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PREVIDENCIÁRIO. CONCESSÃO DE PENSÃO POR MORTE DE AVÔ AO NETO QUE DELE RECEBIA PENSÃO ALIMENTÍCIA. COMPROVAÇÃO DA DEPENDÊNCIA ECONÔMICA. NECESSIDADE DE DILA...

Data da publicação: 27/05/2022, 07:01:19

EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. CONCESSÃO DE PENSÃO POR MORTE DE AVÔ AO NETO QUE DELE RECEBIA PENSÃO ALIMENTÍCIA. COMPROVAÇÃO DA DEPENDÊNCIA ECONÔMICA. NECESSIDADE DE DILAÇÃO PROBATÓRIA. ANULAÇÃO DA SENTENÇA. 1. A concessão do benefício de pensão por morte depende da ocorrência do evento morte, da demonstração da qualidade de segurado do de cujus e da condição de dependente de quem objetiva a pensão. 2. In casu, é necessária a dilação probatória, a fim de esclarecer a real situação vivenciada pelo autor desde o seu nascimento até a data do óbito do avô, de quem passou a receber pensão alimentícia com menos de um ano de idade. 3. Sentença anulada, para determinar a reabertura da instrução. (TRF4, AC 5016297-03.2019.4.04.7204, TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DE SC, Relator PAULO AFONSO BRUM VAZ, juntado aos autos em 19/05/2022)

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5016297-03.2019.4.04.7204/SC

RELATOR: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ

APELANTE: CARLOS EDUARDO DA SILVA VOTRE (Absolutamente Incapaz (Art. 3º CC)) (AUTOR)

APELANTE: ADRIANA DE SOUZA DA SILVA (Pais) (AUTOR)

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)

RELATÓRIO

Cuida-se de apelação interposta pela parte autora em face de sentença, publicada em 14-03-2020 (evento 26, SENT1), que julgou improcedente ação objetivando a concessão do benefício de pensão por morte de seu avô paterno, Sr. Sebastião Josué Votre.

Sustenta, em síntese, fazer jus ao benefício de pensão por morte do avô paterno, de quem recebia pensão alimentícia no montante de 30% dos rendimentos. Alega que, após o falecimento do avô, em 02/12/2010, ficou com dificuldades financeiras, tendo em vista que a pensão alimentícia era de suma importância para a sua manutenção. Com efeito, aduz que sua mãe não possui condições financeiras de satisfazer suas necessidades e seu pai nunca contribuiu para o seu sustento, deixando o encargo para o falecido avô. Pede, pois, a concessão do benefício de pensão por morte desde a data do óbito do segurado (evento 35, APELAÇÃO1).

Com as contrarrazões (evento 38, CONTRAZ1), vieram os autos a esta Corte para julgamento.

Nesta instância, os autos foram remetidos ao Ministério Público Federal, que apresentou parecer pelo desprovimento da apelação (evento 5, PARECER 1).

É o relatório.

VOTO

Premissas

Trata-se de demanda previdenciária na qual a parte autora objetiva a concessão de PENSÃO POR MORTE, prevista no art. 74 da Lei nº 8.213/91, a qual depende do preenchimento dos seguintes requisitos: (a) a ocorrência do evento morte, (b) a demonstração da qualidade de segurado do de cujus e (c) a condição de dependente de quem objetiva o benefício, os quais passam a ser examinados a seguir.

Exame do caso concreto

Na presente ação, ajuizada em 18-11-2019, o autor, CARLOS EDUARDO DA SILVA VOTRE, nascido em 07-09-2004 e representado por sua genitora, Adriana de Souza da Silva, postula a concessão do benefício de pensão por morte do avô paterno, Sr. Sebastião Josué Votre, desde a data do falecimento deste (02-12-2010).

Na inicial, narrou os seguintes fatos:

"O autor, desde muito cedo, experimentou as mazelas que a vida impõe. A sua genitora se divorciou de seu pai e, depois da separação, este não o auxiliou em seu sustento. Por essa razão, o requerente, sua mãe e seus irmãos passaram por crises financeiras bem severas.

