APELAÇÃO CÍVEL Nº 5030057-44.2017.4.04.9999/RS
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RELATOR |
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ARTUR CÉSAR DE SOUZA |
APELANTE | : | HILDA MARIA HANAUER |
ADVOGADO | : | SOLANGE RAQUEL HAACK DE CASTRO |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. CONCESSÃO DE PENSÃO POR MORTE DE CÔNJUGE TITULAR DE BENEFÍCIO ASSITENCIAL. LEGITIMIDADE ATIVA. CONJUNTO PROBATÓRIO SUFICIENTE. BENEFÍCIO DEVIDO. CONSECTÁRIOS.
1. Para a obtenção do benefício de pensão por morte deve a parte interessada preencher os requisitos estabelecidos na legislação previdenciária vigente à data do óbito, consoante iterativa jurisprudência dos Tribunais Superiores e TRF 4.
2. Não há ilegitimidade da dependente postulante à pensão para o pedido de modificação da espécie do benefício recebido pelo segurado falecido, ainda mais que tal alteração reflete em obtenção de direito próprio.
3. Tendo sido demonstrada a qualidade de segurado(a) do(a) falecido(a) ao tempo do óbito, tem a(o) autor(a), na condição de esposo(a), o direito ao recebimento do benefício de pensão por morte.
4. O benefício assistencial é de caráter pessoal, sendo incompatível a sua transmissão "causa mortis" na forma de pensão a dependentes e/ou sucessores do beneficiário; entretanto, os Tribunais vêm admitindo a concessão do benefício de pensão por morte quando a parte interessada comprova que o Instituto Previdenciário incorreu em equívoco ao conceder um benefício de natureza assistencial, quando o de cujus fazia jus a um auxílio-doença ou a uma aposentadoria por invalidez ou, ainda, outro benefício previdenciário. In casu, restou comprovado que o falecido, companheiro da parte autora, fazia jus a uma auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez, acaso caracterizada enfermidade do de cujus, a qual confere à demandante o direito ao benefício de pensão por morte postulado.
5. O Supremo Tribunal Federal reconheceu no RE 870947, com repercussão geral, a inconstitucionalidade do uso da TR, determinando a adoção do IPCA-E para o cálculo da correção monetária nas dívidas não-tributárias da Fazenda Pública.
6. Os juros de mora, a contar da citação, devem incidir à taxa de 1% ao mês, até 29-06-2009. A partir de então, incidem uma única vez, até o efetivo pagamento do débito, segundo o índice oficial de remuneração básica aplicado à caderneta de poupança.
7. Precedente do Supremo Tribunal Federal com efeito vinculante, que deve ser observado, inclusive, pelos órgãos do Poder Judiciário.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 6ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, dar provimento à apelação da parte autora, e determinar o imediato cumprimento do acórdão, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 06 de dezembro de 2017.
Juiz Federal Artur César de Souza
Relator
| Documento eletrônico assinado por Juiz Federal Artur César de Souza, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 9230958v8 e, se solicitado, do código CRC 73DA9569. | |
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| Signatário (a): | Artur César de Souza |
| Data e Hora: | 11/12/2017 20:11 |
APELAÇÃO CÍVEL Nº 5030057-44.2017.4.04.9999/RS
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RELATOR |
: |
ARTUR CÉSAR DE SOUZA |
APELANTE | : | HILDA MARIA HANAUER |
ADVOGADO | : | SOLANGE RAQUEL HAACK DE CASTRO |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
RELATÓRIO
Trata-se de apelação da parte autora contra sentença (prolatada em 20/03/2017 na vigência do NCPC) que julgou improcedente o pedido de pensão por morte, cujo dispositivo reproduzo a seguir:
Ante o exposto, JULGO IMPROCEDENTE o pedido formulado por HILDA MARIA HANAUER, em desfavor do INSS, com apreciação do mérito, o que faço com fulcro no artigo 487, I, do Código de Processo Civil.
