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PREVIDENCIÁRIO. CONCESSÃO DE PENSÃO POR MORTE DE COMPANHEIRO. ÓBITO POSTERIOR À VIGÊNCIA DA LEI Nº 13. 846/2019 E DA EMENDA CONSTITUCIONAL Nº 103/2019. IN...

Data da publicação: 21/12/2023, 11:01:39

EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. CONCESSÃO DE PENSÃO POR MORTE DE COMPANHEIRO. ÓBITO POSTERIOR À VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.846/2019 E DA EMENDA CONSTITUCIONAL Nº 103/2019. INÍCIO DE PROVA MATERIAL DA UNIÃO ESTÁVEL POR PERÍODO SUPERIOR A DOIS ANOS PRESENTE NOS AUTOS. MANTIDA A CONCESSÃO DA PENSÃO POR MORTE DE FORMA VITALÍCIA ATÉ A DATA DO ÓBITO DA AUTORA. 1. Em relação à condição de dependente da companheira, vale destacar que, levada à condição de entidade familiar pela Constituição de 1988, a união estável foi definida na Lei nº 9.278/96, no seu art. 1º, como sendo a convivência duradoura, pública e contínua, de um homem e uma mulher, estabelecida com objetivo de constituir família. Por sua vez, a Lei nº 8.213/91, em seu art. 16, § 3º, considera dependente na condição de companheira ou companheiro a pessoa que, sem ser casada, mantém união estável com o segurado ou com a segurada, de acordo com o § 3º do art. 226 da Constituição Federal. Assim, tem-se que a dependência econômica do companheiro ou companheira é presumida na legislação (art. 16, inciso I e § 4º, da Lei n.º 8.213/91). 2. A Medida Provisória nº 871, de 18/01/2019, incluiu o § 5º ao art. 16 da Lei nº 8.213/91 ("§ 5º A prova de união estável e de dependência econômica exigem início de prova material contemporânea dos fatos, não admitida a prova exclusivamente testemunhal, exceto na ocorrência de motivo de força maior e ou caso fortuito, conforme disposto no Regulamento") e foi convertida na Lei nº 13.846, de 18/06/2019, a qual incluiu os parágrafos 5º e 6º do art. 16 da Lei de Benefícios, com a seguinte redação: § 5º As provas de união estável e de dependência econômica exigem início de prova material contemporânea dos fatos, produzido em período não superior a 24 (vinte e quatro) meses anterior à data do óbito ou do recolhimento à prisão do segurado, não admitida a prova exclusivamente testemunhal, exceto na ocorrência de motivo de força maior ou caso fortuito, conforme disposto no regulamento. § 6º Na hipótese da alínea c do inciso V do § 2º do art. 77 desta Lei, a par da exigência do § 5º deste artigo, deverá ser apresentado, ainda, início de prova material que comprove união estável por pelo menos 2 (dois) anos antes do óbito do segurado. 3. Tendo o óbito do instituidor ocorrido após a vigência da Lei nº 13.846/2019, é necessário, para comprovar a alegada união estável, início de prova material contemporânea aos fatos. 4. Tendo restado comprovada, por início de prova material e por prova testemunhal, a união estável havida entre a autora e o de cujus até a data do óbito, por período superior a dois anos, são devidas as diferenças do benefício de pensão por morte compreendidas entre a data do óbito do instituidor e a data do óbito da autora. (TRF4, AC 5012109-79.2023.4.04.9999, NONA TURMA, Relator PAULO AFONSO BRUM VAZ, juntado aos autos em 13/12/2023)

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5012109-79.2023.4.04.9999/SC

RELATOR: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

APELADO: ROSA ELIANE DE GOES

APELADO: ALICE HENZEL DE GOES

RELATÓRIO

Cuida-se de apelação interposta pelo INSS em face de sentença, publicada em 24-05-2023, nestes termos (evento 120, SENT1):

Ante o exposto, JULGO PROCEDENTE o pedido formulado na inicial por ROSA ELIANE DE GOES contra o Instituto Nacional de Seguro Social - INSS e: a) DECLARO a existência da sociedade conjugal de fato em união estável entre o(a) extinto(a) Wanderlei Locks e o(a) autor(a) durante, pelo menos, 15 anos, que se dissolveu em razão do falecimento do(a) primeiro(a);

b) CONDENO o réu a implantar à parte autora o benefício de pensão por morte de forma vitalícia, nos termos do art. 77, §2°, inc. V, alínea “c”, item 6, da Lei n. 8213/1991, e de imediato, diante da tutela de urgência ora concedida, devendo o INSS comprovar nos autos no prazo de 30 dias.

