APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 5049922-24.2015.4.04.9999/PR
RELATOR | : | PAULO AFONSO BRUM VAZ |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELADO | : | JOAO NENSANH AMANTINO |
: | JOSIANA NIVYGSANH AMANTINO | |
ADVOGADO | : | ANA GRACIELI ANTONIAZZI TERLECKI |
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. CONCESSÃO DE PENSÃO POR MORTE DE COMPANHEIRA E GENITORA. REQUISITOS PREENCHIDOS.
1. A concessão do benefício de pensão por morte depende da ocorrência do evento morte, da demonstração da qualidade de segurado do de cujus e da condição de dependente de quem objetiva a pensão.
2. Preenchidos os requisitos legais, fazem jus os autores à pensão por morte da companheira e genitora.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Colenda 5a. Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação do INSS e à remessa oficial e determinar a implantação imediata do benefício, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 18 de outubro de 2016.
Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ
Relator
Documento eletrônico assinado por Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8570460v5 e, se solicitado, do código CRC C54C82C. | |
Informações adicionais da assinatura: | |
Signatário (a): | Paulo Afonso Brum Vaz |
Data e Hora: | 19/10/2016 13:55 |
APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 5049922-24.2015.4.04.9999/PR
RELATOR | : | Des. Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELADO | : | JOAO NENSANH AMANTINO |
: | JOSIANA NIVYGSANH AMANTINO | |
ADVOGADO | : | ANA GRACIELI ANTONIAZZI TERLECKI |
RELATÓRIO
Cuida-se de remessa oficial e apelação interposta pelo INSS em face de sentença que julgou procedente ação objetivando a concessão do benefício de pensão por morte.
Sustenta, em síntese, que não restou comprovada, por meio de prova material, a qualidade de segurada especial da falecida, pois as certidões emitidas pela FUNAI - Fundação Nacional do Índio - não seriam suficientes para demonstrar que a falecida se dedicava às lides campesinas. Além disso, alega que não restou comprovada a união estável e, por consequência, a condição de dependente do autor João em relação à falecida.
Com as contrarrazões, vieram os autos a esta Corte.
É o relatório.
VOTO
Da remessa oficial
Conheço da remessa necessária, visto que sua dispensa apenas tem lugar quando a sentença líquida veicular condenação não excedente a 60 (sessenta) salários mínimos (STJ, Súmula nº 490, EREsp nº 600.596, Corte Especial, Relator Ministro Teori Albino Zavascki, DJ 23/11/2009).
Saliente-se, por oportuno, que não incide o limite de 1.000 (mil) salários mínimos previsto no art. 496, § 3º, inciso I, do NCPC, porquanto a r. sentença foi proferida antes de 18/03/2016 (data da vigência do NCPC definida pelo Pleno do STJ em 02/04/2016), conforme prevê expressamente o artigo 14 do NCPC [A norma processual não retroagirá e será aplicável imediatamente aos processos em curso, respeitados os atos processuais praticados e as situações jurídicas consolidadas sob a vigência da norma revogada].
Premissas
Trata-se de demanda previdenciária na qual a parte autora objetiva a concessão de PENSÃO POR MORTE, prevista no art. 74 da Lei nº 8.213/91, a qual depende do preenchimento dos seguintes requisitos: (a) a ocorrência do evento morte, (b) a demonstração da qualidade de segurado do de cujus e (c) a condição de dependente de quem objetiva o benefício, os quais passam a ser examinados a seguir.
Exame do caso concreto
Na hipótese sub judice, os autores João Nensãnh Amantino e Josiana Nivygsãnh Amantino postulam a concessão do benefício de pensão por morte na qualidade de companheiro e filha de MADALENA EGSÃNH PEREIRA.
O óbito de MADALENA EGSÃNH PEREIRA, indígena pertencente à etnia Kaigang, ocorreu em 23/04/2000, consoante certidão de registro administrativo de óbito expedida pelo Posto Indígena Rio das Cobras (evento 1, out2, p. 3).
