Apelação Cível Nº 5055433-32.2017.4.04.9999/SC
RELATOR: Desembargador Federal CELSO KIPPER
APELANTE: IVETE INACIO
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RELATÓRIO
Cuida-se de apelação contra sentença, publicada em 09-06-2020, na qual o magistrado a quo julgou extinto o feito, sem resolução do mérito, com fulcro no artigo 485, inciso IV, do Código de Processo Civil (Lei n. 13.105/2015). Condenou a exequente ao pagamento das custas processuais, suspensa a exigibilidade em razão da gratuidade judiciária.
Em suas razões, a parte autora sustenta que teve o seu benefício de auxílio-doença cessado sem a recuperação da capacidade laborativa e/ou reabilitação para outra atividade.
Afirma, ainda, que a alta médica previdenciária ocorreu em descompasso com a decisão proferida no processo 0300605-36.2014.8.24.0001 (Acórdão de n. 5055433-32.2017.4.04.9999/SC), na qual a Apelante teve restabelecido o direito ao benefício de auxílio-doença, “[...] até a efetiva recuperação ou reabilitação para outra atividade”, uma vez que até o presente momento a Apelante não teve a efetiva recuperação, nem foi reabilitada para outra atividade que lhe garanta o sustento.
Ressalta que permanece incapacitada para qualquer atividade que demande esforços físicos, de moderados a severos, movimentos que exijam flexão, extensão da coluna, rotação do tronco, ou àqueles que demandem sobrecarga da coluna ou dos membros inferiores, e também àqueles que exijam movimentos de repetição, elevação, abdução ou adução envolvendo os membros superiores.
Refere que a documentação médica indica a persistência dos sintomas incapacitantes.
Cita precedentes no sentido de que o cumprimento da sentença deve ser realizado nos autos da ação originária.
Dessa forma, requer a reforma da sentença para que seja determinado ao INSS a implantação / restabelecimento do benefício por incapacidade (auxílio-doença), desde a indevida cessação administrativa, ocorrida em 02/04/2019 (NB 548.646.420-3), uma vez que a cessação ocorreu em desrespeito ao comando transitado em julgado, também com a intimação do INSS para o pagamento das parcelas vencidas (que poderão ser apuradas em outro regular cumprimento de sentença ou mesmo pela contadoria do juízo, com pagamento a ser requisitado através de RPV, ou então, com a determinação para que o INSS promova o pagamento administrativamente, mediante complemento positivo, se necessário) e vincendas, devendo o benefício ser mantido até sua efetiva recuperação ou reabilitação da Segurada para outra atividade, explicitando ainda que fica vedada a cessação do benefício pelo INSS na via administrativa antes da conclusão do processo de reabilitação.
Sem contrarrazões, vieram os autos a esta Corte para julgamento.
É o relatório.
VOTO
Inicialmente, cumpre esclarecer que a parte exequente peticionou nesta ação originária pedido de cumprimento de sentença (evento 24 - CERT1).
No pedido, a parte exequente afirmou, em síntese, que o INSS descumpriu a determinação do acórdão (evento 11)
Alegou que ocorreu desrespeito ao comando transitado em julgado, uma vez que não houve a recuperação da capacidade laborativa e/ou a reabilitação para outra atividade.
Observa-se, portanto, que a exequente pretende seja restabelecido o benefício de auxílio-doença sob o argumento de que o INSS descumpriu o título executivo.
Cabe destacar que o acordão referido pela exequente (processo nº 5055433-32.2017.404.9999) transitou em julgado em 25-01-2018, enquanto o benefício de auxílio-doença foi cessado em 02-04-2019 (evento 32 - PROCADM3 - fl. 37).
Quanto ao pedido da exequente, há de se destacar que os benefícios por incapacidade possuem natureza transitória, e na relação jurídica continuativa, típica dessa espécie de benefício, sobrevindo modificação no estado de fato ou de direito, não ofende a coisa julgada a revisão de benefício concedido judicialmente.
