APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 5004280-23.2014.4.04.7102/RS
RELATORA | : | Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELADO | : | TAYLAN LIMA GARCIA (Absolutamente Incapaz (Art. 3º, II e III CC)) |
: | MARIA HELENA LIMA DO CANTO (Curador) | |
ADVOGADO | : | EVERTON BARTH DOS SANTOS |
MPF | : | MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL |
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. CONCESSÃO DE PENSÃO POR MORTE DE AVÔ. NETO MAIOR INVÁLIDO. COMPROVADA A GUARDA E A DEPENDÊNCIA ECONÔMICA. POSSIBILIDADE.CORREÇÃO MONETÁRIA E JUROS DE MORA. FASE DE CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. DIFERIMENTO.
1. Para a obtenção do benefício de pensão por morte deve a parte interessada preencher os requisitos estabelecidos na legislação previdenciária vigente à data do óbito, consoante iterativa jurisprudência dos Tribunais Superiores e desta Corte.
2. Estando comprovada a qualidade de segurado do instituidor do benefício, a efetiva guarda (judicial ou de fato) pelo de cujus - o qual devia ser o responsável pela assistência material, moral e educacional da parte autora -, bem como a dependência econômica desta em relação àquele, faz jus o autor ao benefício de pensão por morte de seu guardião.
3. Segundo o disposto no art. 1.696 do Código Civil Brasileiro, "o direito à prestação de alimentos é recíproco entre pais e filhos, e extensivo a todos os ascendentes, recaindo a obrigação nos mais próximos em grau, uns em falta de outros".
4. In casu, comprovado que o autor, embora maior, dependia economicamente de seu falecido avô, tendo em vista sua condição de invalidez, faz jus ao benefício postulado.
5.Deliberação sobre índices de correção monetária e taxas de juros diferida para a fase de cumprimento de sentença, a iniciar-se com a observância dos critérios da Lei 11.960/2009, de modo a racionalizar o andamento do processo, permitindo-se a expedição de precatório pelo valor incontroverso, enquanto pendente, no Supremo Tribunal Federal, decisão sobre o tema com caráter geral e vinculante. Precedentes do STJ e do TRF da 4ª Região.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 6a. Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação e à remessa oficial, mantida a antecipação de tutela, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre/RS, 17 de maio de 2017.
Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE
Relatora
| Documento eletrônico assinado por Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE, Relatora, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8945001v63 e, se solicitado, do código CRC 50E3AF2A. | |
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| Signatário (a): | Salise Monteiro Sanchotene |
| Data e Hora: | 18/05/2017 14:21 |
APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 5004280-23.2014.4.04.7102/RS
RELATOR | : | SALISE MONTEIRO SANCHOTENE |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELADO | : | TAYLAN LIMA GARCIA (Absolutamente Incapaz (Art. 3º, II e III CC)) |
: | MARIA HELENA LIMA DO CANTO (Curador) | |
ADVOGADO | : | EVERTON BARTH DOS SANTOS |
MPF | : | MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL |
RELATÓRIO
TAYLAN LIMA GARCIA, nascido em 23-10-1993, representado pela tia materna Maria Helena Lima do Canto ajuizou, em 08-04-2014, ação ordinária contra o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), objetivando a concessão de pensão por morte do avô, VILSON SOARES DO CANTO, cujo óbito ocorreu em 20-08-2004.
Sobreveio sentença (31-07-2015) que julgou parcialmente procedente o pedido inicial condenando a autarquia previdenciária a conceder o benefício de pensão por morte em favor da parte autora, com data de início do benefício em 01-05-2009 (dia seguinte à cessação do benefício assistencial percebido pelo Autor) e data de início de pagamento (DIP) em 01-07-2015, com renda mensal calculada nos termos do art. 75 da Lei n° 8.213/91, com a redação dada pela Lei 9528/97. Deferida a antecipação dos efeitos da tutela. Fixou os honorários advocatícios em 10% (dez por cento) das prestações vencidas até a data da Sentença, nos termos da Súmula n. 76, do TRF da 4ª Região.
Irresignado, o INSS apresentou recurso de apelação, sustentando, em síntese, que o autor não detém a qualidade de dependente, por ser neto do segurado, condição não prevista no art. 16 da Lei n° 8.213/91.
Alegou, ainda, que o argumento de estar sob a guarda, conforme previsto no ECA, Lei n° 8.069/90, art. 33, § 3º, também não prospera porque foi editada a Lei n° 9.528/97, que alterou o § 2º do art. 16 da Lei n° 8.213/91, que previa a condição de dependente do menor sob guarda.
Por fim, postulou a aplicação integral do artigo 1º-F, da Lei 9.494/97 com redação dada pela Lei 11.960/2009. Pugna reforma da sentença.
Apresentadas as contrarrazões, vieram os autos para julgamento, inclusive por força da remessa necessária.
O Ministério Público Federal opinou pelo desprovimento do recurso e da remessa oficial.
VOTO
Nos termos do artigo 1.046 do Código de Processo Civil (CPC), em vigor desde 18 de março de 2016, com a redação dada pela Lei nº 13.105, de 16 de março de 2015, suas disposições aplicar-se-ão, desde logo, aos processos pendentes, ficando revogada a Lei nº 5.869, de 11 de janeiro de 1973.
Com as ressalvas feitas nas disposições seguintes a este artigo 1.046 do CPC, compreende-se que não terá aplicação a nova legislação para retroativamente atingir atos processuais já praticados nos processos em curso e as situações jurídicas consolidadas sob a vigência da norma revogada, conforme expressamente estabelece seu artigo 14.
Remessa Oficial
Conheço da remessa oficial tendo em vista que o valor da condenação ultrapassa sessenta salários mínimos, uma vez que reconhecido o direito aos dois benefícios de pensão por morte, por período superior a cinco anos.