A condição de dependente da autora Josiana Nivygsãnh Amantino está comprovada pelo documento de identidade e pela certidão de nascimento anexados no evento 1, out2, pp. 9 e 10, por meio dos quais de verifica que era filha da falecida, nascida em 25/08/1998, ressaltando-se que a dependência econômica dos filhos menores de 21 anos de idade é presumida por força de lei (art. 16, § 4º, da Lei 8.213/91).
A controvérsia restringe-se, pois, à comprovação da qualidade de segurada especial da de cujus e da alegada união estável desta com o autor João, sendo que a dependência econômica entre os companheiros também é presumida por força de lei (art. 16, § 4º, da Lei 8.213/91)..
Pois bem. Consoante é cediço, a caracterização do trabalhador rural qualificado como segurado especial (inciso VII do artigo 11 da Lei 8.213/91) fica condicionada à comprovação do exercício de atividade rural, sendo dispensável o recolhimento de contribuições.
Ademais, o tempo de serviço rural deve ser demonstrado mediante a apresentação de início de prova material contemporâneo do período a ser comprovado, complementada por prova testemunhal idônea, não sendo esta admitida, em princípio, exclusivamente, a teor do art. 55, § 3º, da Lei n. 8.213/91, e Súmula 149 do STJ. Cabe salientar que, embora o art. 106 da Lei de Benefícios relacione os documentos aptos a essa comprovação, tal rol não é exaustivo.
Não se exige, por outro lado, prova documental plena da atividade rural em relação a todos os anos integrantes do período correspondente à carência, mas início de prova material (como notas fiscais, talonário de produtor, comprovantes de pagamento do ITR ou prova de titularidade de imóvel rural, certidões de casamento, de nascimento, de óbito, certificado de dispensa de serviço militar, etc.) que, juntamente com a prova oral, possibilite um juízo de valor seguro acerca dos fatos que se pretende comprovar.
Já em relação à condição de dependente de João Nensãnh Amantino, vale destacar que, levada à condição de entidade familiar pela Constituição de 1988, a união estável foi definida na Lei nº 9.278/96, no seu art. 1º, como sendo a convivência duradoura, pública e contínua, de um homem e uma mulher, estabelecida com objetivo de constituir família. Por sua vez, a Lei nº 8.213/91, em seu art. 16, § 3º, considera dependente na condição de companheira ou companheiro a pessoa que, sem ser casada, mantém união estável com o segurado ou com a segurada, de acordo com o § 3º do art. 226 da Constituição Federal. Assim, tem-se que a dependência econômica do companheiro ou companheira é presumida na legislação (art. 16, inciso I e § 4º, da Lei n.º 8.213/91).
Ademais, detendo a união estável natureza eminentemente fática, exigir a sua comprovação documental seria o mesmo que inviabilizar a concessão do benefício previdenciário, prevalecendo na análise probatória o livre convencimento do julgador (TRF4, AC nº 2003.04.01.037793-2, Quinta Turma, relator Des. Federal Jorge Antônio Maurique, D.E. 14/02/2007).
Na hipótese dos autos, para comprovar a condição de segurada especial da de cujus e a existência da união estável com o autor João, foram colacionadas as seguintes provas documentais (evento 1, out2):
a) certidão do registro administrativo de óbito de índio, expedida pela FUNAI, em 03/07/2000, na qual consta que Madalena Egsãnh Pereira era casada, pertencia à etnia Kaigang, faleceu em 23/04/2000 e foi sepultada em 24/04/2000 no cemitério Indígena da Aldeia Sede - PIN Rio das Cobras, Nova Laranjeira/PR;
b) certidão do registro administrativo de nascimento de índio, expedida pela FUNAI, em 03/07/2000, na qual consta que Madalena Egsãnh Pereira nasceu em 28/06/1979 e pertencia à etnia Kaigang, pertencente ao Posto Indígena Rio das Cobras;
c) declaração de representante da FUNAI, com data de 17/01/2014, de que Madalena trabalhou como agricultora desde o ano de 1995 juntamente com seus pais, cultivando lavouras de pequeno porte para a subsistência da família;
d) certidão de exercício de atividade rural em nome da falecida, com data de 17/01/2014, na qual consta que Madalena pertencia à Tribo Kaigang, era amasiada com João Nensanh Amantino, residia na Terra Indígena Rio das Cobras e exerceu atividade rural em regime de economia familiar no período de 29/06/1995 a 22/04/2000;
e) certidão do registro administrativo de nascimento de índio, expedida pela FUNAI, em 01/09/1998, na qual consta que a autora Josiana Nivygsãnh Amantino nasceu em 25/08/1998, pertecenente à etnia Kaigang, filha do autor João e da falecida Madalena;
f) demonstrativo do Sistema PLENUS comprovando que a falecida Madalena percebeu salário-maternidade no período de 25/08/1998 a 23/12/1998, na qualidade de segurada especial;
g) certidão de nascimento da autora Josiana, expedida em 20/02/2014, filha do autor João e da de cujus.