Havendo mais de um dependente habilitado de mesma classe, AUTORIZO, desde já, o rateio previsto no art. 77, § 1º, da Lei de Benefícios, ou nos termos da legislação vigente à época do óbito do(a) segurado(a) institudor(a) (Súmula n. 340/STJ).

c) CONDENO também, o requerido, a efetuar o pagamento das parcelas vencidas, desde a data do óbito em 12-1-2021, excluídas as parcelas atingidas pela prescrição quinquenal.

Sustenta, em suma, que a autora não faz jus ao benefício de pensão por morte de forma vitalícia, pois não foi apresentado início de prova material da existência da união estável por período superior a 24 meses, o que seria exigível, no caso, porquanto o óbito é posterior à MP 871/2019. Com efeito, alega que as provas materiais apresentadas são do próprio mês do óbito. Além disso, a autora sequer teria sido mencionada na certidão de óbito e no CADÚnico do instituidor. Pede, pois, a reforma da sentença, a fim de que a pensão por morte concedida tenha duração de apenas quatro meses (evento 124, APELAÇÃO1).

No evento 126, foi noticiado o óbito da parte autora, ocorrido em 01-05-2023 (evento 126, CERTOBT6), e requerida a habilitação de sua sucessora, Srª Alice Henzel de Goes.

No evento 137, foi deferida a habilitação da sucessora.

Com as contrarrazões (evento 135, CONTRAZ1), vieram os autos a esta Corte para julgamento.

É o relatório.

VOTO

Premissas

Trata-se de demanda previdenciária na qual a parte autora objetiva a concessão de PENSÃO POR MORTE, prevista no art. 74 da Lei nº 8.213/91, a qual depende do preenchimento dos seguintes requisitos: (a) a ocorrência do evento morte, (b) a demonstração da qualidade de segurado do de cujus e (c) a condição de dependente de quem objetiva o benefício, os quais passam a ser examinados a seguir.

Exame do caso concreto

Na presente ação, ajuizada em 02-06-2021, a autora, Rosa Eliane de Goes, postulou a CONCESSÃO de benefício de PENSÃO POR MORTE em razão do falecimento de Wanderlei Locks a contar da data do óbito (12-01-2021) ou, alternativamente, da data do requerimento administrativo (22-01-2021 - NB 198.904.690-5). Sustentou, em suma, que viveu em união estável com o falecido por mais de 15 anos, desde o início de 2006 até a data do falecimento.

A julgadora a quo acolheu o pedido, pelos seguintes fundamentos (evento 120, SENT1):

"(...)

A parte demandante alega que convivia em união estável com o(a) instituidor(a). Já a parte demandada defende que não há provas da suposta entidade familiar.

A união estável, levada à condição de entidade familiar pela Constituição de 1988 (art. 226), foi definida na Lei nº 9.278/1996, em seu art. 1º, como sendo a convivência duradoura, pública e contínua, de um homem e uma mulher, estabelecida com objetivo de constituir família.

Por sua vez, a Lei n. 8.213/1991, em seu art. 16, § 3º, considera dependente na condição de companheira ou companheiro a pessoa que, sem ser casada, mantém união estável com o segurado ou com a segurada, de acordo com o § 3º do art. 226 da Constituição Federal.

É o que se extrai do dispositivo legal:

§ 3º Considera-se companheira ou companheiro a pessoa que, sem ser casada, mantém união estável com o segurado ou com a segurada, de acordo com o § 3º do art. 226 da Constituição Federal.

É cediço que a união estável dispensa prova de natureza documental, admitindo-se todos os meios de prova a fim de provar o convívio do casal.

