| D.E. Publicado em 14/05/2015 |
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0004325-88.2013.404.9999/RS
RELATOR | : | Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA |
APELANTE | : | AQUELINA DARONCO |
ADVOGADO | : | Andre Antunes Cavalheiro |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. CUMULAÇÃO DE BENEFÍCIOS PREVIDENCIÁRIOS. RECEBIMENTO INDEVIDO DE BENEFÍCIO. MÁ-FÉ. AFASTAMENTO DO PRAZO DECADENCIAL.
Não há falar em prazo decadencial quando comprovada a ma-fé do segurado na época da concessão da aposentadoria, como ocorreu no caso.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 6ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação da parte autora, nos termos do relatório, votos e notas taquigráficas que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 06 de maio de 2015.
Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA
Relator
| Documento eletrônico assinado por Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 6596867v5 e, se solicitado, do código CRC 57F3D1CE. | |
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0004325-88.2013.404.9999/RS
RELATOR | : | Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA |
APELANTE | : | AQUELINA DARONCO |
ADVOGADO | : | Andre Antunes Cavalheiro |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
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RELATÓRIO
Cuida-se de apelação interposta em face da sentença que assim decidiu:
"Ante o exposto, revogo a antecipação de tutela deferida à fl. 81, e julgo improcedentes os pedidos deduzidos na exordial, extinguindo o processo, com resolução do mérito, nos termos do art. 269, inciso I do CPC, conforme motivação supra.
Sucumbente, condeno a autora no pagamento da verba honorária em favor do patrono do INSS, esta arbitrada em R$ 900,00 (novecentos reais), forte no artigo 20, § 3º do CPC, corrigida monetariamente pelo IGP-M a contar da intimação desta decisão, e no pagamento das custas processuais. Todavia, suspendo a exigibilidade de tais verbas, uma vez que a autora é beneficiária da AJG".
Apela a parte autora postulando a reforma do julgado. Alega, preliminarmente: a) a nulidade do ato administrativo de cancelamento de seu benefício de Aposentadoria Rural por Idade; b) a existência de coisa julgada administrativa; c) a decadência do direito do INSS de revisar o ato administrativo de concessão de concessão de benefício previdenciário. No mérito, sustenta, em síntese, que faz jus ao restabelecimento de seu benefício, a partir da data da cessação, em novembro de 2011, uma vez que o conjunto probatório acostado aos autos é hábil a respaldar o reconhecimento do exercício da atividade rural em regime de economia familiar no período correspondente à carência. Aduz, ainda, que iniciou atividade urbana após trinta anos de atividades rurais, sendo realizado em meio turno, pois no restante do período permaneceu trabalhando na agricultura.
Oportunizadas contrarrazões, subiram os autos a esta Corte.
O Ministério Público Federal manifestou-se pelo desprovimento do recurso da parte autora (fls. 202/205).
É o relatório.
VOTO
A questão controvertida nos autos cinge-se ao direito da parte autora ao restabelecimento da sua Aposentadoria Rural por Idade (NB 064.508.278-3), a partir da data da cessação do benefício, ocorrida em 01/11/2011 (fl. 69), em razão de eventuais inconsistências verificadas na concessão do beneficio.
Conforme o Resumo de Documentos para Cálculo de Tempo de Contribuição emitido em 24/08/1995 (fl. 40), o INSS reconheceu e averbou o tempo de atividade rural prestado pela autora na condição de segurada especial, nos períodos de 01-01-1988 a 18-07-1995.
Na sequência, foi concedido o benefício de Aposentadoria por Idade Rural a segurada, a partir de 18-07-1995 (DER - fl. 32).
O benefício foi cancelado em novembro de 2011 (fl. 69), ao argumento de que a concessão seria indevida, porque teria sido descaracterizada a condição de segurada especial da autora, pois a mesma havia exercido atividade como Funcionária Pública do Estado do Rio Grande do Sul, não se enquadrando no art. 11, item VII, parágrafo único da Lei nº 8.213/91.