Pensão por Morte
O Requerente é interditado, portador de hidrocefalia congênita ( CID G 91.1 e G 40.6), alegou que requereu o benefício de pensão por morte nº 166.190.788-9 em 01-11-2013, o qual foi negado pela Autarquia ré, sob o argumento de "perda da qualidade de dependente dos pais biológicos, em face adoção, na data do óbito/reclusão" (evento 1, INFBEN12, p.1).
Refere o Autor que Theresa Lima do Canto, sua avó, ficou recebendo a pensão por morte decorrente do óbito do de cujus, seu esposo e avô do requerente, até 03-05-2007, quando então ela veio a óbito, razão pela qual o demandante pretende o pagamento das parcelas vencidas desde tal data (03-05-2007), já que, tendo permanecido sob a guarda da avó, foi benefíciado com o pagamento da pensão no período de 20-08-2004 a 03-05-2007.
Para a obtenção do benefício de pensão por morte, a parte interessada deve preencher os requisitos previstos na legislação previdenciária vigente na data do óbito, conforme dispõe a Súmula 340, do Superior Tribunal de Justiça (STJ).
À época, quando do falecimento de VILSON SOARES DO CANTO, ocorrido em 20-08-2004, a legislação aplicável à espécie - Lei nº 8.213, de 24 de julho de 1991 (Plano de Benefícios da Previdência Social) - apresentava a seguinte redação:
Art.74 - A pensão por morte será devida ao conjunto dos dependentes do segurado quef alecer, aposentado ou não, a contar da data:
I -do óbito, quando requerida até 30 dias depois deste;
II -do requerimento, quando requerida após o prazo previsto no inciso anterior;
III -da decisão judicial, no caso de morte presumida.
São, portanto, três os requisitos para a concessão do benefício previdenciário de pensão por morte:
a) o óbito (ou morte presumida);
b) a qualidade de segurada da pessoa falecida;
c) a existência de dependentes, na forma prevista no artigo 16 da Lei nº 8.213/1991.
O evento morte está comprovado pela certidão de óbito (evento 8, CERTOBT8, p, 1).
Não há controvérsia em relação ao de cujus, sendo que a avó do autor, Theresa Lima do Canto, esposa do falecido, instituidor do benefício de Pensão por Morte Previdenciária NB 135.455.445-8, era por ela titulada (evento 1, INFBEN10, p.1). Constato que o falecido era titular de Aposentadoria por Invalidez previdenciária, ramo de atividade ferroviário (evento 3, INFBEN1, P.1).
Verifico que Theresa Lima do Canto, avó do autor, veio a óbito em 03-05-2007 (evento 1, CERTOBT9, p.1).
A controvérsia dos autos cinge-se à comprovação da condição de dependência econômica do autor em relação ao falecido avô, considerando que à época do óbito ele estava sob a guarda judicial do instituidor do benefício.
Como se sabe, a Lei de Benefícios da Previdência Social (LBPS) não relaciona, dentre os beneficiários da Previdência Social na condição de dependentes do segurado, o menor sob guarda, embora o faça com relação ao enteado e ao menor tutelado, nos termos do parágrafo 2º do art. 16, que tem a seguinte redação:
O enteado e o menor tutelado equiparam-se a filho mediante declaração do segurado e desde que comprovada a dependência econômica na forma estabelecida no Regulamento.
Por outro lado, o menor que, por determinação judicial esteja sob a sua guarda e o menor que esteja sob sua tutela e não possua condições suficientes para o próprio sustento e educação teve sua situação alterada pela redação dada pela Lei n.º 9.528/97, a qual excluiu a possibilidde de o menor sob guarda ser equiparado ao filho.
Entretanto, as alterações previdenciárias trazidas por esta lei não tiveram o condão de derrogar o art. 33 do ECA.
O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA - Lei nº 8.069/90) estabelece, em seu art. 33, §3º, que a guarda confere à criança ou adolescente a condição de dependente, para todos os fins e efeitos de direito, inclusive previdenciários.
Eis a redação do citado artigo:
Art. 33. A guarda obriga a prestação de assistência material, moral e educacional à criança ou adolescente, conferindo a seu detentor o direito de opor-se a terceiros, inclusive aos pais.
§ 1º A guarda destina-se a regularizar a posse de fato, podendo ser deferida, liminar ou incidentalmente, nos procedimentos de tutela e adoção, exceto no de adoção por estrangeiros.
§ 2º Excepcionalmente, deferir-se-á a guarda, fora dos casos de tutela e adoção, para atender a situações peculiares ou suprir a falta eventual dos pais ou responsável, podendo ser deferido o direito de representação para a prática de atos determinados.
§ 3º A guarda confere à criança ou adolescente a condição de dependente, para todos os fins e efeitos de direito, inclusive previdenciários.
§ 4o Salvo expressa e fundamentada determinação em contrário, da autoridade judiciária competente, ou quando a medida for aplicada em preparação para adoção, o deferimento da guarda de criança ou adolescente a terceiros não impede o exercício do direito de visitas pelos pais, assim como o dever de prestar alimentos, que serão objeto de regulamentação específica, a pedido do interessado ou do Ministério Público.
Os dispositivos acima transcritos devem ser analisados de forma sistemática, à luz do princípio constitucional de proteção especial à criança e ao adolescente insculpido no art. 227 da Constituição Federal, notadamente, para os fins ora em exame, no caput e em seu parágrafo 3º, inc. II:
Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.
(...)
§ 3º - O direito a proteção especial abrangerá os seguintes aspectos:
(...)
II - garantia de direitos previdenciários e trabalhistas;
Com enfoque na proteção especial da criança e do adolescente (Constituição Federal de 1988, art. 227, caput e § 3º, inc. II), o menor sob guarda pode ser considerado dependente previdenciário do segurado, nos termos do art. 33, § 3º, do Estatuto da Criança e do Adolescente, combinado com o art. 16, §2º, da Lei de Benefícios, desde que comprovada a dependência econômica, conforme dispõe a parte final deste último dispositivo.