Assim, o autor ingressou com uma Ação de Alimentos contra o Sr. Sebastião Josué Votre, seu avô paterno. Dessa forma, o Sr. Sebastião foi condenado, por sentença judicial transitada em julgado – a qual já entrou no mérito acerca da dependência econômica –, ao pagamento de uma pensão alimentícia ao requerente, no importe de 30% (trinta por cento) dos seus rendimentos. Contudo, infelizmente, o avô do requerente faleceu no dia 02 de dezembro de 2010.

Em que pese a enorme dor, a morte do seu avô trouxe, também, uma dificuldade financeira, pois a pensão alimentícia, prestada pelo Sr. Sebastião, era de suma importância. Isso porque, a mãe do adolescente Carlos não possui condições financeiras de satisfazer todas as necessidades de seu filho. Por essa razão, o requerente dependia economicamente da prestação alimentícia de seu avó.

O Sr. Sebastião, antes de falecer, estava aposentado pelo INSS, recebendo um salário mínimo à título de proventos. Todavia, conforme será demonstrado, o requerente era dependente do de cujus e cumpre com todas as exigências instituídas pela lei 8.213/1991, fazendo jus ao benefício da pensão por morte."

Embora o autor tenha requerido, na petição inicial, a produção de "todas as espécies de provas admitidas em direito, em especial as provas documentais e testemunhais", ao ser intimado para se manifestar sobre a contestação e especificar as provas que pretendia produzir (evento 18, ATOORD1), apenas se manifestou sobre a contestação, sem requerer outras provas (evento 22, PET1).

Na sequência, foi proferida sentença de improcedência, pelos seguintes fundamentos (evento 26, SENT1):

"Mérito.

Nos termos do art. 74 da Lei n. 8.213/91 são requisitos para a concessão do benefício previdenciário de pensão por morte: a qualidade de segurado do(a) instituidor(a) e a dependência econômica do(s) requerente(s).

Da qualidade de segurado do instituidor.

A qualidade de segurado do instituidor é incontroversa, pois ao tempo do óbito recebia aposentadoria por idade rural (NB 980399882 - DIB em 07/11/1985).

Da alegada dependência econômica do autor em relação ao extinto.

Sobre a dependência, há que se observar o que prescreve o art. 16 da Lei n. 8.213/91:

Art. 16. São beneficiários do Regime Geral de Previdência Social, na condição de dependentes do segurado:

I - o cônjuge, a companheira, o companheiro e o filho não emancipado, de qualquer condição, menor de 21 (vinte e um) anos ou inválido ou que tenha deficiência intelectual ou mental ou deficiência grave;

II - os pais;

III - o irmão não emancipado, de qualquer condição, menor de 21 (vinte e um) anos ou inválido ou que tenha deficiência intelectual ou mental ou deficiência grave;

§ 1º A existência de dependente de qualquer das classes deste artigo exclui do direito às prestações os das classes seguintes.

§ 2º .O enteado e o menor tutelado equiparam-se a filho mediante declaração do segurado e desde que comprovada a dependência econômica na forma estabelecida no Regulamento.

§ 3º Considera-se companheira ou companheiro a pessoa que, sem ser casada, mantém união estável com o segurado ou com a segurada, de acordo com o § 3º do art. 226 da Constituição Federal.

§ 4º A dependência econômica das pessoas indicadas no inciso I é presumida e a das demais deve ser comprovada

(...)

Observa-se que a dependência de neto não é amparada pela legislação, de modo que a obrigação alimentar acordada judicialmente pelo avô (Evento 1, PROCADM6, p.17) não reflete no rol de dependentes previdenciários.

No caso, observa-se que o avô falecido sequer era guardião do menor, que, inclusive, é representando civilmente por sua genitora.

Aliás o autor conta com genitor e genitora vivos, capazes e em idade ativa (respectivamente 30 e 40 anos) - vide CNIS do genitor no evento 25 - não sendo justificável o recebimento de pensão por morte em razão do falecimento do avô, visto que tal situação, poderia até mesmo ensejar ao absurdo recebimento de três pensões, caso, infortunadamente, os pais viessem a falecer.

Entende-se assim que a dependência econômica reconhecida na ação de alimentos teve por base fundamentos e princípios próprios do direito de família, os quais não são aplicados - em sua integralidade - no direito previdenciário.