Conforme se extrai do Ofício n.º 19023040/11 (fl. 62), de 05-10-2011, da Agência da Previdência Social em Ijuí-RS, a autora foi cientificada a respeito do referido indício de irregularidade, da suspensão do pagamento do benefício, e também quanto à abertura de prazo para apresentação de defesa.
No caso dos autos, a incidência do instituto da decadência depende da análise sobre os indícios de irregularidade apontados pelo INSS, que ora passo a fazer, visto que fora superado o prazo decadencial de 10 anos, contados a partir de 18-07-1995.
A sentença recorrida teve a seguinte fundamentação (fls. 166/169):
"II - Fundamentação.
A questão controvertida nos autos cinge-se ao direito da parte autora ao restabelecimento da sua Aposentadoria Rural por Idade (NB 064508278-3), a partir da data de sua cessação, em novembro de 2011, em razão de eventuais irregularidades verificadas na concessão do beneficio.
Não há dúvida de que depois de deferido um benefício ou reconhecido um direito o INSS pode, em princípio, rever a situação quando restar configurada ilicitude. Essa possibilidade há muito é reconhecida pela doutrina e pela jurisprudência, e restou consagrada nas Súmulas 346 e 473 do Supremo Tribunal Federal, passando posteriormente a contar com previsão legal expressa (art. 43 da Lei 9.784/99 e art. 103-A, da Lei 8.213/91, introduzido pela MP 138/03).
Existem, todavia, limites para a revisão, por parte do INSS, dos atos que impliquem reconhecimento de direito em favor do segurado.
Por primeiro, registro que o cancelamento de qualquer ato desta natureza pressupõe a instauração de procedimento específico, com notificação do interessado, oportunizando-se ainda que ele produza provas e exerça plenamente seu direito de defesa. Inviável, assim, o cancelamento sumário, pois deve ser observado o que dispõe o artigo 5°, inciso LV da Constituição Federal.
Também consigno que a Administração não pode desfazer ato de concessão de benefício ou reconhecimento de direito com base em simples reavaliação de processo administrativo perfeito e acabado. Com efeito, não havendo prova de ilegalidade, não é dado à Administração simplesmente reavaliar a situação, voltando atrás quanto à sua manifestação, porquanto caracterizada em tal situação a denominada "coisa julgada administrativa" ou preclusão das vias de impugnação interna.
A dita "coisa julgada administrativa" não se equipara à coisa julgada propriamente dita, pois despida de definitividade. Todavia, constitui óbice ao desfazimento do ato por parte da autoridade administrativa ao argumento de mera reavaliação de situação já apreciada anteriormente. Assim como não se admite o desfazimento de ato no qual reconhecido direito do segurado em razão de simples reavaliação, também o tempo tem influência significativa na possibilidade de atuação do INSS em casos que tais.
A partir da revogação da Lei n. 6.309/75 ocorreu um vácuo legal, que somente foi suprido com o advento da Lei n. 9.784, de 29/01/99 (publicada no DOU de 01/02/99), a qual dispôs em seus artigos 53 e 54, in verbis:
Art. 53. A Administração deve anular seus próprios atos, quando eivados de- vício de legalidade, e pode revogá-los por motivo de conveniência ou oportunidade, respeitados os direitos adquiridos,
Art. 54. O direito da Administração de anular os atos administrativos de que decorram efeitos favoráveis para os destinatários decai em cinco anos, contados da data em que foram praticados, salvo comprovada má-fé.
§ 1° No caso de efeitos patrimoniais contínuos, o prazo de decadência contar-se-á da percepção do primeiro pagamento.
2° Considera-se exercício do direito de anular qualquer medida de autoridade administrativa que importe impugnação à validade do ato. Grifei
A disciplina da Lei n. 9.784/99 foi clara: ressalvados os casos de comprovada má-fé, uma vez decorridos cinco anos sem que o segurado tenha sido notificado do procedimento instaurado para revisar o ato administrativo que implicou reconhecimento de direito em seu favor, resta consumada a decadência. E a decadência existe exatamente para tornar definitivas situações antigas, pouco importando que ilegais, ressalvados, obviamente, os casos de fraude, pois estes podem ser revistos, em princípio, a qualquer tempo.
