APELAÇÃO CÍVEL Nº 5000919-65.2014.4.04.7112/RS
RELATOR | : | ARTUR CÉSAR DE SOUZA |
APELANTE | : | ELIANA GLADIS PRESTES IBALDO |
ADVOGADO | : | EDUARDO FIGUEIRA GUIMARÃES |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. CONCESSÃO DE PENSÃO POR MORTE. QUALIDADE DE DEPENDENTE. EX-ESPOSA. DEPENDÊNCIA ECONÔMICA. CORREÇÃO MONETÁRIA E JUROS DE MORA. FASE DE CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. DIFERIMENTO PARA A FASE PRÓPRIA (EXECUÇÃO).
1. Para a obtenção do benefício de pensão por morte deve a parte interessada preencher os requisitos estabelecidos na legislação previdenciária vigente à data do óbito, consoante iterativa jurisprudência dos Tribunais Superiores e desta Corte.
2. Comprovada a união estável, presume-se a dependência econômica (artigo 16, § 4º, da Lei 8.213/91), impondo-se à Previdência Social demonstrar que esta não existia.
3. Caso em que a ex-exposa conseguiu comprovar a caracterização da união estável no período compreendido entre a separação litigiosa do casal e o falecimento do segurado, apresentando conjunto probatório que comprova a dependência econômica em relação ao ex-marido.
3. Deliberação sobre índices de correção monetária e taxas de juros diferida para a fase de cumprimento de sentença, a iniciar-se com a observância dos critérios da Lei 11.960/2009, de modo a racionalizar o andamento do processo, permitindo-se a expedição de precatório pelo valor incontroverso, enquanto pendente, no Supremo Tribunal Federal, decisão sobre o tema com caráter geral e vinculante. Precedentes do STJ e do TRF da 4ª Região.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 6ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, dar provimento à apelação da parte autora, diferir para a fase de execução a forma de cálculo dos consectários legais, adotando-se inicialmente o índice da Lei 11.960/2009, e determinar o imediato cumprimento do acórdão, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 13 de setembro de 2017.
Juiz Federal Artur César de Souza
Relator
| Documento eletrônico assinado por Juiz Federal Artur César de Souza, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 9094319v40 e, se solicitado, do código CRC 2A296132. | |
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| Signatário (a): | Artur César de Souza |
| Data e Hora: | 15/09/2017 10:28 |
APELAÇÃO CÍVEL Nº 5000919-65.2014.4.04.7112/RS
RELATOR | : | ARTUR CÉSAR DE SOUZA |
APELANTE | : | ELIANA GLADIS PRESTES IBALDO |
ADVOGADO | : | EDUARDO FIGUEIRA GUIMARÃES |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
RELATÓRIO
Trata-se de apelação da parte autora contra sentença (21/10/2016) que julgou improcedente o pedido de pensão por morte, cujo dispositivo reproduzo a seguir:
Ante o exposto, JULGO IMPROCEDENTE o pedido formulado pela autora na inicial, resolvendo o mérito da causa e concluindo a fase cognitiva do processo, nos termos do art. 487, I, do Código de Processo Civil de 2015.
Condeno a parte autora a pagar as custas judiciais e a pagar, em favor dos advogados públicos, honorários advocatícios, restando, sob condição suspensiva de exigibilidade em virtude do deferimento do benefício da assistência judiciária gratuita.
Consoante dispõe o Código de Processo Civil (Lei n. 13.105/2015), por ser ilíquida a presente sentença, os honorários advocatícios serão arbitrados, em desfavor da parte sucumbente, na forma do inciso II do § 4.º do art. 85, ao ensejo da liquidação do julgado.
Sem reexame necessário, ante a improcedência da demanda.
Sustentou, em apertada síntese, que a sentença merece ser reformada, pois restou demonstrado que após a separação litigiosa, o casal se reconciliou e tornaram a manter uma relação estável.
Ademais, alegou que os documentos e os depoimentos confirmam o alegado.
Apresentada as contrarrazões, vieram os autos para esta Corte para julgamento.
É o relatório.
VOTO
Juízo de admissibilidade
O apelo preenche os requisitos legais de admissibilidade.