De outro lado, na prova oral, realizada em 28/06/2015, foram ouvidos o autor João e duas testemunhas, as quais confirmaram que a falecida Madalena sempre desenvolveu a atividade rural, inclusive no período anterior ao óbito, na aldeia de Rio das Cobras, município de Nova Laranjeiras; que Madalena e o autor João viviam como se casados fossem e só tiveram uma filha - a autora Josiana; que o trabalho que ela e o companheiro desenvolviam era na lavoura e no artesanato; que cada família de indígena tem o seu pedaço de terra para plantar mandioca, feijão, milho e batata; que o casal não era casado oficialmente, o que era comum entre os indígenas (eventos 44 e 64).
Do conjunto probatório produzido nos autos, extraio, pois, ter restado comprovado que a de cujus exerceu a atividade rural em regime de economia familiar até a data do falecimento e que a união daquela com o autor João era estável e com intuitu familiae, preenchendo assim os requisitos legais para a concessão do benefício postulado.
Termo inicial
Tendo em vista que o óbito de MADALENA EGSÃNH PEREIRA ocorreu em 23/04/2000 e o requerimento administrativo da pensão em 30/01/2014, o marco inicial do benefício deve ser fixado na data do óbito para a autora Josiana, nos termos do art. 74, inciso I, da Lei 8.213/91, uma vez que, nas referidas datas, aquela autora era absolutamente incapaz, pois nascida em 25/08/1998, não havendo, pois, parcelas prescritas.
Já quanto ao autor João, faz jus às parcelas a contar do requerimento administrativo, nos termos do art. 74, inciso II, da Lei 8.213/91.
Dos consectários
Correção Monetária e Juros
Não obstante a determinação do artigo 491 do NCPC no sentido de que "na ação relativa à obrigação de pagar quantia, ainda que formulado pedido genérico, a decisão definirá desde logo a extensão da obrigação, o índice de correção monetária, a taxa de juros, o termo inicial de ambos e a periodicidade da capitalização dos juros, se for o caso", tal deliberação resta inviabilizada, neste momento, em razão da pendência do julgamento das ADIs 4.357 e 4.425 pelo STF e dos recursos representativos de controvérsia (Resp 1495146/MG, 1495144/RS e 1492221/PR) pelo STJ (Tema 905).
Por conseguinte, ainda que o percentual de juros e o índice de correção monetária devam ser aqueles constantes da legislação em vigor em cada período em que ocorreu a mora da Fazenda Pública (INSS), difere-se, excepcionalmente, para a fase de execução a forma de cálculo dos consectários legais, restando prejudicado o recurso e/ou remessa necessária, no ponto, nos termos da deliberação proferida pelo STJ (EDcl no MS 14.741/DF , Rel. Ministro JORGE MUSSI, Terceira Seção, DJe 15/10/2014).
Honorários Advocatícios
Os honorários advocatícios devem ser fixados em 10% sobre o valor da condenação, excluídas as parcelas vincendas, observando-se a Súmula 76 desta Corte: "Os honorários advocatícios, nas ações previdenciárias, devem incidir somente sobre as parcelas vencidas até a data da sentença de procedência ou do acórdão que reforme a sentença de improcedência".
