
Apelação Cível Nº 5002477-50.2024.4.04.7200/SC
PROCESSO ORIGINÁRIO: Nº 5002477-50.2024.4.04.7200/SC
RELATOR: Desembargador Federal SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ
RELATÓRIO
O feito foi assim relatado na origem:
Trata-se de pedido de revisão de benefício de aposentadoria por incapacidade permanente, para que seja observada a regra de cálculo anterior à EC 103-2019.
Sustenta que a incapacidade permanente é anterior a 12-11-2019, bem como a inconstitucionalidade da regra do art. 26 da EC 103-2019.
Foi realizada perícia judicial.
O INSS, em contestação, alega em suma que deve ser observada a lei vigente ao tempo da ocorrência do fato gerador, no caso a invalidez. Fundamentou acerca da constitucionalidade da alteração promovida pela EC 103-2019.
Após a réplica, vieram os autos conclusos para sentença.
É o breve relatório. Passo a decidir.
Sobreveio sentença de procedência dos pedidos, nos seguintes termos (evento 35):
Ante o exposto, JULGO PROCEDENTE O PEDIDO formulado na presente ação, e extingo o processo com fulcro no art. 487, I, do CPC, para condenar o INSS a:
a) revisar o benefício de aposentadoria por incapacidade permanente de titularidade do autor (NB 637.847.661-0), observado o direito adquirido antes da EC 103-19, para que corresponda a 100% do salário de benefício do auxílio-doença NB 623.816.421-6;
b) pagar os valores atrasados desde a DIB (19-01-2022), descontados os valores recebidos na via administrativa, que serão apurados na fase de cumprimento.
Em razão do julgamento pelo plenário do STF dos Embargos de Declaração no RE 870.947, em 03-10-2019, definindo o tema 810, e da tese firmada no Tema 905 STJ, incide atualização monetária pelo INPC nos benefícios previdenciários e pelo IPCA-E nos assistenciais.
Juros de mora, contados a partir da citação, devidos no percentual de 0,5% ao mês, nos termos do art. 1º-F da Lei nº 9.494-1997, no período de julho-2009 a abril-2012, a partir de quando passam a seguir o mesmo percentual de juros incidentes sobre a caderneta de poupança, ou seja, 0,5% ao mês, enquanto a taxa SELIC seja superior a 8,5% ao ano, ou 70% da taxa SELIC ao ano, mensalizada, nos demais casos (MP nº 567-2012, convertida na Lei nº 12.703-2012).
Por força do art. 3º da EC nº 113-2021, a contar de 09-12-2021, aplicação da SELIC, uma única vez, englobando correção monetária e juros moratórios.
Transitada em julgado, o pagamento dos atrasados deve observar o Tema 755 do STF.
O benefício da gratuidade da justiça foi deferido no evento 5.
Condeno o INSS ao pagamento dos honorários advocatícios no montante equivalente a 10% dos atrasados, considerando as prestações vencidas até a sentença (Súmula 111 do STJ).
Publicação e registro eletrônicos. Intimem-se.
Certificado o trânsito em julgado da ação e não remanescendo quaisquer providências a serem adotadas, arquivem-se os autos.
Irresignado, o INSS apela. Em suas razões, a autarquia requer a suspensão do feito, em razão do Recurso Extraordinário 1.400.392/SC E TNU - PUIL Nº 5004228-75.2020.4.04.7115/RS, uma vez que se discute a sistemática de cálculo da RMI da aposentadoria por incapacidade permanente, considerando que o fato gerador de tal benefício seria posterior à entrada em vigência da EC 103/2019 (evento 41). Aduz que:
Considerando que a data de início da incapacidade permanente foi corretamente fixada em 2022 e que não existem elementos técnicos capazes de justificar a alteração dessa data, conclui-se que o cálculo da RMI da aposentadoria por incapacidade permanente com base no artigo 26, § 2º, inciso III, da EC 103/2019 não admite revisão.
Sem contrarrazões, vieram os autos a este Tribunal para julgamento.
É o relatório.
VOTO
A sentença julgou procedente os pedidos para o fim de determinar ao INSS:
a) revisar o benefício de aposentadoria por incapacidade permanente de titularidade do autor (NB 637.847.661-0), observado o direito adquirido antes da EC 103-19, para que corresponda a 100% do salário de benefício do auxílio-doença NB 623.816.421-6;
b) pagar os valores atrasados desde a DIB (19-01-2022), descontados os valores recebidos na via administrativa, que serão apurados na fase de cumprimento.
A autarquia requer a suspensão do feito, em razão do Recurso Extraordinário 1.400.392/SC E TNU - PUIL Nº 5004228-75.2020.4.04.7115/RS, uma vez que se discute a sistemática de cálculo da RMI da aposentadoria por incapacidade permanente, considerando que o fato gerador de tal benefício seria posterior à entrada em vigência da EC 103/2019 (evento 41).