Condeno a parte autora ao pagamento das custas e despesas processuais e de honorários advocatícios ao procurador da ré, que fixo em R$ 937,00 (novecentos e trinta e sete reais), atenta ao efetivo labor profissional, nos termos do art. 85, §§§ 2º, 8º, e 14º, do CPC, valor a ser atualizado pelo INPC a contar da sentença até o efetivo pagamento.
Suspensa a exigibilidade das referidas verbas com base no disposto no art. 98, §§ 2º e 3º, do CPC, em razão do benefício da gratuidade judiciária concedido.
Sustentou que a autarquia previdenciária concedeu ao marido da apelante um amparo previdenciário por invalidez, quando o mesmo fazia jus ao benefício de aposentadoria por invalidez rural, pois que sempre foi trabalhador rural.
Ademais, alegou as provas produzidas, tanto documentais como testemunhais, deixaram claro que o de cujus possuía qualidade de segurado em 01/12/1976, data em que passou a receber o benefício assistencial, concedido pelo INSS.
Sem as contrarrazões, vieram os autos a esta Corte para julgamento.
É o relatório.
VOTO
Juízo de admissibilidade
O apelo preenche os requisitos legais de admissibilidade.
Decadência
A autora deseja a revisão da concessão do benefício concedido pelo INSS, tendo em vista que ao instituidor do benefício foi concedido Amparo Previdenciário por Invalidez - Trabalhador Rural NB 091.771.109-2, mas que na verdade deveria ter sido concedido uma aposentadoria por invalidez como rurícola, para então ter direito à pensão por morte decorrente do falecimento de seu marido.
A propositura da ação judicial ocorreu em 30/03/2016 (evento 3, CAPA1, p.1).
Ora, no caso concreto não se trata de revisão de prestação previdenciária, mas sim de obtenção de benefício, em princípio, indeferido pelo INSS.
Assim, quando se trata de rever o próprio indeferimento administrativo do benefício, inexiste decadência do direito à sua obtenção.
A 3ª Seção do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4) uniformizou entendimento das Turmas Previdenciárias de que não há decadência do direito de revisar o ato de indeferimento do benefício, caso concreto, seguindo orientação do STF no julgamento do RE 626.489, de 16-10-2013:
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO INDEFERIDO NA VIA ADMINISTRATIVA. DECADÊNCIA. ART. 103, CAPUT, DA LEI 8.213/91. INEXISTÊNCIA. "Inexiste prazo decadencial para a concessão inicial do benefício previdenciário". (Repercussão Geral no Recurso Extraordinário n. 626.489, julgado pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal em 16-10-2013). (TRF4, EINF 5004349-85.2010.404.7105, Terceira Seção, Relator p/ Acórdão Celso Kipper, D.E. 05/12/2013).
Afasta-se, pois, a decadência.
Da prescrição
Em se tratando de obrigação de trato sucessivo e de verba alimentar, não há falar em prescrição do fundo de direito. Contudo, são atingidas pela prescrição as parcelas vencidas antes do quinquênio anterior à propositura da ação, conforme os termos do parágrafo único do art. 103 da Lei nº 8.213/91 e da Súmula 85/STJ.
No caso em tela, considerando que a ação foi ajuizada em 30/03/2016 (evento 3, CAPA1, p.1), encontram-se prescritas eventuais parcelas a receber pela demandante, anteriores ao período de 30/03/2011.
Objeto da ação
A presente ação se limita a concessão do benefício de pensão por morte em decorrência do falecimento de Pedro Otto Hanauer, ocorrido em 05/01/1993. Para fins de clareza, transcrevo excerto do relatório da sentença (evento 3, SENT10):
HILDA MARIA HANAUER ajuizou ação previdenciária contra o INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL, ambos qualificados nos autos, alegando, em síntese, que em 26 de novembro de 2015, ingressou com pedido de pensão por morte, que restou indeferido sob alegação de que o de cujus era beneficiário de um amparo previdenciário por invalidez.
Mencionou legislação vigente à época do falecimento e posterior. Requereu, com base nisso, a procedência da demanda, com a condenação do réu a implantar o benefício de pensão por morte, inclusive liminarmente, bem como a pagar as parcelas vencidas desde o óbito, acrescidas de juros e correção monetária. Postulou, ainda, o deferimento da gratuidade judiciária. Juntou documentos (fls. 12/109).