Nesse sentido é o ententimento da 4° Turma Recursal do Rio Grande do Sul:

PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. ROL DE DEPENDENTES. ARTIGO 16 DA LEI 8.213/91. NETO. PENSÃO ALIMENTÍCIA. GUARDA. DEPENDÊNCIA ECONÔMICA. GENITORES CAPAZES. INEXISTÊNCIA DE DIREITO AO BENEFÍCIO. 1. O neto não figura no rol legal de dependentes estabelecidos pelo art. 16 da Lei nº 8.213/91. 2. Situação em que a avó, instituidora, sequer era guardiã da menor, o que tampouco o inclui na previsão do artigo 33, do Estatuto da Criança e do Adolescente. 3. Ainda que nada justifique, sob a vigência da Lei de Benefícios, a concessão do amparo previdenciário ao neto, poder-se-ia pensar, abstratamente, em reconhecimento de direito originário à pensão previdenciária ao menor dependente econômico, mas somente no caso de não ser possível encontrar qualquer outra pessoa que pudesse prover o seu sustento, pois neste caso afrontar-se-ia o núcleo essencial do direito fundamental à previdência social. 4. Caso em que tanto o pai como a mãe da autora são pessoas capazes, que exercem atividade laborativa e podem e devem prover perfeitamente o sustento da menor. 5. O simples pagamento da pensão por decisão judicial em alimentos não enseja, por si só, a necessária e exclusiva dependência econômica, para fins previdenciários, ainda mais quando o autor possui pai e mãe vivos e capazes de prover o seu sustento, sendo certo que a dependência previdenciária não se confunde com a dependência civil. 6. Recurso inominado da parte autora improvido. (5007517-20.2018.4.04.7104, QUARTA TURMA RECURSAL DO RS, Relatora MARINA VASQUES DUARTE, julgado em 05/02/2020) - grifou-se.

Visto isso, entende-se pela improcedência do pedido."

Inconformado, o autor apela, sustentando, em suma, que dependia economicamente de seu falecido avô e, portanto, faz jus ao benefício de pensão por morte. Alega, ainda, que deve ser aplicada uma interpretação teleológica do art. 16 da Lei nº 8.213/91, que prevê o rol de dependentes previdenciários, de modo a elastecer as possibilidades de sua incidência, abrangendo o neto que dependia economicamente do falecido avô.

Na hipótese sub judice, resta incontroversa a qualidade de segurado do instituidor, visto que era titular de benefício previdenciário de aposentadoria (nº 980399882, espécie 7, DIB em 07-11-1985).

A controvérsia restringe-se à condição de dependente do demandante, tendo em vista que o benefício de pensão por morte requerido em 04-02-2019 foi indeferido em razão de "falta de comprovação da qualidade de dependente" (evento 1, PROCADM6, p. 35).

Como é sabido, a Lei n. 8.213/91 não elenca, entre os beneficiários da Previdência Social na condição de dependentes do segurado, o neto menor de idade que receba pensão alimentícia, embora o faça com relação ao enteado e ao menor tutelado, nos termos do parágrafo 2º do art. 16, que tem a seguinte redação:

"O enteado e o menor tutelado equiparam-se a filho mediante declaração do segurado e desde que comprovada a dependência econômica na forma estabelecida no Regulamento."

De outro lado, o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA - Lei nº 8.069/90) estabelece, em seu art. 33, § 3º, que a guarda confere à criança ou adolescente a condição de dependente, para todos os fins e efeitos de direito, inclusive previdenciários. Eis a redação do citado artigo:

Art. 33. A guarda obriga a prestação de assistência material, moral e educacional à criança ou adolescente, conferindo a seu detentor o direito de opor-se a terceiros, inclusive aos pais.

§ 1º A guarda destina-se a regularizar a posse de fato, podendo ser deferida, liminar ou incidentalmente, nos procedimentos de tutela e adoção, exceto no de adoção por estrangeiros.

§ 2º Excepcionalmente, deferir-se-á a guarda, fora dos casos de tutela e adoção, para atender a situações peculiares ou suprir a falta eventual dos pais ou responsável, podendo ser deferido o direito de representação para a prática de atos determinados.

§ 3º A guarda confere à criança ou adolescente a condição de dependente, para todos os fins e efeitos de direito, inclusive previdenciários.

§ 4o Salvo expressa e fundamentada determinação em contrário, da autoridade judiciária competente, ou quando a medida for aplicada em preparação para adoção, o deferimento da guarda de criança ou adolescente a terceiros não impede o exercício do direito de visitas pelos pais, assim como o dever de prestar alimentos, que serão objeto de regulamentação específica, a pedido do interessado ou do Ministério Público.