Outrossim, existindo a união estável, é dispensada a prova da dependência econômica, a qual é presumida nos termos da fundamentação supracitada (artigo 16, § 4º, da Lei 8.213/1991).

Nesse sentido, quanto à dispensa de início de prova material, extrai-se do TRF4:

PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE DE COMPANHEIRO. UNIÃO ESTÁVEL DEMONSTRADA. JUROS E CORREÇÃO. 1. Havendo início de prova material, o que não é requisito obrigatório para comprovação de união estável, e tendo a prova testemunhal sido clara ao afirmar que a demandante e o instituidor da pensão viviam como se marido e mulher fossem, inclusive na data do óbito, deve ser concedida pensão por morte. 2. O Supremo Tribunal Federal reconheceu no RE 870947, com repercussão geral, a inconstitucionalidade do uso da TR, sem modulação de efeitos. 3. O Superior Tribunal de Justiça, no REsp 1495146, em precedente também vinculante, e tendo presente a inconstitucionalidade da TR como fator de atualização monetária, distinguiu os créditos de natureza previdenciária, em relação aos quais, com base na legislação anterior, determinou a aplicação do INPC, daqueles de caráter administrativo, para os quais deverá ser utilizado o IPCA-E. 4. Os juros de mora, a contar da citação, devem incidir à taxa de 1% ao mês, até 29-6-2009. A partir de então, incidem uma única vez, até o efetivo pagamento do débito, segundo o percentual aplicado à caderneta de poupança. (TRF4, AC 5003482-69.2013.4.04.7111, SEXTA TURMA, Relatora TAÍS SCHILLING FERRAZ, juntado aos autos em 28-5-2020, grifei)

Nesse sentido, ressalta-se que, de acordo com firme entendimento, "a legislação previdenciária não faz qualquer restrição quanto à admissibilidade da prova testemunhal, para comprovação da união estável, com vista à obtenção de benefício previdenciário." (Súmula n. 104 do TRF4).

A fim de comprovar a união estável, a parte autora juntou os seguintes documentos:

a) Escritura Pública de União Estável registrada em 18-1-2021 (Evento 1, ESCRITURA9);

b) comprovantes de endereço (energia elétrica e de água) emitidos nas datas de 1-2021 e 1-2021 em nome do autor e da falecida, na qual consta, também, o endereço de ambos na Av. Frei Rogerio, n. 865, bairro São Francisco. Curitibanos/SC (Evento 1, END5 E Evento 1, OUT14);

c) suposta foto dos dois (Evento 1, FOTO11).

Ademais, ressalte-se que a comprovação da união estável pode ser feita unicamente por prova testemunhal, não se exigindo apresentação de prova material, sendo apenas um reforço no conjunto probatório.

A Turma Nacional de Unificação - TNU, sensibilizada com a dificuldade encontrada pelos conviventes para demonstrar a existência da união estável, principalmente quando não há filhos em comum em conjunto com a ausência de previsão legal, visto que a Lei 8.213/91 exige apresentação de início de prova material apenas para provar tempo de serviço, editou a súmula n° 63, vejamos: "Enunciado n. 63. A comprovação de união estável para efeito de concessão de pensão por morte prescinde de início de prova material".

Como se vê, há razoável indício de prova material do convívio em união estável com o(a) instituidor(a).

Nesse contexto, a prova oral assume importância fundamental. Por isso, por meio da(s) três testemunha(s) ouvidas em Juízo, NELSA APARECIDA RIBEIRO e LUCIANE NEVES, restou complementada a prova de que, na data do falecimento, o(a) segurado(a) instituidor(a) convivia em união estável com a parte autora.

Os relatos colhidos em audiência corroboraram a pretensão exposta na inicial, uma vez que as testemunhas ouvidas foram unânimes no sentido de que conheceram o(a) segurado(a) falecido(a) e que ele(a) e a parte autora conviviam em união estável há aproximadamente 15 anos, rompendo a relação apenas em decorrência do falecimento.

Dessas constatações averiguadas nas provas documental e oral, é possível concluir que a parte autora preenche os pressupostos necessários à concessão da pensão por morte, conforme dispõe os arts. 11 a 13, 16 e 74 a 79, ambos da Lei n. 8.213/91.

