APELAÇÃO CÍVEL Nº 5005578-98.2015.4.04.7107/RS
RELATORA | : | Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE |
APELANTE | : | AQUILINA STEIGER |
ADVOGADO | : | FERNANDA APARECIDA DA ROSA NECKER |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. CONCESSÃO DE PENSÃO POR MORTE.QUALIDADE DE DEPENDENTE. EX-ESPOSA. COMPANHEIRA.DEPENDÊNCIA ECONÔMICA. CORREÇÃO MONETÁRIA E JUROS DE MORA. FASE DE CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. DIFERIMENTO.
1. Para a obtenção do benefício de pensão por morte deve a parte interessada preencher os requisitos estabelecidos na legislação previdenciária vigente à data do óbito, consoante iterativa jurisprudência dos Tribunais Superiores e desta Corte.
2. Comprovada a união estável, presume-se a dependência econômica (artigo 16, § 4º, da Lei 8.213/91), impondo-se à Previdência Social demonstrar que esta não existia.
3. Caso em que a ex-exposa conseguiu comprovar a caracterização da união estável no período compreendido entre a separação do casal e o falecimento do segurado, apresentando conjunto probatório que comprova a dependência econômica em relação ao ex-marido.
3. Deliberação sobre índices de correção monetária e taxas de juros diferida para a fase de cumprimento de sentença, a iniciar-se com a observância dos critérios da Lei 11.960/2009, de modo a racionalizar o andamento do processo, permitindo-se a expedição de precatório pelo valor incontroverso, enquanto pendente, no Supremo Tribunal Federal, decisão sobre o tema com caráter geral e vinculante. Precedentes do STJ e do TRF da 4ª Região.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 6a. Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, dar provimento à apelação da parte autora e determinar o cumprimento imediato do acórdão no que se refere à implantação do benefício, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre/RS, 07 de junho de 2017.
Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE
Relatora
| Documento eletrônico assinado por Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE, Relatora, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8988241v10 e, se solicitado, do código CRC 9519CB23. | |
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| Data e Hora: | 08/06/2017 17:25 |
APELAÇÃO CÍVEL Nº 5005578-98.2015.4.04.7107/RS
RELATOR | : | SALISE MONTEIRO SANCHOTENE |
APELANTE | : | AQUILINA STEIGER |
ADVOGADO | : | FERNANDA APARECIDA DA ROSA NECKER |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
RELATÓRIO
AQUILINA STEIGER ajuizou, em 28-04-2015, ação ordinária contra o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), objetivando a concessão de pensão por morte do ex-marido/companheiro, OVIDIO STEIGER, cujo óbito ocorreu em 25-06-2010.
Sobreveio sentença (15-07-2016) que julgou improcedente o pedido inicial, sob fundamento de não ter sido comprovada a qualidade de dependente da autora.
Inconformada a parte autora recorreu, em síntese, sustentando ter comprovado nos autos a condição de companheira do ex-marido.
Ademais, alegou que a prova testemunhal já seria suficiente à comprovação da união estável; mesmo assim, foram acostados vários documentos com este fim.
Apresentada as contrarrazões, vieram os autos para julgamento.
VOTO
Pensão por Morte
A autora alegou que fora casada com Ovídio Steiger por 31 anos, e que após a separação judicial no ano de 2006, retornaram a conviver como um casal. Sustentou que Ovídio faleceu em 25-06-2010. Asseverou que requereu o benefício de pensão por morte em 09-07-2010, que foi negado pela autarquia previdenciária sob fundamento que os documentos apresentados não comprovaram a união estável em relação ao segurado instituidor (evento 1, OUT10, p. 8).
Para a obtenção do benefício de pensão por morte, a parte interessada deve preencher os requisitos previstos na legislação previdenciária vigente na data do óbito, conforme dispõe a Súmula 340, do Superior Tribunal de Justiça (STJ).