Em 2003 foi publicada a MP n. 138 (de 19/11/03, publicada no DOU de 20/11/03, quando entrou em vigor), a qual instituiu o art. 103-A da Lei n. 8.213/91, que dispõe:
Art. 103-A, O direito da Previdência Social de anular os atos administrativos de que decorram efeitos favoráveis para os seus beneficiários decai em dez anos, contados da data em que foram praticados, salvo comprovada má-fé. (Incluído pela Lei n° 10.839, de 2004)
§1ª No caso de efeitos patrimoniais contínuos, o prazo decadência! contar-se-á da percepção do primeiro pagamento.
§2ª Considera-se exercício do direito de anular qualquer medida de autoridade administrativa que importe impugnação à validade do ato. grifei
O Código Civil de 2002, que alterou diversos prazos de prescrição e decadência previstos em seu antecessor (CC de 1916), dispôs sobre a questão de direito intertemporal, estabelecendo em seu artigo 2.028 o princípio de que no caso de redução, o prazo da lei nova incide sobre as situações pendentes, salvo seja decorrido mais da metade do tempo estabelecido pela lei anterior.
Os prazos maiores do Código revogado, portanto, somente prevalecem excepcionalmente.
Na prática, no entanto, todos os casos subsumidos inicialmente à regência da Lei n. 9.784/99, portanto, passaram a observar o prazo decadencial de dez anos, pois a MP n. 138/03 entrou em vigor antes de decorridos cinco anos a contar do advento daquela lei.
Por oportuno, também ressalto a importância do princípio da segurança jurídica - pois uma das funções precípuas do Direito é a pacificação social - para a análise da ação da administração no sentido de desfazer ato de concessão de benefício previdenciário. Esta ponderação tem importância principalmente para os benefícios deferidos entre a revogação da Lei 6.309/75 e o advento da Lei 9.784/99, pois, segundo entendimento do Superior Tribunal de Justiça, não existe, nestes casos, decadência estabelecida em detrimento da Administração. Deve ser considerada (esta ponderação), entrementes, para todos os casos de concessão de benefício, independentemente da data em que ocorridos, já que o princípio referido tem status constitucional e deve ser sempre observado.
E, nesse norte, entendo que em toda situação na qual se analisa ato de cancelamento de benefício previdenciário, (em especial para os benefícios deferidos entre a revogação da Lei 6.309/75 e o advento da Lei 9.784/99), há necessidade de análise do caso concreto, considerando-se, por exemplo, o tempo decorrido, as circunstâncias que deram causa à concessão do benefício, as condições sociais do interessado, sua idade, e a inexistência de má~fé, tudo à luz do princípio da segurança jurídica.
No que atine à atribuição dos ônus probatórios é sabido que nas ações judiciais nos quais se pretende a concessão de benefício previdenciário ou o reconhecimento de tempo de serviço, cabe ao segurado provar que faz jus ao bem da vida perseguido. As ações de restabelecimento, todavia, têm como particularidade o fato de que ao segurado já foi deferido administrativamente o que postulava. Assim, o ato concessório se reveste de presunção de legitimidade, ou seja, presume-se que os requisitos legais para a obtenção do benefício tenham sido preenchidos.
Diante de tal quadro, caso não comprovada alguma ilegalidade no ato concessório, o cancelamento é indevido. É ao INSS pois, que toca provar ter sido o benefício indevidamente concedido e, por consequência, corretamente cancelado.
Adentrando na análise do fato em lide, verifico que se trata de cancelamento de benefício ocorrido em novembro de 2011 (fl. 69), referente à aposentadoria por idade, com DIB em 18/07/1995.
Observo que foram observadas as garantias do contraditório e da ampla defesa no processo administrativo, tendo a autora sido devidamente intimada para apresentar defesa antes da decisão administrativa proferida pela Autarquia (fls. 61/76).
