Apelação/Remessa Necessária Nº 5080144-05.2016.4.04.7100/RS
RELATOR: Desembargador Federal RÔMULO PIZZOLATTI
APELANTE: CATSUL GUAIBA - TRANSPORTES HIDROVIARIOS LTDA (IMPETRANTE)
ADVOGADO: JOÃO JOAQUIM MARTINELLI
APELANTE: UNIÃO - FAZENDA NACIONAL (INTERESSADO)
APELADO: OS MESMOS
MPF: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL (MPF)
RELATÓRIO
Catsul Guaíba - Transportes Hidroviários Ltda. formulou os seguintes pedidos em mandado de segurança impetrado contra o Delegado da Receita Federal do Brasil em Porto Alegre/RS:
f) Ao final, seja CONCEDIDA A SEGURANÇA, para:
f.1) Determinar que a Autoridade Coatora se abstenha de efetuar a cobrança do RAT Ajustado, em face da aplicação do Fator Acidentário de Prevenção, por total inconstitucionalidade e ilegalidade do art. 10 da Lei 10.666/03, determinando que retorne à exigibilidade da contribuição nos moldes do art. 22, II, da Lei nº 8.212/91 anteriores a aplicabilidade do indigitado dispositivo ora atacado;
f.2) Alternativa e/ou subsidiariamente:
(f.2.1) determinar a suspensão da vigência do Fator Acidentário de Prevenção – FAP tendo em vista a falta de disponibilização de todos os elementos necessários para a conferência do cálculo do FAP, conforme razões expostas na presente exordial, até que tais elementos sejam disponibilizados e ofertados o direito de defesa à Impetrante;
(f.2.2) declarar e determinar que seja dado efeito suspensivo a(s) defesa(s)/impugnação (ões) das Impetrantes que forem interpostas, após a divulgação de todos os dados, em razão das alíquotas e/ou enquadramentos estabelecidos pela Administração até que seja proferida decisão pelo Ministério da Previdência Social, por contrariar diretamente o disposto no art. 202-A, par 5º do Decreto n. 3048/99. Referida suspensão da vigência do FAP, não acarretará a obrigatoriedade da Impetrante efetuar o recolhimento retroativo, após a elucidação do cálculo do FAP;
(f.2.3) em face da suspensão nos moldes dos itens acima, determinar que retorne a exigibilidade da contribuição nos moldes do art. 22, II, da Lei nº 8.212/91 anteriores a aplicabilidade do indigitado dispositivo ora atacado; e,
(f.2.4) determinar a ilegalidade da metodologia do FAP aprovada pelo Conselho Nacional de Previdência Social, excluindo-se da base de dados para cômputo do cálculo do FAP todos os acidentes de trajeto; desligamento do funcionário antes da concessão do benefício; as Comunicações de Acidente de Trabalho emitidas e que não implicaram em afastamentos pela Previdência Social; e, defesas apresentadas em face da caracterização de Nexo Técnico Epidemiológico Previdenciário pendentes de julgamento pelo INSS.
g) Em função do deferimento dos pedidos contidos nos itens anteriores, digne-se Vossa Excelência em determinar a restituição às Impetrantes de todos os valores recolhidos indevidamente a este título, via compensação10, com a devida correção monetária pela taxa SELIC, ou outro índice que venha a substituí-la, incidindo juros e expurgos admitidos pelo Judiciário, com demais tributos administrados pela SRFB;
Ao final (evento 28, SENT1), o MM. Juiz Federal Tiago Scherer, da 14ª Vara Federal de Porto Alegre/RS, concedeu em parte o mandado de segurança para declarar a ilegalidade da inclusão, no cálculo do Fator Acidentário de Prevenção – FAP aplicável à impetrante, dos registros de acidentes de trabalho derivados da aplicação de Nexo Técnico Epidemiológico sobre os quais haja impugnação pendente de análise na via administrativa. Reconheceu-se ainda que Eventuais valores recolhidos a maior em decorrência da revisão do FAP resultante desta decisão deverão ser compensados pela impetrante, atualizados na forma da fundamentação e observado o art. 74 da Lei 9.430/96.
Apelaram as partes. Em suas razões recursais (evento 40, APELAÇÃO1), a impetrante alega que (a) a Lei nº 10.666, de 2003, ao delegar fixação da alíquota a uma fórmula variável de empresa para empresa, fixando apenas parâmetros mínimos e máximos, conferiu ao Fisco Federal o poder de aumentar o tributo, violando o art. 150, I da CF/88; (b) não houve publicidade das informações utilizadas para cálculo do FAP, o que constitui violação ao art. 202-A, §5º do decreto 3.048, de 1999; (c) depende da divulgação do nordem - posição do índice do ordenamento da empresa na sua subclasse - para que se possa conferir se os róis de percentis divulgados estão corretos; (d) a previsão contida na Lei 10.666, de 2003, a qual condicionou a possibilidade de flexibilização das alíquotas da Contribuição ao SAT, vai de encontro com a vedação do aumento do tributo com caráter punitivo, imposta pelo art.3º do CTN; (e) não devem ser incluídos no computo do cálculo do FAP as CAT’s referentes a acidentes de trabalho e nem as CAT’s emitidas que não implicaram em afastamento pela Previdência Social. Pede o prequestionamento dos arts. 3º, 97 e 142 do CTN, do art. 202-A, § 5º do Decreto 3048/1999, do Decreto 6.042, de 2007, da Lei 10.666, de 2003, e do art. 150, I, da Constituição Federal.