Nesse sentido, trago precedentes desta Corte:
AGRAVO DE INSTRUMENTO. AUXÍLIO-DOENÇA. CONCESSÃO JUDICIAL. PRAZO. REVISÃO ADMINISTRATIVA. CESSAÇÃO. 1. O INSS pode, a qualquer tempo, convocar o beneficiário de auxílio-doença para perícia médica. Todavia, quando a concessão/manutenção do benefício decorreu de ordem judicial, estando a decisão vigente e enquanto o feito não for julgado em segunda instância, será necessário submeter ao juízo eventuais razões para o cancelamento. 2. Após o trânsito em julgado da decisão que determina a concessão de benefício por incapacidade, é legítimo o ato administrativo que o cancela se nova perícia médica concluir pela aptidão laboral, restando ao segurado recorrer administrativamente ou ingressar em juízo por meio de outra ação a fim de demonstrar a persistência do quadro fático autorizador da manutenção do benefício. (TRF4, AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 5005649-42.2019.4.04.0000, 6ª Turma, Juíza Federal TAIS SCHILLING FERRAZ, POR UNANIMIDADE, JUNTADO AOS AUTOS EM 21/06/2019)
PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO. . AUXÍLIO-DOENÇA. PERÍCIA ADMINISTRATIVA. CANCELAMENTO EXTRAJUDICIAL DE BENEFÍCIO CONCEDIDO EM AÇÃO JUDICIAL COM TRÂNSITO EM JULGADO. 1. Em princípio, o benefício previdenciário concedido por decisão judicial só não pode ser cancelado na via administrativa enquanto a ação estiver sub judice. 2. Havendo previsão legal para que a Autarquia providencie revisão periódica das condições laborativas do segurado (LBPS, art. 101), é de ser indeferido o pedido da parte autora de que o INSS não a submeta às perícias até julgamento final. O que não pode o INSS fazer é cancelar o benefício que foi deferido em razão da tutela antecipada enquanto o feito estiver sub judice. (TRF4, AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 0002847-98.2015.404.0000, 6ª TURMA, Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA, POR UNANIMIDADE, D.E. 21/10/2015, PUBLICAÇÃO EM 22/10/2015)
PREVIDENCIÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. REVISÃO E CANCELAMENTO DE BENEFÍCIO DE AUXÍLIO-DOENÇA CONCEDIDO NA ESFERA JUDICIAL DEFINITIVAMENTE. POSSIBILIDADE. PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO REVISIONAL. ESGOTAMENTO. DESNECESSIDADE IN CASU. 1. Em matéria previdenciária, o STF e o STJ têm afirmado que a suspensão do benefício previdenciário somente é possível após o esgotamento da esfera administrativa. Entretanto, se, na esfera judicial, o debate transcender a questão do esgotamento da esfera administrativa e for centrado no mérito da suspensão do benefício, chegando-se à conclusão, estando assegurado o contraditório e a ampla defesa, do acerto do ato revisional, especialmente em casos de fraude ou de má-fé do beneficiário, ou de ilegalidade evidente, deve-se manter o cancelamento administrativo do benefício previdenciário. 2. Tratando-se de auxílio-doença, a Autarquia Previdenciária pode e deve efetuar reavaliações médico-periciais periódicas e, uma vez constatada a capacidade laborativa do segurado por perícia médica efetuada pela Administração, é possível o cancelamento de benefício concedido na esfera judicial definitivamente. 3. Devido ao monopólio estatal da jurisdição, enquanto a matéria estiver sub judice e, portanto, pendente de solução definitiva, não é possível que, unilateralmente, por meio de procedimento administrativo, sejam modificados fatos, decisões e questões fixados em Juízo. 4. Na hipótese dos autos, o auxílio-doença, cujo restabelecimento é postulado pelo impetrante, foi concedido por força de decisão judicial, com trânsito em julgado em 22-11-2013, e o INSS iniciou o processo de revisão do referido benefício somente após o trânsito em julgado, não havendo arbitrariedade no ato administrativo sob esse prisma. De outro lado, da análise do procedimento administrativo, verifica-se que foram observados os princípios do devido processo legal, da ampla defesa e do contraditório, pois a Autarquia Previdenciária somente cancelou o benefício após a realização de nova perícia médica, na qual foi constatada a inexistência de incapacidade para o labor, e após a apresentação de defesa pelo segurado. 5. Segurança denegada. (TRF4, APELAÇÃO CÍVEL Nº 5006249-43.2014.404.7209, 6ª TURMA, Juiz Federal MARCELO MALUCELLI, POR UNANIMIDADE, JUNTADO AOS AUTOS EM 06/05/2015)
AGRAVO. PREVIDENCIÁRIO. RESTABELECIMENTO DE AUXÍLIO-DOENÇA. CANCELAMENTO ADMINISTRATIVO DE BENEFÍCIO CONCEDIDO NA ESFERA JUDICIAL DEFINITIVAMENTE. 1. Tratando-se de auxílio-doença, a Autarquia Previdenciária pode e deve efetuar reavaliações médico-periciais periódicas e, uma vez constatada a capacidade laborativa do segurado por perícia médica efetuada pela Administração, é possível o cancelamento de benefício concedido na esfera judicial definitivamente. 2. Devido ao monopólio estatal da jurisdição, enquanto a matéria estiver sub judice e, portanto, pendente de solução definitiva, não é possível que, unilateralmente, por meio de procedimento administrativo, sejam modificados fatos, decisões e questões fixados em Juízo. 3. Na hipótese dos autos, se discute a possibilidade de cessação administrativa de benefício de auxílio-doença concedido judicialmente, em decisão já transitada em julgado, em razão de nova perícia administrativa que constatou a melhoria do estado de saúde da parte autora. Portanto, segundo entendimento firmado pela Terceira Seção desta Corte, ao julgar os EIAC nº 1999.04.01.024704-6/RS), de que é possível o cancelamento administrativo de benefício decorrente de decisão judicial, em julgamento definitivo, sempre que verificada a recuperação da capacidade laboral da parte por perícia médica, não há arbitrariedade no ato administrativo que resultou no cancelamento do benefício de auxílio-doença da segurada. (TRF4, AG 0005687-18.2014.404.0000, Sexta Turma, Relator Celso Kipper, D.E. 21/01/2015)
Cumpre referir, ainda, que no acórdão foi determinada a manutenção do benefício de auxílio-doença até a efetiva recuperação ou reabilitação a outra atividade, nestes termos (evento 11 - RELVOTO1 - fl. 03):
Considerando, pois, a conclusão da perícia judicial, é devido o benefício de auxílio-doença à parte autora até a sua efetiva recuperação ou reabilitação a outra atividade.
