APELAÇÃO CÍVEL Nº 5068209-64.2017.4.04.9999/RS
RELATOR | : | ARTUR CÉSAR DE SOUZA |
APELANTE | : | ISETE TONELLO |
ADVOGADO | : | SAMUEL ANZOLIN |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. CONCESSÃO DE PENSÃO POR MORTE. QUALIDADE DE DEPENDENTE. EX-ESPOSA. DEPENDÊNCIA ECONÔMICA. CONSECTÁRIOS.
1. Para a obtenção do benefício de pensão por morte deve a parte interessada preencher os requisitos estabelecidos na legislação previdenciária vigente à data do óbito, consoante iterativa jurisprudência dos Tribunais Superiores e desta Corte.
2. Comprovada a união estável, presume-se a dependência econômica (artigo 16, § 4º, da Lei 8.213/91), impondo-se à Previdência Social demonstrar que esta não existia.
3. Caso em que a ex-exposa conseguiu comprovar a caracterização da união estável no período compreendido entre a separação litigiosa do casal e o falecimento do segurado.
4. O Supremo Tribunal Federal reconheceu no RE 870947, com repercussão geral, a inconstitucionalidade do uso da TR, determinando, no recurso paradigma, a adoção do IPCA-E para o cálculo da correção monetária.
5. Considerando que o recurso que originou o precedente do STF tratava de condenação da Fazenda Pública ao pagamento de débito de natureza administrativa, o Superior Tribunal de Justiça, no REsp 1495146, em precedente também vinculante, e tendo presente a inconstitucionalidade da TR como fator de atualização monetária, distinguiu os créditos de natureza previdenciária, em relação aos quais, com base na legislação anterior, determinou a aplicação do INPC.
6. Os juros de mora, a contar da citação, devem incidir à taxa de 1% ao mês, até 29-06-2009. A partir de então, incidem uma única vez, até o efetivo pagamento do débito, segundo o índice oficial de remuneração básica aplicado à caderneta de poupança.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 6ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, dar provimento à apelação, e determinar o imediato cumprimento do acórdão no que se refere à implantação do benefício, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 18 de julho de 2018.
Juiz Federal Artur César de Souza
Relator
| Documento eletrônico assinado por Juiz Federal Artur César de Souza, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 9420570v54 e, se solicitado, do código CRC CE48CC05. | |
| Informações adicionais da assinatura: | |
| Signatário (a): | Artur César de Souza |
| Data e Hora: | 19/07/2018 16:38 |
APELAÇÃO CÍVEL Nº 5068209-64.2017.4.04.9999/RS
RELATOR | : | ARTUR CÉSAR DE SOUZA |
APELANTE | : | ISETE TONELLO |
ADVOGADO | : | SAMUEL ANZOLIN |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
RELATÓRIO
Trata-se de apelação da parte autora contra sentença (18/09/2017) que julgou improcedente o pedido de pensão por morte, cujo dispositivo reproduzo a seguir:
Isso posto. JULGO improcedente o pedido. Sucumbente, a parte autora arcará com o valor das custas processuais, além de honorários fixados em 15% do valor da causa, atualizados pelo IGP-M a contar do ajuizamento, ficando suspensa a exigibilidade do pagamento em face da AJG.
Inconformada, recorreu alegando, em síntese, que a sentença merece ser reformada, pois restou demonstrado que a requerente dependia economicamente da ajuda do instituidor do benefício.
Ademais, sustentou que após a homologação do acordo de separação, o casal ficou separado de fato por apenas alguns meses, e após se reconciliaram e voltaram a residir juntos.
Asseverou que o principal motivo para a separação do casal foi o excessivo consumo de álcool pelo Sr. Valdir, todavia, após a separação, o mesmo passou a realizar tratamento médico contra o alcoolismo, fazendo com o que o casal se reconciliasse e voltasse a conviver em união estável até a data do óbito de Valdir, em 21/10/2005.