No mesmo sentido, a jurisprudência do TRF4:
PREVIDENCIÁRIO. CONCESSÃO DE PENSÃO POR MORTE DE AVÓ. MENOR SOB GUARDA. DEPENDÊNCIA ECONÔMICA. COMPROVAÇÃO. LEI Nº 9.528/97. SENTENÇA PROCEDENTE MANTIDA. 1. Para a obtenção do benefício de pensão por morte, deve a parte interessada preencher os requisitos estabelecidos na legislação previdenciária vigente à data do óbito, consoante reiterada jurisprudência dos Tribunais Superiores e desta Corte. 2. A Lei nº 9.528/97 não revogou expressamente o § 3º do art. 33 do Estatuto da Criança e do Adolescente, o qual confere ao menor sob guarda a condição de dependente para todos os efeitos, inclusive previdenciários, exigindo-se tão somente a demonstração de sua dependência econômica. 3. A prova colhida foi no sentido de que a falecida contribuía decisivamente para o sustento e as despesas da tutelada, que tinha 10 anos quando sua avó morreu, restando caracterizada a dependência econômica exigida pela legislação para a concessão de pensão por morte. 4. Mantida a sentença de procedência da ação. (TRF4, APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 0001314-80.2015.404.9999, 6ª TURMA, Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA, POR UNANIMIDADE, D.E. 29/07/2015, PUBLICAÇÃO EM 30/07/2015)
Portanto, o menor sob guarda pode ser considerado dependente previdenciário do segurado, desde que comprovada a dependência econômica.
Neste sentido, precedente do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4):
PREVIDENCIÁRIO. CONCESSÃO DE PENSÃO POR MORTE. MENOR SOB GUARDA JUDICIAL. POSSIBILIDADE. COMPROVAÇÃO DA DEPENDÊNCIA ECONÔMICA. 1. Para a obtenção do benefício de pensão por morte deve a parte interessada preencher os requisitos estabelecidos na legislação previdenciária vigente à data do óbito, consoante iterativa jurisprudência dos Tribunais Superiores e desta Corte. 2. A guarda e a tutela estão intimamente relacionadas: a) ambas são modalidades, assim como a adoção, de colocação da criança e do adolescente em família substituta, nos termos do art. 28, caput, do ECA; b) a guarda pode ser deferida, liminarmente, em procedimentos de tutela e de adoção, embora a eles não se limite (art. 33, §§ 2º e 3º); c) o deferimento da tutela implica necessariamente o dever de guarda (art. 36, parágrafo único); d) ambas obrigam à prestação de assistência material, moral e educacional à criança ou adolescente, conferindo a seu detentor o direito de opor-se a terceiros, inclusive aos pais. 3. À luz do princípio constitucional de proteção especial da criança e do adolescente, o menor sob guarda pode ser considerado dependente previdenciário do segurado, nos termos do art. 33, § 3º, do Estatuto da Criança e do Adolescente, combinado com o art. 16, §2º, da Lei de Benefícios, desde que comprovada a dependência econômica, conforme dispõe a parte final deste último dispositivo. 4. Estando comprovada a qualidade de segurado do instituidor do benefício, a guarda judicial pelo de cujus - pois este era o responsável pela assistência material, moral e educacional da parte autora -, bem como a dependência econômica desta em relação àquele, tem direito o menor sob guarda ao benefício de pensão por morte de seu guardião. Precedentes jurisprudenciais. (TRF4, Apelação/Reexame Necessário Nº 5045737-46.2011.404.7100, 6ª TURMA, Des. Federal CELSO KIPPER, POR UNANIMIDADE, JUNTADO AOS AUTOS EM 19/12/2014)
Demais, a 5ª Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) teve a oportunidade de se manifestar sobre o tema, por ocasião do julgamento do Recurso Especial Nº 322.715 - RS (2001/0052623-3), conforme ementa:
PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. MENOR DEPENDENTE SOB GUARDA DO AVÔ SERVIDOR PÚBLICO. LEI Nº 6697/79. CÓDIGO DE MENORES. PRECEDENTES DO STJ. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. I - A Lei nº 6697/79 - Código de Menores - previa em seu artigo 24, § 2º, que "a guarda confere ao menor a condição de dependente para fins previdenciários.". Não obstante na legislação aplicável à hipótese - Lei nº 1711/52 e Decreto nº 83080/79 - não conste o neto no rol de beneficiários de pensão temporária, a questão merece ser analisada à luz da legislação de proteção ao menor. II - Neste contexto, restando comprovada a guarda deve ser garantido o benefício para quem dependa economicamente do instituidor, como ocorre na hipótese dos autos. Precedentes do Superior Tribunal de Justiça. III - Recurso conhecido e desprovido
(STJ - REsp: 322715 RS 2001/0052623-3, Relator: Ministro JORGE SCARTEZZINI, Data de Julgamento: 24/08/2004, T5 - QUINTA TURMA, Data de Publicação: DJ 04.10.2004 p. 336)
Além disso, a teor do no art. 1.696 do Código Civil Brasileiro, "o direito à prestação de alimentos é recíproco entre pais e filhos, e extensivo a todos os ascendentes, recaindo a obrigação nos mais próximos em grau, uns em falta de outros".
Com efeito, entendo que as questões controvertidas foram devidamente analisadas na sentença, cujos fundamentos acolho e adoto como razão de decidir, merecendo transcrição, in verbis:
(...)
Desta feita, não havendo divergência quanto à qualidade de segurado do falecido, resta aferir a qualidade de dependente do Autor.
O benefício em questão rege-se pela legislação vigente na data do óbito do instituidor do benefício. Assim, sendo o óbito posterior a 11/12/1997, o benefício está sujeito às alterações da Lei n° 9.528/1997, que excluiu da relação de dependentes do art.16 da Lei n° 8213/1991, o menor sob a guarda, mantendo a previsão do enteado e do menor tutelado, nos termos do parágrafo 2º do art. 16, acima citado.