A Constituição Federal de 1988, por seu turno, consagrou o princípio de proteção especial à criança e ao adolescente, como se vê no art. 227, caput e § 3º, inc. II, os quais transcrevo:

Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.

(...)

§ 3º O direito a proteção especial abrangerá os seguintes aspectos:

(...)

II - garantia de direitos previdenciários e trabalhistas;

Ora, a guarda e a tutela estão intimamente relacionadas: a) ambas são modalidades, assim como a adoção, de colocação da criança e do adolescente em família substituta, nos termos do art. 28, caput, do ECA; b) a guarda pode ser deferida, liminarmente, em procedimentos de tutela e de adoção, embora a eles não se limite (art. 33, §§ 2º e 3º); c) o deferimento da tutela implica necessariamente o dever de guarda (art. 36, parágrafo único); d) ambas obrigam à prestação de assistência material, moral e educacional à criança ou adolescente, conferindo a seu detentor o direito de opor-se a terceiros, inclusive aos pais.

Devido à estreita relação entre a guarda e a tutela e à importância de ambas para a educação, a convivência familiar, a dignidade, o respeito e a assistência material e moral da criança e do adolescente, não se pode dar tratamento previdenciário diverso aos menores que se encontrem sob uma ou outra modalidade de colocação em família substituta.

Portanto, entendo que o menor sob guarda pode ser considerado dependente previdenciário do segurado, nos termos do art. 33, § 3º, do Estatuto da Criança e do Adolescente, combinado com o art. 16, § 2º, da Lei de Benefícios, "desde que comprovada a dependência econômica na forma estabelecida no Regulamento", conforme dispõe a parte final deste último dispositivo.

Nesse sentido, colaciono o recente precedente do STJ, que julgou, em sede de Recurso Repetitivo, o REsp n. 1.411.258/RS, assim ementado:

DIREITO PREVIDENCIÁRIO E HUMANITÁRIO. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DA CONTROVÉRSIA. PROCESSAMENTO NOS TERMOS DO ART. 543-C DO CPC E DA RESOLUÇÃO 08/STJ. DIREITO DO MENOR SOB GUARDA À PENSÃO POR MORTE DO SEU MANTENEDOR. EMBORA A LEI 9.528/97 O TENHA EXCLUÍDO DO ROL DOS DEPENDENTES PREVIDENCIÁRIOS NATURAIS OU LEGAIS DOS SEGURADOS DO INSS. PROIBIÇÃO DE RETROCESSO. DIRETRIZES CONSTITUCIONAIS DE ISONOMIA, PRIORIDADE ABSOLUTA E PROTEÇÃO INTEGRAL À CRIANÇA E AO ADOLESCENTE (ART. 227 DA CF). APLICAÇÃO PRIORITÁRIA OU PREFERENCIAL DO ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE (LEI 8.069/90), POR SER ESPECÍFICA, PARA ASSEGURAR A MÁXIMA EFETIVIDADE DO PRECEITO CONSTITUCIONAL DE PROTEÇÃO. PARECER DO MPF PELO NÃO CONHECIMENTO DO RECURSO, A TEOR DA SÚMULA 126/STJ. RECURSO ESPECIAL CONHECIDO, PORÉM DESPROVIDO.

1. A não interposição de Recurso Extraordinário somente tem a força de impedir o conhecimento de Recurso Especial quando (e se) a matéria decidida no acórdão recorrido apresenta dupla fundamentação, devendo a de nível constitucional referir imediata e diretamente infringência à preceito constitucional explícito; em tema de concessão de pensão por morte a menor sob guarda, tal infringência não se verifica, tanto que o colendo STF já decidiu que, nestas hipóteses, a violação à Constituição Federal, nesses casos, é meramente reflexa. A propósito, os seguintes julgados, dentre outros: ARE 804.434/PI, Rel. Min. DIAS TOFFOLI, DJe 19.3.2015; ARE 718.191/BA, Rel. Min. LUIZ FUX, DJe 17.9.2014; RE 634.487/MG, Rel. Min. ROSA WEBER, DJe 1.8.2014; ARE 763.778/RS, Rel. Min. CARMEN LÚCIA, DJe 24.10.2013; não se apresenta razoável afrontar essa orientação do STF, porquanto se trata, neste caso, de questão claramente infraconstitucional.