Objeto da ação
A presente ação se limita à concessão do benefício de pensão por morte em decorrência do falecimento de Antônio Carlos Silveira Viegas, ocorrido em 21/02/2013. Para fins de clareza, transcrevo excerto do relatório da sentença (fl.62):
Eliana Gladis Prestes Ibaldo, devidamente qualificada na petição inicial do presentes autos, pelo procurador regularmente constituído, ajuizou a presente Ação Ordinária contra o INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, visando à obtenção do benefício de pensão por morte, em decorrência do óbito de seu companheiro, Sr. Antônio Carlos Silveira Viegas, em 21/02/2013.
Pensão por Morte
Para a obtenção do benefício de pensão por morte deve a parte interessada preencher os requisitos estabelecidos na legislação previdenciária vigente à data do óbito, consoante iterativa jurisprudência dos Tribunais Superiores e desta Corte.
À época, quando do falecimento de ANTÔNIO CARLOS SILVEIRA VIEGAS, ocorrido em 21/02/2013, a legislação aplicável à espécie - Lei 8.213, de 24 de julho de 1991 (Plano de Benefícios da Previdência Social) - apresentava a seguinte redação:
Art. 74 - A pensão por morte será devida ao conjunto dos dependentes do segurado que falecer, aposentado ou não, a contar da data:
I - do óbito, quando requerida até 30 dias depois deste;
II - do requerimento, quando requerida após o prazo previsto no inciso anterior;
III - da decisão judicial, no caso de morte presumida.
São, portanto, três os requisitos para a concessão do benefício de pensão por morte previdenciária:
a) o óbito (ou morte presumida);
b) a qualidade de segurada da pessoa falecida;
c) a existência de dependentes, na forma prevista no artigo 16, da Lei n. 8.213/1991.
O evento morte está comprovado pela certidão de óbito (evento 1, CERTOBT12, p.1).
A qualidade de segurado de Antônio Carlos Silveira Viegas não foi objeto de debate. Tal condição foi demonstrada por meio de pesquisa Plenus, na qual observo que o de cujus era titular de Aposentadoria por Invalidez Previdenciária (evento 1, INFBEN9, p.1)
A controvérsia, in casu, versa sobre a existência de união estável havida entre a parte autora e o ex-marido/falecido, considerando que a Sra. Eliana e o de cujus foram casados por 30 anos, até se divorciarem. No entanto, a requerente alega que teriam voltado a se relacionar aproximadamente dois anos antes do óbito do segurado, mantendo, a partir desse momento, união estável.
Passo a analisar esta questão, para fins de qualificação da parte autora como dependente do falecido.
No que pertine à qualidade de companheira, a Constituição de 1988 estendeu a proteção dada pelo Estado à família para as entidades familiares constituídas a partir da união estável entre homem e mulher nos seguintes termos:
Art. 226, § 3º: Para efeito da proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre o homem e a mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em casamento.
O legislador ordinário, por sua vez, regulamentou esse dispositivo constitucional na Lei 9.278/96:
Art. 1º É reconhecida como entidade familiar a convivência duradoura, pública e contínua, de um homem e uma mulher, estabelecida como objetivo de constituição da família.
A Lei 8.213/91, em sua redação original, assim definiu companheiro (a):
Art. 16. São beneficiários do Regime Geral de Previdência Social, na condição de dependentes do segurado:
(...)
§3º Considera-se companheira ou companheiro a pessoa que, sem ser casada, mantém união estável com o segurado ou com a segurada, de acordo com o§ 3º do artigo 226 da Constituição Federal.
Já o Decreto 3.048/99 conceituou a união estável deste modo:
Art.16. São beneficiários do Regime Geral de Previdência Social, na condição de dependentes do segurado:
(...)
§ 6º Considera-se união estável aquela verificada entre o homem e a mulher como entidade familiar, quando forem solteiros, separados judicialmente, divorciados ou viúvos, ou tenham prole em comum, enquanto não se separarem.
Ressalto, ainda, que o novo Código Civil disciplinou a matéria consoante dispõem o caput e o §1º do seu art. 1.723:
Art. 1.723. É reconhecida como entidade familiar a união estável entre o homem e a mulher, configurada na convivência pública, contínua e duradoura e estabelecida com o objetivo de constituição de família.
§ 1º. A união estável não se constituirá se ocorrerem os impedimentos do art. 1.521; não se aplicando a incidência do inciso VI no caso de a pessoa casada se achar separada de fato ou judicialmente.