Nesse passo, importante referir que o Estatuto da Criança e do Adolescente, Lei nº 8.069/1990, estabelece em seu art. 33, §3º, que a guarda confere à criança ou adolescente a condição de dependente, para todos os fins e efeitos de direito, inclusive previdenciários, nos seguintes termos:
Art. 28. A colocação em família substituta far-se-á mediante guarda, tutela ou adoção, independentemente da situação jurídica da criança ou adolescente, nos termos desta Lei.
Art. 33. A guarda obriga a prestação de assistência material, moral e educacional à criança ou adolescente, conferindo a seu detentor o direito de opor-se a terceiros, inclusive aos pais. (Vide Lei nº 12.010, de 2009)
§ 1º A guarda destina-se a regularizar a posse de fato, podendo ser deferida, liminar ou incidentalmente, nos procedimentos de tutela e adoção, exceto no de adoção por estrangeiros.
§ 2º Excepcionalmente, deferir-se-á a guarda, fora dos casos de tutela e adoção, para atender a situações peculiares ou suprir a falta eventual dos pais ou responsável, podendo ser deferido o direito de representação para a prática de atos determinados.
§ 3º A guarda confere à criança ou adolescente a condição de dependente, para todos os fins e efeitos de direito, inclusive previdenciários.
§ 4º Salvo expressa e fundamentada determinação em contrário, da autoridade judiciária competente, ou quando a medida for aplicada em preparação para adoção, o deferimento da guarda de criança ou adolescente a terceiros não impede o exercício do direito de visitas pelos pais, assim como o dever de prestar alimentos, que serão objeto de regulamentação específica, a pedido do interessado ou do Ministério Público. (Incluído pela Lei nº 12.010, de 2009) (grifei)
De igual forma, o art. 227 da Constituição Federal, ao dispor sobre a proteção da criança e do adolescente, preceitua:
Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão. (Redação dada Pela Emenda Constitucional nº 65, de 2010)
(...)
§ 3º - O direito a proteção especial abrangerá os seguintes aspectos:
(...)
II - garantia de direitos previdenciários e trabalhistas; (grifei)
Assim, é possível inferir que a guarda e a tutela estão intimamente relacionadas, eis que ambas são modalidades de colocação da criança e do adolescente em família substituta, nos termos do art. 28, caput, do ECA, bem como obrigam à prestação de assistência material, moral e educacional à criança, conferindo a seu detentor o direito de opor-se a terceiros, inclusive aos pais.
Portanto, dada a íntima relação entre a guarda e a tutela, e a importância de ambas para a educação, a convivência familiar, a dignidade, o respeito e a assistência material e moral da criança e do adolescente, penso que não se pode dar tratamento previdenciário diverso aos menores que se encontrem sob uma ou outra modalidade de colocação em família substituta.
Assim, à luz do princípio constitucional de proteção especial da criança e do adolescente (Constituição Federal, art. 227, caput e § 3º, inc. II), o menor sob guarda pode ser considerado dependente previdenciário do segurado, nos termos do art. 33, § 3º, do Estatuto da Criança e do Adolescente, combinado com o art. 16, § 2º, da Lei de Benefícios, desde que comprovada a dependência econômica, conforme dispõe a parte final deste último dispositivo.
Destarte, conflitando a lei ordinária com preceito Constitucional, a exclusão é, neste ponto, inconstitucional, valendo apenas a exigência da comprovação da dependência econômica.
Nesse sentido:
EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. MENOR SOB GUARDA. COMPROVAÇÃO DA INVALIDEZ. DEPENDÊNCIA ECONÔMICA. CONCESSÃO DO BENEFÍCIO. 1. A concessão do benefício de pensão por morte depende da ocorrência do evento morte, da demonstração da qualidade de segurado do de cujus e da condição de dependente de quem objetiva a pensão. 2. A nova redação dada pela Lei n.º 9.528/97 ao § 2º do art. 16 da Lei n.º 8.213/91 não teve o condão de derrogar o art. 33 da Lei n.º 8.069/90 (ECA), sob pena de ferir a ampla garantia de proteção ao menor disposta no art. 227 do texto constitucional, que não faz distinção entre o tutelado e o menor sob guarda. Permanece, pois, como dependente o menor sob guarda judicial, inclusive para fins previdenciários. 3. Demonstrada a qualidade de dependente do menor sob guarda, não havendo para os inválidos limitação de idade, uma vez comprovado que o quadro mórbido é preexistente ao óbito do segurado, ex vi do art. 16, I e § 4º, da Lei nº 8.213/91, faz jus à concessão da pensão em função do óbito de sua guardiã. (TRF4, APELREEX 0023114-38.2013.404.9999, Quinta Turma, Relatora Carla Evelise Justino Hendges, D.E. 18/02/2014); (grifei)
EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. CONCESSÃO. QUALIDADE DE DEPENDENTE. COMPANHEIRO. MENOR SOB GUARDA DE DIREITO OU DE FATO. 1. A concessão do benefício de pensão por morte depende da ocorrência do evento morte, da demonstração da qualidade de segurado do de cujus e da condição de dependente de quem objetiva a pensão. 2. É presumida a condição de dependência do companheiro, face às disposições contidas no artigo 16, I e § 4º, da Lei 8.213/91. 3. A nova redação dada pela Lei n.º 9.528/97 ao § 2º do art. 16 da Lei n.º 8.213/91 não teve o condão de derrogar o art. 33 da Lei n.º 8.069/90 (ECA), sob pena de ferir a ampla garantia de proteção ao menor disposta no art. 227 do texto constitucional, que não faz distinção entre o tutelado e o menor sob guarda de fato ou de direito. Permanece, pois, como dependente o menor sob guarda de direito ou de fato, inclusive para fins previdenciários. 4. Comprovada a condição de dependência para fins previdenciários, preenchidos os demais requisitos, fazem jus as autoras à concessão da pensão por morte. (TRF4, AC 0016258-58.2013.404.9999, Quinta Turma, Relator Ricardo Teixeira do Valle Pereira, D.E. 13/12/2013); (grifei)
EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. CONCESSÃO DE PENSÃO POR MORTE DE AVÓ. MENORES SOB GUARDA. DEPENDÊNCIA ECONÔMICA. COMPROVAÇÃO. LEI Nº 9.528/97. TERMO INICIAL. A Lei nº 9.528/97 não revogou expressamente o § 3º do art. 33 do Estatuto da Criança e do Adolescente, o qual confere ao menor sob guarda a condição de dependente para todos os efeitos, inclusive previdenciários, exigindo-se tão somente a demonstração de sua dependência econômica. (TRF4, AG 0005269-17.2013.404.0000, Sexta Turma, Relator Néfi Cordeiro, D.E. 12/11/2013). (grifei)
Ademais, recentemente, a Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ), em julgamento realizado no dia 26/02/2014, modificou entendimento anterior e passou a entender que o Estatuto da Criança e do Adolescente deve prevalecer sobre as positivações da Lei nº 8.213/91, assegurando-se o benefício ao menor sob guarda. O julgamento se deu no RMS 36034/MT, Relator Ministro Benedito Gonçalves:
PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. RECURSO EM MANDADO DE SEGURANÇA. PENSÃO POR MORTE. MENOR SOB GUARDA JUDICIAL. APLICABILIDADE DO ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE - ECA. INTERPRETAÇÃO COMPATÍVEL COM A DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA E COM O PRINCÍPIO DE PROTEÇÃO INTEGRAL DO MENOR.
1. Caso em que se discute a possibilidade de assegurar benefício de pensão por morte a menor sob guarda judicial, em face da prevalência do disposto no artigo 33, § 3º, do Estatuto da Criança e do Adolescente - ECA, sobre norma previdenciária de natureza específica.
2. Os direitos fundamentais da criança e do adolescente têm seu campo de incidência amparado pelo status de prioridade absoluta, requerendo, assim, uma hermenêutica própria comprometida com as regras protetivas estabelecidas na Constituição Federal e no Estatuto da Criança e do Adolescente.
3. A Lei 8.069/90 representa política pública de proteção à criança e ao adolescente, verdadeiro cumprimento da ordem constitucional, haja vista o artigo 227 da Constituição Federal de 1988 dispor que é dever do Estado assegurar com absoluta prioridade à criança e ao adolescente o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.
4. Não é dado ao intérprete atribuir à norma jurídica conteúdo que atente contra a dignidade da pessoa humana e, consequentemente, contra o princípio de proteção integral e preferencial a crianças e adolescentes, já que esses postulados são a base do Estado Democrático de Direito e devem orientar a interpretação de todo o ordenamento jurídico.
5. Embora a lei complementar estadual previdenciária do Estado de Mato Grosso seja lei específica da previdência social, não menos certo é que a criança e adolescente tem norma específica, o Estatuto da Criança e do Adolescente que confere ao menor sob guarda a condição de dependente para todos os efeitos, inclusive previdenciários (art. 33, § 3º, Lei n.º 8.069/90), norma que representa a política de proteção ao menor, embasada na Constituição Federal que estabelece o dever do poder público e da sociedade na proteção da criança e do adolescente (art. 227, caput, e § 3º, inciso II).
6. Havendo plano de proteção alocado em arcabouço sistêmico constitucional e, comprovada a guarda, deve ser garantido o benefício para quem dependa economicamente do instituidor. (grifei)
7. Recurso ordinário provido.
(Recurso em Mandado de Segurança n° 36.034 - MT (2011/0227834-9). Relator: Ministro Benedito Gonçalves. Primeira Seção do STJ. DJe: 15.04.2014)
Registro, outrossim, que mesmo a existência de uma guarda de fato não deve ser empecilho para a caracterização da dependência previdenciária, uma vez que a guarda prevista no Estatuto da Criança e do Adolescente destina-se, justamente, a regularizar uma posse de fato (art. 33, §1º).
Portanto, restando comprovado que o guardião de fato da parte autora era efetivamente o responsável por sua assistência material, moral e educacional, justamente as obrigações exigidas do guardião judicial, deve ser aquele equiparado a este, para fins previdenciários.