Deferida a gratuidade judiciária; determinada a realização de justificação administrativa; postergada a análise da tutela antecipada (fls. 110/111).
Juntada a justificação administrativa (fls. 114/119).
Na sequência, a autora reiterou o pedido de tutela antecipada (fls. 121/124), cujo exame foi relegado para momento posterior à resposta do réu.
Contestou o INSS, arguindo, inicialmente, a ocorrência da prescrição. Alegou, em suma, que inexiste previsão legal para pensão decorrente de benefício assistencial (LOAS) e que não foi comprovada a qualidade de segurado do de cujus. Afirmou, desse modo, que não se encontram preenchidos os requisitos necessários à concessão da pensão por morte, pugnando pela improcedência do pleito (fls. 127/135).
Pensão por morte
Para a obtenção do benefício de pensão por morte deve a parte interessada preencher os requisitos estabelecidos na legislação previdenciária vigente à data do óbito, consoante iterativa jurisprudência dos Tribunais Superiores e desta Corte.
À época, quando do falecimento de PEDRO OTTO HANAUER, ocorrido em 05/01/1993, a legislação aplicável à espécie - Lei 8.213, de 24 de julho de 1991 (Plano de Benefícios da Previdência Social) - apresentava a sua redação original:
Art.74 - A pensão por morte será devida ao conjunto dos dependentes do segurado que vier a falecer aposentado ou não, a contar da data do óbito ou da decisão judicial, no caso de morte presumida.
São, portanto, três os requisitos para a concessão do benefício de pensão por morte previdenciária:
a) o óbito (ou morte presumida);
b) a qualidade de segurada da pessoa falecida;
c) a existência de dependentes, na forma prevista no artigo 16, da Lei n. 8.213/1991.
O evento morte está comprovado pela certidão de óbito (evento 3, ANEXOS PET4, p.7).
Não há discussão quanto à qualidade de dependente de Hilda Maria Schwendler, porquanto esposa do falecido, comprovado pela certidão de casamento (eventos 3, ANEXOS PET4, p.8).
A dependência econômica da esposa é presumida por força e lei (art. 16, inc. I, § 4º, da Lei 8.213/1991):
Art. 16. São beneficiários do Regime Geral de Previdência Social, na condição de dependentes do segurado:
I - o cônjuge, a companheira, o companheiro e o filho não emancipado, de qualquer condição, menor de 21 (vinte e um) anos ou inválido ou que tenha deficiência intelectual ou mental que o torne absoluta ou relativamente incapaz", assim declarado judicialmente;
[...]
§ 4o A dependência econômica das pessoas indicadas no inciso I é presumida e a das demais deve ser comprovada.
A controvérsia do caso em apreço cinge-se à condição de segurado de PEDRO OTTO HANAUER na época do óbito, alegado trabalhador rural em regime de economia familiar titular de Amparo Previdenciário por Invalidez - Trabalhador Rural NB 091.771.109-2.