A União (evento 43, APELAÇÃO1), por sua vez, assevera, em síntese, que, por força do 21-A, § 2° da Lei 8.213, de 1991, o requerimento de não aplicação do nexo técnico epidemiológico não suspende a exigibilidade do crédito tributário .
Com resposta de ambas as partes, vieram os autos a este Tribunal.
É o relatório.
VOTO
Admissibilidade
Cabe conhecer das apelações, por serem os recursos próprios ao caso, e se apresentarem formalmente regulares e tempestivos.
A remessa necessária, por sua vez, também é de ser admitida, por se tratar de sentença concessiva (em parte) de mandado de segurança (art. 1, §1º, da Lie 12.016, de 2009).
Mérito
De início, observo que a alegação de ilegitimidade do FAP por ofensa ao princípio da legalidade tributária já foi afastada pela Corte Especial deste tribunal, no julgamento da Argüição de Inconstitucionalidade nº 5007417-47.2012.404.0000, a cujos fundamentos me reporto, adotando-os como razão de decidir. A síntese desse julgamento é a seguinte:
CONTRIBUIÇÃO SOCIAL. RISCOS AMBIENTAIS DO TRABALHO. LEI Nº 10.666, ART. 10. REDUÇÃO E AUMENTO DE ALÍQUOTAS. É constitucional a redução ou aumento das alíquotas da contribuição social destinada ao financiamento da aposentadoria especial e dos benefícios por incapacidade laboral decorrentes dos riscos ambientais do trabalho, na forma determinada pelo art. 10 da Lei nº 10.666, de 2003. (TRF4, ARGINC 5007417-47.2012.404.0000, Corte Especial, Relator p/ Acórdão Rômulo Pizzolatti, D.E. 07/11/2012)
Entendo, pois, que é constitucional o art. 10 da Lei nº 10.666, de 2003, no que atribuiu ao Poder Executivo o aumento (ou a diminuição) das alíquotas atinentes à contribuição social conhecida como SAT - Seguro de Acidentes do Trabalho (Lei nº 8.212, de 1991, art. 22, II), assim como é legal a instituição, pelo art. 202-A do Decreto nº 3.048, de 1999, do FAP - Fator Acidentário de Proteção.
Ademais, não vislumbro ofensa ao princípio da publicidade, pois os dados utilizados no cálculo do FAP foram devidamente divulgados, podendo ser acessados na página da Previdência Social na internet, desde 30-09-2009.
Outrossim, a impossibilidade de aferição do NORDEM (número de ordem da empresa dentro da subclasse) da impetrante com base nas informações publicadas não impede a aplicação do FAP atribuído, até mesmo porque não comprovou a impetrante ter solicitado administrativamente a disponibilização de tal informação.
Insurge-se, ainda, a impetrante, contra o cômputo no cálculo do FAP dos "acidentes de trajeto" e dos acidentes que não geraram benefício previdenciário.
Ora, considerando que o FAP tem como finalidade última a redução dos riscos e a proteção dos trabalhadores, com a consequente diminuição dos afastamentos em decorrência de infortúnios de ordem laboral, não se verifica ilegalidade que autorize o afastamento do cálculo do índice dos acidentes que não geraram afastamento ou concessão de benefício, bem como aqueles ocorridos no trajeto entre o local de trabalho e a residência do empregado (os quais são equiparados pela lei previdenciária a acidente de trabalho).
Insta salientar que os acidentes in itinire devem ser considerados na apuração do FAP, não só porque a legislação previdenciária prevê que eles são eventos acidentários, mas também porque fazem parte dos riscos ambientais do trabalho, sendo certo que as empresas também devem zelar pelo período em que o trabalhador se desloca de sua casa para o trabalho.
A impetrante alega, ainda, que devem ser desconsiderados do cálculo do FAP os acidentes de trabalho presumidos em razão do NTEP - Nexo Técnico Epidemiológico Previdenciário, nos casos em que apresentada defesa pela empresa contra a caracterização do nexo, a qual seria dotada de efeito suspensivo.
A respeito da questão, transcreve-se o teor do § 2º do art. 21-A da Lei 8.213, de 1991:
Art. 21-A. A perícia médica do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) considerará caracterizada a natureza acidentária da incapacidade quando constatar ocorrência de nexo técnico epidemiológico entre o trabalho e o agravo, decorrente da relação entre a atividade da empresa ou do empregado doméstico e a entidade mórbida motivadora da incapacidade elencada na Classificação Internacional de Doenças (CID), em conformidade com o que dispuser o regulamento.