Saliente-se, por oportuno, que não incide a sistemática dos honorários prevista no art. 85 do NCPC, porquanto a sentença foi proferida antes de 18/03/2016 (data da vigência do NCPC definida pelo Pleno do STJ em 02/04/2016), conforme prevê expressamente o artigo 14 do NCPC [A norma processual não retroagirá e será aplicável imediatamente aos processos em curso, respeitados os atos processuais praticados e as situações jurídicas consolidadas sob a vigência da norma revogada].
Custas Processuais
O INSS é isento do pagamento das custas no Foro Federal (art. 4º, I, da Lei nº 9.289/96) e na Justiça Estadual do Rio Grande do Sul, devendo, contudo, pagar eventuais despesas processuais, como as relacionadas a correio, publicação de editais e condução de oficiais de justiça (artigo 11 da Lei Estadual nº 8.121/85, com a redação da Lei Estadual nº 13.471/2010, já considerada a inconstitucionalidade formal reconhecida na ADI nº 70038755864 julgada pelo Órgão Especial do TJ/RS), isenções estas que não se aplicam quando demandado na Justiça Estadual do Paraná (Súmula 20 do TRF4), devendo ser ressalvado, ainda, que, no Estado de Santa Catarina (art. 33, par. único, da Lei Complementar estadual 156/97), a autarquia responde pela metade do valor.
Implantação do benefício
Reconhecido o direito da parte, impõe-se a determinação para a imediata implantação do benefício, nos termos do art. 497 do NCPC [Art. 497. Na ação que tenha por objeto a prestação de fazer ou de não fazer, o juiz, se procedente o pedido, concederá a tutela específica ou determinará providências que assegurem a obtenção de tutela pelo resultado prático equivalente.] e da jurisprudência consolidada da Colenda Terceira Seção desta Corte (QO-AC nº 2002.71.00.050349-7, Rel. p/ acórdão Des. Federal Celso Kipper). Dessa forma, deve o INSS implantar o benefício em até 45 dias, conforme os parâmetros acima definidos, incumbindo ao representante judicial da autarquia que for intimado dar ciência à autoridade administrativa competente e tomar as demais providências necessárias ao cumprimento da tutela específica.
Conclusão
Confirma-se a sentença para conceder a pensão por morte desde a data do óbito para a autora Josiana e desde a DER para o autor João.
Dispositivo
Ante o exposto, voto por negar provimento à apelação do INSS e à remessa oficial e determinar a implantação imediata do benefício.
Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ
Relator
Documento eletrônico assinado por Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8570459v21 e, se solicitado, do código CRC 6E5A454C. | |
Informações adicionais da assinatura: | |
Signatário (a): | Paulo Afonso Brum Vaz |
Data e Hora: | 19/10/2016 13:55 |
EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 18/10/2016
APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 5049922-24.2015.4.04.9999/PR
ORIGEM: PR 00015206520148160104
RELATOR | : | Des. Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ |
PRESIDENTE | : | Paulo Afonso Brum Vaz |
PROCURADOR | : | Dra. Márcia Neves Pinto |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELADO | : | JOAO NENSANH AMANTINO |
: | JOSIANA NIVYGSANH AMANTINO | |
ADVOGADO | : | ANA GRACIELI ANTONIAZZI TERLECKI |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 18/10/2016, na seqüência 290, disponibilizada no DE de 27/09/2016, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, a DEFENSORIA PÚBLICA e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 5ª TURMA, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO DO INSS E À REMESSA OFICIAL E DETERMINAR A IMPLANTAÇÃO IMEDIATA DO BENEFÍCIO.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Des. Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ |
VOTANTE(S) | : | Des. Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ |
: | Juíza Federal ANA PAULA DE BORTOLI | |
: | Juiz Federal HERMES S DA CONCEIÇÃO JR |
Lídice Peña Thomaz
Secretária de Turma
Documento eletrônico assinado por Lídice Peña Thomaz, Secretária de Turma, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8657045v1 e, se solicitado, do código CRC A2031760. | |
Informações adicionais da assinatura: | |
Signatário (a): | Lídice Peña Thomaz |
Data e Hora: | 18/10/2016 16:40 |