Apresentadas as contrarrazões, vieram os autos para esta Corte para julgamento.
É o relatório.
VOTO
Juízo de admissibilidade
O apelo preenche os requisitos legais de admissibilidade.
Objeto da ação
A presente ação se limita à concessão do benefício de pensão por morte em decorrência do falecimento de Valdir Ricardo Wildner, ocorrido em 21/10/2005. Para fins de clareza, transcrevo excerto do relatório da sentença (evento 3, SENT19):
ISETE TONELLO WILDNER ajuizou a presente ação previdenciária em face do INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS. pretendendo a concessão do benefício de pensão pela morte de ex-marido, dito companheiro na data do óbito, sr. Valdir Ricardo Wildner, falecido em 21/10/2005. Pediu a procedência do pedido, com a concessão do benefício, bem como a concessão da AIG. Instruiu com procuração e documentos. Concedida a gratuidade judiciária (fl. 185). Citado, o INSS contestou nas fls. 187 e seguintes, pedindo a improcedência do pedido.
Pensão por Morte
Para a obtenção do benefício de pensão por morte deve a parte interessada preencher os requisitos estabelecidos na legislação previdenciária vigente à data do óbito, consoante iterativa jurisprudência dos Tribunais Superiores e desta Corte.
À época, quando do falecimento de VALDIR RICARDO WILDNER, ocorrido em 21/10/2005, a legislação aplicável à espécie - Lei 8.213, de 24 de julho de 1991 (Plano de Benefícios da Previdência Social) - apresentava a seguinte redação:
Art. 74 - A pensão por morte será devida ao conjunto dos dependentes do segurado que falecer, aposentado ou não, a contar da data:
I - do óbito, quando requerida até 30 dias depois deste;
II - do requerimento, quando requerida após o prazo previsto no inciso anterior;
III - da decisão judicial, no caso de morte presumida.
São, portanto, três os requisitos para a concessão do benefício de pensão por morte previdenciária:
a) o óbito (ou morte presumida);
b) a qualidade de segurada da pessoa falecida;
c) a existência de dependentes, na forma prevista no artigo 16, da Lei n. 8.213/1991.
O evento morte está comprovado pela certidão de óbito (evento 3, ANEXOS PET4, p.16).
A qualidade de segurado do falecido é fato incontroverso, tanto que ensejou a concessão do benefício da mesma espécie aos filhos, questão, ademais, não contestada pelo INSS.
A controvérsia, in casu, versa sobre a existência de união estável havida entre a parte autora Isete Tonello e o ex-marido/falecido, Valdir Ricardo Wildner, considerando que foram casados por 17 anos, até se separarem judicialmente. No entanto, a requerente alega que teriam voltado a conviver juntos até o óbito, pois o marido resolvera tratar-se do alcoolismo, motivo da separação.
Passo a analisar esta questão, para fins de qualificação da parte autora como dependente do falecido.
No que pertine à qualidade de companheira, a Constituição de 1988 estendeu a proteção dada pelo Estado à família para as entidades familiares constituídas a partir da união estável entre homem e mulher nos seguintes termos:
Art. 226, § 3º: Para efeito da proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre o homem e a mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em casamento.
O legislador ordinário, por sua vez, regulamentou esse dispositivo constitucional na Lei 9.278/96:
Art. 1º É reconhecida como entidade familiar a convivência duradoura, pública e contínua, de um homem e uma mulher, estabelecida como objetivo de constituição da família.
A Lei 8.213/91, em sua redação original, assim definiu companheiro (a):
Art. 16. São beneficiários do Regime Geral de Previdência Social, na condição de dependentes do segurado:
(...)
§3º Considera-se companheira ou companheiro a pessoa que, sem ser casada, mantém união estável com o segurado ou com a segurada, de acordo com o§ 3º do artigo 226 da Constituição Federal.