À época, quando do falecimento de OVÍDIO STEIGER ocorrido em 25-06-2010, a legislação aplicável à espécie - Lei nº 8.213, de 24 de julho de 1991 (Plano de Benefícios da Previdência Social) - apresentava a seguinte redação:
Art.74 - A pensão por morte será devida ao conjunto dos dependentes do segurado que falecer, aposentado ou não, a contar da data:
I - do óbito, quando requerida até 30 dias depois deste;
II - do requerimento, quando requerida após o prazo previsto no inciso anterior;
III - da decisão judicial, no caso de morte presumida.
São, portanto, três os requisitos para a concessão do benefício previdenciário de pensão por morte:
a) o óbito (ou morte presumida);
b) a qualidade de segurada da pessoa falecida;
c) a existência de dependentes, na forma prevista no artigo 16 da Lei nº 8.213/1991.
O evento morte está comprovado pela certidão de óbito (evento 1, CERTOBT8, p.2).
A qualidade de segurado de Ovídio Steiger não foi objeto de debate. Tal condição foi demonstrada por meio de pesquisa Plenus, na qual observo que o de cujus era titular de Aposentadoria por Invalidez Previdenciária (evento 1, OUT9, p.6).
A controvérsia, in casu, versa sobre a existência de união estável havida entre a parte autora e o ex-marido/falecido.
A requerente alegou que apesar da separação judicial, retomou o convívio com o de cujus, na qualidade de união estável, até o óbito deste (evento 1, INIC 1, p.2). Passo a analisar esta questão, para fins de qualificação da parte autora como dependente do falecido.
A Constituição Federal de 1988, para efeito da proteção do Estado, reconheceu a união estável entre o homem e a mulher como entidade familiar, remetendo à lei a tarefa de facilitar sua conversão em casamento (artigo 226, §3º).
A regulamentação desse dispositivo constitucional veio com a Lei 9.278, de 10 de maio de 1996, que assim estabeleceu em seu artigo 1º:
Art. 1º É reconhecida como entidade familiar a convivência duradoura, pública e contínua, de um homem e uma mulher, estabelecida como objetivo de constituição da família.
Por seu turno, o artigo 16, §3º, da Lei 8.213, de 24 de julho de 1991, em sua redação original, ao dispor sobre os beneficiários do Regime Geral de Previdência Social, na condição de dependentes, definiu como companheiro ou companheira a pessoa que, sem ser casada, mantém união estável com o segurado ou com a segurada, de acordo com o§ 3º do artigo 226 da Constituição Federal.
Posteriormente, o Regulamento da Previdência Social (Decreto nº 3.048. de 06 de maio de 1999), ao especificar a união estável para fins previdenciários, observou o tratamento conferido ao tema pelo artigo 1.723, do Código Civil de 2002, que reconhece como entidade familiar a união estável entre o homem e a mulher, configurada na convivência pública, contínua e duradoura e estabelecida com o objetivo de constituição de família.
Esta disposição legal deve ser interpretada conforme a Constituição Federal de 1988, de modo a dela se excluir qualquer significado que impeça o reconhecimento da união contínua, pública e duradoura entre pessoas do mesmo sexo como família, consoante decidiu o Supremo Tribunal Federal na Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental nº 132.
(Relator: Ministro Ayres Britto, Tribunal Pleno, julgado em 05 de maio de 2011, DJe-198 DIVULG 13-10-2011 PUBLIC 14-10-2011).
De toda maneira, para o reconhecimento da união estável, essencial que haja o propósito atual de constituir família, na linha de recente julgado do Superior Tribunal de Justiça, cujo trecho da ementa assim refere:
[...]
2.1 O propósito de constituir família, alçado pela lei de regência como requisito essencial à constituição da união estável - a distinguir, inclusive, esta entidade familiar do denominado "namoro qualificado" -, não consubstancia mera proclamação, para o futuro, da intenção de constituir uma família. É mais abrangente. Esta deve se afigurar presente durante toda a convivência, a partir do efetivo compartilhamento de vidas, com irrestrito apoio moral e material entre os companheiros. É dizer: a família deve, de fato, restar constituída.