Em qualquer caso, para o reconhecimento da união estável, essencial que haja aparência de casamento, não sendo a coabitação, entretanto, requisito indispensável, consoante demonstra o julgado do STJ abaixo ementado:
DIREITOS PROCESSUAL CIVIL E CIVIL. UNIÃO ESTÁVEL. REQUISITOS. CONVIVÊNCIA SOB O MESMO TETO. DISPENSA. CASO CONCRETO. LEI N. 9.728/96. ENUNCIADO N. 382 DA SÚMULA/STF. ACERVO FÁTICO-PROBATÓRIO. REEXAME. IMPOSSIBILIDADE. ENUNCIADO N. 7 DA SÚMULA/STJ. DOUTRINA. PRECEDENTES. RECONVENÇÃO. CAPÍTULO DA SENTENÇA. TANTUM DEVOLUTUM QUANTUM APELLATUM. HONORÁRIOS. INCIDÊNCIA SOBRE A CONDENAÇÃO. ART. 20, § 3º, CPC. RECURSO PROVIDO PARCIALMENTE.
I - Não exige a lei específica (Lei n. 9.728/96) a coabitação como requisito essencial para caracterizar a união estável. Na realidade, a convivência sob o mesmo teto pode ser um dos fundamentos a demonstrar a relação comum, mas a sua ausência não afasta, de imediato, a existência da união estável.
II - Diante da alteração dos costumes, além das profundas mudanças pelas quais tem passado a sociedade, não é raro encontrar cônjuges ou companheiros residindo em locais diferentes.
III - O que se mostra indispensável é que a união se revista de estabilidade, ou seja, que haja aparência de casamento, como no caso entendeu o acórdão impugnado. (...)
(STJ, Quarta Turma, REsp 474962, Processo: 200200952476/SP, DJ 01-03-2004, Relator Min. SÁLVIO DE FIGUEIREDO TEIXEIRA)
De mais a mais, comprovada a relação concubinária com intuitu familiae, isto é, aquela que apresenta convivência duradoura, pública, contínua e reconhecida como tal pela comunidade na qual convivem os companheiros, presume-se a dependência econômica, como referi alhures, impondo-se à Previdência Social demonstrar que esta não existia. Nesse sentido:
"PREVIDENCIÁRIO. CONCESSÃO DE PENSÃO POR MORTE DE COMPANHEIRO. UNIÃO ESTÁVEL QUANDO DO ÓBITO.
1. A prova material demonstra a convivência "more uxório", sendo presumida a dependência econômica, entre companheiros. (...)"
(Sexta Turma, AC 533327, Processo: 199971000160532/RS, DJU 23-07-2003, Relator Des. Fed. NÉFI CORDEIRO)
"PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. CONDIÇÃO DE SEGURADO ESPECIAL DO DE CUJUS. COMPROVAÇÃO. UNIÃO ESTÁVEL. DEPENDÊNCIA ECONÔMICA PRESUMIDA. (...)
2. A dependência econômica da companheira é presumida (art. 16, I e § 4º e art. 74 da Lei nº 8.213/91). (...)"
(Sexta Turma, AC 572909, Processo: 2001.70.07.002419-0/PR, DJU 23-06-2004, Rel. Des. Fed. NYLSON PAIM DE ABREU)
Ademais, a união estável pode ser demonstrada por testemunhos idôneos e coerentes, informando a existência da relação 'more uxório', uma vez que a Lei nº 8.213/91 apenas exige início de prova material para a comprovação de tempo de serviço. (TRF4, AC 0001256-77.2015.404.9999, Sexta Turma, Relatora Vânia Hack de Almeida, D.E. 29/06/2015).
A fim de comprovar a alegada união estável com o segurado instituidor da pensão, foi realizada audiência de instrução e julgamento em 16/07/2015, oportunidade na qual foram ouvidas três testemunhas.
O depoimento da testemunha Ana Luiza Fontes, apresentou o relato que segue (evento 53, TERMOTRANSCDEP1):
JUIZ: A senhora conhece a dona Eliana, correto?
TESTEMUNHA: Sim.
JUIZ: Da onde e aproximadamente desde quando?
TESTEMUNHA: Da onde ela é vizinha do lado, não é.
JUIZ: Certo.
TESTEMUNHA: Eu fui morar na Ana Néri em 2010.
JUIZ: 2010.