No caso concreto, foram acostados os seguintes documentos:
a) Certidão de óbito de Pedro Otto Hanauer, ocorrido em 05/01/1993, qualificado como "aposentado" (evento 3, ANEXOS PET4, p.7);
b) Certidão de casamento de Pedro Otto Hanauer e Hilda Maria Schwendler, ocorrido em 22/09/1956, na qual o de cujus está qualificado como "agricultor", averbada em 05/04/2010 (evento 3, ANEXOS PET4, p.8);
c) Certidão de nascimento de Flavia Ágata Hanauer, ocorrido em 06/02/1960, filha do casal, na qual o de cujus está qualificado como "agricultor", lavrada em 20/02/1960 (evento 3, ANEXOS PET4, p.13);
d) Certidão de nascimento de Lidia Ortulana Hanauer, ocorrido em 15/02/1962, filha do casal, na qual o de cujus está qualificado como "agricultor", lavrada em 27/02/1962 (evento 3, ANEXOS PET4, p.17);
e) Certidão de nascimento de Lucinda Apolônia Hanauer, ocorrido em 16/09/1964, filha do casal, na qual o de cujus está qualificado como "agricultor", lavrada em 14/10/1964 (evento 3, ANEXOS PET4, p.18);
f) Certidão de nascimento de Plínio Augustinho Schwendler Hanauer, ocorrido em 22/02/1967, filho do casal, na qual o de cujus está qualificado como "agricultor", lavrada em 17/06/1968 (evento 3, ANEXOS PET4, p.19);
g) Ficha de inscrição no Sindicato dos trabalhadores Rurais de Crissiumal/RS em nome de Pedro Otto Hanauer com registros de contribuição até o ano de 1969 (evento 3, ANEXOS PET4, p.20);
h) Certidão de nascimento de Maria Dionísia Schwendler Hanauer, ocorrido em 07/06/1969, filha do casal, na qual o de cujus está qualificado como "agricultor", lavrada em 16/07/1975 (evento 3, ANEXOS PET4, p.21);
i) Certidão expedida pelo INCRA, expedida em 27/07/2006, acusando a existência imóvel rural em Crissiumal/RS em nome do de cujus (evento 3, ANEXOS PET4, p. 23);
j) Notas fiscais referente à comercialização de produto agrícola, referente ao período de 1973 a 1978, em nome do de cujus (evento 3, ANEXOS pp.24/30);
k) Ficha de inscrição no Sindicato dos trabalhadores Rurais de Crissiumal/RS em nome de Flávia Ágata Hanauer, na qual está qualificada como "agricultora", filiação do associado Pedro Otto Hanauer (evento 3, ANEXOS PET4, p.43);
l) Declaração de exercício de atividade rural, em nome do de cujus, referente ao período de 1956 a 1975, atividade agricultura, firmado pelo Pedro Otto Hanauer (evento 3, ANEXOS PET4, p. 50);
m) Ficha de entrevista junto ao FUNRURAL, em nome do de cujus, na qual consta a data de nascimento 27/07/1928, realizada em 16/08/1976 (evento 3, ANEXOS PET4, p. 53);
n) Atestado de incapacidade total e definitiva, expedido pelo Funrural, em 26/04/1977, que concluiu que Pedro Otto Hanauer estava total e definitivamente incapacitado para o trabalho (evento 3, ANEXOS PET4, p.54);
o) Pesquisa Plenus em nome de Pedro Otto Hanauer na qual é possível constatar que o falecido era titular de Amparo Previdenciário por Invalidez - Trabalhador Rural NB 091.771.109-2, DIB 01/12/1976 (evento 3, ANEXOS PET4, p.74).
Foi realizada justificação administrativa em 08/06/2016, oportunidade na qual foram ouvidas duas testemunhas (evento 3, PET6, p.4):
Depoimento da testemunha Ilga Armanda Mallmann Leichtweis, trabalhadora rural aposentada, com 85 anos de idade, apresentou o relato que segue:
Que conheceu a justificante (Hilda) e o falecido esposo há mais de sessenta anos. Este conhecimento se deu porque a testemunha na época foi residir na localidade de Lajeado Magro, interior do município de Crissiumal, RS, onde ali já residia o de cujus Pedro Otto Hanauer e a Justificante Hilda Maria Hanauer, e já na época tinham oito filhos, sendo dois filhos homens e seis filhas mulheres, que eram proprietários de uma área de aproximadamente umas 11,5 hectares de terras, sendo a testemunha vizinha distante em linha reta uns 1800 metros dessa propriedade. Que juntamente com o de cujus trabalhava a Justificante, ambos em regime de economia familiar, sem empregados, peões e ou terceiros, embora na época todo o trabalho fosse executado manualmente, onde usavam arado de bois, plantadeiras PEC-pec, enxada, foice, roçadeira e outros implementos agrícolas manuais. Que somente o grupo familiar eram quem executava a limpa, preparo, plantio e colheita de milho, feijão, soja, trigo, mandioca, batata doce, batatinha inglesa, produtos de horta, criavam porcos de engorde e galinhas poedeiras, assim como possuíam animais, como bois, vacas de leite e outros semoventes. Que parte da produção era para consumo do grupo familiar e as sobras comercializadas em comércios locais e outros. Que não arrendavam terras de terceiros, e nem arrendavam terras para terceiros, trabalham na área total de terras do falecido OTTO. A testemunha tem conhecimento que a Justificante e o de cujus permaneceram trabalhando na agricultura até o ano de mil novecentos e setenta e oito, pois lembra a testemunha o falecido Otto havia se aposentado há uns dois anos, quando venderam a propriedade e todo o grupo familiar veio residir na cidade. Nada mais.