Quanto à matéria de fundo, verifico que a segurada, quando requereu a aposentadoria por idade, ocultou o vínculo estatutário que tinha com o Estado do Rio Grande do Sul. Na ocasião da entrevista administrativa (realizada em 18/07/1995 - fl. 107), ela inclusive já era beneficiária de aposentadoria junto ao Estado do Rio Grande do Sul, tendo exercido cargo público de 1973 a 1994, o que por si só afastava a qualidade de segurada especial, consoante balizada jurisprudência. E, na dita entrevista, a autora disse, em resposta ao questionamento acerca do exercício de outra atividade, que não exercia outra atividade, ocultando a verdade da Autarquia Previdenciária, o que levou o INSS a conceder o benefício de aposentadoria rural por idade à autora à época.
Os elementos colacionados pelo INSS, portanto, evidenciam ilegalidade na concessão do benefício. Isso porque demonstrado que a autora era aposentada/segurada como servidora pública estadual, e a eventual renda obtida com a alegada atividade rural não era essencial à sua subsistência, de modo que não tinha ela a condição de trabalhadora rural como segurada especial, de modo que indevida a concessão do benefício.
Nesse sentido, o seguinte precedente:
PREVIDENCIÁRIO. RESTABELECIMENTO DE APOSENTADORIA POR IDADE RURAL REVISÃO ADMINISTRATIVA. PRAZO DECADENCIAL PRINCÍPIOS DA LEGALIDADE E DA SEGURANÇA JURÍDICA. APLICAÇÃO. PREPONDERÂNCIA DE UM OU OUTRO. CIRCUNSTÂNCIAS. CASO CONCRETO. 1. A Administração, em atenção ao princípio da legalidade, pode e deve anular seus próprios atos administrativos, desde que eivados de vícios que os tornem ilegais. 2. No âmbito da Administração Pública Federal, até o advento das Lei n°s 9.784/99 e 10.839/04 inexistia prazo decadêncial para a revisão dos atos administrativos. 3. Conquanto no período compreendido entre o Início da vigência da Lei n.° 8.213/91 e da Lei 9.784/99 inexistisse prazo decadêncial para a revisão dos atos administrativos, há que se examinar a possibilidade de revisão à luz do princípio da segurança jurídica. Para considerar indevida a anulação de atos administrativos concessivos de benefícios previdenciários, não basta o transcurso, por si só, de um dado tempo, mas este associado a um conjunto de circunstâncias que, pelas suas peculiaridades, inflijam ao beneficiário gravame desmedido à sua confiança e a confiança da sociedade nas instituições e à necessária estabilidade das situações e relações jurídicas. 4. A inexistência de prazo decadêncial para anulação dos atos administrativos no período em questão não significa que a Administração possa anular seus atos a qualquer tempo sem que sejam sopesados o princípio da legalidade e o princípio da segurança jurídica, aqui entendido como proteção à confiança, na forma que está hoje reconhecido na legislação e na jurisprudência do Supremo Tribunal Federal como princípio de valor constitucional, imanente ao princípio do Estado de Direito, e que serve de limite à invalidação, pela Administração Pública dos seus atos administrativos eivados de ilegalidade ou de inconstitucionalidade, com preponderância de um ou outro, conforme o caso em concreto. 5. A aposentadoria rural por idade conferida ao segurado especial é uma exceção ao sistema contributivo da Previdência Social e, por isso mesmo, deve ser concedida de forma restritiva, tão-somente àqueles que de fato preencham seus requisitos. O art. 11, VII, e § 1°, da Lei 8.213/91 exige, para a caracterização do exercício de atividade rural em regime de economia familiar, que a atividade agrícola seja indispensável à própria subsistência e seja exercida em condição de mútua dependência e colaboração, sem o uso de empregados. 6. Sendo a autora professora aposentada, possuindo outra fonte de renda e desempenhando afazeres domésticos, incompatíveis com a ideia de dedicação concomitante com a atividade na agricultura, não há como qualificá-la como segurada especial, devendo prevalecer o princípio da legalidade sobre o da segurança jurídica, a ensejar o cancelamento do benefício, concedido em evidente afronta ao texto legal, porquanto não configuradas quaisquer das circunstâncias excepcionais que justificariam a manutenção do amparo. (EMBARGOS JNFRINGENTES EM AC N° 2001.04.01.023173-4/RS. 3a Seção TRF4. Rel: Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA) grifei
No que diz com a idade da demandante (80 anos - fl. 35), não se justifica a manutenção em razão do princípio da segurança jurídica, pois a obtenção do benefício decorreu de informação incorreta e tinha ela renda para se sustentar. Registre-se que restou observado o devido processo legal e a hipótese não é de mera reavaliação da prova, mas de má-fé.