TESTEMUNHA: É, e daí ela foi para lá no final de 2011.
JUIZ: Então ela chegou depois da senhora?
TESTEMUNHA: Sim.
JUIZ: Ela morava sozinha?
TESTEMUNHA: Oi?
JUIZ: ela morava sozinha?
TESTEMUNHA: Não.
JUIZ: Com quem ela morava?
TESTEMUNHA: Com o ex marido que voltou a ser marido.
JUIZ: O ex marido que voltou a ser marido, então vamos esclarecer isso aí. A senhora se refere a quem, a senhora lembra o nome?
TESTEMUNHA: O seu Antonio.
JUIZ: seu Antonio Carlos Silveira Piegas?
TESTEMUNHA: Isso.
JUIZ: Certo. E quando ela foi morar lá em 2011 que a senhora mencionou, ela foi com o seu Antonio?
TESTEMUNHA: Sim.
JUIZ: A senhora mencionou ex marido, eles tiveram um período separados então? TESTEMUNHA: Sim.
JUIZ: Mas quando eles foram morar ali já havia superado essa separação? TESTEMUNHA: Sim.
JUIZ: Já haviam retornado?
TESTEMUNHA: Sim.
JUIZ: Está. A senhora tem conhecimento do motivo da separação? TESTEMUNHA: Não.
JUIZ: Não?
TESTEMUNHA: Não.
JUIZ: eles ficaram muito tempo separados, a senhora tem conhecimento? TESTEMUNHA: Também não.
JUIZ: Também não sabe. Pela proximidade, a senhora soube ou chegou a presenciar o fato de, seja a dona Eliana, seja o seu Antonio ter tido algum tipo de relação extraconjugal, ela tinha namorado e ele namorada, algo do gênero? TESTEMUNHA: Não sei lhe dizer.
JUIZ: A senhora não sabe dizer?
TESTEMUNHA: Não.
JUIZ: Mas aparentemente pra senhora eles viviam como um casal? TESTEMUNHA: Sim, eles viviam como um casal, sim.
JUIZ: A senhora presenciava eles de mãos dadas, juntos?
TESTEMUNHA: Sim... Sim, tomavam chimarrão juntos, mercadinho ali perto de casa iam juntos.
JUIZ: Certo. A senhora sabe quem sustentava a família, o grupo?
TESTEMUNHA: Não, isso eu não sei lhe dizer.
JUIZ: A senhora não sabe.
TESTEMUNHA: Não. JUIZ: A senhora chegou a acompanhar o sepultamento, velório do seu Antonio?
TESTEMUNHA: Não.
JUIZ: Não acompanhou?
TESTEMUNHA: Não.
JUIZ: Mas soube do falecimento dele?
TESTEMUNHA: Sim.
JUIZ: Doutor?
DEFESA: Excelência... Quanto tempo, depois que voltaram, viveram juntos na casa?
JUIZ: A senhora pode responder?
TESTEMUNHA: Em torno de dois anos, dois anos e meio até o falecimento dele. JUIZ: Eles foram para essa casa então, que é sua vizinha?
TESTEMUNHA: Sim... É vizinha.
JUIZ: E depois não saíram de lá?
TESTEMUNHA: Não.
JUIZ: Daí veio a acontecer o óbito do seu Antonio?
TESTEMUNHA: Sim. DEFESA: Satisfeito, doutor.
No depoimento da testemunha Helena Lima Ribeiro, por sua vez, foram referidas estas informações (evento 53, TERMOTRANSCDEP2):
JUIZ: A senhora conhece a dona Eliana da onde, de que local e aproximadamente desde quando?
TESTEMUNHA: Ah, desde quando eu não lembro, eu a conheço quando passa pela rua assim, ela é minha vizinha.
JUIZ: São vizinhas?
TESTEMUNHA: São vizinhas longe ali, quando ela passa que eu a conheço.
JUIZ: Muito longe?
TESTEMUNHA: É, longe assim...
JUIZ: É muito longe que a senhora mora?
TESTEMUNHA: Longe, longe não, é na mesma rua.
JUIZ: Na mesma rua.
TESTEMUNHA: Sim.
JUIZ: A senhora conheceu o seu Antonio Carlos Silveira Piegas?
TESTEMUNHA: Sim.
JUIZ: Da onde?
TESTEMUNHA: Da onde que ela mora, junto com ela.