2. Dessa forma, apesar da manifestação ministerial em sentido contrário, entende-se possível, em princípio, conhecer-se do mérito do pedido recursal do INSS, afastando-se a incidência da Súmula 126/STJ, porquanto, no presente caso, o recurso deve ser analisado e julgado, uma vez que se trata de matéria de inquestionável relevância jurídica, capaz de produzir precedente da mais destacada importância, apesar de não interposto o Recurso Extraordinário.

3. Quanto ao mérito, verifica-se que, nos termos do art. 227 da CF, foi imposto não só à família, mas também à sociedade e ao Estado o dever de, solidariamente, assegurar à criança e ao adolescente os direitos fundamentais com absoluta prioridade. Além disso, foi imposto ao legislador ordinário a obrigação de garantir ao menor os direitos previdenciários e trabalhistas, bem como o estímulo do Poder Público ao acolhimento, sob a forma de guarda, de criança ou adolescente órfão ou abandonado.

4. A alteração do art. 16, § 2o. da Lei 8.213/91, pela Lei 9.528/97, ao retirar o menor sob guarda da condição de dependente previdenciário natural ou legal do Segurado do INSS, não elimina o substrato fático da dependência econômica do menor e representa, do ponto de vista ideológico, um retrocesso normativo incompatível com as diretrizes constitucionais de isonomia e de ampla e prioritária proteção à criança e ao adolescente.

5. Nesse cenário, a jurisprudência desta Corte Superior tem avançado na matéria, passando a reconhecer ao menor sob guarda a condição de dependente do seu mantenedor, para fins previdenciários. Precedentes: MS 20.589/DF, Rel. Min. RAUL ARAÚJO, Corte Especial, DJe 2.2.2016; AgRg no AREsp. 59.461/MG, Rel. Min. OLINDO MENEZES, DJe 20.11.2015; AgRg no REsp. 1.548.012/PE, Rel. Min. HERMAN BENJAMIN, DJe 20.11.2015; AgRg no REsp. 1.550.168/SE, Rel. Min. MAURO CAMPBELL MARQUES, DJe 22.10.2015; REsp. 1.339.645/MT, Rel. Min. SÉRGIO KUKINA, DJe 4.5.2015.

6. Não se deve perder de vista o sentido finalístico do Direito Previdenciário e Social, cuja teleologia se traduz no esforço de integração dos excluídos nos benefícios da civilização e da cidadania, de forma a proteger as pessoas necessitadas e hipossuficientes, que se encontram em situações sociais adversas; se assim não for, a promessa constitucional de proteção a tais pessoas se esvai em palavras sonoras que não chegam a produzir qualquer alteração no panorama jurídico.

7. Deve-se proteger, com absoluta prioridade, os destinatários da pensão por morte de Segurado do INSS, no momento do infortúnio decorrente do seu falecimento, justamente quando se vêem desamparados, expostos a riscos que fazem periclitar a sua vida, a sua saúde, a sua alimentação, a sua educação, o seu lazer, a sua profissionalização, a sua cultura, a sua dignidade, o seu respeito individual, a sua liberdade e a sua convivência familiar e comunitária, combatendo-se, com pertinácia, qualquer forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão (art. 227, caput da Carta Magna).

8. Considerando que os direitos fundamentais devem ter, na máxima medida possível, eficácia direta e imediata, impõe-se priorizar a solução ao caso concreto de forma que se dê a maior concretude ao direito. In casu, diante da Lei Geral da Previdência Social que apenas se tornou silente ao tratar do menor sob guarda e diante de norma específica que lhe estende a pensão por morte (Lei 8.069/90, Estatuto da Criança e do Adolescente, art. 33, § 3o.), cumpre reconhecer a eficácia protetiva desta última lei, inclusive por estar em perfeita consonância com os preceitos constitucionais e a sua interpretação inclusiva.