Nesse sentido:

PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. UNIÃO ESTÁVEL COMPROVADA. BENEFÍCIO CONCEDIDO. 1. A concessão do benefício de pensão por morte depende da ocorrência do evento morte, da demonstração da qualidade de segurado do de cujus e da condição de dependente de quem objetiva o benefício. 2. Comprovada união estável da autora com o segurado falecido, mediante suficiente prova material da convivência habitual e sob o mesmo teto, por longo tempo até a data do óbito, corroborada por prova testemunhal, é devido o benefício de pensão por morte. (TRF4, AC 5019499-22.2018.4.04.7107, SEXTA TURMA, Relatora TAÍS SCHILLING FERRAZ, juntado aos autos em 05/11/2020, grifou-se)

2.1. Da data de início do benefício

A data de início do benefício é a do óbito do(a) segurado(a), vez que a pensão por morte foi requerida antes de 90 dias da data do falecimento (Lei n. 8.213/1991, art. 74, inc. I). Assim, fica estabelecida desde 12-1-2021.

Impõe-se assim, o deferimento do benefício de pensão por morte, nos termos pleiteados na inicial, desde a data do óbito, conforme o artigo 74, I, da Lei 8.213/1991, então vigente, in verbis:

Art. 74. A pensão por morte será devida ao conjunto dos dependentes do segurado que falecer, aposentado ou não, a contar da data:

I - do óbito, quando requerida em até 180 (cento e oitenta) dias após o óbito, para os filhos menores de 16 (dezesseis) anos, ou em até 90 (noventa) dias após o óbito, para os demais dependentes;

II - do requerimento, quando requerida após o prazo previsto no inciso anterior;

III - da decisão judicial, no caso de morte presumida.

Importante ressaltar que, ausente prévio pedido administrativo, em causas em que a autarquia costuma rejeitá-lo, deve-se adotar supletivamente a data da citação válida.

2.2. Da renda mensal inicial

Nos termos do art. 75 da Lei n. 8.213/1991, o valor mensal da pensão por morte será de 100% (cem por cento) do valor da aposentadoria que a segurada recebia ou daquela a que teria direito se estivesse aposentada por invalidez na data de seu falecimento.

2.3. Da duração do benefício

Em relação ao período de vigência do benefício postulado no feito, prevê o art. 77 da Lei n. 8213/1991:

"Art. 77. A pensão por morte, havendo mais de um pensionista, será rateada entre todos em parte iguais.

§ 1º Reverterá em favor dos demais a parte daquele cujo direito à pensão cessar.

§ 2º O direito à percepção da cota individual cessará:

I - pela morte do pensionista;

II - para o filho, a pessoa a ele equiparada ou o irmão, de ambos os sexos, ao completar vinte e um anos de idade, salvo se for inválido ou tiver deficiência intelectual ou mental ou deficiência grave;

III - para filho ou irmão inválido, pela cessação da invalidez;

IV - pelo decurso do prazo de recebimento de pensão pelo cônjuge, companheiro ou companheira, nos termos do § 5º.

V - para cônjuge ou companheiro:

a) se inválido ou com deficiência, pela cessação da invalidez ou pelo afastamento da deficiência, respeitados os períodos mínimos decorrentes da aplicação das alíneas “b” e “c”;

b) em 4 (quatro) meses, se o óbito ocorrer sem que o segurado tenha vertido 18 (dezoito) contribuições mensais ou se o casamento ou a união estável tiverem sido iniciados em menos de 2 (dois) anos antes do óbito do segurado;

c) transcorridos os seguintes períodos, estabelecidos de acordo com a idade do beneficiário na data de óbito do segurado, se o óbito ocorrer depois de vertidas 18 (dezoito) contribuições mensais e pelo menos 2 (dois) anos após o início do casamento ou da união estável:

1) 3 (três) anos, com menos de 21 (vinte e um) anos de idade;

2) 6 (seis) anos, entre 21 (vinte e um) e 26 (vinte e seis) anos de idade;

3) 10 (dez) anos, entre 27 (vinte e sete) e 29 (vinte e nove) anos de idade;

4) 15 (quinze) anos, entre 30 (trinta) e 40 (quarenta) anos de idade;

5) 20 (vinte) anos, entre 41 (quarenta e um) e 43 (quarenta e três) anos de idade;

6) vitalícia, com 44 (quarenta e quatro) ou mais anos de idade.