Neste sentido é a orientação da Terceira Seção do TRF da 4ª Região, in verbis:
EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE DE AVÔ. GUARDA DE FATO. COMPROVAÇÃO DA DEPENDÊNCIA ECONÔMICA. A nova redação dada pela Lei nº 9.528/97 ao §2º do art. 16 da Lei nº 8.213/91, excluindo a menção expressa ao menor sob guarda dentre as figuras equiparadas aos filhos para fins previdenciários, não teve o efeito de vedar o reconhecimento de sua condição de dependente e o consequente direito de pensão por morte do guardião, se comprovada a dependência econômica à época do óbito. Interpretação da regra previdenciária em consonância com o direito assegurado pelo texto constitucional e pelo Estatuto da Criança e do Adolescente. (TRF4, EINF 0016266-40.2010.404.9999, Terceira Seção, Relator Rogerio Favreto, D.E. 08/03/2012); (grifei)
EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. CONCESSÃO DE PENSÃO POR MORTE. MENOR SOB GUARDA (DE FATO). PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL DE PROTEÇÃO ESPECIAL DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE (CONSTITUIÇÃO FEDERAL, ART. 227, CAPUT, E § 3.º, INC. II). COMPROVAÇÃO DA DEPENDÊNCIA ECONÔMICA. (...) 3. A existência, in casu, de guarda de fato não deve ser empecilho para a caracterização da dependência previdenciária, uma vez que a guarda prevista no Estatuto da Criança e do Adolescente destina-se, justamente, a regularizar uma posse de fato (art. 33, §1º). Assim, comprovado que os avós efetivamente eram os responsáveis pela assistência material, moral e educacional do menor, justamente as obrigações exigidas do guardião judicial, devem ser aqueles equiparados a este, para fins previdenciários. Precedentes deste Tribunal. (TRF4, EINF 2008.72.99.000972-0, Terceira Seção, Relator Celso Kipper, D.E. 14/12/2011); (grifei)
EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DECLARATÓRIOS. CONCESSÃO DE PENSÃO POR MORTE. MENORES SOB GUARDA DE FATO. CONTRADIÇÃO. ocorrência. OMISSÃO INEXISTência. (...). 3. A existência, in casu, de guarda de fato não deve ser empecilho para a caracterização da dependência previdenciária, uma vez que a guarda prevista no Estatuto da Criança e do Adolescente destina-se, justamente, a regularizar uma posse de fato (art. 33, §1º). Assim, comprovado que os avós efetivamente eram os responsáveis pela assistência material, moral e educacional dos autores, justamente as obrigações exigidas do guardião judicial, devem ser aqueles equiparados a este, para fins previdenciários. Precedentes deste Tribunal. (...). (TRF4, EINF 2008.71.99.003054-7, Terceira Seção, Relatora Eliana Paggiarin Marinho, D.E. 11/05/2011). (grifei)
A esse passo, para comprovar a qualidade de dependente em relação ao avô materno, o Autor anexou aos autos os seguintes documentos:
- Certidão de nascimento do Autor, ocorrido em 23.10.1993, filho de Claudemir dos Santos Garcia e Isabel Cristina Lima do Canto, tendo como avós maternos Vilson Soares do Canto e Theresa Lima do Canto, constando averbação no sentido de que o Autor foi interditado por sentença, conforme registro lavrado em 16.09.2013, tendo sido nomeada curadora Maria Helena Lima do Canto; grifo meu
- Certidão de interdição do Autor, conforme sentença proferida em 04.06.2013 e transitada em julgado em 01.07.2013;
- Atestado emitido pelo neurologista Carlos Sangoi, datado de 20.07.2011, no sentido de que o Autor é portador de hidrocefalia congênita, com retardo psicomotor, dependendo totalmente de familiares (CID G 91.1 e G 40.6);
- Sentença proferida na Justiça Estadual para deferir, de modo definitivo, a guarda do Autor aos avós Vilson Soares do Canto e Theresa Lima do Canto, datada de 13.09.1999;
- Sentença de interdição do Autor, proferida na Justiça Estadual em 04.06.2013, promovida por sua tia Maria Helena Lima do Canto, sendo reconhecida a incapacidade absoluta do Demandante para o atos da vida civil e nomeada a tia como curadora definitiva;
- Certidão de óbito de Vilson Soares do Canto, ocorrido em 20.08.2004, constando que era casado com Theresa Lima do Canto;
- Informação de benefício referente à percepção, por Vilson Soares do Canto, de aposentadoria por invalidez previdenciária, com DIB em 01.01.1982 e DCB em 20.08.2004;
- Informação de benefício referente à percepção, por Theresa Lima do Canto, de pensão por morte previdenciária decorrente do óbito de Vilson Soares do Canto, com DIB em 20.08.2004 e DCB em 03.05.2007, em virtude do óbito de Theresa;
- Comprovante de pagamento de pensão do IPERGS em favor do Autor, datado de 01/2013, no valor de um salário mínimo;
- Certidão de óbito de Theresa Lima do Canto, ocorrido em 03.05.2007;
- Informação de benefício referente à percepção, pelo Autor, representado por sua mãe Isabel Cristina do Canto, de benefício assistencial, com DIB em 26.04.2004 e DCB em 30.04.2009.
Foi determinada a realização de audiência de instrução e julgamento (Evento 38).
A curadora Maria Helena Lima do Canto afirmou ser tia do Autor, irmã de Isabel Cristina Lima do Canto, mãe do Demandante. Afirmou que o Autor foi cuidado pelos avós desde que nasceu com hidrocefalia congênita. Os pais biológicos não tinha condições financeiras de cuidá-lo, mas a mãe do Autor, Isabel Cristina, sempre morou na mesma casa que os pais Vilson e Theresa, avós maternos do Autor. Referiu que a irmã Isabel nunca quis trabalhar, embora tivesse saúde. Os pais da depoente sempre moraram na Tancredo Neves, na Quadra 17, Casa 25, desde 1986 até o falecimento dos mesmos. O Autor sempre dependeu economicamente dos avós, era o pai da depoente quem pagava as despesas médicas, as fraudas, tudo. O pai biológico nunca ajudou com nada. A Isabel morou um tempo com o pai do Autor, depois voltou a morar na casa dos avós do Demandante, na Quadra 17, Casa 25, Tancredo Neves. Teve um período em que a Isabel recebeu um BA, ocasião em que morava no mesmo endereço dos pais.
A testemunha João Raimundo Schucz referiu que foi colega de serviço e vizinho do Sr Vilson Soares de Lima. Afirmou que o Autor sempre morou com os avós Vilson e Theresa. Não sabe informar se a mãe do Autor, Isabel Cristina, sempre morou com os pais. Na época do falecimento do Sr Vilson o Autor estava morando com ele, e sempre dependeu economicamente do mesmo, vez que os pais biológicos não tinham condições financeiras. A Isabel Cristina nunca trabalhou, e não tinha problema de saúde. Após o óbito dos avós, o Autor ficou sujo, mal cuidado, então a Maria Helena quando o viu se apavorou e pegou o Autor para cuidar. A Isabel não tem renda, de modo que a testemunha acredita que ela é sustentada por um irmão.