O depoimento da testemunha Natalia Schmitt, trabalhadora rural aposentada, com 72 anos de idade, apresentou o relato que segue:
Que conheceu ambos há mais de sessenta anos. Este conhecimento se deu porque o "de cujus" PEDRO OTTO HANAEUR e a JÍUSTIFICANTE eram agricultores e proprietários de uma área de aproximadamente umas 11,5 hectares de terras localizadas em Lajeado Magro interior do município de Crissiumal, RS, onde a testemunha na época residia. Que junto com o falecido trabalhava a JUSTIFICANTE e já na época oito filhos, seis filhas mulheres e dois filhos homens. Que todo o grupo familiar vivia exclusivamente da agricultura, e não tinham outra fonte de renda, pois dela tiravam para o sustento familiar, sendo o excedente de produção comercializado em comércios locais e outros. Que cultivavam produtos tais como: milho, feijão, soja, mandioca, trigo, batata doce, batatinha inglesa, produtos de horta, criavam porcos e galinhas assim como possuíam animais como bois, vacas de leite e outros semoventes. Que trabalhavam na forma manual onde usavam a força braçal e a tração animal, e mesmo assim não contratavam mão de obra de terceiros, nem tinham peões e ou empregados. A testemunha diz ter conhecimento que seu Otto vendeu essa propriedade logo após ter se aposentado, há aproximadamente uns quarenta anos. Que todo o grupo familiar passou a residir na cidade. A testemunha diz também que desde que conheceu tanto a JUSTIFICANTE, quanto o falecido esposo PEDRO OTTO HANAUER, estes sempre trabalharam como agricultores, e que inclusive tiveram a ajuda dos filhos, sendo esta a única fonte de sustento da família, onde a produção era para o sustento do grupo familiar, sendo as sobras de produção comercializados em comércio local e outros. Nada mais
CONCLUSÃO: Que as testemunhas foram identificadas por mim. Que as testemunhas AFIRMARAM com certeza que o "de cujus", EXERCEU A ATIVIDADE DE TRABALHADOR(a), RURAL, EM REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR, SEM A AJUDA DE EMPREGADOS, PEÕES E OU TERCEIROS, NOS PERÍODOS ACIMA CITADOS. HOMOLOGO quanto a FORMA, a presente JA, uma vez que foi processada regularmente. Não foram apresentados novos elementos. Que não foram detectados no sistema outros elementos que comprovassem ao contrário do alegado pelas testemunhas. Esta é a CONCLUSÃO do processante designado.
O tempo de serviço rural pode ser comprovado mediante a produção de prova material suficiente, ainda que inicial, complementada por prova testemunhal idônea - quando necessária ao preenchimento de eventuais lacunas - não sendo esta admitida exclusivamente, a teor do art. 55, § 3º, da Lei n. 8.213/1991, e Súmula 149 do Superior Tribunal de Justiça - STJ.
Embora o art. 106 da Lei de Benefícios relacione os documentos aptos a essa comprovação, tal rol não é exaustivo, sendo certa a possibilidade de alternância das provas ali referidas.
Não se exige prova plena da atividade rural de todo o período correspondente à carência, de forma a inviabilizar a pretensão, mas um início de documentação que, juntamente com a prova oral, possibilite um juízo de valor seguro acerca dos fatos que se pretende comprovar.