2.2. Tampouco a coabitação, por si, evidencia a constituição de uma união estável (ainda que possa vir a constituir, no mais das vezes, um relevante indício)
[...].
(REsp 1454643/RJ, Rel. Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, TERCEIRA TURMA, julgado em 03/03/2015, DJe 10/03/2015).
Dessa forma, comprovada a relação intuitu familiae, ou seja, que apresenta convivência duradoura e por tempo indeterminável, contínua e reconhecida publicamente na comunidade em que convivem os companheiros, a dependência econômica é presumida, cabendo ao Instituto Nacional do Seguro Social demonstrar o contrário. Nesse sentido:
PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE DE COMPANHEIRO E GENITOR. DEPENDÊNCIA ECONÔMICA COMPROVADA E PRESUMIDA. QUALIDADE DE SEGURADO ESPECIAL DEMONSTRADA. TUTELA ESPECÍFICA. 1. Na vigência da Lei nº 8.213/91, dois são os requisitos para a concessão de benefício de pensão por morte, quais sejam: a qualidade de segurado do instituidor e a dependência dos beneficiários que, se preenchidos, ensejam o seu deferimento. 2. Presumida a dependência econômica em relação aos filhos e, também, em relação á companheira, pois demonstrada a existência de união estável entre o casal, correta a sentença que concedeu ao autor o benefício de pensão por morte a contar do óbito em relação aos filhos menores, absolutamente incapazes, e a contar do ajuizamento da ação em relação à companheira. 3. Determina-se o cumprimento imediato do acórdão naquilo que se refere à obrigação de implementar o benefício, por se tratar de decisão de eficácia mandamental que deverá ser efetivada mediante as atividades de cumprimento da sentença stricto sensu previstas no art. 461 do CPC, sem a necessidade de um processo executivo autônomo (sine intervallo). (TRF4, APELREEX 0022784-41.2013.404.9999, Sexta Turma, Relator João Batista Pinto Silveira, D.E. 27/07/2015).
PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. CONCESSÃO. QUALIDADE DE DEPENDENTE. UNIÃO ESTÁVEL. CONSECTÁRIOS. 1. A concessão do benefício de pensão por morte depende da ocorrência do evento morte, da demonstração da qualidade de segurado do de cujus e da condição de dependente de quem objetiva a pensão. 2. Para a obtenção do benefício de pensão por morte deve a parte interessada preencher os requisitos estabelecidos na legislação previdenciária vigente à data do óbito, consoante iterativa jurisprudência dos Tribunais Superiores e desta Corte. 3. É presumida a condição de dependência do companheiro, face às disposições contidas no artigo 16, I e § 4º, da Lei 8.213/91. 4. Necessidade de comprovação da união estável, para fim de caracterizar a dependência econômica da companheira, face às disposições contidas no artigo 16, I e § 4º, da Lei 8.213/91. (TRF4, APELREEX 0007002-23.2015.404.9999, Quinta Turma, Relator Rogério Favreto, D.E. 20/07/2015).
Ademais, a união estável pode ser demonstrada por testemunhos idôneos e coerentes, informando a existência da relação 'more uxório', uma vez que a Lei nº 8.213/91 apenas exige início de prova material para a comprovação de tempo de serviço. (TRF4, AC 0001256-77.2015.404.9999, Sexta Turma, Relatora Vânia Hack de Almeida, D.E. 29/06/2015).
Por determinação judicial foi realizada Justificação Administrativa em 03-02-2016, na qual foi tomado o depoimento pessoal da autora e ouvidas três testemunhas, que demonstraram bem conhecer a vida em comum havida entre a requerente Aquilina e falecido Ovídio.