VI - pela perda do direito, na forma do § 1º do art. 74 desta Lei.

[...]" (Grifei)

Nesse norte, o benefício será concedido de forma vitalícia, uma vez que a parte autora: a) tinha mais de 50 anos na data do óbito do(a) instituidor(a); b) convivia em união estável há mais de 2 anos e; c) apesar de não ser ponto controvertido, constata-se que a pessoa falecida verteu mais de 18 contribuições ao RGPS antes de seu falecimento.

Outrossim, "(...) o de cujus verteu mais de 18 contribuições ao RGPS. 3. Embora tais recolhimentos não tenham se dado no momento imediatamente anterior ao óbito, o direito ao seu cômputo se incorpora definitivamente ao patrimônio jurídico do segurado, ainda que haja posterior perda dessa qualidade. 4. Recurso provido. ( 5006233-59.2018.4.04.7206, SEGUNDA TURMA RECURSAL DE SC, Relator HENRIQUE LUIZ HARTMANN, julgado em 13/12/2019)"

Inconformado, apela o INSS, insurgindo-se tão-somente no tocante ao prazo de duração do benefício, que foi deferido de forma vitalícia..

Com efeito, alega o Instituto que a autora não conseguiu comprovar, por meio de início de prova material, que a união estável teve duração superior a 24 meses, devendo a pensão por morte ser deferida pelo prazo de apenas quatro meses.

A controvérsia restringe-se à comprovação do prazo de duração da união estável da autora com o de cujus até a data do óbito.

Em relação à condição de dependente da autora, vale destacar que, levada à condição de entidade familiar pela Constituição de 1988, a união estável foi definida na Lei nº 9.278/96, no seu art. 1º, como sendo a convivência duradoura, pública e contínua, de um homem e uma mulher, estabelecida com objetivo de constituir família. Por sua vez, a Lei nº 8.213/91, em seu art. 16, § 3º, considera dependente na condição de companheira ou companheiro a pessoa que, sem ser casada, mantém união estável com o segurado ou com a segurada, de acordo com o § 3º do art. 226 da Constituição Federal. Assim, tem-se que a dependência econômica do companheiro ou companheira é presumida na legislação (art. 16, inciso I e § 4º, da Lei n.º 8.213/91).

Ademais, detendo a união estável natureza eminentemente fática, exigir a sua comprovação documental seria o mesmo que inviabilizar a concessão do benefício previdenciário, prevalecendo na análise probatória o livre convencimento do julgador (TRF4, AC nº 2003.04.01.037793-2, Quinta Turma, relator Des. Federal Jorge Antônio Maurique, D.E. 14/02/2007).

Nesse sentido, veja-se o enunciado da Súmula 104 desta Corte:

"A legislação previdenciária não faz qualquer restrição quanto à admissibilidade da prova testemunhal, para comprovação da união estável, com vista à obtenção de benefício previdenciário."

No entanto, a Medida Provisória nº 871, de 18/01/2019, incluiu o § 5º ao art. 16 da Lei nº 8.213/91, passando assim a dispor:

§ 5º A prova de união estável e de dependência econômica exigem início de prova material contemporânea dos fatos, não admitida a prova exclusivamente testemunhal, exceto na ocorrência de motivo de força maior e ou caso fortuito, conforme disposto no Regulamento.

A referida Medida Provisória foi convertida na Lei nº 13.846, de 18/06/2019, a qual incluiu os parágrafos 5º e 6º do art. 16 da Lei de Benefícios, com a seguinte redação:

§ 5º As provas de união estável e de dependência econômica exigem início de prova material contemporânea dos fatos, produzido em período não superior a 24 (vinte e quatro) meses anterior à data do óbito ou do recolhimento à prisão do segurado, não admitida a prova exclusivamente testemunhal, exceto na ocorrência de motivo de força maior ou caso fortuito, conforme disposto no regulamento.