As certidões de casamento, nascimento e óbito nas quais o instituidor do benefício está qualificado "agricultor", tornam-se hábeis a configurar início de prova material acerca da atividade rural desenvolvida pela pessoa falecida até a data do óbito.
A propósito, precedente do Superior Tribunal de Justiça (STJ):
PREVIDENCIÁRIO.APOSENTADORIA RURAL POR IDADE. CERTIDÃO DE CASAMENTO NA QUAL CONSTA A QUALIFICAÇÃO DO CÔNJUGE COMO AGRICULTOR OU RURAL. EXTENSÃO À ESPOSA, DESDE QUE VENHA ACOMPANHADO DE PROVA TESTEMUNHAL IDÔNEA. FALECIMENTO DO MARIDO, SEPARAÇÃO JUDICIAL OU DE FATO NÃO CONDUZEM À EXTEMPORANEIDADE DO DOCUMENTO PÚBLICO.
1. A certidão de casamento na qual consta a qualificação do marido como agricultor ou rural é documento público hábil a comprovar o início de prova material do trabalho da esposa nomeio agrícola, entretanto deve vir acompanhado de idônea prova testemunhal como observado pelo acórdão a quo. 2. A ocorrência do falecimento do marido, a separação judicial ou de fato do casal, em momento até mesmo anterior ao implemento da idade para o gozo do benefício, não são eventos aptos a gerar a extemporaneidade ou a desnaturar a validade e a eficácia da certidão de casamento, desde que a prova testemunhal produzida ateste a continuidade do labor da mulher nas lides rurais. Nesse sentido: "Ainda que a certidão pública nas condições acima seja a única prova material e não haja prova documental do labor rural após o óbito do cônjuge qualificado como trabalhador rural, está caracterizada a qualidade de segurado especial se a continuidade do labor agrícola for atestada por robusta prova testemunhal (AgRg no AREsp100.566/MG, Rel. Min. Herman Benjamin, Segunda Turma, Dje 24/04/2012)". A propósito, confiram-se: AgRg no AREsp 105.451/MG, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, Primeira Turma, DJe 20/03/2014; e AgRg no Ag 1.424.675/MT, Rel. Min. Og Fernandes, Sexta Turma, Dje 04/10/2012. 3. Agravo regimental não provido.
(AgRg no AREsp 119028 / MT,Re. Ministro BENEDITO GONÇALVES, PRIMEIRA TURMA, DJe 15/04/2014)
E da jurisprudência do Tribunal Regional Federal da 4ª Região:
PREVIDENCIÁRIO.SALÁRIO-MATERNIDADE. TRABALHADORA RURAL BÓIA-FRIA. CERTIDÃO DE NASCIMENTO.DOCUMENTO COMPROBATÓRIO HÁBIL. REQUISITOS LEGAIS DEMONSTRADOS. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. MAJORAÇÃO. 1. As certidões da vida civil são hábeis a constituir início probatório da atividade rural, nos termos na jurisprudência pacífica do Egrégio STJ. 2. Demonstrada a maternidade e a qualidade de trabalhadora rural boia-fria,mediante início razoável de prova documental, corroborada pela prova testemunhal, durante período equivalente ao da carência, é devido o salário-maternidade. 3. Em ações de salário-maternidade, o valor da condenação de apenas quatro salários mínimos exige ponderação para montante maior que o usual 10%, sob pena de aviltamento do trabalho técnico do patrono da parte autora. (TRF4, APELAÇÃO CÍVEL Nº 0007858-84.2015.404.9999, 6ª TURMA, Des.Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA, POR UNANIMIDADE, D.E. 29/07/2015, PUBLICAÇÃO EM 30/07/2015)
Ademais, os depoimentos prestados pelas testemunhas na justificação administrativa convergem no mesmo sentido, que efetivamente conheciam o falecido há muitos anos e que o mesmo sempre trabalhou na agricultura até o momento em que passou a receber o amparo.
Sem embargo, a hipótese de vocação rurícola do casal é lastreada nas certidões e nas notas fiscais de comercialização de produtos agrícolas (evento 3, ANEXOS pp.24/30) e na própira conclusão da justificação administrativa (evento 3, PET6, p.4).
