualização monetária, distinguiu os créditos de natureza previdenciária, em relação aos quais, com base na legislação anterior, determinou a aplicação do INPC, daqueles de caráter administrativo, para os quais deverá ser utilizado o IPCA-E.

6. Estando pendentes embargos de declaração no STF para decisão sobre eventual modulação dos efeitos da inconstitucionalidade do uso da TR, impõe-se fixar desde logo os índices substitutivos, resguardando-se, porém, a possibilidade de terem seu termo inicial definido na origem, em fase de cumprimento de sentença.

7. Os juros de mora, a contar da citação, devem incidir à taxa de 1% ao mês, até 29-06-2009. A partir de então, incidem uma única vez, até o efetivo pagamento do débito, segundo o percentual aplicado à caderneta de poupança.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 6ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, dar parcial provimento à apelação da parte autora, determinando o cumprimento imediato do acórdão, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Porto Alegre, 15 de abril de 2019.



Documento eletrônico assinado por ARTUR CÉSAR DE SOUZA, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40000949426v3 e do código CRC c1f0e26c.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): ARTUR CÉSAR DE SOUZA
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5003256-39.2015.4.04.7129
40000949426 .V3


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Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIãO

EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 27/03/2019

Apelação Cível Nº 5003256-39.2015.4.04.7129/RS

RELATOR: Juiz Federal ARTUR CÉSAR DE SOUZA

PRESIDENTE: Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA

SUSTENTAÇÃO ORAL: HELENA LANZINI LOSSO por JANICE ABSY

APELANTE: LIA BEATRIZ WOLTMANN (AUTOR)

ADVOGADO: MARLISE SEVERO

APELADO: JANICE ABSY (RÉU)

ADVOGADO: HELENA LANZINI LOSSO

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)

Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 27/03/2019, na sequência 534, disponibilizada no DE de 12/03/2019.

Certifico que a 6ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:

APÓS A SUSTENTAÇÃO ORAL, FOI SUSPENSO O JULGAMENTO POR INDICAÇÃO DO RELATOR.



Conferência de autenticidade emitida em 07/07/2020 20:45:23.

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIãO

EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 15/04/2019

Apelação Cível Nº 5003256-39.2015.4.04.7129/RS

RELATOR: Juiz Federal ARTUR CÉSAR DE SOUZA

PRESIDENTE: Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA

APELANTE: LIA BEATRIZ WOLTMANN (AUTOR)

ADVOGADO: MARLISE SEVERO

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)

APELADO: JANICE ABSY (RÉU)

ADVOGADO: HELENA LANZINI LOSSO

Certifico que a 6ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:

A 6ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, DAR PARCIAL PROVIMENTO À APELAÇÃO DA PARTE AUTORA, DETERMINANDO O CUMPRIMENTO IMEDIATO DO ACÓRDÃO.

RELATOR DO ACÓRDÃO: Juiz Federal ARTUR CÉSAR DE SOUZA

Votante: Juiz Federal ARTUR CÉSAR DE SOUZA

Votante: Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA

Votante: Juíza Federal TAIS SCHILLING FERRAZ



Conferência de autenticidade emitida em 07/07/2020 20:45:23.

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