Outrossim, no caso concreto, muito embora pudesse ser reconhecida a decadência do direito do INSS em desfazer o ato administrativo, tal instituto não se aplica, uma vez que comprovada a má-fé da segurada quando do requerimento administrativo, conforme dispõe a parte final do art. 103-A da Lei n. 8.213/91, "O direito da Previdência Social de anular os atos administrativos de que decorram efeitos favoráveis para os seus beneficiários decai em dez anos, contados da data em que foram praticados, salvo comprovada má-fé."
Assim, a improcedência dos pedidos iniciais é medida que se impõe."
Mantenho a sentença por seus próprios fundamentos. Com efeito, não há falar em prazo decadencial quando comprovada a ma-fé do segurado na época da concessão da aposentadoria, como ocorreu no caso.
No mesmo sentido, é o Parecer do Ministério Público Federal (fls. 203/205):
"Inicialmente, no tocante à alegação da apelante de ocorrência da coisa julgada administrativa, o que impossibilitaria a revisão do ato administrativo de concessão de sua aposentadoria, bem como a restituição dos valores indevidamente recebidos, cumpre referir que à Administração é facultado anular seus próprios atos, quando eivados de vícios que os tornam ilegais, porque deles não se originam direitos (primeira parte da Súmula 473 do STF), estando aí inserida a possibilidade de revisão dos atos concessórios de benefícios previdenciários.
Já em relação ao prazo dessa revisão, por força do art. 69 da Lei n° 9.784/1999¹, deve ser aplicado o disposto no art. 103-A da Lei n° 8.213/1991, o qual estabelece que o direito da Previdência Social de anular os atos administrativos de que decorram efeitos favoráveis para os seus beneficiários decai em dez anos contados da data em que foram praticados, salvo comprovada má fé.
No caso em tela, observamos que na entrevista feita pela autarquia previdenciária, à época do requerimento de aposentadoria rural por idade, em 18/07/1995, a segurada, quando perguntada se tinha outros rendimentos, disse que sua renda derivava da aposentadoria do esposo e da safra, ocultando que exercia cargo público vinculado ao Estado do Rio Grande do Sul (fls. 44), descumprindo com seu dever de informar a verdade, o que levou o INSS a conceder o benefício com base nas informações incorretas.
Além disso, as informações prestadas pela demandante na referida entrevista foram de extrema relevância para a concessão de sua aposentadoria, tendo em vista que, à época, o Cadastro Nacional de Informações Sociais (CNIS) ainda estava em fase de implantação, conforme informações extraídas da Portaria Interministerial MF/MT/MPAS n° 13, de novembro de 1995, o que impossibilitou ao INSS de constatar o vínculo de aposentadoria da autora junto ao Estado do Rio Grande do Sul.
Assim, tendo em vista que a demandante ocultou informações necessárias junto ao INSS, entendemos estar comprovado a má-fé referida na exceção do art. 103-A da Lei n° 8.213/1991, em razão do que não há prazo decadencial para o INSS rever a concessão da sua aposentadoria rural por idade.
Nesse sentido é o seguinte julgado do Egrégio Tribunal Federal da 4a Região, in verbis:
PREVIDENCIÁRIO.CUMULAÇÃODE BENEFÍCIOS PREVIDENCIÁRIOS. RECEBIMENTO INDEVIDO DE BENEFÍCIO. MÁ-FÉ. AFASTAMENTO DO PRAZO DECADENCIAL. Não há falar em prazo decadencial quando comprovada a ma-fé do segurado na época da concessão da aposentadoria, como ocorreu no caso. (AC n° 500874-33.201 0.404. 7005/PR, Sexta Turma, Rel. Des. Federal João Batista Pinto Silveira, DE de 09/05/2013)
Já quanto à alegação de que não foram respeitados os princípios do processo legal e da ampla defesa na esfera administrativa, também não merece acolhimento, pois, pela simples leitura do processo administrativo, constatamos que a segurada foi previamente notificada para apresentar defesa, tendo exercido seu direito, e a administração decido, ainda que em decisão minimamente fundamentada (fls. 116-125 verso).