No mais, os elementos instrutórios do feito dão conta de que o falecido se dedicou à lida campesina seguramente até a concessão do amparo.
Evidenciada a condição de trabalhador rurícola do falecido, resta avaliar o eventual equívoco, ou não na concessão do amparo.
No que se refere ao fato do falecido estar recebendo benefício de prestação continuada, é de se acrescentar que a jurisprudência vem admitindo a concessão do benefício de pensão por morte quando a parte interessada comprova que o Instituto Previdenciário incorreu em equívoco ao conceder um benefício de natureza assistencial, quando o de cujus fazia jus a um auxílio-doença ou a uma aposentadoria por invalidez ou, ainda, a uma aposentadoria por idade.
Dessarte, restou incontroversa a existência de inaptidão laborativa da de cujus, reconhecida no Atestado de incapacidade total e definitiva, expedido pelo Funrural, em 26/04/1977, que concluiu que Pedro Otto Hanauer estava total e definitivamente incapacitado para o trabalho (evento 3, ANEXOS PET4, p.54), e quando da concessão do benefício Amparo Previdenciário por Invalidez - Trabalhador Rural NB 091.771.109-2, DIB 01/12/1976 (evento 3, ANEXOS PET4, p.74).
Ora, comprovado que PEDRO OTTO HANAUER era vinculado ao RGPS, na condição de trabalhador rural, e que se encontrava inapto ao trabalho à época da concessão do benefício de prestação continuada, resta evidenciado o equívoco cometido pela autarquia previdenciária quando lhe concedeu o amparo, pois na realidade teria direito ao benefício de auxílio-doença/aposentadoria por invalidez, o que lhe garantiria a condição de segurado especial da previdência social até o óbito.
Assim, reconhecida a qualidade de segurado especial do falecido na condição trabalhador rural em regime de economia familiar ao tempo do óbito, deve ser reformada a sentença para julgar procedentes os pedidos da autora.
Termo inicial
Consigno que a situação fática estava sob a regência normativa do artigo 74 Lei 8.213/91, em sua redação original, desde o óbito. Assim, o benefício é devido desde o óbito em 05/01/1993.
No entanto, considerando que a ação foi ajuizada em 30/03/2016 (evento 3, CAPA1, p.1), encontram-se prescritas as parcelas anteriores ao período de 30/03/2011.
Como a parte autora logrou êxito em parte dos pedidos, invertem-se os ônus da sucumbência, nos termos do art. 86, parágrafo único, do novo Código de Processo Civil (CPC), para condenar a requerida ao pagamento de custas e honorários advocatícios, como segue.
Correção monetária
A correção monetária, segundo o entendimento consolidado da 3ª Seção deste Tribunal, incidirá a contar do vencimento de cada prestação e será calculada pelos seguintes índices oficiais:
- IGP-DI de 05/96 a 03/2006, de acordo com o art. 10 da Lei n. 9.711/98, combinado com o art. 20, §§5º e 6º, da Lei n. 8.880/94;
- INPC de 04/2006 a 29/06/2009, conforme o art. 31 da Lei n. 10.741/03, combinado com a Lei n. 11.430/06, precedida da MP n. 316, de 11/08/2006, que acrescentou o art. 41-A à Lei n. 8.213/91;
- IPCA-E a partir de 30/06/2009.
A incidência da TR como índice de correção monetária dos débitos judiciais da Fazenda Pública foi afastada pelo STF, no julgamento do RE 870947, com repercussão geral, tendo-se determinado a utilização do IPCA-E, como já havia sido determinado para o período subsequente à inscrição em precatório, por meio das ADIs 4.357 e 4.425.
Juros de mora
Os juros de mora devem incidir a partir da citação.
Até 29-06-2009, os juros de mora devem incidir à taxa de 1% ao mês, com base no art. 3º do Decreto-Lei n. 2.322/87, aplicável analogicamente aos benefícios pagos com atraso, tendo em vista o seu caráter eminentemente alimentar, consoante firme entendimento consagrado na jurisprudência do STJ e na Súmula 75 desta Corte.