JUIZ: Morava junto com ela?
TESTEMUNHA: Morava junto com ela.
JUIZ: Qual era o relacionamento deles?
TESTEMUNHA: Olha, não sei, aparentemente era bem...
JUIZ: Não, eu lhe digo familiares, irmãos, amigos?
TESTEMUNHA: Eles eram casados.
JUIZ: Eles eram casados?
TESTEMUNHA: Casados, sim.
JUIZ: A senhora chegou a acompanhar, enfim, as homenagens póstumas pelo falecimento do seu Antonio, sepultamento, velório?
TESTEMUNHA: Não cheguei a ir.
JUIZ: Não chegou a ir?
TESTEMUNHA: Não.
JUIZ: A senhora, então, pelo que observava eles eram casados, é isso? TESTEMUNHA: Sim.
JUIZ: Como é que a senhora chegou a essa conclusão, isso lhe foi comentado pela dona Eliana ou pela aparência de vida que eles mantinham, se foi possível...? TESTEMUNHA: Pela aparência de vida que eles tinham, que eles estavam, saíam juntos, às vezes a gente os encontrava juntos.
JUIZ: Certo.
TESTEMUNHA: Isso aí.
JUIZ: A senhora tem conhecimento de que eles foram por um determinado período divorciados?
TESTEMUNHA: Sim.
JUIZ: A senhora soube dessa situação, como se desenvolveu isso?
TESTEMUNHA: Pelos outros assim, um comentário, que a gente ficou sabendo. JUIZ: O que comentavam, a senhora sabe?
TESTEMUNHA: Que eles tinham separado.
JUIZ: E ficaram muito tempo separados para depois retornar?
TESTEMUNHA: ah, isso eu não lembro bem, mas eles ficaram um tempinho separados, não lembro.
JUIZ: Certo. A senhora sabe se eles tiveram filhos?
TESTEMUNHA: Sim.
JUIZ: A situação dos filhos a senhora conhece?
TESTEMUNHA: Mais ou menos, assim.
JUIZ: Ainda que por terceiros, a senhora chegou a ouvir comentários aqui ou acolá de que a dona Eliana ou o seu Antonio pudessem ter alguma relação extraconjugal com outra pessoa?
TESTEMUNHA: Não, nunca ouvi nada.
JUIZ: Nunca ouviu nada?
TESTEMUNHA: Não, nunca ouvi nada.
JUIZ: Doutor?
DEFESA: Supondo nessa separação, quanto tempo mais ou menos ele retornou para a casa da dona Eliana?
JUIZ: A senhora tem conhecimento?
TESTEMUNHA: Eu acho que foi uns dois, três anos.
JUIZ: Quem saiu de casa então foi o seu Antonio?
TESTEMUNHA: Sim.
DEFESA: Satisfeito, doutor.
A testemunha Gerson Brasil Alves por fim, prestou depoimento com o seguinte teor (evento 53, TERMOTRANSCDEP3):
JUIZ: O senhor conhece a dona Eliana?
TESTEMUNHA: Sim, eu era barbeiro do seu Antonio.
JUIZ: Barbeiro?
TESTEMUNHA: Isso.
JUIZ: Seu Antonio... Seu Antonio Carlos Silveira
Piegas?
TESTEMUNHA: Isto.
JUIZ: O senhor sabe qual a relação do seu Antonio com a dona Eliana?
TESTEMUNHA: Seu Antonio era o esposo.
JUIZ: Esposo?
TESTEMUNHA: Isso, da dona Eliana.
JUIZ: como é que chegou essa informação ao senhor?
TESTEMUNHA: Eu, lá por 2010 comecei a cortar o cabelo do seu Antonio em casa, antes disso ele cortava comigo na minha barbearia.
JUIZ: Certo.
TESTEMUNHA: E aí como eu comecei a atender a domicílio, daí eu conheci a dona Eliana, na residência deles lá.
JUIZ: Certo, eles moravam juntos?
TESTEMUNHA: Sim.
JUIZ: Havia mais alguém que morasse com eles na casa?
TESTEMUNHA: Não.
JUIZ: O senhor recorda se a dona Eliana lhe foi apresentada como familiar ou exatamente como esposa?
TESTEMUNHA: Ele me apresentou como a esposa.
JUIZ: Como esposa dele?
TESTEMUNHA: Sim, quando eu ia cortar o cabelo dele lá.
