Apelação Cível Nº 5007144-54.2016.4.04.7202/SC
RELATOR: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
APELADO: JORGE ROBERTO VALENTE CASSEMIRO (AUTOR)
RELATÓRIO
Cuida-se de apelação interposta pelo INSS (Evento 59 - APELAÇÃO1), em face da sentença (Evento 50 - SENT1), publicada em 24/10/2017, que julgou procedente o pedido de restabelecimento do benefício de aposentadoria por invalidez e pagamento das parcelas devidas durante a suspensão, nos termos do artigo 487, inciso III, alínea a, do CPC, também ao pagamento de indenização por dano moral, com fundamento no art. 487, I, do novo Código de Processo Civil, fixado em R$ 50.000,00.
Em suas razões, a Autarquia Previdenciária sustenta, em síntese, ser fato que houve atraso no pagamento dos proventos do apelado, concernentes aos meses de agosto e setembro de 2016. Contudo, entende que disso não resulta prejuízo moral passível de indenização.
Alega que houve crítica no sistema (normalmente dados conflitantes em relação a nome, endereço, dependentes), in casu, muito provavelmente relacionado aos empréstimos consignados e alteração do valor da pensão alimentícia, consoante relatado pelo próprio requerente na peça exordial, os quais, juntos, comprometiam mais da metade da sua renda (precisamente, 56,95% dos proventos). Ciente do problema (suspensão) o INSS resolveu. Levou ciquenta dias, mas resolveu. Logo, não há prova alguma de que a autarquia tenha agido de forma desditosa, desarrazoada, retardando injustificadamente o restabelecimento do benefício do segurado, no claro desiderato de prejudicá-lo.
Aduz que o suposto dano moral decorre de simples atraso no pagamento das prestações de agosto e setembro no ano de 2016. Só isso e nada mais. Crê-se, portanto, que o patamar fixado em R$ 50.000,00 é totalmente desarrazoado, ocasionando ao demandante enriquecimento indevido, sendo superior aos importes comumente fixados por esta Colenda Corte de Justiça em casos de condutas administrativas bem mais repreensíveis e prejuízos maiores, pelo que se pede e espera a sua redução a valor equitativo.
Subsidiariamente, requer a reforma da sentença no que tange à aplicação dos índices de juros e correção monetária.
Com as contrarrazões do autor, vieram os autos a esta Corte para julgamento.
É o relatório.
VOTO
A controvérsia recursal cinge-se à comprovação do cabimento ou não de danos morais na hipótese em tela bem como ao valor estabelecido pelo juiz a quo.
Primeiramente, trago à colação trecho da sentença que analisou o ponto controvertido, in verbis:
(...) No caso dos autos, o autor alega constrangimentos em razão de ter acumulado atrasos em suas contas de aluguel, luz, água e também na manutenção de sua subsistência.
A declaração de débitos inscritos nos serviços de proteção de crédito e os extrados bancários, anexados à petição inicial, demonstram que na data da suspensão indevida do benefíco do autor, ele enfrentava sérias dificuldades financeiras. Adicionalmente, este benefício também sustentata os dependentes do requerente, para os quais eram descontados valores mensais, a título de pensão alimentícia.
Esse quadro de grave dificuldade financeira, foi demasiamente agravado pelo ato ilícito da ré que suspendeu, sem qualquer motivo justificado, por um período de dois meses, o pagamento do benefício previdenciário do demandante. Como alguém que está em situação financeira dramática, pode se sustentar se os seus rendimentos mensais ficam suspensos por dois meses? Sem dúvida alguma o nível de sofrimento ao que o autor foi exposto é elevadíssimo.
A demonstração da extensão do sofrimento do autor veio materilizada nos autos pelo depoimento da testemunha Rita de Cassia dos Santos, a qual relatou o constrangimento e humilhação pelo qual o requerente foi exposto ao ter que pedir dinheiro emprestado à várias pessoas para pagamentos de alugueres e outras contas necessárias à sua subsistência.