§ 6º Na hipótese da alínea c do inciso V do § 2º do art. 77 desta Lei, a par da exigência do § 5º deste artigo, deverá ser apresentado, ainda, início de prova material que comprove união estável por pelo menos 2 (dois) anos antes do óbito do segurado.

Assim sendo, como, na hipótese sub judice, o óbito do instituidor ocorreu após a vigência da lei acima referida, é necessário, para comprovar a alegada união estável, início de prova material contemporânea aos fatos.

Pois bem. Como início de prova material da união estável, a autora trouxe aos autos diversos documentos, dentre os quais destaco:

a) certidão de óbito de Wanderlei Locks, na qual consta que era divorciado de Ana Lúcia Bueno, residia na Av. Frei Rogério, 865, São Francisco, Curitibanos/SC, e faleceu no próprio domicílio em 12-01-2021, em virtude de "edema agudo do pulmão, desequilíbrio hidroeletrolítico, neoplasia maligna rim esquerdo" (evento 1, CERTOBT6);

b) fatura de água/esgoto relativa ao mês 01/2021 em nome da autora, relativa ao mesmo endereço declarado na certidão de óbito: Av. Frei Rogério, 865, São Francisco, Curitibanos/SC (evento 1, END5);

c) escritura pública declaratória feita pela autora em 18-01-2021, declarando que conviveu em união estável com Wanderlei Locks há aproximadamente 15 anos até a data do falecimento deste, de forma pública, contínua e duradoura (evento 1, ESCRITURA9);

d) diversos registros de deslocamento (roteiro) de veículos da Secretaria Municipal de Saúde até a casa do falecido (Av. Frei Rogério, 865) nos anos de 2018 (25-01, 05-02, 16-02, 22-02, 04-04, 08-05, 10-05, 17-05, 06-08, 09-08, 22-08, 27/08, 28-09, 12/12 e 17-12-2018), 2019 (16-01, 20-03, 24-04, 26-04, 30-04, 16-05, 23-05, 05-06, 07-06, 09-07 e 03-10-2019) e 2020 (15-01, 04-03 e 12-03-2020), nos quais consta o nome da autora como acompanhante de Wanderlei Locks (evento 1, COMP10);

e) fatura de energia elétrica relativa ao mês 01/2021 em nome do de cujus, relativa ao endereço da Av. Frei Rogério, 865, São Francisco, Curitibanos/SC (evento 1, OUT14).

Entendo que os documentos acima elencados são suficientes para configurar o início de prova material da união estável por período superior a dois anos, consoante exigido pela legislação.

Além disso, as duas testemunhas ouvidas em audiência confirmaram que a autora e o de cujus viveram juntos, como se casados fossem, por mais de dois anos até a data do óbito (a testemunha Neusa afirmou que viveram juntos por cerca de 15 anos; a testemunha Luciane afirmou que, quando conheceu a autora, há cerca de 5 anos, ela já vivia com seu marido Wanderlei); que a relação do casal era pública; que não tiveram filhos em comum; que o falecido tinha um filho de uma relação anterior, o qual, segundo a testemunha Neusa, vivia com o casal.

Portanto, da análise da prova produzida nos autos, entendo ter restado comprovado que a autora e o de cujus viveram em união estável por período superior a dois anos até a data do falecimento do instituidor (12-01-2021), razão pela qual deveria ser mantida a sentença, que condenou o INSS a conceder o benefício de PENSÃO POR MORTE à autora de forma vitalícia.

No entanto, tendo a autora falecido no curso do processo, são devidas as diferenças do benefício de pensão por morte compreendidas entre a data do óbito do instituidor (12-01-2021) e a data do óbito da autora (01-05-2023).