JUIZ: Certo, e toda vez ela estava sempre lá?
TESTEMUNHA: Sim, sim.
JUIZ: qual era a frequência que o senhor ia na casado seu Antonio?
TESTEMUNHA: Era mensal, uma vez por mês.
JUIZ: Uma vez por mês?
TESTEMUNHA: Sim.
JUIZ: O senhor tem conhecimento de que eles chegaram em um determinado momento a se divorciar, separaram-se?
TESTEMUNHA: Não, não tenho esse conhecimento.
JUIZ: Desconhece?
TESTEMUNHA: Sim.
JUIZ: O senhor sabe por comentários de terceiros ou pessoas estranhas, enfim, se a dona Eliana ou o seu Antonio tinham um relacionamento com outra pessoa, algo do gênero?
TESTEMUNHA: Não.
JUIZ: Não... Doutor?
DEFESA: Há quanto tempo ele conhece o seu Antonio?
JUIZ: Pode responder.
TESTEMUNHA: Olha, já faz... Olha, desde que eu cortava o cabelo na minha barbearia lá... Foi bem antes, bem antes de 2010 eu já cortava o cabelo dele, bem antes acho que uns... Não dá para calcular certo, porque eu tenho que olhar na minha agenda de clientes também, como eu não tinha uma intimidade...
JUIZ: O que o senhor lembrar é o suficiente...
TESTEMUNHA: Em torno de 10...
DEFESA: Satisfeito, doutor.
JUIZ: Pois não?
TESTEMUNHA: Em torno eu acho que de 10 anos, eu acho.
Esses testemunhos já seriam suficientes à comprovação da união estável. Porém, há outros elementos nos autos que confirmam idêntico propósito, a saber:
a) Averbação do Divórcio na Certidão de Casamento, em 23 de maio de 2014 (Evento 9 - CERTCAS1, pág. 02);
b) Cédula de Crédito Bancário do Banco BMG, emitida no ano de 2008 em nome do falecido (Evento 9 - OUT23, p.1);
c) Comprovante de residência da requerente datado de 2012 (Evento 9 - OUT24);
d) Nota Fiscal das despesas funerárias, suportadas pela requerente (Evento 9 - OUT23, p.1);
e) Carta expedida pelo INSS em 20/06/2013 negando pedido administrativo de Pensão por Morte formulado pela autora em 14/03/20113 (evento 9, OUT25, P.1).
Com efeito, analisando detidamente o acervo probatório, crível a alegação de que a autora e o falecido conviveram em união estável até o óbito deste. A separação do casal, ao que tudo indica, de fato não teve o condão de caracterizar à sociedade local a dissolução do casamento, pois os depoimentos colhidos na audiência de instrução e julgamento referiam-se sempre à convivência do casal como marido e mulher, hipótese ancorada principalmente no depoimento de Gerson Brasil Alves, barbeiro do falecido que frequentava mensalmente a casa do casal, podendo, in loco, confirmar a união havida entre a ELIANA e ANTÔNIO.
Ademais, os elementos instrutórios do feito dão conta de que a requerente e o falecido segurado, além de manterem uma relação de confiança recíproca, conviviam publicamente, com laços afetivos contínuos e duradouros e estabelecidos com o objetivo de constituição familiar, em condições que configuram o reconhecimento da união estável, nos termos do art. 1.723 do CC.
Assim, encontra-se perfeitamente evidenciada a união estável pela produção da prova testemunhal em juízo, o que é suficiente para considerar cumprido o requisito legal para a concessão do benefício, devendo ser reformada a sentença de improcedência para conceder à ELIANA GLADIS PRESTES IBALDO o benefício de Pensão por Morte.
Termo inicial
A situação fática estava sob a regência normativa do artigo 74, I, Lei 8.213/91 - do óbito, quando requerida até 30 dias depois deste, tendo em vista que não transcorrera mais de 30 dias entre o óbito em 21/02/2013 e o requerimento administrativo em 14/03/2013.
Assim, o termo inicial do benefício é a data do óbito em 21/02/2013.
Como a parte autora logrou êxito na integralidade do pedido, invertem-se os ônus da sucumbência, nos termos do art. 86, parágrafo único, do novo Código de Processo Civil (CPC), para condenar a requerida ao pagamento de custas e honorários advocatícios, como segue.