Sem poder laborar e sem outra fonte de renda, e com pensão alimentícia para efetuar o pagamento, além de suas despesas de subsistência, o autor foi submetido a grandes dificuldades, que poderiam ter sido evitadas com a correção administrativa do erro sobre a suspensão indevida do benefício que vinha sendo pago ao autor.
O auxílio-doença e a aposentadoria por invalidez, por certo têm mais do que qualquer outro, caráter alimentar para o segurado, que, no caso do autor, depende unicamente deste para sobreviver.
Cabe ao Estado buscar adequar o sistema às diversas situações que se apresentarem, não sendo justificável que, por excesso de informações o benefício seja simplesmente suspensão expondo o segurado à tão grave situação.
Desse modo, impõe-se o reconhecimento da existência de dano moral decorrente do ato ilítico cometido pelo INSS de suspender o pagamento do benefício previdenciário do autor, fora das hipóteses legais.
Quanto à definição do quantum indenizatório, nas ações de reparação por dano moral deve ser estipulado de modo a desestimular a ocorrência de repetição de prática lesiva; de legar à coletividade exemplo expressivo da reação da ordem pública para com os infratores e compensar a situação vexatória a que indevidamente foi submetido o lesado, sem reduzi-la a um mínimo inexpressivo, nem elevá-la a cifra enriquecedora. Nesse sentido, vale transcrever voto proferido pelo Ministro Castro Filho no REsp n. 291.625-SP, in verbis:
Em que pese o grau de subjetivismo que envolve o tema da fixação da reparação, vez que não existem critérios determinados e fixos para a quantificação do dano moral, reiteradamente tem-se pronunciado esta Corte no sentido de que a reparação do dano não pode vir a constituir-se em enriquecimento indevido. Por outro lado, há de ser fixada em montante que desestimule o ofensor a repetir o cometimento do ilícito.
Os danos morais devem assim ser arbitrados levando-se em consideração as circunstâncias do fato, bem como a condição sócio-econômica do ofendido e do ofensor, orientando-se a fixação da indenização pelos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade.
Nesse contexto, tenho que a quantia de R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais) revela-se como suficiente para compensar o constrangimento e o sofrimento que foram impostos ao autor e, ao mesmo tempo, patarmar suficiente para coibir a reiteração futura pela ré, a qual deve repensar a sua postura diante de erros administrtivos dessa natureza, a fim de evitar o aviltamento da dignidade humana de seus segurados.
Do dano moral
Nos termos do art. 37, § 6º, da Constituição Federal, a responsabilidade do Estado por danos causados a terceiros é, em regra, objetiva, não dependendo da existência de culpa.
As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa.
Mesmo em se tratando de responsabilidade objetiva, essencial que se demonstre a existência de dano, sem o que não há dever de indenizar.
O dano moral, por óbvio, também exige comprovação quanto à sua efetiva ocorrência, excetuando-se apenas as hipóteses nas quais a jurisprudência o tem considerado como presumido (in re ipsa), dentre as quais não se inclui a hipótese dos autos.
Para sua configuração, exige-se a existência de fato dotado de gravidade capaz de gerar abalo profundo, no plano social, objetivo, externo, como situações de constrangimento, humilhação ou degradação e não apenas dissabor decorrente de intercorrências do cotidiano (TRF da 4ª Região, AC 0004146-57.2013.404.9999, Quarta Turma, Relator Luís Alberto D'azevedo Aurvalle, D.E. 20/10/2014).
No caso de benefícios previdenciários, a jurisprudência tem decidido no sentido de que o indeferimento em regra não gera dano moral indenizável, pois este exige, objetivamente, um sofrimento significativo, que não decorre apenas da cessação do benefício (v.g. TRF4, APELREEX 5003327-36.2012.404.7100, Quinta Turma, Relator p/ Acórdão Ricardo Teixeira do Valle Pereira, D.E. 27/04/2012).