A partir de então, deve haver incidência dos juros, uma única vez, até o efetivo pagamento do débito, segundo o índice oficial de remuneração básica aplicado à caderneta de poupança, nos termos estabelecidos no art. 1º-F, da Lei 9.494/97, na redação da Lei 11.960/2009, considerado hígido pelo STF no RE 870947, com repercussão geral reconhecida. Os juros devem ser calculados sem capitalização, tendo em vista que o dispositivo determina que os índices devem ser aplicados "uma única vez" e porque a capitalização, no direito brasileiro, pressupõe expressa autorização legal (STJ, 5ª Turma, AgRgnoAgRg no Ag 1211604/SP, Rel. Min. Laurita Vaz).
Honorários Advocatícios
Incide, no caso, a sistemática de fixação de honorários advocatícios prevista no art. 85 do NCPC, porquanto a sentença foi proferida após 18/03/2016 (data da vigência do NCPC definida pelo Pleno do STJ em 02/04/2016).
Invertidos os ônus sucumbenciais, estabeleço a verba honorária em 10% (dez por cento) sobre as parcelas vencidas até a data do presente julgado, considerando as variáveis dos incisos I a IV do § 2º do artigo 85 do NCPC.
Custas e despesas processuais
O INSS é isento do pagamento das custas processuais quando demandado na Justiça Estadual do Rio Grande do Sul, devendo, contudo, pagar eventuais despesas processuais, como as relacionadas a correio, publicação de editais e condução de oficiais de justiça (artigo 11 da Lei Estadual nº 8.121/85, com a redação da Lei Estadual nº 13.471/2010, já considerada a inconstitucionalidade formal reconhecida na ADI nº 70038755864 julgada pelo Órgão Especial do TJ/RS).
Cumprimento imediato do julgado (tutela específica)
Considerando a eficácia mandamental dos provimentos fundados no art. 497 do novo CPC, que repete dispositivo constante do art. 461 do antigo CPC, e tendo em vista que a presente decisão não está sujeita, em princípio, a recurso com efeito suspensivo (TRF4, 3ª Seção, Questão de Ordem na AC n. 2002.71.00.050349-7/RS, Rel. para o acórdão Des. Federal Celso Kipper, julgado em 09/08/2007), determino o cumprimento imediato do acórdão, a ser efetivado em 45 dias, mormente pelo seu caráter alimentar e necessidade de efetivação imediata dos direitos sociais fundamentais.
Prequestionamento
O prequestionamento da matéria segue a sistemática prevista no art. 1.025 do CPC/2015.
Conclusão
Dado provimento à apelação da autora, adequando consectários à orientação do STF no RE 870947.
Dispositivo
Ante o exposto, voto por dar provimento à apelação da parte autora, e determinar o imediato cumprimento do acórdão.
Juiz Federal Artur César de Souza
Relator
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 06/12/2017
APELAÇÃO CÍVEL Nº 5030057-44.2017.4.04.9999/RS
ORIGEM: RS 00018548020168210075
RELATOR | : | Juiz Federal ARTUR CÉSAR DE SOUZA |
PRESIDENTE | : | Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA |
PROCURADOR | : | Dr. Carlos Eduardo Copetti Leite |
APELANTE | : | HILDA MARIA HANAUER |
ADVOGADO | : | SOLANGE RAQUEL HAACK DE CASTRO |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 06/12/2017, na seqüência 882, disponibilizada no DE de 20/11/2017, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, a DEFENSORIA PÚBLICA e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 6ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU DAR PROVIMENTO À APELAÇÃO DA PARTE AUTORA, E DETERMINAR O IMEDIATO CUMPRIMENTO DO ACÓRDÃO.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Juiz Federal ARTUR CÉSAR DE SOUZA |
VOTANTE(S) | : | Juiz Federal ARTUR CÉSAR DE SOUZA |
: | Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA | |
: | Juíza Federal TAÍS SCHILLING FERRAZ |
Lídice Peña Thomaz
Secretária de Turma
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