Correção monetária e juros de mora
A questão da atualização monetária das quantias a que é condenada a Fazenda Pública, dado o caráter acessório de que se reveste, não deve ser impeditiva da regular marcha do processo no caminho da conclusão da fase de conhecimento.
Firmado em sentença, em apelação ou remessa oficial o cabimento dos juros e da correção monetária por eventual condenação imposta ao ente público e seus termos iniciais, a forma como serão apurados os percentuais correspondentes, sempre que se revelar fator impeditivo ao eventual trânsito em julgado da decisão condenatória, pode ser diferida para a fase de cumprimento, observando-se a norma legal e sua interpretação então em vigor. Isso porque é na fase de cumprimento do título judicial que deverá ser apresentado, e eventualmente questionado, o real valor a ser pago a título de condenação, em total observância à legislação de regência.
O recente art. 491 do NCPC, ao prever, como regra geral, que os consectários já sejam definidos na fase de conhecimento, deve ter sua interpretação adequada às diversas situações concretas que reclamarão sua aplicação. Não por outra razão seu inciso I traz exceção à regra do caput, afastando a necessidade de predefinição quando não for possível determinar, de modo definitivo, o montante devido. A norma vem com o objetivo de favorecer a celeridade e a economia processuais, nunca para frear o processo.
E no caso, o enfrentamento da questão pertinente ao índice de correção monetária, a partir da vigência da Lei 11.960/09, nos débitos da Fazenda Pública, embora de caráter acessório, tem criado graves óbices à razoável duração do processo, especialmente se considerado que pende de julgamento no STF a definição, em regime de repercussão geral, quanto à constitucionalidade da utilização do índice da poupança na fase que antecede a expedição do precatório (RE 870.947, Tema 810).
Tratando-se de débito, cujos consectários são totalmente regulados por lei, inclusive quanto ao termo inicial de incidência, nada obsta a que sejam definidos na fase de cumprimento do julgado, em que, a propósito, poderão as partes, se assim desejarem, mais facilmente conciliar acerca do montante devido, de modo a finalizar definitivamente o processo.
Sobre esta possibilidade, já existe julgado da Terceira Seção do STJ, em que assentado que "diante a declaração de inconstitucionalidade parcial do artigo 5º da Lei n. 11.960/09 (ADI 4357/DF), cuja modulação dos efeitos ainda não foi concluída pelo Supremo Tribunal Federal, e por transbordar o objeto do mandado de segurança a fixação de parâmetros para o pagamento do valor constante da portaria de anistia, por não se tratar de ação de cobrança, as teses referentes aos juros de mora e à correção monetária devem ser diferidas para a fase de execução. 4. Embargos de declaração rejeitados". (EDcl no MS 14.741/DF, Rel. Ministro JORGE MUSSI, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 08/10/2014, DJe 15/10/2014).
Na mesma linha vêm decidindo as duas turmas de Direito Administrativo desta Corte (2ª Seção), à unanimidade, (Ad exemplum: os processos 5005406-14.2014.404.7101 3ª Turma, julgado em 01-06-2016 e 5052050-61.2013.404.7000, 4ª Turma, julgado em 25/05/2016)
Portanto, em face da incerteza quanto ao índice de atualização monetária, e considerando que a discussão envolve apenas questão acessória no contexto da lide, à luz do que preconizam os art. 4º, 6º e 8º do novo Código de Processo Civil, mostra-se adequado e racional diferir-se para a fase de execução a decisão acerca dos critérios de correção, ocasião em que, provavelmente, a questão já terá sido dirimida pelo Tribunal Superior, o que conduzirá à observância, pelos julgadores, ao fim e ao cabo, da solução uniformizadora.
A fim de evitar novos recursos, inclusive na fase de cumprimento de sentença, e anteriormente à solução definitiva pelo STF sobre o tema, a alternativa é que o cumprimento do julgado se inicie, adotando-se os índices da Lei nº 11.960/2009, inclusive para fins de expedição de Precatório ou RPV pelo valor incontroverso, diferindo-se para momento posterior ao julgamento pelo STF a decisão do juízo sobre a existência de diferenças remanescentes, a serem requisitadas, acaso outro índice venha a ter sua aplicação legitimada.