Pois bem.
Extrai-se do CNIS do autor:
Verifica-se que o autor recebeu benefício por incapacidade desde 2018, em razão das mesmas moléstias.
A sentença apelada assim consignou:
Inicialmente, a controvérsia dos autos diz respeito à data de início da incapacidade permanente.
O perito judicial afirmou que a data de início da incapacidade temporária foi em 29-06-2018, e a permanente em 05-01-2022, justificando (evento 21, LAUDOPERIC1):
Conclui-se que NÃO é possível retroagir a incapacidade permanente para 2019, sendo que o caráter permanente da incapacidade pode ser definido somente a partir da última internação em 05/01/2022.
Contudo, a análise atenta do histórico das perícias administrativas (evento 2) permite a ponderação do laudo judicial e a conclusão de que a incapacidade permanente é anterior à EC 103-19.
O autor recebeu benefício auxílio-doença entre os anos de 2009 a 2013 e depois quase que initerruptamente a contar de 20-04-2016, até a conversão em aposentadoria por incapacidade permanente em 19-01-2022, sempre em razão de doença psiquiátrica (transtorno afetivo bipolar).
Colhe-se da perícia administrativa realizada em 11-06-2019 que já havia indicação de LI (limite indefinido), é dizer, incapacidade permanente (evento 2, LAUDO1, fl 49):
EXAME FISICO: mantém relato de ideação suicida , humor claramente rebaixado, discurso bastante melancolico, sem sinais de alt da sensopercepção anedonia intensa descriação de deficit de memoria
CONSIDERACOES: Ja teve varios BIs pela Bipolaridade 2009-2013 e desde 04/2016 teve curtos períodos de labor. 4 internações psiquiatricas, algumas tentativas de suicídio com atendimento pela emergencia Bancário, necessita cognição adequada, e não acredito que possa tê-la com carga terapeutica atual Diante de todo o histórico, da ampla sintomatologia hoje apresentada, da ampla gama de medicações em uso. Acato sugestão de médico assistente e concordo com manutenção de incapacidade , não elegível a reabilitação no momento.Por tratar-s de PPMRES , fixo LI (grifei)
Posteriormente houve a prorrogação do benefício de auxílio-doença, sendo que na perícia seguinte, em 19-01-2022, foi reafirmada a indicação de LI.
Registro as informações da perícia administrativa (evento 2, LAUDO1, fl 53):
EXAME FISICO: Lúcido, orientado, contactuante, com diálogo lógico e coerente, sem interrupções da linha de raciocínio. Humor estável mas rebaixado juízo crítico e pragmatismo prejudicados pelas ideias suicidas e pelo uso de medicamento psicoativos. Inspeção:REG, corado, hidratado, anictérico, acianótico, afebril, eupneico. Sonolento, tletárgico e disperso.
CONSIDERAÇÃO: Segurado internado no Instituto São José pela 4ª vez. Esta desde 07/01/22 por quadro depressivo e ideias suicidas com planos de morte. Segurado com idade já avançada e com comportamento deteriorado pelo quadro de depressão de longa dada e já sem capacidade laborativa residual Conduta: Indico LI. (grifei).
Portanto, não foi apenas com a última internação médica, como concluiu o perito judicial, que o autor pode ser considerado total e permanentemente incapaz, vez que já havia indicação pela própria perícia administrativa do réu em 11-06-2019 da insuscetibilidade de melhora do quadro clínico do autor.
Assim, é possível concluir que havia incapacidade permanente antes de 13-11-2019, é dizer, inaplicáveis das regras da Emenda Constitucional 103-19.
Em conclusão, deve ser observado o direito adquirido à norma de cálculo anterior mais benéfica, de modo que o valor do benefício corresponda a 100% do salário de benefício do auxílio-doença antecedente (NB 623.816.421-6).
Por fim, resta prejudicada a análise da inconstitucionalidade da regra do art. 26 da EC 103-2019.
Ocorre que, diferentemente do que sustenta a autarquia, o caso não é o de concessão de aposentadoria por incapacidade permanente após o advento da Emenda Constitucional nº 103/2019, desvinculada de benefício por incapacidade anterior.
A situação é a de conversão de sucessivos auxílios por incapacidade temporária em aposentadoria por incapacidade permanente, havendo o primeiro sido concedido ainda em 2009, verificando-se a piora do estado de saúde da autora em 2018, de modo que a inaptidão tornou-se definitiva em janeiro/2022, fazendo-se necessária a conversão em aposentadoria desde então.