No depoimento pessoal da autora Aquilina Steiger, constaram as declarações abaixo:
Que casou em 1975, com OVÍDIO STEIGER, separou, não lembra quando, tiveram três filhos falecidos Terezinha, Vanderlei e está viva a Adriana com um filho. Todos os filhos e netos gozam de boa saúde mental e física, não dependentes. Que mesmos separados, permaneciam sob mesmo teto, em quarto distinto. Que acompanhava o Ovídio no médico, cozinhava. Que Ovídio tinha problemas cardíacos, coração grande, não era acamado e se locomovia. Que Ovídio era afastado pelo INSS, recebia auxílio-doença. Que Ovídio tomava medicamentos, não lembra quais, a base de dez a doze diários. Que foi hospitalizado no Hospital Pompéia, antes da separação. Que Ovídio faleceu no dia 25de abril de 2010, ataque fulminante, na rua. Que a justificante foi no velório e enterro, em Caxias do Sul. Que Ovídio sustentava a casa, comprava comida, "ele tinha que comprar medicamento dele", "o básico para a gente viver". Que Ovídio recebia "mil e pouco". Que a justificante tinha renda de R$ 25,00, por meio dia, até a separação. Após a separação fazia "bico" de cuidadora do Pedro Vieira, falecido há 03 a 04 anos, com 94 anos de idade. Que a justificante refere-se a "bico" quando substituía sua amiga D. Clori, não tem apelido. Que a casa é própria. Que não moraram em localidades diferentes, após a separação, em nenhum momento. Que a justificante ficou um tempo em Vacaria, na casa de amiga, após falecimento de Ovídio, para disparecer. Que não lembra quanto tempo está separada. Diz a advogada que a justificante tem problemas de depressão e esquecimento. Pelo advogado: Que a justificante mantinha intimidade com seu ex-marido. Que tinha plano de saúde, não lembra qual, foi até o passamento do Ovídio. Dito isso, dá-se por encerrada a tomada do depoimento.
O depoimento da testemunha Marisa Rodrigues da Silva Silveira apresentou o relato que segue:
Que a testemunha não é parente do justificante. Que a testemunha conhece o justificante há 25 anos, de vista, morando a uma quadra de distância. Que a justificante era casada com Ovídio, não sabe o nome de família, tiveram casal de filhos, não sabe o nome, com mais de vinte anos de idade, com saúde física e mental normal. Que a justificante e o Ovídio eram casados, moravam sob mesmo teto, e dependia dele. Que a justificante não tinha renda, mas sabe que é cuidadora de pessoas, não sabendo se exerceu atividade. Que o casal de filhos moravam sob mesmo teto que a justificante e Ovídio, o filho é morto, não sabe quando e a filha está viva, trabalha e não sabe aonde. Que a filha é casada, tem filho e mora no mesmo terreno onde está a casa da justificante, todos em casas próprias. Que Ovídio é falecido, "do coração", na metade do ano de 2010, foi no velório, avistou a filha e a justificante, não sabe o local de falecimento, em Caxias do Sul. Que Ovídio trabalhava de vigilante, não sabe a empresa. Que não sabe se Ovídio foi afastado do trabalho. Que via o Ovídio sair de casa, pela manhã, com fardamento de trabalho, não lembra quando, não tendo idéia se há um dia, um mês, um ano. Que avistou a justificante e Ovídio no mercado, padaria e posto de saúde, por dois a três meses antes do passamento. Que presenciou, várias vezes, as compras no mercado e padaria, sendo Ovídio quem pagava. Que não tem idéia de quanto tempo antes do falecimento, referente as várias vezes. Que Ovídio aparentava estar normal. Que não sabe se tinham plano de saúde. Que a justificante caminhava com o Ovídio, na rua, sendo a última vez, há dois anos antes da morte. Pelo advogado: nada a perguntar. Dito isso, dá-se por encerrada a tomada do depoimento.