O auxílio-doença e a aposentadoria por invalidez, por certo têm mais do que qualquer outro, caráter alimentar para o segurado, que, normalmente, depende unicamente deste para sobreviver.
Cabe ao Estado buscar adequar o sistema às diversas situações que se apresentarem, não sendo justificável que, por excesso de informações, o benefício previdenciário ao qual o autor faz jus seja simplesmente suspenso, expondo o segurado a tão grave situação.
Logo, o reconhecimento da existência de dano moral em razão da suspensão do pagamento da aposentadoria por invalidez ao autor, cometida pelo INSS, fora das hipóteses legais, é medida que se impõe.
Neste sentido em caso análogo:
ADMINISTRATIVO. DANOS MORAIS. SEGURO-DESEMPREGO. CANCELAMENTO INDEVIDO. DANO MORAL CONFIGURADO. QUANTUM INDENIZATÓRIO. Cabível a indenização por danos morais em virtude do cancelamento indevido do seguro-desemprego e da privação dos valores devidos transpõem os meros aborrecimentos e desabares do cotidiano, uma vez que são importâncias destinadas a garantir a subsistência do beneficiário e de sua família em uma época de excepcional necessidade, ocasionada pelo desemprego involuntário. Levando-se em conta a natureza do dano, o princípio da razoabilidade, a impossibilidade de serem fixados valores que ocasionem o enriquecimento indevido e os parâmetros utilizados por esta Turma em casos similares, o quantum indenizatório deve ser arbitrado em R$ 5.000,00 (cinco mil reais). (TRF4, AC 5004019-37.2014.404.7012, QUARTA TURMA, Relatora VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA, juntado aos autos em 16/09/2016)
No que tange à definição do quantum indenizatório, nas ações de reparação por dano moral deve ser estipulado de modo a desestimular a ocorrência de repetição de prática lesiva; de legar à coletividade exemplo expressivo da reação da ordem pública para com os infratores e compensar a situação vexatória a que indevidamente foi submetido o lesado, sem reduzi-la a um mínimo inexpressivo, nem elevá-la a cifra enriquecedora.
Os danos morais devem assim ser arbitrados levando-se em consideração as circunstâncias do fato, bem como a condição sócio-econômica do ofendido e do ofensor, orientando-se a fixação da indenização pelos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade.
No caso em análise, o autor recebeu benefício no valor mensal de R$ 603,00 referentes aos meses de janeiro a maio de 2016 e no valor de cerca de R$ 1.600,00 relativo ao mês de junho de 2016 (evento 59 - HISCRE2, p. 1), pagamento efetuado em 04/07/2016. Os valores auferidos demonstram tratar-se de pessoa de baixa renda. Em agosto e setembro desse mesmo ano, o autor teve o pagamento do benefício suspenso pela autarquia previdenciária, que assumiu o erro e, imediatamente, procurou resolvê-lo.
Nesse contexto, tenho que a quantia de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) revela-se como suficiente para compensar o constrangimento que lhe foi imposto e coibir a reiteração futura do equívoco pela ré.
Dos consectários
Segundo o entendimento das Turmas previdenciárias do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, estes são os critérios aplicáveis aos consectários:
Correção monetária
A correção monetária incidirá a contar do vencimento de cada prestação e será calculada pelos índices oficiais e aceitos na jurisprudência, quais sejam:
- INPC no que se refere ao período posterior à vigência da Lei 11.430/2006, que incluiu o art. 41-A na Lei 8.213/91, conforme deliberação do STJ no julgamento do Tema 905 (REsp mº 1.495.146 - MG, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, D DE 02-03-2018).
Juros moratórios
Os juros de mora incidirão à razão de 1% (um por cento) ao mês, a contar da citação (Súmula 204 do STJ), até 29/06/2009.