Já o Decreto 3.048/99 conceituou a união estável deste modo:
Art.16. São beneficiários do Regime Geral de Previdência Social, na condição de dependentes do segurado:
(...)
§ 6º Considera-se união estável aquela verificada entre o homem e a mulher como entidade familiar, quando forem solteiros, separados judicialmente, divorciados ou viúvos, ou tenham prole em comum, enquanto não se separarem.
Ressalto, ainda, que o novo Código Civil disciplinou a matéria consoante dispõem o caput e o §1º do seu art. 1.723:
Art. 1.723. É reconhecida como entidade familiar a união estável entre o homem e a mulher, configurada na convivência pública, contínua e duradoura e estabelecida com o objetivo de constituição de família.
§ 1º. A união estável não se constituirá se ocorrerem os impedimentos do art. 1.521; não se aplicando a incidência do inciso VI no caso de a pessoa casada se achar separada de fato ou judicialmente.
Em qualquer caso, para o reconhecimento da união estável, essencial que haja aparência de casamento, não sendo a coabitação, entretanto, requisito indispensável, consoante demonstra o julgado do STJ abaixo ementado:
DIREITOS PROCESSUAL CIVIL E CIVIL. UNIÃO ESTÁVEL. REQUISITOS. CONVIVÊNCIA SOB O MESMO TETO. DISPENSA. CASO CONCRETO. LEI N. 9.728/96. ENUNCIADO N. 382 DA SÚMULA/STF. ACERVO FÁTICO-PROBATÓRIO. REEXAME. IMPOSSIBILIDADE. ENUNCIADO N. 7 DA SÚMULA/STJ. DOUTRINA. PRECEDENTES. RECONVENÇÃO. CAPÍTULO DA SENTENÇA. TANTUM DEVOLUTUM QUANTUM APELLATUM. HONORÁRIOS. INCIDÊNCIA SOBRE A CONDENAÇÃO. ART. 20, § 3º, CPC. RECURSO PROVIDO PARCIALMENTE.
I - Não exige a lei específica (Lei n. 9.728/96) a coabitação como requisito essencial para caracterizar a união estável. Na realidade, a convivência sob o mesmo teto pode ser um dos fundamentos a demonstrar a relação comum, mas a sua ausência não afasta, de imediato, a existência da união estável.
II - Diante da alteração dos costumes, além das profundas mudanças pelas quais tem passado a sociedade, não é raro encontrar cônjuges ou companheiros residindo em locais diferentes.
III - O que se mostra indispensável é que a união se revista de estabilidade, ou seja, que haja aparência de casamento, como no caso entendeu o acórdão impugnado. (...)
(STJ, Quarta Turma, REsp 474962, Processo: 200200952476/SP, DJ 01-03-2004, Relator Min. SÁLVIO DE FIGUEIREDO TEIXEIRA)
De mais a mais, comprovada a relação concubinária com intuitu familiae, isto é, aquela que apresenta convivência duradoura, pública, contínua e reconhecida como tal pela comunidade na qual convivem os companheiros, presume-se a dependência econômica, como referi alhures, impondo-se à Previdência Social demonstrar que esta não existia. Nesse sentido:
"PREVIDENCIÁRIO. CONCESSÃO DE PENSÃO POR MORTE DE COMPANHEIRO. UNIÃO ESTÁVEL QUANDO DO ÓBITO.
1. A prova material demonstra a convivência "more uxório", sendo presumida a dependência econômica, entre companheiros. (...)"
(Sexta Turma, AC 533327, Processo: 199971000160532/RS, DJU 23-07-2003, Relator Des. Fed. NÉFI CORDEIRO)
"PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. CONDIÇÃO DE SEGURADO ESPECIAL DO DE CUJUS. COMPROVAÇÃO. UNIÃO ESTÁVEL. DEPENDÊNCIA ECONÔMICA PRESUMIDA. (...)