No depoimento da testemunha Fabiana Brando da Silva, por sua vez, foram referidas estas informações:
Que a testemunha não é parente do justificante. Que a testemunha conhece o justificante desde há dez anos, morando na distância de 03 a 04 casas, na mesma quadra. Que a justificante conheceu a justificante com Ovídio, tiveram casal de filhos, Adriana e um guri, ele falecido. Que Adriana é casada tem filho, todos gozam de boa saúde física e mental. Que a justificante e o Ovídio eram casados, moravam sob mesmo teto, não sabendo se em quarto separado. Que a Adriana mora na parte de cima da casa, não havendo outra casa no mesmo terreno. Que não sabe se Ovídio trabalhava, não sabe se tinha renda. Que a justificante é cuidadora e cuida de pessoas, nada sabe sobre o trabalho dela. Que a renda da justificante advinha do seu serviço. Que o Ovídio sustentava a casa, "ela falava", pagava as contas e mantinha a casa, água, luz, comida "como todo homem faz". Que a testemunha frequentava a casa da justificante, quando comprava cuca feito pela Adriana. Que sabia que Ovídio trabalhava, só não sabia o local e a renda. Que Ovídio é falecido do coração, na julho.2010, não foi no velório e enterro. Que não viu Ovídio sair de casa para trabalhar. Que a justificante e o Ovídio tomavam chimarrão juntos, na área, iam ao mercado Vantajão, que não avistou quem pagou as compras. Que para o mercado eles passavam em frente à casa da testemunha. Que presenciou a justificante e Ovídio passeando na rua, no bairro, em períodos próximos ao falecimento. Que Ovídio aparentava estar normal. Que não sabe se tinham plano de saúde. Pelo advogado: nada a perguntar. Dito isso, dá-se por encerrada a tomada do depoimento.
A testemunha Noemi Consoladora Alves Machado, por fim, prestou depoimento com o seguinte teor:
Que a testemunha não é parente do justificante. Que a testemunha conhece o justificante há vinte anos, de vista, morando no outro lado da rua. Que a justificante conheceu a justificante com Ovídio, tiveram casal de filhos, Adriana e um guri, ele falecido. Que Adriana é casada, tem filho, todos gozam de boa saúde física e mental. Que a justificante e o Ovídio eram casados, moravam sob mesmo teto, não sabendo se em quarto separado. Que a Adriana mora nos fundos da casa da justificante, são casas separadas no mesmo terreno. Que não sabe se Ovídio trabalhava, não sabe se tinha renda. Que a justificante é cuidadora e cuida de pessoas, sempre trabalhou de cuidadora. Que o Ovídio sustentava a casa, não sabe explicar a origem da renda, "diserto tinha alguma coisa". Que a justificante e Ovídio iam à Padaria Neves, passando na frente da casa da testemunha, não viu quem pagava ou o que comprava. Que "a gente sempre via eles sentados numa areazinha, na casa, tomando chimarrão", um dia antes de falecimento. Que Ovídio faleceu de "fulminante", não sabe dizer o que, em 2010 não foi no velório e enterro. Que não viu Ovídio sair de casa para trabalhar. Que Ovídio aparentava estar normal. Que não sabe se tinham plano de saúde. Não sabe quem paga luz, água, IPTU. Pelo advogado: nada a perguntar. Dito isso, dá-se por encerrada a tomada do depoimento
Esses testemunhos já seriam suficientes à comprovação da união estável. Porém, há outros elementos nos autos que confirmam idêntico propósito, a saber:
a) certidão de óbito de Otávio, na qual consta a autora como declarante (CERTOBT8);
b) correspondência enviada pelo INSS e guia de pagamento do IPTU do ano de 2010, constando o endereço do falecido como sendo "Rua Antônio Andrighetti, nº 2155, Santa Fé, Caxias do Sul" (fl. 10 do OUT9 e fls. 2-3 do OUT10);
c) conta de energia elétrica em nome da demandante, com vencimento no ano de 2014, na qual consta seu endereço como sendo "Rua Antônio Andrighetti, nº 2155, Vila Ipê, Caxias do Sul" (fl. 1 do OUT15);
d) conta de energia elétrica com vencimento em dezembro de 2010, constando o endereço da demandante como sendo "Rua dos Bem-Te-Vis, nº 2155, Vila Ipê, Caxias do Sul" (fl. 3 do OUT150);
e) correspondência em nome da autora e do falecido, enviada pela Secretaria Municipal da Habitação de Caxias do Sul no mês de maio de 2009, tendo como endereço dos destinatários a "Rua Antônio Andrighetti, nº 2155, Vila Ipê, Caxias do Sul" (fl. 1 do OUT20);
f) declarações prestadas por particulares no sentido de que a requerente e o falecida reataram a convivência marital após a separação ocorrida no ano de 2006 (fls. 1-3 do OUT24);
g) registros fotográficos (FOTO27 a FOTO 31).