Em casos tais, esta Turma, no âmbito do Colegiado ampliado, sob o rito do artigo 942 do Código de Processo Civil, concluiu que, na conversão do auxílio por incapacidade temporária em aposentadoria por incapacidade permanente realizada após a EC 103/2019, a RMI observará as regras que lhe são anteriores quando o fato gerador da inaptidão laboral for anterior à vigência da referida Emenda Constitucional.
A propósito, confira-se a respectiva ementa do julgado em questão:
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR INCAPACIDADE PERMANENTE. RMI. VIGÊNCIA DA EC 103/19. INAPLICABILIDADE. INCAPACIDADE ANTERIOR À REFORMA PREVIDENCIÁRIA. JULGAMENTO NA FORMA DO ART. 942 DO CPC.
1. Se a incapacidade foi constatada antes da vigência da reforma previdenciária de 2019, a RMI não deve ser calculada nos termos da redação do art. 26, § 2º, da EC 103/2019, em observância ao princípio tempus regit actum.
2. Na conversão de auxílio-doença em aposentadoria por incapacidade permanente, após a EC 103/2019, o valor do novo benefício não pode ser inferior ao concedido anteriormente, sob pena de afronta ao princípio da proporcionalidade e da irredutibilidade do do valor dos benefícios previdenciários.
3. Hipótese em que a parte autora vinha auferindo benefício previdenciário por incapacidade desde setembro de 2016.
(TRF4, AC 5005522-52.2021.4.04.7205, NONA TURMA, Relator para Acórdão PAULO AFONSO BRUM VAZ, juntado aos autos em 02/06/2022)
Assim sendo, de fato, não é o caso de incidência do artigo 26, § 2º, da EC 103/2019, em observância ao princípio tempus regit actum.
Nessa perspectiva, impõe-se a confirmação da sentença de procedência.
Por fim, resta prejudicada a análise da inconstitucionalidade da regra do art. 26 da EC 103/2019.
Honorários Recursais
Em face da sucumbência recursal do INSS, majoro, em 10% (dez por cento), o valor dos honorários advocatícios arbitrados em seu desfavor, na sentença.
Dispositivo
Ante o exposto, voto por negar provimento à apelação.
Documento eletrônico assinado por SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40004730735v3 e do código CRC 9480055f.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ
Data e Hora: 14/11/2024, às 9:31:10
Conferência de autenticidade emitida em 12/12/2024 21:22:52.
Identificações de pessoas físicas foram ocultadas

Apelação Cível Nº 5002477-50.2024.4.04.7200/SC
PROCESSO ORIGINÁRIO: Nº 5002477-50.2024.4.04.7200/SC
RELATOR: Desembargador Federal SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. DIB. CONDIÇÕES PESSOAIS. INCAPACIDADE TOTAL E PERMANENTE. PRECEDIDA DE AUXÍLIO POR INCAPACIDADE TEMPORÁRIA. FATO GERADOR DA INCAPACIDADE ANTERIOR À EC 103/2019. CÁLCULO DA RMI. TEMPUS REGIT ACTUM.
1. A questão trazida nos autos deve ser analisada de forma contextualizada, considerando-se as condições pessoais do autor, que conta com idade avançada e apresenta histórico de doença crônica progressiva.
2. A aposentadoria por incapacidade permanente do autor, decorre da conversão de benefício por incapacidade temporária, remontando a inaptidão laboral a momento anterior ao advento da reforma previdenciária de 2019.
3. Tendo em vista que o fato gerador da incapacidade ocorreu antes da vigência da EC nº 103/2019, a RMI da aposentadoria do autor não deve ser calculada nos termos da redação do artigo 26, § 2º, da EC nº 103/2019, em observância ao princípio tempus regit actum, mas, sim, em conformidade com a legislação vigente na data de início da incapacidade, malgrado a concessão ou conversão ocorra após a vigência da referida Emenda.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 9ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, negar provimento à apelação, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Florianópolis, 12 de novembro de 2024.
Documento eletrônico assinado por SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40004730736v3 e do código CRC 0026cf27.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ
Data e Hora: 14/11/2024, às 9:31:10
Conferência de autenticidade emitida em 12/12/2024 21:22:52.
Identificações de pessoas físicas foram ocultadas

EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 05/11/2024 A 12/11/2024
Apelação Cível Nº 5002477-50.2024.4.04.7200/SC
RELATOR: Desembargador Federal SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ
PRESIDENTE: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ
PROCURADOR(A): MARCELO VEIGA BECKHAUSEN
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 05/11/2024, às 00:00, a 12/11/2024, às 16:00, na sequência 1063, disponibilizada no DE de 23/10/2024.
Certifico que a 9ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A 9ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO.
RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ
Votante: Desembargador Federal SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ
Votante: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ
Votante: Desembargador Federal CELSO KIPPER
ALEXSANDRA FERNANDES DE MACEDO
Secretária
Conferência de autenticidade emitida em 12/12/2024 21:22:52.
Identificações de pessoas físicas foram ocultadas