Dos consectários

Segundo o entendimento das Turmas previdenciárias do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, estes são os critérios aplicáveis aos consectários:

Correção monetária

A correção monetária incidirá a contar do vencimento de cada prestação e será calculada pelos índices oficiais e aceitos na jurisprudência, quais sejam:

- INPC no que se refere ao período posterior à vigência da Lei 11.430/2006, que incluiu o art. 41-A na Lei 8.213/91, conforme deliberação do STJ no julgamento do Tema 905 (REsp mº 1.495.146 - MG, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, D DE 02-03-2018), o qual resta inalterada após a conclusão do julgamento de todos os EDs opostos ao RE 870947 pelo Plenário do STF em 03-102019 (Tema 810 da repercussão geral), pois foi rejeitada a modulação dos efeitos da decisão de mérito.

Juros moratórios

Os juros de mora incidirão à razão de 1% (um por cento) ao mês, a contar da citação (Súmula 204 do STJ), até 29/06/2009.

A partir de 30/06/2009, incidirão segundo os índices oficiais de remuneração básica e juros aplicados à caderneta de poupança, conforme art. 5º da Lei 11.960/09, que deu nova redação ao art. 1º-F da Lei 9.494/97, cuja constitucionalidade foi reconhecida pelo STF ao julgar a 1ª tese do Tema 810 da repercussão geral (RE 870.947), julgado em 20/09/2017, com ata de julgamento publicada no DJe n. 216, de 22/09/2017.

SELIC

A partir de dezembro de 2021, a variação da SELIC passa a ser adotada no cálculo da atualização monetária e dos juros de mora, nos termos do art. 3º da Emenda Constitucional nº 113/2021:

"Nas discussões e nas condenações que envolvam a Fazenda Pública, independentemente de sua natureza e para fins de atualização monetária, de remuneração do capital e de compensação da mora, inclusive do precatório, haverá a incidência, uma única vez, até o efetivo pagamento, do índice da taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia (Selic), acumulado mensalmente."

Honorários advocatícios recursais

Incide, no caso, a sistemática de fixação de honorários advocatícios prevista no art. 85 do CPC, porquanto a sentença foi proferida após 18/03/2016 (data da vigência do CPC definida pelo Pleno do STJ em 02/04/2016).

Aplica-se, portanto, em razão da atuação do advogado da parte em sede de apelação, o comando do §11 do referido artigo, que determina a majoração dos honorários fixados anteriormente, pelo trabalho adicional realizado em grau recursal, observando, conforme o caso, o disposto no art. 85, parágrafos 2º a 6º e os limites estabelecidos nos parágrafos 2º e 3º desse dispositivo legal.

Confirmada a sentença no mérito, majoro a verba honorária, elevando-a de 10% para 15% (quinze por cento) sobre as parcelas vencidas (Súmula 111 do STJ), considerando as variáveis do do artigo 85 § 2º, incisos I a IV, do CPC.

Custas Processuais

O INSS é isento do pagamento de custas (art. 4º, inciso I, da Lei nº 9.289/96 e Lei Complementar Estadual nº 156/97, com a redação dada pelo art. 3º da LCE nº 729/2018).

Dispositivo

Ante o exposto, voto por negar provimento à apelação do INSS.



Documento eletrônico assinado por PAULO AFONSO BRUM VAZ, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40004221449v24 e do código CRC 3ab7c321.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): PAULO AFONSO BRUM VAZ
Data e Hora: 13/12/2023, às 20:25:24


5012109-79.2023.4.04.9999
40004221449.V24


Conferência de autenticidade emitida em 21/12/2023 08:01:38.

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5012109-79.2023.4.04.9999/SC

RELATOR: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

APELADO: ROSA ELIANE DE GOES

APELADO: ALICE HENZEL DE GOES

EMENTA

PREVIDENCIÁRIO. concessão de PENSÃO POR MORTE DE COMPANHEIRo. ÓBITO POSTERIOR À VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.846/2019 e da eMENDA CONSTITUCIONAL Nº 103/2019. INÍCIO DE PROVA MATERIAL DA UNIÃO ESTÁVEL por período superior a dois anos PRESENTE NOS AUTOS. mantida a concessão da pensão por morte de forma vitalícia até a data do óbito da autora.