Com efeito, analisando detidamente o acervo probatório, crível a alegação de que a autora e o falecido conviveram em união estável até o óbito deste. A separação do casal declarada pela própria autora na certidão de óbito, ao que tudo indica, de fato não teve o condão de caracterizar à sociedade local a dissolução do casamento, pois os depoimentos colhidos na justificação administrativa referiam-se sempre a convivência do casal como marido e mulher, hipótese ancorada no vasto acervo documental.
Ademais, os elementos instrutórios do feito dão conta de que a requerente e o falecido segurado, além de manterem uma relação de confiança recíproca, conviviam publicamente, com laços afetivos contínuos e duradouros e estabelecidos com o objetivo de constituição familiar, em condições que configuram o reconhecimento da união estável, nos termos do art. 1.723 do CC.
Assim, encontra-se perfeitamente evidenciada a união estável pela produção da prova testemunhal em juízo, o que é suficiente para considerar cumprido o requisito legal para a concessão do benefício, devendo ser reformada a sentença de improcedência para conceder à AQUILINA STEIGER o benefício de Pensão por Morte.
Termo inicial
O termo inicial do benefício é a data do óbito, ocorrido em 25-06-2010, nos termos do artigo art. 74, I da Lei nº 8.213/91, por ser a legislação vigente à época do passamento. Não há parcelas atingidas pela prescrição quinquenal.
Como a parte autora logrou êxito na integralidade do pedido, invertem-se os ônus da sucumbência, nos termos do art. 86, parágrafo único, do novo Código de Processo Civil (CPC), para condenar a requerida ao pagamento de custas e honorários advocatícios, como segue.
Consectários. Juros moratórios e correção monetária.
A questão da atualização monetária das quantias a que é condenada a Fazenda Pública, dado o caráter acessório de que se reveste, não deve ser impeditiva da regular marcha do processo no caminho da conclusão da fase de conhecimento.
Firmado em sentença, em apelação ou remessa oficial o cabimento dos juros e da correção monetária por eventual condenação imposta ao ente público e seus termos iniciais, a forma como serão apurados os percentuais correspondentes, sempre que se revelar fator impeditivo ao eventual trânsito em julgado da decisão condenatória, pode ser diferida para a fase de cumprimento, observando-se a norma legal e sua interpretação então em vigor. Isso porque é na fase de cumprimento do título judicial que deverá ser apresentado, e eventualmente questionado, o real valor a ser pago a título de condenação, em total observância à legislação de regência.
O recente art. 491 do NCPC, ao prever, como regra geral, que os consectários já sejam definidos na fase de conhecimento, deve ter sua interpretação adequada às diversas situações concretas que reclamarão sua aplicação. Não por outra razão seu inciso I traz exceção à regra do caput, afastando a necessidade de predefinição quando não for possível determinar, de modo definitivo, o montante devido. A norma vem com o objetivo de favorecer a celeridade e a economia processuais, nunca para frear o processo.