2. A dependência econômica da companheira é presumida (art. 16, I e § 4º e art. 74 da Lei nº 8.213/91). (...)"
(Sexta Turma, AC 572909, Processo: 2001.70.07.002419-0/PR, DJU 23-06-2004, Rel. Des. Fed. NYLSON PAIM DE ABREU)
Ademais, a união estável pode ser demonstrada por testemunhos idôneos e coerentes, informando a existência da relação 'more uxório', uma vez que a Lei nº 8.213/91 apenas exige início de prova material para a comprovação de tempo de serviço. (TRF4, AC 0001256-77.2015.404.9999, Sexta Turma, Relatora Vânia Hack de Almeida, D.E. 29/06/2015).
A fim de comprovar a alegada união estável entre a autora Isete Tonello e o ex-marido/falecido, Valdir Ricardo Wildner, foi realizada audiência de instrução e julgamento em 19/04/2017, oportunidade na qual foram ouvidas três testemunhas.
O depoimento da testemunha Vilson de Almeida Couto, apresentou o relato:
Que Isete e Valdir eram casados; que eles ficaram separados uns cinco ou seis meses lá, depois voltaram; que ele foi morar na residência do Arzelindo, o sobrenome dele não lembro; que depois desse tempo eles se reconciliaram e ele voltou a morar com ela; que nunca entrou na residência deles, mas que eles viviam juntos, viviam; que o falecido comentou com o depoente que tinha parado de beber, e que a esposa tinha aceitado ele de volta; que quando Valdir faleceu eles já estavam morando juntos; que o depoente era vizinho deles; que soube que houve um processo de separação judicial e que o depoente aconselhava muito ele, para parar um pouco de beber,que era de uma família tradicional; que o motivo da separação teria sido este, ele bebia muito; que eles ficaram pouco tempo separados; que os filhos eram menores; que eles ficavam com ela, mas o guri ficava sempre com o pai. Nada mais.
No depoimento da testemunha João Carlos Alves Rozado, por sua vez, foram referidas estas informações):
Que o falecido era cliente do depoente; que sabe "de fofoca" que eles se separaram, mas não sabe nada sobre processo judicial; que antes dele falecer moravam com ela na mesma casa; que quando ele faleceu eles estavam juntos. Nada mais.
A testemunha Arzelindo Pedro Batistello por fim, prestou depoimento com o seguinte teor:
Que Isete foi casada com Valdir; que acompanhou a separação do casal, inclusive ofereceu a casa dele para o falecido que não sabia para onde iria; que eles ficaram separados uns quatro, cinco ou seis meses, por aí; que depois ele voltou a morar com ela; que acha que ele voltou a conviver porque ele se arrependeu, ele bebia um pouquinho; que a partir dali eles voltaram a conviver juntos até o óbito; que ficaram como marido e mulher. Nada mais.
Esses testemunhos já seriam suficientes à comprovação da união estável. Porém, há outros elementos nos autos que confirmam idêntico propósito, a saber:
a) Recibos referentes a sepultamento e serviços funerários de Valdir em nome de Isete (evento 3, ANEXOS PET4, pp.6/7);
b) Atestado de frequência de filho do casal expedido pela Escola Estadual Ângelo Mônaco, expedido em 20/04/2015 (evento 3, ANEXOS PET4, p.8);
c) Foto do casal com filho sem identificação de época (evento 3, ANEXOS PET4, p.9);
d) Certidão de óbito de Valdir Ricardo Wildner, ocorrido em 21/10/2005, tendo como declarante a ex-esposa/autora Isete Tonello Wildner, averbada em 24/10/2005 (evento 3, ANEXOS PET4, p.8).
