APELAÇÃO CÍVEL Nº 5004606-15.2016.4.04.7004/PR
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RELATOR |
: |
GISELE LEMKE |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELADO | : | ANGELINA ANDRADE DE OLIVEIRA |
ADVOGADO | : | VALDINEI APARECIDO MARCOSSI |
: | PAULO AFONSO PEGORARO FIGUEIREDO |
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. DECADÊNCIA. BENEFÍCIO. ANULAÇÃO. APOSENTADORIA POR IDADE. SEGURADO ESPECIAL. MÁ-FÉ. PROVA.
1 - O INSS tem o poder de rever e anular seus próprios atos, mediante procedimento específico, mas deve observar o prazo decadencial estabelecido no art. 103-A da Lei 8.213/91, aplicável via de regra, a não ser nos casos de comprovada má-fé.
2 - Não havendo evidências da má-fé, diante do contexto probatório e das condições pessoais da segurada, corre o prazo decadencial de 10 anos, que, uma vez consumado, impede a anulação do ato administrativo de concessão do benefício.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 31 de outubro de 2017.
Juíza Federal Gisele Lemke
Relatora
| Documento eletrônico assinado por Juíza Federal Gisele Lemke, Relatora, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 9229891v4 e, se solicitado, do código CRC EB95CCFF. | |
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 5004606-15.2016.4.04.7004/PR
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RELATORA |
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Juíza Federal GISELE LEMKE |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELADO | : | ANGELINA ANDRADE DE OLIVEIRA |
ADVOGADO | : | VALDINEI APARECIDO MARCOSSI |
: | PAULO AFONSO PEGORARO FIGUEIREDO |
RELATÓRIO
Cuida-se de apelação do INSS contra sentença (proferida em 17/02/2017) que reconheceu a decadência do seu direito de anular o ato de concessão de aposentadoria e o condenou a restabelecer o benefício.
Argumentou o recorrente que não se consumou a decadência, tendo em vista que a autora agiu de má-fé por ocasião do requerimento da aposentadoria, cujo cancelamento é devido, sendo aplicável a ressalva do art. 103-A da Lei 8.213/91, bem como o art. 115 da Lei 8.213/91.
Foram oferecidas contrarrazões pela autora.
Não houve remessa oficial.
É o relatório.
VOTO
Em 2001, a autora começou a receber do INSS aposentadoria por idade na condição de trabalhadora rural. Em 2015, teve início procedimento de revisão do ato de concessão, a partir de indícios de irregularidades, culminando o procedimento com o cancelamento do benefício (evento 30, procadm2).
Na data em que o INSS tomou providências tendentes à anulação do ato concessório, já estava em vigor o art. 103-A, caput, da Lei 8.213/91, com a redação que lhe foi dada pela Lei 10.839/04:
Art. 103-A. O direito da Previdência Social de anular os atos administrativos de que decorram efeitos favoráveis para os seus beneficiários decai em dez anos, contados da data em que foram praticados, salvo comprovada má-fé.
§ 1º No caso de efeitos patrimoniais contínuos, o prazo decadencial contar-se-á da percepção do primeiro pagamento.
§ 2º Considera-se exercício do direito de anular qualquer medida de autoridade administrativa que importe impugnação à validade do ato.
Portanto, já haviam decorrido mais de 10 anos da data do primeiro pagamento da aposentadoria, de forma que apenas em caso de comprovada má-fé seria possível afastar a decadência.
No caso concreto, não se configurou a má-fé por ocasião da concessão do benefício, valendo ressaltar que a autora se trata de pessoa não alfabetizada e, assim, mais carente de informações documentadas. A sentença deve ser mantida por sua própria fundamentação, porque analisou atentamente o contexto probatório:
Segundo o INSS, a má-fé decorreria do fato de que o benefício foi concedido com base, única e exclusivamente, em declaração firmada pela pessoa de José Maria Pereira Fernandes (que sequer tinha propriedade rural à época). Como já foi dito antes, esse argumento invocado pela Autarquia Federal para suspender seu benefício, é extremamente frágil. O simples fato de a pessoa não possuir imóveis rurais registrados em seu nome não desnatura sua condição de empregador rural, tampouco afasta, sem outras provas, a qualidade de segurada especial da autora, especialmente se considerado que no documento o empregador consta como arrendatário.
O fato de alguém não ter a propriedade de imóvel rural não o impede de trabalhar a terra, de ser agricultor. Para isso basta que tenha a posse como arrendatário, ou comodatário, por exemplo. A mera circunstância de o Sr. José Maria Pereira Fernandes não ter propriedade registral de imóveis rurais à época não indica, por si só, que ele não empregava.
Analisando a íntegra do processo administrativo é possível perceber que não foi com base apenas na declaração que o INSS concluiu tratar-se de segurada especial. A parte ainda juntou a certidão de casamento, declaração de exercício de atividade rural expedida por sindicato da categoria, entre outros, que o qualificam como lavrador.
Logo, não foi apenas com base na declaração do empregador que o benefício foi concedido. Mesmo que essa declaração fosse desconstituída, há outros elementos de prova que apontam para o desempenho da atividade rural.