E no caso, o enfrentamento da questão pertinente ao índice de correção monetária, a partir da vigência da Lei 11.960/09, nos débitos da Fazenda Pública, embora de caráter acessório, tem criado graves óbices à razoável duração do processo, especialmente se considerado que pende de julgamento no STF a definição, em regime de repercussão geral, quanto à constitucionalidade da utilização do índice da poupança na fase que antecede a expedição do precatório (RE 870.947, Tema 810).
Tratando-se de débito, cujos consectários são totalmente regulados por lei, inclusive quanto ao termo inicial de incidência, nada obsta a que seja diferida para a fase de cumprimento do julgado em que, a propósito, poderão as partes, se assim desejarem, mais facilmente conciliar acerca do montante devido, de modo a finalizar definitivamente o processo.
Sobre esta possibilidade, já existe julgado da Terceira Seção do STJ, em que assentado que "diante a declaração de inconstitucionalidade parcial do artigo 5º da Lei n. 11.960/09 (ADI 4357/DF), cuja modulação dos efeitos ainda não foi concluída pelo Supremo Tribunal Federal, e por transbordar o objeto do mandado de segurança a fixação de parâmetros para o pagamento do valor constante da portaria de anistia, por não se tratar de ação de cobrança, as teses referentes aos juros de mora e à correção monetária devem ser diferidas para a fase de execução. 4. Embargos de declaração rejeitados". (EDcl no MS 14.741/DF, Rel. Ministro JORGE MUSSI, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 08/10/2014, DJe 15/10/2014).
Na mesma linha vêm decidindo as duas turmas de Direito Administrativo desta Corte (2ª Seção), à unanimidade, (Ad exemplum: os processos 5005406-14.2014.404.7101 3ª Turma, julgado em 01-06-2016, e 5052050-61.2013.404.7000, 4ª Turma, julgado em 25/05/2016)
Portanto, em face da incerteza quanto ao índice de atualização monetária, e considerando que a discussão envolve apenas questão acessória no contexto da lide, à luz do que preconizam os art. 4º, 6º e 8º do novo Código de Processo Civil, mostra-se adequado e racional diferir-se para a fase de execução a solução em definitivo acerca dos critérios de correção, ocasião em que, provavelmente, a questão já terá sido dirimida pelo tribunal superior, o que conduzirá à observância, pelos julgadores, ao fim e ao cabo, da solução uniformizadora.
A fim de evitar novos recursos, inclusive na fase de cumprimento de sentença, e anteriormente à solução definitiva pelo STF sobre o tema, a alternativa é que o cumprimento do julgado se inicie, adotando-se os índices da Lei 11.960/2009, inclusive para fins de expedição de precatório ou RPV pelo valor incontroverso, diferindo-se para momento posterior ao julgamento pelo STF a decisão do juízo sobre a existência de diferenças remanescentes, a serem requisitadas, acaso outro índice venha a ter sua aplicação legitimada.
Os juros de mora, incidentes desde a citação, como acessórios que são, também deverão ter sua incidência garantida na fase de cumprimento de sentença, observadas as disposições legais vigentes conforme os períodos pelos quais perdurar a mora da Fazenda Pública.
Evita-se, assim, que o presente feito fique paralisado, submetido a infindáveis recursos, sobrestamentos, juízos de retratação e até ações rescisórias, com comprometimento da efetividade da prestação jurisdicional, apenas para solução de questão acessória.
Diante disso, difere-se para a fase de cumprimento de sentença a forma de cálculo dos consectários legais, adotando-se inicialmente o índice da Lei 11.960/2009, restando prejudicado o recurso no ponto.