A partir de 30/06/2009, incidirão segundo os índices oficiais de remuneração básica e juros aplicados à caderneta de poupança, conforme art. 5º da Lei 11.960/09, que deu nova redação ao art. 1º-F da Lei 9.494/97, cuja constitucionalidade foi reconhecida pelo STF ao julgar a 1ª tese do Tema 810 da repercussão geral (RE 870.947), julgado em 20/09/2017, com ata de julgamento publicada no DJe n. 216, de 22/09/2017.
Honorários advocatícios
Incide, no caso, a sistemática de fixação de honorários advocatícios prevista no art. 85 do NCPC, porquanto a sentença foi proferida após 18/03/2016 (data da vigência do NCPC definida pelo Pleno do STJ em 02/04/2016).
Contudo, diante do acolhimento integral ou parcial da pretensão recursal da Autarquia, descabe a majoração da verba honorária, sob pena de agravar a condenação do INSS fixada na sentença.
Custas Processuais
O INSS é isento do pagamento das custas no Foro Federal (art. 4º, I, da Lei nº 9.289/96) e responde por metade do valor no Estado de Santa Catarina (art. 33, parágrafo único, da Lei Complementar estadual 156/97).
Conclusão
Reformada a sentença para reduzir de R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais) para R$ 5.000,00 (cinco mil reais) o valor da condenação do INSS em danos morais e adequar os consectários legais.
Dispositivo
Ante o exposto, voto por dar provimento ao recurso.
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Apelação Cível Nº 5007144-54.2016.4.04.7202/SC
RELATOR: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
APELADO: JORGE ROBERTO VALENTE CASSEMIRO (AUTOR)
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. DANO MORAL. CONDUTA ILÍCITA OU OMISSIVA DO PODER PÚBLICO. COMPROVAÇÃO. QUANTUM INDENIZATÓRIO.
1. O dano moral se estabelece quando demonstrada violação a direito subjetivo e efetivo abalo moral, em razão de procedimento flagrantemente abusivo ou ilegal por parte da Administração.
2. Nas ações de reparação por dano moral, o quantum indenizatório deve ser estipulado de modo a desestimular a ocorrência de repetição de prática lesiva; de legar à coletividade exemplo expressivo da reação da ordem pública para com os infratores e compensar a situação vexatória a que indevidamente foi submetido o lesado, sem reduzi-la a um mínimo inexpressivo, nem elevá-la a cifra enriquecedora.
3. Recurso do INSS provido para reduzir o montante devido a título de dano moral.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia Turma Regional Suplementar de Santa Catarina do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, decidiu dar provimento ao recurso, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Florianópolis, 12 de julho de 2018.
Documento eletrônico assinado por JOSÉ ANTONIO SAVARIS, Juiz Federal Convocado, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40000507385v5 e do código CRC b6995084.Informações adicionais da assinatura:
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 12/07/2018
Apelação Cível Nº 5007144-54.2016.4.04.7202/SC
RELATOR: Juiz Federal JOSÉ ANTONIO SAVARIS
PRESIDENTE: Desembargador Federal CELSO KIPPER
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
APELADO: JORGE ROBERTO VALENTE CASSEMIRO (AUTOR)
ADVOGADO: CRISTIANE HAMMERSCHMITT IMMICH
ADVOGADO: FABIULA BRANCHER
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 12/07/2018, na seqüência 79, disponibilizada no DE de 26/06/2018.
Certifico que a Turma Regional suplementar de Santa Catarina, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A Turma Regional Suplementar de Santa Catarina, por unanimidade, decidiu dar provimento ao recurso.
RELATOR DO ACÓRDÃO: Juiz Federal JOSÉ ANTONIO SAVARIS
Votante: Juiz Federal JOSÉ ANTONIO SAVARIS
Votante: Desembargador Federal CELSO KIPPER
Votante: Desembargador Federal JORGE ANTONIO MAURIQUE
ANA CAROLINA GAMBA BERNARDES
Secretária
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