De outro lado, afirma a apelante que "as circunstâncias fáticas demonstram que não houve a descaracterização do regime de economia familiar, dadas as peculiaridades do caso concreto" (fl. 196, fine). Entretanto, devemos ter em conta que a existência de outra fonte de renda, que não seja decorrente de benefício previdenciário ou de atividade remunerada transitória, exclui o membro do grupo familiar da condição de segurado especial, nos termos do art. 11, § 9°, da Lei n° 8.213/91, in verbis:
§ 9° Não é segurado especial o membro de grupo familiar que possuir outra fonte de rendimento, exceto se decorrente de: (Incluído pela Lei n° 11.718, de 2008)
I - benefício de pensão por morte, auxílio-acidente ou auxílio-reclusão, cujo valor não supere o do menor benefício de prestação continuada da Previdência Social; (Incluído pela Lei n° 11.718, de 2008)
II - benefício previdenciário pela participação em plano de previdência complementar instituído nos termos do inciso IV do § 8° deste artigo; (Incluído pela Lei n° 11.718, de 2008)
III - exercício de atividade remunerada em período não superior a cento e vinte dias, corridos ou intercalados, no ano civil, observado o disposto no § 13 do art. 12 da Lei no 8.212, de 24 de julho de 1991; (Redação dada pela Medida Provisória n° 619, de 2013)
IV - exercício de mandato eletivo de dirigente sindical de organização da categoria de trabalhadores rurais; (Incluído pela Lei n° 11.718, de 2008)
V - exercício de mandato de vereador do Município em que desenvolve a atividade rural ou de dirigente de cooperativa rural constituída, exclusivamente, por segurados especiais, observado o disposto no § 13 do art. 12 da Lei n° 8.212, de 24 de julho de 1991; (Incluído pela Lei n° 11.718, de 2008)
VI - parceria ou meação outorgada na forma e condições estabelecidas no inciso l do § 8° deste artigo; (Incluído pela Lei n° 11.718, de 2008)
VII - atividade artesanal desenvolvida com matéria-prima produzida pelo respectivo grupo familiar, podendo ser utilizada matéria-prima de outra origem, desde que a renda mensal obtida na atividade não exceda ao menor benefício de prestação continuada da Previdência Social; e (Incluído pela Lei n° 11.718, de 2008)
VIII- atividade artística, desde que em valor mensal inferior ao menor benefício de prestação continuada da Previdência Social. (Incluído pela Lei n° 11.718, de 2008) (Grifou-se)
Assim, como a demandante comprovadamente possui outra fonte de rendimento, oriundo do Estado do Rio Grande do Sul (fls. 30-31 e 111 verso), resta descaracterizado o regime de economia familiar, o que, consequentemente, acaba por afastar os requisitos para a manutenção da aposentadoria rural por idade da parte autora.
Em face do exposto, manifesta-se o Ministério Público Federal pelo desprovimento da apelação.
Ante o exposto, voto por negar provimento à apelação da parte autora.
Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA
Relator
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 06/05/2015
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0004325-88.2013.404.9999/RS
ORIGEM: RS 00001372420128210091
RELATOR | : | Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA |
PRESIDENTE | : | Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA |
PROCURADOR | : | Procurador Regional da República Flávio Augusto de Andrade Strapason |
APELANTE | : | AQUELINA DARONCO |
ADVOGADO | : | Andre Antunes Cavalheiro |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 06/05/2015, na seqüência 159, disponibilizada no DE de 24/04/2015, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 6ª TURMA, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO DA PARTE AUTORA.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA |
VOTANTE(S) | : | Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA |
: | Des. Federal CELSO KIPPER | |
: | Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA |
Gilberto Flores do Nascimento
Diretor de Secretaria
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