Honorários advocatícios
Os honorários advocatícios seguem a sistemática prevista no artigo 85 do Código de Processo Civil de 2015. Considerando que o valor mensal do benefício aqui deferido será equivalente a cerca de 2,3 salários mínimos, bem como que entre a data de entrega do requerimento (09-07-2010) e a presente decisão de procedência, é possível, desde logo, projetar que o valor da condenação, mesmo com a aplicação dos juros e correção monetária, não será superior a 200 salários mínimos, para efeitos de enquadramento do percentual de honorários nas faixas previstas no § 3º, inciso I a V, do artigo 85 do CPC/2015.
Assim, fixo os honorários advocatícios em 10% sobre o valor da condenação, sobre as parcelas vencidas até a data deste julgado (Súmulas nº 111 do Superior Tribunal de Justiça e nº 76 do Tribunal Regional Federal da 4ª Região), considerando as variáveis dos incisos I a IV do § 2º do artigo 85 do CPC/2015.
Custas
O INSS é isento do pagamento das custas no Foro Federal (art. 4, I, da Lei nº 9.289/96) e na Justiça Estadual do Rio Grande do Sul, devendo, contudo, pagar eventuais despesas processuais, como as relacionadas a correio, publicação de editais e condução de oficiais de justiça (artigo 11 da Lei Estadual nº 8.121/85, com a redação da Lei Estadual nº 13.471/2010, já considerada a inconstitucionalidade formal reconhecida na ADInº 70038755864, julgada pelo Órgão Especial do TJ/RS); para os feitos ajuizados a partir de 2015 é isento o INSS da taxa única de serviços judiciais, na forma do estabelecido na lei estadual nº 14.634/2014 (artigo 5º). Tais isenções não se aplicam quando demandado na Justiça Estadual do Paraná (Súmula 20 do TRF4), devendo ser ressalvado, ainda, que no Estado de Santa Catarina (art. 33, parágrafo único, da Lei Complementar Estadual nº 156/97), a autarquia responde pela metade do valor.
Tutela específica
Considerando a eficácia mandamental dos provimentos fundados no art. 497, caput, do Código de Processo Civil, e tendo em vista que a presente decisão não está sujeita, em princípio, a recurso com efeito suspensivo (TRF4, 3ª Seção, Questão de Ordem na AC n. 2002.71.00.050349-7/RS, Relator para o acórdão Desembargador Federal Celso Kipper, julgado em 09 de agosto de 2007), determino o cumprimento imediato do acórdão no tocante à implantação do benefício da parte autora, a ser efetivada em 45 dias.
Conclusão
A apelação da parte autora restou provida para conceder o benefício de Pensão por Morte desde o óbito. Difere-se para a fase de execução a forma de cálculo dos consectários legais.
Dispositivo
Ante o exposto, voto por dar provimento à apelação da parte autora e determinar o cumprimento imediato do acórdão no que se refere à implantação do benefício.
Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE
Relatora
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 07/06/2017
APELAÇÃO CÍVEL Nº 5005578-98.2015.4.04.7107/RS
ORIGEM: RS 50055789820154047107
RELATOR | : | Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE |
PRESIDENTE | : | Desembargadora Federal Vânia Hack de Almeida |
PROCURADOR | : | Procurador Regional da República Alexandre Amaral Gavronski |
APELANTE | : | AQUILINA STEIGER |
ADVOGADO | : | FERNANDA APARECIDA DA ROSA NECKER |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 07/06/2017, na seqüência 822, disponibilizada no DE de 23/05/2017, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 6ª TURMA, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU DAR PROVIMENTO À APELAÇÃO DA PARTE AUTORA E DETERMINAR O CUMPRIMENTO IMEDIATO DO ACÓRDÃO NO QUE SE REFERE À IMPLANTAÇÃO DO BENEFÍCIO.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE |
VOTANTE(S) | : | Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE |
: | Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA | |
: | Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA |
Gilberto Flores do Nascimento
Diretor de Secretaria
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