De acordo com o Tribunal Regional Federal da 4ª Região:
O fato de ter havido irregularidade não significa necessariamente fraude ou má-fé no recebimento de benefício que não se revelava devido, considerando ter sido concedido na via administrativa, mediante processo regular. Isso porque, para se afastar a incidência da regra que prevê o prazo decenal para o exercício do direito do INSS de anular seus atos, é necessário que haja prova suficiente ma-fé na percepção. AC 0013111-87.2014.404.9999, QUINTA TURMA, Relator PAULO AFONSO BRUM VAZ, D.E. 23.01.2017.
É preciso separar as pessoas de José Maria, do Sindicato Rural, e da parte autora. Se aqueles laboraram em ilícito não é a parte autora quem deve responder por isso. O nome da autora não é citado uma vez sequer no relatório da operação.
(...)
O INSS, por dever de autotutela administrativa, é obrigado a revisar atos ilegais. À administração é dado anular seus próprios atos quando eivados de nulidade (art. 53 da Lei nº 9.784/99 e Súmula nº 473 do STF). A restituição de benefício previdenciário concedido ilegalmente tem fundamento principal: (a) na vedação ao enriquecimento sem causa do beneficiário, prevista no art. 884 do Código Civil: "aquele que, sem justa causa, se enriquecer à custa de outrem, será obrigado a restituir o indevidamente auferido, feita a atualização dos valores monetários"; (b) no princípio administrativo da supremacia do interesse público sobre o privado e no poder de autotutela da Administração Pública.
Esse poder-dever da Administração condiciona-se, no entanto, à comprovação das referidas ilegalidades em processo administrativo que oportunize ao administrado as garantias constitucionais da ampla defesa e do contraditório (art. 5º, LV, da CF/88 e Súmula nº 160 do extinto TFR, e Lei nº 9.784/99 ). De acordo com o relatório do evento 38, foram 280 (duzentos e oitenta) benefícios concedidos no período, nem todos eles são necessariamente fraudulentos. Não se pode fazer cessar todos eles sem uma investigação individualizada. A Autarquia sequer levou em consideração a defesa administrativa que a parte autora aviou, muito menos a convocou para oitiva.
Se o INSS se fia exclusivamente em declaração de sindicatos, isso é algo que se constitui numa falha estrutural que não pode ser atribuída aos verdadeiros segurados. Se houve prejuízo, é o fraudador quem deve pagar.
Assim, não havendo má-fé comprovada, há que se reconhecer a decadência, condenando-se o INSS a restabelecer o benefício e pagar os atrasados.
Desta forma, deve ser mantida a ordem de restabelecimento do benefício, estando a fundamentação da sentença de acordo com a jurisprudência deste TRF:
PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. AGRAVO DE INSTRUMENTO. ANTECIPAÇÃO DE TUTELA. PENSÃO. BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO.
- A tutela de urgência será concedida quando houver elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo. Inteligência do art. 300 do CPC.
- O cancelamento de qualquer ato da natureza da demanda pressupõe a instauração de procedimento específico, com notificação do interessado, oportunizando-se ainda que ele produza provas e exerça plenamente seu direito de defesa. Inviável, assim, o cancelamento sumário, pois deve ser observado o que dispõe o artigo 5º, inciso LV da Constituição federal.
- Quando não há prova de ilegalidade que possa justificar a anulação do ato pela Administração, mas tão-somente mudança de critério interpretativo, ou mesmo reavaliação da prova, não se mostra possível o desfazimento do ato administrativo.
- Em toda situação na qual se analisa ato de cancelamento de ato administrativo, há necessidade de análise do caso concreto, considerando-se, por exemplo, o tempo decorrido, as circunstâncias que deram causa à concessão do benefício, as condições sociais do interessado, sua idade, e a inexistência de má-fé, tudo à luz do princípio da segurança jurídica.
- Na hipótese, presente a presunção de legitimidade do ato de concessão e, ainda, o caráter alimentar do benefício, recomendável a manutenção dos pagamentos até ulterior decisão, considerando-se, ademais, que não houve prova de fraude ou de má-fé por parte da segurada, até o momento.
(TRF4, AG 5044259-84.2016.404.0000, TERCEIRA TURMA, Relator RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA, juntado aos autos em 22/02/2017)
Devem ser mantidos os critérios de juros e de correção monetária estabelecidos pela sentença, que estão de acordo com o julgamento do RE 870.947 pelo STF.
O INSS pagará à parte contrária honorários de advogado de 15% do valor da causa, na forma do art. 85, § 11, do CPC.
Ante o exposto, voto por negar provimento à apelação.
Juíza Federal Gisele Lemke
Relatora
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 28/11/2017
APELAÇÃO CÍVEL Nº 5004606-15.2016.4.04.7004/PR
ORIGEM: PR 50046061520164047004
RELATOR | : | Juíza Federal GISELE LEMKE |
PRESIDENTE | : | Luiz Carlos Canalli |
PROCURADOR | : | Dr. Fábio Nesi Venzon |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELADO | : | ANGELINA ANDRADE DE OLIVEIRA |
ADVOGADO | : | VALDINEI APARECIDO MARCOSSI |
: | PAULO AFONSO PEGORARO FIGUEIREDO |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 28/11/2017, na seqüência 579, disponibilizada no DE de 13/11/2017, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, a DEFENSORIA PÚBLICA e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 5ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Juíza Federal GISELE LEMKE |
VOTANTE(S) | : | Juíza Federal GISELE LEMKE |
: | Des. Federal LUIZ CARLOS CANALLI | |
: | Juiz Federal ÉZIO TEIXEIRA |
Lídice Peña Thomaz
Secretária de Turma
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