Em outras palavras, a manutenção do benefício de auxílio-doença não foi condicionada à necessidade de reabilitação profissional, mas até a efetiva recuperação ou reabilitação a outra atividade.
No caso concreto, não se verifica o alegado descumprimento do acórdão ou ofensa à coisa julgada, haja vista que o benefício de auxílio-doença foi mantido até 02-04-2019, tendo ocorrido a cessação após a constatação de recuperação da capacidade laborativa em perícia médica administrativa (evento 37 - CERT2 - fl. 01):
Ou seja, o INSS implantou o benefício, ocorrendo a cessação somente após o trânsito em julgado e a constatação da recuperação da capacidade laborativa na via administrativa.
Logo, não há como acolher o pedido do exequente de restabelecimento do benefício sob o argumento de que houve o descumprimento da decisão judicial.
Por fim, conforme referido pelo magistrado a quo, se a segurada objetiva comprovar a persistência do quadro incapacitante, inclusive com a produção das provas que entender necessário, pode ser veiculada em ação de conhecimento específica, em que poderão ser analisadas alegações de que ela permanece incapacitada, e não no bojo de ação que objetiva o cumprimento de decisão judicial que já foi cumprida voluntariamente pela autarquia, não existindo, portanto, título executivo judicial apto a embasar o presente cumprimento de sentença.
Assim sendo, deve ser mantida a sentença, que julgou extinto o feito, sem resolução do mérito, com fulcro no artigo 485, IV, do Código de Processo Civil (Lei n. 13.105/2015).
Dispositivo
Ante o exposto, voto por negar provimento ao apelo da parte exequente.
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Apelação Cível Nº 5055433-32.2017.4.04.9999/SC
RELATOR: Desembargador Federal CELSO KIPPER
APELANTE: IVETE INACIO
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. CANCELAMENTO DE BENEFÍCIO DE AUXÍLIO-DOENÇA CONCEDIDO NA ESFERA JUDICIAL. POSSIBILIDADE. PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO. RECUPERAÇÃO DA CAPACIDADE LABORATIVA.
1. Tratando-se de auxílio-doença, a Autarquia Previdenciária pode e deve efetuar reavaliações médico-periciais periódicas e, uma vez constatada a capacidade laborativa do segurado por perícia médica efetuada pela Administração, é possível o cancelamento de benefício concedido na esfera judicial.
2. No caso dos autos, o benefício de auxílio-doença, cujo restabelecimento é postulado pela exequente, foi concedido por força de decisão judicial, com trânsito em julgado em 25-01-2018, com determinação de manutenção até a efetiva recuperação ou reabilitação a outra atividade.
3. Hipótese em que o benefício de auxílio-doença foi cessado após o trânsito em julgado e a realização de perícia médica administrativa que constatou a recuperação da capacidade laborativa, não havendo arbitrariedade no ato administrativo sob esse prisma e/ou descumprimento da decisão judicial.
4. A ação de cumprimento de sentença proposta não se revela adequada para impugnar ilegalidade de ato administrativo, bem como para a comprovação da persistência do quadro incapacitante.
5. Mantida a sentença, que julgou extinto o feito, sem resolução do mérito, com fulcro no artigo 485, IV, do Código de Processo Civil (Lei n. 13.105/2015).
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia Turma Regional Suplementar de Santa Catarina do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, negar provimento ao apelo da parte exequente, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Florianópolis, 17 de dezembro de 2020.
Documento eletrônico assinado por CELSO KIPPER, Desembargador Federal, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40002242763v4 e do código CRC 21c5f608.Informações adicionais da assinatura:
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO Virtual DE 10/12/2020 A 17/12/2020
Apelação Cível Nº 5055433-32.2017.4.04.9999/SC
RELATOR: Desembargador Federal CELSO KIPPER
PRESIDENTE: Desembargador Federal CELSO KIPPER
PROCURADOR(A): WALDIR ALVES
APELANTE: IVETE INACIO
ADVOGADO: JANDREI ALDEBRAND (OAB SC014980)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 10/12/2020, às 00:00, a 17/12/2020, às 16:00, na sequência 832, disponibilizada no DE de 30/11/2020.
Certifico que a Turma Regional suplementar de Santa Catarina, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DE SANTA CATARINA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, NEGAR PROVIMENTO AO APELO DA PARTE EXEQUENTE.
RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal CELSO KIPPER
Votante: Desembargador Federal CELSO KIPPER
Votante: Desembargador Federal SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ
Votante: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ
ANA CAROLINA GAMBA BERNARDES
Secretária
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