(...)
§ 2o A empresa ou o empregador doméstico poderão requerer a não aplicação do nexo técnico epidemiológico, de cuja decisão caberá recurso, com efeito suspensivo, da empresa, do empregador doméstico ou do segurado ao Conselho de Recursos da Previdência Social.
Vê-se que apenas o recurso dirigido ao Conselho de Recursos da Previdência Social será dotado de efeito suspensivo, não se podendo estender tal efeito também ao requerimento de não aplicação do nexo apresentado pela empresa empregadora (denominado de "defesa/impugnação" pela impetrante).
É, pois, de ser reformada a sentença, para denegar o mandado de segurança, rejeitando-se tanto o pedido principal da autora, de reconhecimento de inconstitucionalidade e ilegalidade do art. 10 da Lei 10.666, de 2003, quanto os pedidos subsidiários (suspensão da aplicação do FAP até a disponibilização dos elementos necessários para a conferência do cálculo do FAP; reconhecimento do efeito suspensivo às defesas/impugnações interpostas contra a caracterização do NTEP; exclusão do cálculo do FAP dos acidentes que não geraram afastamento ou concessão de benefício e dos acidentes de trajeto).
Dispositivo
Ante o exposto, voto por dar povimento à apelação da União e à remessa necessária e negar provimento à apelação da impetrante.
Documento eletrônico assinado por RÔMULO PIZZOLATTI, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40000501012v13 e do código CRC 165ef587.Informações adicionais da assinatura:
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Apelação/Remessa Necessária Nº 5080144-05.2016.4.04.7100/RS
RELATOR: Desembargador Federal RÔMULO PIZZOLATTI
APELANTE: CATSUL GUAIBA - TRANSPORTES HIDROVIARIOS LTDA (IMPETRANTE)
ADVOGADO: JOÃO JOAQUIM MARTINELLI
APELANTE: UNIÃO - FAZENDA NACIONAL (INTERESSADO)
APELADO: OS MESMOS
MPF: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL (MPF)
EMENTA
CONTRIBUIÇÃO SOCIAL. RISCOS AMBIENTAIS DO TRABALHO - RAT. FATOR ACIDENTÁRIO DE PREVENÇÃO - FAP. constitucionalidade. metodologia de cálculo. acidentes de trajeto. acidentes dos quais não resulta a concessão de benefício previdenciário. NTEP. RECURSO. EFEITO SUSPENSIVO.
1. É legítima a instituição e aplicação do Fator Acidentário de Prevenção (FAP), com base no art. 10 da Lei nº 10.666, de 2003, e art. 202-A do Decreto nº 3.048, de 1999, com a redação dos decretos nºs 6.042, de 2007, e 7.126, de 2010.
2. O FAP tem como finalidade última a redução dos riscos e a proteção dos trabalhadores, pelo que não se verifica ilegalidade que autorize o afastamento do cálculo do índice dos acidentes que não geraram afastamento ou concessão de benefício, bem como aqueles ocorridos no trajeto entre o local de trabalho e a residência do empregado (os quais são equiparados pela lei previdenciária a acidente de trabalho).
3. Apenas o recurso dirigido ao Conselho de Recursos da Previdência Social contra a aplicação do NTEP será dotado de efeito suspensivo, não podendo ser atribuído tal efeito ao requerimento de não aplicação do nexo.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 2ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, decidiu dar povimento à apelação da União e à remessa necessária e negar provimento à apelação da impetrante, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 24 de julho de 2018.
Documento eletrônico assinado por RÔMULO PIZZOLATTI, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40000501013v5 e do código CRC f2244293.Informações adicionais da assinatura:
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 24/07/2018
Apelação/Remessa Necessária Nº 5080144-05.2016.4.04.7100/RS
RELATOR: Desembargador Federal RÔMULO PIZZOLATTI
PRESIDENTE: Desembargadora Federal LUCIANE AMARAL CORRÊA MÜNCH
APELANTE: CATSUL GUAIBA - TRANSPORTES HIDROVIARIOS LTDA (IMPETRANTE)
ADVOGADO: JOÃO JOAQUIM MARTINELLI
APELANTE: UNIÃO - FAZENDA NACIONAL (INTERESSADO)
APELADO: OS MESMOS
MPF: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL (MPF)
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 24/07/2018, na seqüência 408, disponibilizada no DE de 04/07/2018.
Certifico que a 2ª Turma , ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A 2ª Turma , por unanimidade, decidiu dar povimento à apelação da União e à remessa necessária e negar provimento à apelação da impetrante.
RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal RÔMULO PIZZOLATTI
Votante: Desembargador Federal RÔMULO PIZZOLATTI
Votante: Desembargadora Federal LUCIANE AMARAL CORRÊA MÜNCH
Votante: Desembargador Federal SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ
MARIA CECÍLIA DRESCH DA SILVEIRA
Secretária
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