Outrossim, entendeu o Juízo de origem pela improcedência do pedido, sob fundamento, reproduzo excerto (evento 3, SENT19, p.3):
Porém, o fato separação judicial judicialmente homologada pouco mais de 1 ano antes do óbito é sintomático. E não há como assentar. pela prova que veio ao processo, tenha-se restabelecido tão rapidamente uma relação de afeto entre ambos, relação de afeto com as características necessárias, ou seja. união estável por longo período. duradoura, publica e com efetiva dependência econômica. Chama a atenção o depoimento da ora autora prestado perante o INSS. logo depois do óbito, fls. 140/141, afirmando que depois da separação manteve pouco contato com o falecido. Como controverteu o INSS em contestação, não há razão lógica para que a autora prestasse o referido depoimento se realmente estivesse convivendo com o falecido antes do óbito. Para piorar, as testemunhas ouvidas na via administrativa, e são importantes porque prestaram o depoimento de forma livre e contemporânea ao óbito. diversamente das testemunhas ouvidas em juízo, que assim o foram quase 12 anos depois, denotaram que não havia convivência como marido e mulher, fls. 142/146.
Com efeito, crível serem verdadeiras as declarações da autora prestadas administrativamente, de que depois da separação manteve pouco contato com o ex-marido, pois em momento algum foi omitida a informação que o casal passou por um período de seis meses separados, decorrência do problema que acometia o falecido, reconciliando-se após. Destarte, entendo fragilizadas os depoimentos colhidos administrativamente; Leandro Rigo nada referiu sobre a autora; Santo Magro e Antonio Mezadri referiram conhecer por mais de 20 anos o falecido, e ainda assim afirmaram: nunca viu ela nas lavouras com ele, que Isete tinha poucos contatos com o falecido; chama a atenção que o falecido e a autora estavam casados desde janeiro de 1986, separando-se tão somente em 2004. Ora, parece evidente que não a viam, a um que estavam separados por seis meses, a dois que Isete não laborava na agricultura, pois era servidora pública (contracheques evento 3, ANEXOS PET4, pp. 2/3).
Sem embargo, analisando detidamente o acervo probatório, crível a alegação de que a autora e o falecido conviveram em união estável até o óbito deste. A separação do casal, ao que tudo indica, de fato não teve o condão de caracterizar à sociedade local a dissolução do casamento, pois os depoimentos colhidos na audiência de instrução e julgamento referiam-se sempre à convivência do casal como marido e mulher, hipótese ancorada principalmente nos harmônicos depoimentos, e nos recibos referentes a sepultamento e serviços funerários de Valdir em nome de Isete (evento 3, ANEXOS PET4, pp.6/7); e na Certidão de óbito de Valdir Ricardo Wildner, tendo como declarante a ex-esposa/autora Isete Tonello Wildner, averbada em 24/10/2005 (evento 3, ANEXOS PET4, p.8).
Ademais, os elementos instrutórios do feito dão conta de que a requerente e o falecido segurado, além de manterem uma relação de confiança recíproca, conviviam publicamente, com laços afetivos contínuos e duradouros e estabelecidos com o objetivo de constituição familiar, em condições que configuram o reconhecimento da união estável, nos termos do art. 1.723 do CC.
Assim, encontra-se perfeitamente evidenciada a união estável pela produção da prova testemunhal em juízo, o que é suficiente para considerar cumprido o requisito legal para a concessão do benefício, devendo ser reformada a sentença de improcedência para conceder à Isete Tonello o benefício de Pensão por Morte.
Termo inicial
A situação fática estava sob a regência normativa do artigo 74, II, Lei 8.213/91, tendo em vista que transcorrera mais de 30 dias entre o óbito em 21/10/2005 e o requerimento administrativo em 06/02/2015.
Assim, o termo inicial da quota parte do benefício é a data do requerimento administrativo em 06/02/2015. Não há parcelas atingidas pela prescrição, considerando que a ação foi distribuída, em 05/02/2016 (evento 3, CAPA1).