1. Em relação à condição de dependente da companheira, vale destacar que, levada à condição de entidade familiar pela Constituição de 1988, a união estável foi definida na Lei nº 9.278/96, no seu art. 1º, como sendo a convivência duradoura, pública e contínua, de um homem e uma mulher, estabelecida com objetivo de constituir família. Por sua vez, a Lei nº 8.213/91, em seu art. 16, § 3º, considera dependente na condição de companheira ou companheiro a pessoa que, sem ser casada, mantém união estável com o segurado ou com a segurada, de acordo com o § 3º do art. 226 da Constituição Federal. Assim, tem-se que a dependência econômica do companheiro ou companheira é presumida na legislação (art. 16, inciso I e § 4º, da Lei n.º 8.213/91).

2. A Medida Provisória nº 871, de 18/01/2019, incluiu o § 5º ao art. 16 da Lei nº 8.213/91 ("§ 5º A prova de união estável e de dependência econômica exigem início de prova material contemporânea dos fatos, não admitida a prova exclusivamente testemunhal, exceto na ocorrência de motivo de força maior e ou caso fortuito, conforme disposto no Regulamento") e foi convertida na Lei nº 13.846, de 18/06/2019, a qual incluiu os parágrafos 5º e 6º do art. 16 da Lei de Benefícios, com a seguinte redação: § 5º As provas de união estável e de dependência econômica exigem início de prova material contemporânea dos fatos, produzido em período não superior a 24 (vinte e quatro) meses anterior à data do óbito ou do recolhimento à prisão do segurado, não admitida a prova exclusivamente testemunhal, exceto na ocorrência de motivo de força maior ou caso fortuito, conforme disposto no regulamento. § 6º Na hipótese da alínea c do inciso V do § 2º do art. 77 desta Lei, a par da exigência do § 5º deste artigo, deverá ser apresentado, ainda, início de prova material que comprove união estável por pelo menos 2 (dois) anos antes do óbito do segurado.

3. Tendo o óbito do instituidor ocorrido após a vigência da Lei nº 13.846/2019, é necessário, para comprovar a alegada união estável, início de prova material contemporânea aos fatos.

4. Tendo restado comprovada, por início de prova material e por prova testemunhal, a união estável havida entre a autora e o de cujus até a data do óbito, por período superior a dois anos, são devidas as diferenças do benefício de pensão por morte compreendidas entre a data do óbito do instituidor e a data do óbito da autora.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 9ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, negar provimento à apelação do INSS, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Florianópolis, 12 de dezembro de 2023.



Documento eletrônico assinado por PAULO AFONSO BRUM VAZ, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40004221450v5 e do código CRC 252a6962.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): PAULO AFONSO BRUM VAZ
Data e Hora: 13/12/2023, às 19:10:21


5012109-79.2023.4.04.9999
40004221450 .V5


Conferência de autenticidade emitida em 21/12/2023 08:01:38.

Poder Judiciário
Tribunal Regional Federal da 4ª Região

EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 04/12/2023 A 12/12/2023

Apelação Cível Nº 5012109-79.2023.4.04.9999/SC

RELATOR: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ

PRESIDENTE: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ

PROCURADOR(A): MAURICIO PESSUTTO

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

APELADO: ROSA ELIANE DE GOES

ADVOGADO(A): HENRIELLY RIBEIRO DE SOUZA (OAB SC062206)

ADVOGADO(A): FABRICIO ULLIRSCH (OAB SC029692)

APELADO: ALICE HENZEL DE GOES

ADVOGADO(A): CEZAR JOSÉ SCARAVELLI JUNIOR (OAB SC025935)

ADVOGADO(A): FABRICIO ULLIRSCH (OAB SC029692)

ADVOGADO(A): HENRIELLY RIBEIRO DE SOUZA (OAB SC062206)

Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 04/12/2023, às 00:00, a 12/12/2023, às 16:00, na sequência 385, disponibilizada no DE de 23/11/2023.

Certifico que a 9ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:

A 9ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO DO INSS.

RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ

Votante: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ

Votante: Juíza Federal GABRIELA PIETSCH SERAFIN

Votante: Desembargador Federal SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ

ALEXSANDRA FERNANDES DE MACEDO

Secretária



Conferência de autenticidade emitida em 21/12/2023 08:01:38.

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