9. Em consequência, fixa-se a seguinte tese, nos termos do art. 543-C do CPC/1973: O MENOR SOB GUARDA TEM DIREITO À CONCESSÃO DO BENEFÍCIO DE PENSÃO POR MORTE DO SEU MANTENEDOR, COMPROVADA A SUA DEPENDÊNCIA ECONÔMICA, NOS TERMOS DO ART. 33, § 3o. DO ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE, AINDA QUE O ÓBITO DO INSTITUIDOR DA PENSÃO SEJA POSTERIOR À VIGÊNCIA DA MEDIDA PROVISÓRIA 1.523/96, REEDITADA E CONVERTIDA NA LEI 9.528/97. FUNDA-SE ESSA CONCLUSÃO NA QUALIDADE DE LEI ESPECIAL DO ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE (8.069/90), FRENTE À LEGISLAÇÃO PREVIDENCIÁRIA.

10. Recurso Especial do INSS desprovido.

(REsp 1411258/RS, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 11/10/2017, DJe 21/02/2018)

No mesmo sentido, é a jurisprudência deste TRF: AC 5001870-49.2015.404.7104, SEXTA TURMA, Relatora VÂNIA HACK DE ALMEIDA, juntado aos autos em 12/08/2016; APELREEX 0008477-14.2015.404.9999, QUINTA TURMA, Relator ROGERIO FAVRETO, D.E. 17/05/2016; AC 5016363-76.2015.404.9999, QUINTA TURMA, Relator MARCELO DE NARDI, juntado aos autos em 09/03/2016; 5043356-83.2015.404.0000, QUINTA TURMA, Relatora TAÍS SCHILLING FERRAZ, juntado aos autos em 21/01/2016; AC 0009726-97.2015.404.9999, SEXTA TURMA, Relator JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA, D.E. 26/11/2015; AC 0018921-43.2014.404.9999, SEXTA TURMA, Relator OSNI CARDOSO FILHO, D.E. 21/10/2015.

No caso dos autos, embora o autor não alegue que vivia sob a guarda do avô paterno, não há elementos de prova suficientes para comprovar a real situação por ele vivenciada desde o seu nascimento até a data do óbito do avô, de quem passou a receber pensão alimentícia com menos de um ano de idade (evento 1, OUT7). Com efeito, não se sabe com quem ele vivia na época do falecimento do avô, se o avô exercia uma guarda de fato, se seus pais trabalhavam ou possuíam alguma renda, se eles contribuíam para o seu sustento, se a pensão alimentícia recebida do avô era a única renda da família etc.

Além de inexistir documentação que possa indicar as condições financeiras da família, não foi produzida a prova oral, por meio da qual poderiam ser esclarecidas todas essas circunstâncias.

De outro lado, ressalto haver precedente, nesta Corte, concedendo a pensão por morte da avó para neta que não vivia sob a sua guarda, mas recebia pensão alimentícia fundamental para a sua subsistência, muito embora possuísse pais vivos:

PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE DE AVÓ QUE NÃO DETINHA A GUARDA DA NETA. QUALIDADE DE DEPENDENTE DEMONSTRADA. 1. A concessão do benefício de pensão por morte depende da ocorrência do evento morte, da demonstração da qualidade de segurado do de cujus e da condição de dependente de quem objetiva a pensão. 2. Para a obtenção do benefício de pensão por morte deve a parte interessada preencher os requisitos estabelecidos na legislação previdenciária vigente à data do óbito, consoante iterativa jurisprudência dos Tribunais Superiores e desta Corte. 3. A nova redação dada pela Lei n.º 9.528/97 ao § 2º do art. 16 da Lei n.º 8.213/91 não teve o condão de derrogar o art. 33 da Lei n.º 8.069/90 (ECA), sob pena de ferir a ampla garantia de proteção ao menor disposta no art. 227 do texto constitucional, que não faz distinção entre o tutelado e o menor sob guarda. Permanece, pois, como dependente o menor sob guarda judicial, inclusive para fins previdenciários. 4. Hipótese em que evidenciada a qualidade de dependente da requerente, já que comprovado que a neta recebia pensão alimentícia da avó, há mais de 10 (dez) anos, que era imprescindível para suprir as suas necessidades básicas de sobrevivência. (TRF4, AC 5036476-85.2019.4.04.7000, TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DO PR, Relator LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO, juntado aos autos em 16/09/2020)

Assim sendo, considerando as circunstâncias do caso em apreço e a existência do referido precedente, entendo que a sentença deve ser anulada, para que seja reaberta a instrução e oportunizada a juntada de documentos e a oitiva de testemunhas, a fim de esclarecer a alegada dependência econômica do autor em relação ao falecido avô paterno.