Como a parte autora logrou êxito na integralidade do pedido, invertem-se os ônus da sucumbência, nos termos do art. 86, parágrafo único, do novo Código de Processo Civil (CPC), para condenar a requerida ao pagamento de custas e honorários advocatícios, como segue.
Correção monetária
A correção monetária, segundo o entendimento consolidado da 3ª Seção deste Tribunal, incidirá a contar do vencimento de cada prestação e será calculada pelos seguintes índices oficiais:
- IGP-DI de 05/96 a 03/2006, de acordo com o art. 10 da Lei n. 9.711/98, combinado com o art. 20, §§ 5º e 6º, da Lei n. 8.880/94;
- INPC a partir de 04/2006, de acordo com a Lei n. 11.430/06, precedida da MP nº 316, de 11/08/2006, que acrescentou o art. 41-A à Lei n. 8.213/91, sendo que o art. 31 da Lei nº 10.741/03, determina a aplicabilidade do índice de reajustamento dos benefícios do RGPS às parcelas pagas em atraso.
A incidência da TR como índice de correção monetária dos débitos judiciais da Fazenda Pública foi afastada pelo Supremo Tribunal Federal, no julgamento do RE 870947, com repercussão geral, tendo-se determinado, no recurso paradigma a utilização do IPCA-E, como já havia sido determinado para o período subsequente à inscrição em precatório, por meio das ADIs 4.357 e 4.425.
Interpretando a decisão do STF, e tendo presente que o recurso paradigma que originou o precedente tratava de condenação da Fazenda Pública ao pagamento de débito de natureza não previdenciária (benefício assistencial), o Superior Tribunal de Justiça, em precedente também vinculante (REsp 149146), distinguiu, para fins de determinação do índice de atualização aplicável, os créditos de natureza previdenciária, para estabelecer que, tendo sido reconhecida a inconstitucionalidade da TR como fator de atualização, deveria voltar a incidir, em relação a tal natureza de obrigação, o índice que reajustava os créditos previdenciários anteriormente à Lei 11.960/09, ou seja, o INPC.
Importante ter presente, para a adequada compreensão do eventual impacto sobre os créditos dos segurados, que os índices em referência - INPC e IPCA-E tiveram variação praticamente idêntica no período transcorrido desde julho de 2009 até setembro de 2017, quando julgado o RE 870947, pelo STF (IPCA-E: 64,23%; INPC 63,63%), de forma que a adoção de um ou outro índice nas decisões judiciais já proferidas não produzirá diferenças significativas sobre o valor da condenação.
A conjugação dos precedentes acima resulta na aplicação do INPC aos benefícios previdenciários, a partir de abril de 2006, reservando-se a aplicação do IPCA-E aos benefícios de natureza assistencial.
Juros de mora
Os juros de mora devem incidir a partir da citação.
Até 29-06-2009, os juros de mora devem incidir à taxa de 1% ao mês, com base no art. 3º do Decreto-Lei n. 2.322/87, aplicável analogicamente aos benefícios pagos com atraso, tendo em vista o seu caráter eminentemente alimentar, consoante firme entendimento consagrado na jurisprudência do STJ e na Súmula 75 desta Corte.
A partir de então, deve haver incidência dos juros, uma única vez, até o efetivo pagamento do débito, segundo o índice oficial de remuneração básica aplicado à caderneta de poupança, nos termos estabelecidos no art. 1º-F, da Lei 9.494/97, na redação da Lei 11.960/2009, considerado hígido pelo STF no RE 870947, com repercussão geral reconhecida. Os juros devem ser calculados sem capitalização, tendo em vista que o dispositivo determina que os índices devem ser aplicados "uma única vez" e porque a capitalização, no direito brasileiro, pressupõe expressa autorização legal (STJ, 5ª Turma, AgRgnoAgRg no Ag 1211604/SP, Rel. Min. Laurita Vaz).