Por fim, a informante Ane Patrícia da Motta do Canto, prima do Autor, mencionou que desde que o Demandante nasceu ele mora com os avós Vilson e Theresa, porque a mãe não tinha condições de criá-lo. Na época do óbito o Autor morava com os avós e também com a mãe Isabel Cristina. Afirmou que a Isabel continua morando na casa dos avós do Autor, e vive do bolsa-família e da pensão que recebe dos outros dois filhos que possui, paga pelo pai do Autor, que é o mesmo pai dos outros filhos. Refere que a Isabel nunca trabalhou, embora não possua nenhuma doença. Depois que a Maria Helena voltou definitivamente de São Paulo, passou a tomar conta do Autor, isso após o óbito dos avós Vilson e Theresa. Afirma que a Maria Helena sempre cuidou bem do Autor.
Extrai-se do conjunto probatório que o Autor recebeu auxílio financeiro e afetivo dos avós Vilson e Theresa desde que nasceu, vivendo inicialmente sob a guarda de fato dos mesmos, e posteriormente sob a guarda judicial, a contar de 13.09.1999.
Outrossim, restou demonstrada a dependência econômica dele em relação ao avô Vilson, tendo sido clara e uniforme a prova oral no sentido de que os pais biológicos nunca prestaram nenhum auxílio, de modo que a mãe, Isabel Cristina, embora saudável, nunca trabalhou, e que o pai do Autor também não demonstrou interesse em auxíliá-lo.
Destarte, entendo demonstrada a qualidade de dependente do Autor em relação ao extinto, na condição de menor sob guarda, atualmente maior, porém, absolutamente incapaz para os atos da vida civil.
Assim, faz jus o Autor à concessão da benesse postulada na exordial.
Data de início do Benefício
A data de início do benefício de pensão por morte deve ser fixada de acordo com o artigo 74 da Lei 8.213/91:
Art. 74. A pensão por morte será devida ao conjunto dos dependentes do segurado que falecer, aposentado ou não, a contar da data: (Redação dada pela Lei nº 9.528, de 1997)
I - do óbito, quando requerida até trinta dias depois deste; (Incluído pela Lei nº 9.528, de 1997)
II - do requerimento, quando requerida após o prazo previsto no inciso anterior; (Incluído pela Lei nº 9.528, de 1997)
III - da decisão judicial, no caso de morte presumida. (Incluído pela Lei nº 9.528, de 1997)
No caso dos autos, no que concerne à DIB da pensão por morte, cumpre tecer algumas considerações.
Verifico que o Autor percebeu benefício assistencial, representado por sua mãe, no período de 26.04.2004 a 30.04.2009, quando ambos residiam no mesmo endereço em que moravam os avós do Autor, pais de Isabel Cristina. O avô Vilson faleceu em 20.08.2004 e a avó Theresa em 03.05.2007.
Nessa linha, observo que a aposentadoria por invalidez previdenciária percebida pelo avô do Autor era de um salário mínimo (Evento 3, INFBEN 1). A pensão por morte decorrente de seu óbito, paga a avó Theresa no período de 20.08.2004 a 03.05.2007, era de valor um pouco inferior ao salário mínimo (Evento 3, INFBEN 1).
Nessa hipótese, tenho que durante o período em que houve a percepção de benefício assistencial pelo Autor - 26.04.2004 a 30.04.2009 - não restou demonstrada a dependência econômica em relação ao avô, visto que o valor auferido com a benesse assistencial era idêntico ao valor pago a título de aposentadoria e pensão por morte, situação em que resta caracterizada uma complementação de renda, mas não a dependência econômica.
Após a cessação do amparo assistencial, entretanto, volta a restar demonstrada a dependência econômica do Autor em relação ao de cujus.
Assim, a DIB do benefício deve ser fixada no dia seguinte à cessação do benefício assistencial, ou seja, 01.05.2009, lembrando, ainda, que contra absolutamente incapazes não corre prescrição ou decadência.
(...)
Como se vê, dos documentos acostados aos autos, restou comprovada a condição de dependente do autor em relação ao de cujus, sendo devida a concessão do benefício de pensão por morte.
Consectários. Juros moratórios e correção monetária.
A questão da atualização monetária das quantias a que é condenada a Fazenda Pública, dado o caráter acessório de que se reveste, não deve ser impeditiva da regular marcha do processo no caminho da conclusão da fase de conhecimento.
Firmado em sentença, em apelação ou remessa oficial o cabimento dos juros e da correção monetária por eventual condenação imposta ao ente público e seus termos iniciais, a forma como serão apurados os percentuais correspondentes, sempre que se revelar fator impeditivo ao eventual trânsito em julgado da decisão condenatória, pode ser diferida para a fase de cumprimento, observando-se a norma legal e sua interpretação então em vigor. Isso porque é na fase de cumprimento do título judicial que deverá ser apresentado, e eventualmente questionado, o real valor a ser pago a título de condenação, em total observância à legislação de regência.
O recente art. 491 do NCPC, ao prever, como regra geral, que os consectários já sejam definidos na fase de conhecimento, deve ter sua interpretação adequada às diversas situações concretas que reclamarão sua aplicação. Não por outra razão seu inciso I traz exceção à regra do caput, afastando a necessidade de predefinição quando não for possível determinar, de modo definitivo, o montante devido. A norma vem com o objetivo de favorecer a celeridade e a economia processuais, nunca para frear o processo.
E no caso, o enfrentamento da questão pertinente ao índice de correção monetária, a partir da vigência da Lei 11.960/09, nos débitos da Fazenda Pública, embora de caráter acessório, tem criado graves óbices à razoável duração do processo, especialmente se considerado que pende de julgamento no STF a definição, em regime de repercussão geral, quanto à constitucionalidade da utilização do índice da poupança na fase que antecede a expedição do precatório (RE 870.947, Tema 810).