Dispositivo

Ante o exposto, voto por, de ofício, anular a sentença, para determinar a reabertura da instrução, prejudicada a apelação da parte autora.



Documento eletrônico assinado por PAULO AFONSO BRUM VAZ, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40003156469v19 e do código CRC 46dcf8d2.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): PAULO AFONSO BRUM VAZ
Data e Hora: 19/5/2022, às 18:27:45


5016297-03.2019.4.04.7204
40003156469.V19


Conferência de autenticidade emitida em 27/05/2022 04:01:19.

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5016297-03.2019.4.04.7204/SC

RELATOR: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ

APELANTE: CARLOS EDUARDO DA SILVA VOTRE (Absolutamente Incapaz (Art. 3º CC)) (AUTOR)

APELANTE: ADRIANA DE SOUZA DA SILVA (Pais) (AUTOR)

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)

EMENTA

PREVIDENCIÁRIO. concessão de pensão por morte de avô ao neto que dele recebia pensão alimentícia. comprovação da dependência econômica. necessidade de dilação probatória. anulação da sentença.

1. A concessão do benefício de pensão por morte depende da ocorrência do evento morte, da demonstração da qualidade de segurado do de cujus e da condição de dependente de quem objetiva a pensão.

2. In casu, é necessária a dilação probatória, a fim de esclarecer a real situação vivenciada pelo autor desde o seu nascimento até a data do óbito do avô, de quem passou a receber pensão alimentícia com menos de um ano de idade.

3. Sentença anulada, para determinar a reabertura da instrução.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia Turma Regional Suplementar de Santa Catarina do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, de ofício, anular a sentença, para determinar a reabertura da instrução, prejudicada a apelação da parte autora, com ressalva do entendimento do Desembargador Federal CELSO KIPPER, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Florianópolis, 17 de maio de 2022.



Documento eletrônico assinado por PAULO AFONSO BRUM VAZ, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40003156470v5 e do código CRC 5dd2137a.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): PAULO AFONSO BRUM VAZ
Data e Hora: 19/5/2022, às 18:27:45


5016297-03.2019.4.04.7204
40003156470 .V5


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Poder Judiciário
Tribunal Regional Federal da 4ª Região

EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 10/05/2022 A 17/05/2022

Apelação Cível Nº 5016297-03.2019.4.04.7204/SC

RELATOR: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ

PRESIDENTE: Desembargador Federal SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ

PROCURADOR(A): WALDIR ALVES

APELANTE: CARLOS EDUARDO DA SILVA VOTRE (Absolutamente Incapaz (Art. 3º CC)) (AUTOR)

ADVOGADO: VANIO FREITAS (OAB SC030335)

ADVOGADO: LEONARDO ALVES FARACO (OAB SC053750)

APELANTE: ADRIANA DE SOUZA DA SILVA (Pais) (AUTOR)

ADVOGADO: VANIO FREITAS (OAB SC030335)

ADVOGADO: LEONARDO ALVES FARACO (OAB SC053750)

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)

MPF: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL (MPF)

Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 10/05/2022, às 00:00, a 17/05/2022, às 16:00, na sequência 416, disponibilizada no DE de 29/04/2022.

Certifico que a Turma Regional suplementar de Santa Catarina, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:

A TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DE SANTA CATARINA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, DE OFÍCIO, ANULAR A SENTENÇA, PARA DETERMINAR A REABERTURA DA INSTRUÇÃO, PREJUDICADA A APELAÇÃO DA PARTE AUTORA, COM RESSALVA DO ENTENDIMENTO DO DESEMBARGADOR FEDERAL CELSO KIPPER.

RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ

Votante: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ

Votante: Desembargador Federal CELSO KIPPER

Votante: Desembargador Federal SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ

ALEXSANDRA FERNANDES DE MACEDO

Secretária

MANIFESTAÇÕES DOS MAGISTRADOS VOTANTES

Ressalva - GAB. 92 (Des. Federal CELSO KIPPER) - Desembargador Federal CELSO KIPPER.

Ressalvando que não faço, neste momento, apreciação sobre a possibilidade ou não de deferimento da pensão por morte de avô mesmo sem comprovação da guarda, ainda que de fato, do menor, acompanho o e. Relator.



Conferência de autenticidade emitida em 27/05/2022 04:01:19.

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