Honorários Advocatícios
Incide, no caso, a sistemática de fixação de honorários advocatícios prevista no art. 85 do NCPC, porquanto a sentença foi proferida após 18/03/2016 (data da vigência do NCPC definida pelo Pleno do STJ em 02/04/2016).
Invertidos os ônus sucumbenciais, estabeleço a verba honorária em 10% (dez por cento) sobre as parcelas vencidas até a data do presente julgado, considerando as variáveis dos incisos I a IV do § 2º do artigo 85 do NCPC.
Custas e despesas processuais
O INSS é isento do pagamento das custas processuais quando demandado na Justiça Estadual do Rio Grande do Sul, devendo, contudo, pagar eventuais despesas processuais, como as relacionadas a correio, publicação de editais e condução de oficiais de justiça (artigo 11 da Lei Estadual nº 8.121/85, com a redação da Lei Estadual nº 13.471/2010, já considerada a inconstitucionalidade formal reconhecida na ADI nº 70038755864 julgada pelo Órgão Especial do TJ/RS).
Cumprimento imediato do julgado (tutela específica)
Considerando a eficácia mandamental dos provimentos fundados no art. 497 do novo CPC, que repete dispositivo constante do art. 461 do antigo CPC, e tendo em vista que a presente decisão não está sujeita, em princípio, a recurso com efeito suspensivo (TRF4, 3ª Seção, Questão de Ordem na AC n. 2002.71.00.050349-7/RS, Rel. para o acórdão Des. Federal Celso Kipper, julgado em 09/08/2007), determino o cumprimento imediato do acórdão, a ser efetivado em 45 dias, mormente pelo seu caráter alimentar e necessidade de efetivação imediata dos direitos sociais fundamentais.
Prequestionamento
O prequestionamento da matéria segue a sistemática prevista no art. 1.025 do CPC/2015.
Conclusão
Dado provimento à apelação da autora, adequando consectários à orientação do STF no RE 870947, determinando o cumprimento imediato do acórdão.
Dispositivo
Ante o exposto, voto por dar provimento à apelação, e determinar o imediato cumprimento do acórdão no que se refere à implantação do benefício.
Juiz Federal Artur César de Souza
Relator
| Documento eletrônico assinado por Juiz Federal Artur César de Souza, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 9420569v52 e, se solicitado, do código CRC B9D3C1EB. | |
| Informações adicionais da assinatura: | |
| Signatário (a): | Artur César de Souza |
| Data e Hora: | 19/07/2018 16:38 |
EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 18/07/2018
APELAÇÃO CÍVEL Nº 5068209-64.2017.4.04.9999/RS
ORIGEM: RS 00003320920168210078
RELATOR | : | Juiz Federal ARTUR CÉSAR DE SOUZA |
PRESIDENTE | : | Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA |
PROCURADOR | : | Dr. Cícero Augusto Pujol Corrêa |
APELANTE | : | ISETE TONELLO |
ADVOGADO | : | SAMUEL ANZOLIN |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 18/07/2018, na seqüência 40, disponibilizada no DE de 02/07/2018, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 6ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU DAR PROVIMENTO À APELAÇÃO, E DETERMINAR O IMEDIATO CUMPRIMENTO DO ACÓRDÃO NO QUE SE REFERE À IMPLANTAÇÃO DO BENEFÍCIO.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Juiz Federal ARTUR CÉSAR DE SOUZA |
VOTANTE(S) | : | Juiz Federal ARTUR CÉSAR DE SOUZA |
: | Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA | |
: | Juíza Federal TAÍS SCHILLING FERRAZ |
Lídice Peña Thomaz
Secretária de Turma
| Documento eletrônico assinado por Lídice Peña Thomaz, Secretária de Turma, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 9442835v1 e, se solicitado, do código CRC 65E86121. | |
| Informações adicionais da assinatura: | |
| Signatário (a): | Lídice Peña Thomaz |
| Data e Hora: | 18/07/2018 12:48 |