Tratando-se de débito, cujos consectários são totalmente regulados por lei, inclusive quanto ao termo inicial de incidência, nada obsta a que seja diferida para a fase de cumprimento do julgado em que, a propósito, poderão as partes, se assim desejarem, mais facilmente conciliar acerca do montante devido, de modo a finalizar definitivamente o processo.
Sobre esta possibilidade, já existe julgado da Terceira Seção do STJ, em que assentado que "diante a declaração de inconstitucionalidade parcial do artigo 5º da Lei n. 11.960/09 (ADI 4357/DF), cuja modulação dos efeitos ainda não foi concluída pelo Supremo Tribunal Federal, e por transbordar o objeto do mandado de segurança a fixação de parâmetros para o pagamento do valor constante da portaria de anistia, por não se tratar de ação de cobrança, as teses referentes aos juros de mora e à correção monetária devem ser diferidas para a fase de execução. 4. Embargos de declaração rejeitados". (EDcl no MS 14.741/DF, Rel. Ministro JORGE MUSSI, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 08/10/2014, DJe 15/10/2014).
Na mesma linha vêm decidindo as duas turmas de Direito Administrativo desta Corte (2ª Seção), à unanimidade, (Ad exemplum: os processos 5005406-14.2014.404.7101 3ª Turma, julgado em 01-06-2016, e 5052050-61.2013.404.7000, 4ª Turma, julgado em 25/05/2016).
Portanto, em face da incerteza quanto ao índice de atualização monetária, e considerando que a discussão envolve apenas questão acessória no contexto da lide, à luz do que preconizam os art. 4º, 6º e 8º do novo Código de Processo Civil, mostra-se adequado e racional diferir-se para a fase de execução a solução em definitivo acerca dos critérios de correção, ocasião em que, provavelmente, a questão já terá sido dirimida pelo tribunal superior, o que conduzirá à observância, pelos julgadores, ao fim e ao cabo, da solução uniformizadora.
A fim de evitar novos recursos, inclusive na fase de cumprimento de sentença, e anteriormente à solução definitiva pelo STF sobre o tema, a alternativa é que o cumprimento do julgado se inicie, adotando-se os índices da Lei 11.960/2009, inclusive para fins de expedição de precatório ou RPV pelo valor incontroverso, diferindo-se para momento posterior ao julgamento pelo STF a decisão do juízo sobre a existência de diferenças remanescentes, a serem requisitadas, acaso outro índice venha a ter sua aplicação legitimada.
Os juros de mora, incidentes desde a citação, como acessórios que são, também deverão ter sua incidência garantida na fase de cumprimento de sentença, observadas as disposições legais vigentes conforme os períodos pelos quais perdurar a mora da Fazenda Pública.
Evita-se, assim, que o presente feito fique paralisado, submetido a infindáveis recursos, sobrestamentos, juízos de retratação e até ações rescisórias, com comprometimento da efetividade da prestação jurisdicional, apenas para solução de questão acessória.
Diante disso, difere-se para a fase de cumprimento de sentença a forma de cálculo dos consectários legais, adotando-se inicialmente o índice da Lei 11.960/2009, restando prejudicado o recurso e/ou remessa necessária no ponto.
Honorários advocatícios
Os honorários advocatícios devem ser fixados em 10% (dez por cento) sobre o valor das parcelas vencidas até a data da sentença, a teor das Súmulas 111, do STJ, e 76, do TRF da 4ª Região.
Negado provimento à apelação no ponto.
Custas
O INSS é isento do pagamento das custas no Foro Federal (art. 4, I, da Lei nº 9.289/96) e na Justiça Estadual do Rio Grande do Sul, devendo, contudo, pagar eventuais despesas processuais, como as relacionadas a correio, publicação de editais e condução de oficiais de justiça(artigo 11 da Lei Estadual nº 8.121/85, com a redação da Lei Estadual nº13.471/2010, já considerada a inconstitucionalidade formal reconhecida na ADInº 70038755864 julgada pelo Órgão Especial do TJ/RS), isenções estas que não se aplicam quando demandado na Justiça Estadual do Paraná (Súmula 20 do TRF4), devendo ser ressalvado, ainda, que no Estado de Santa Catarina (art. 33, parágrafo único, da Lei Complementar Estadual nº156/97), a autarquia responde pela metade do valor.
Da antecipação da tutela
Uma vez confirmado o direito ao benefício, resta mantida a antecipação dos efeitos da tutela, concedida no juízo de origem.
Verifico que o INSS informou, através do sistema Plenus, a implementação do benefício (evento 1, INFBEN10, p.1).
Conclusão
Negado provimento à apelação e à remessa oficial. Prejudicado o exame do critério de aplicação dos juros e correção monetária. Difere-se para a fase de execução a forma de cálculo dos consectários legais.
Dispositivo
Ante o exposto, voto por negar provimento à apelação e à remessa oficial, mantida a antecipação de tutela.
Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE
Relatora
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 17/05/2017
APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 5004280-23.2014.4.04.7102/RS
ORIGEM: RS 50042802320144047102
RELATOR | : | Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE |
PRESIDENTE | : | Desembargadora Federal Vânia Hack de Almeida |
PROCURADOR | : | Procurador Regional da Republica Paulo Gilberto Cogo Leivas |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELADO | : | TAYLAN LIMA GARCIA (Absolutamente Incapaz (Art. 3º, II e III CC)) |
: | MARIA HELENA LIMA DO CANTO (Curador) | |
ADVOGADO | : | EVERTON BARTH DOS SANTOS |
MPF | : | MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 17/05/2017, na seqüência 1610, disponibilizada no DE de 02/05/2017, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 6ª TURMA, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO E À REMESSA OFICIAL, MANTIDA A ANTECIPAÇÃO DE TUTELA.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE |
VOTANTE(S) | : | Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE |
: | Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA | |
: | Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA |
Gilberto Flores do Nascimento
Diretor de Secretaria
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