Os juros de mora, incidentes desde a citação, como acessórios que são, também deverão ter sua incidência garantida na fase de cumprimento de sentença, observadas as disposições legais vigentes conforme os períodos pelos quais perdurar a mora da Fazenda Pública.
Evita-se, assim, que o presente feito fique paralisado, submetido a infindáveis recursos, sobrestamentos, juízos de retratação, e até ações rescisórias, com comprometimento da efetividade da prestação jurisdicional, apenas para solução de questão acessória.
Diante disso, difere-se para a fase de cumprimento de sentença a forma de cálculo dos consectários legais, adotando-se inicialmente o índice da Lei nº 11.960/2009.
Honorários Advocatícios
Incide, no caso, a sistemática de fixação de honorários advocatícios prevista no art. 85 do NCPC, porquanto a sentença foi proferida após 21/10/2016 (data da vigência do NCPC definida pelo Pleno do STJ em 02/04/2016).
Invertidos os ônus sucumbenciais, estabeleço a verba honorária em 15% (quinze por cento) sobre as parcelas vencidas até a data do presente julgado, considerando as variáveis dos incisos I a IV do §2º do artigo 85 do NCPC.
Custas e despesas processuais
O INSS é isento do pagamento das custas processuais no Foro Federal (art. 4º, I, da Lei n.º 9.289/96), devendo restituir os honorários periciais.
Cumprimento imediato do julgado (tutela específica)
Considerando a eficácia mandamental dos provimentos fundados no art. 497 do novo CPC, que repete dispositivo constante do art. 461 do antigo CPC, e tendo em vista que a presente decisão não está sujeita, em princípio, a recurso com efeito suspensivo (TRF4, 3ª Seção, Questão de Ordem na AC n. 2002.71.00.050349-7/RS, Rel. para o acórdão Des. Federal Celso Kipper, julgado em 09/08/2007), determino o cumprimento imediato do acórdão, a ser efetivado em 45 dias, mormente pelo seu caráter alimentar e necessidade de efetivação imediata dos direitos sociais fundamentais.
Prequestionamento
O prequestionamento da matéria segue a sistemática prevista no art. 1.025 do CPC/2015.
Conclusão
Dar provimento à apelação da parte autora para conceder o benefício de pensão por morte desde o óbito em 21/02/2013. Os honorários advocatícios foram majorados em 15% (quinze por cento) sobre as parcelas vencidas, diante da sucumbência do INSS.
Restou diferida para a para a fase de execução a forma de cálculo dos consectários legais, adotando-se inicialmente o índice da Lei 11.960/2009.
O INSS é isento do pagamento das custas processuais no Foro Federal (art. 4º, I, da Lei n.º 9.289/96), devendo restituir os honorários periciais.
Dispositivo
Ante o exposto, voto por dar provimento à apelação da parte autora, diferir para a fase de execução a forma de cálculo dos consectários legais, adotando-se inicialmente o índice da Lei 11.960/2009, e determinar o imediato cumprimento do acórdão.
Juiz Federal Artur César de Souza
Relator
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 13/09/2017
APELAÇÃO CÍVEL Nº 5000919-65.2014.4.04.7112/RS
ORIGEM: RS 50009196520144047112
RELATOR | : | Juiz Federal ARTUR CÉSAR DE SOUZA |
PRESIDENTE | : | Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA |
PROCURADOR | : | Dr. Carlos Eduardo Copetti Leite |
APELANTE | : | ELIANA GLADIS PRESTES IBALDO |
ADVOGADO | : | EDUARDO FIGUEIRA GUIMARÃES |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 13/09/2017, na seqüência 457, disponibilizada no DE de 22/08/2017, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, a DEFENSORIA PÚBLICA e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 6ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU DAR PROVIMENTO À APELAÇÃO DA PARTE AUTORA, DIFERIR PARA A FASE DE EXECUÇÃO A FORMA DE CÁLCULO DOS CONSECTÁRIOS LEGAIS, ADOTANDO-SE INICIALMENTE O ÍNDICE DA LEI 11.960/2009, E DETERMINAR O IMEDIATO CUMPRIMENTO DO ACÓRDÃO.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Juiz Federal ARTUR CÉSAR DE SOUZA |
VOTANTE(S) | : | Juiz Federal ARTUR CÉSAR DE SOUZA |
: | Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA | |
: | Juíza Federal TAÍS SCHILLING FERRAZ |
Lídice Peña Thomaz
Secretária de Turma
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